segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Book, revolução tecnológica


PUNIÇÃO PARA TROTE VIOLENTO

CORREIO BRAZILIENSE


Causa constrangimento e repulsa a notícia do trote levado avante na Universidade de Brasília (UnB). Veteranos da Faculdade de Agronomia e Veterinária (FAV) submeteram as calouras a situações humilhantes. Entre elas, obrigaram as moças a lamber linguiça vestida de camisinha lambuzada de leite condensado, em alusão à prática de sexo oral. Em torno, presentes riam e ridicularizavam as moças. Fotos da exibição entraram na internet e circularam mundo afora.

Alunas do curso, inconformadas, denunciaram a coação imposta às novatas à Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. “É a permanência de gestos e posturas que colocam a mulher na situação subalterna, além de ser uma violência moral”, julgou a titular da pasta, ministra Iriny Lopes, que pediu esclarecimento à Reitoria da UnB. O diretor da FAV, Cícero Lopes da Silva, considerou o episódio “lamentável”. Segundo ele, os organizadores do ato haviam sido avisados de que a universidade não ficaria passiva se ultrapassassem os “limites aceitáveis”.

Espera-se que as palavras se transformem em ação. É inaceitável que as dependências de uma das mais importantes instituições de ensino superior do país sirvam de palco para tão degradante espetáculo. Os responsáveis pela universidade precisam tomar medidas exemplares a fim de, por um lado, punir os abusos cometidos e, por outro, inibir tentações de reprise de eventos como o da FAV. A futura elite nacional tem de lembrar-se de que as relações devem ser movidas pela civilidade, não pela barbárie.

Receber os novos colegas com brincadeiras de boas-vindas constitui tradição nos câmpus. Em tempos não muito distantes, estudantes consideravam o trote espécie de troféu. Exibir a cara pintada ou os cabelos multicoloridos era a demonstração pública de que haviam ultrapassado mais uma etapa importante na vida. A brincadeira, organizada pelos colegas veteranos, funcionava como rito de passagem.

O calouro deixava a vida tutelada para trás e ingressava na idade adulta — com os desafios de adquirir os conhecimentos e conquistar as habilidades necessárias ao exercício profissional. Terminada a cerimônia, pais e filhos andavam orgulhosos pelas ruas, numa mostra de dupla vitória. O espírito cordial que movia os discentes de então precisa voltar. A gentileza tem vez no século 21.
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Descontinuar continuando


Gaudêncio Torquato
O ESTADO DE SÃO PAULO

Continuar ou descontinuar? Essa tem sido recorrente questão sempre que novos governantes começam a gestão. Este jornal mostrou, na terça-feira, que a sucessão nos governos dos Estados interrompe programas, altera ênfases administrativas, impõe novos rótulos, sendo a descontinuidade a marca não apenas de opositores que ganharam o pleito, como Siqueira Campos (PSDB), que decidiu eliminar da fisionomia pública do Tocantins todos os traços do antecessor, Carlos Gaguim (PMDB), mas de correligionários, como é o caso, em São Paulo, do tucano Geraldo Alckmin, que ordenou a revisão de contratos do ex-governador José Serra. A descontinuidade, vale dizer, é um fenômeno natural do regime democrático, na medida em que ele ganha oxigênio com rodízios no comando de poder e, por conseguinte, com a adoção de abordagens diferentes nas administrações federal, estadual e municipal. A tese seria inquestionável se a descontinuidade abrigasse mudança de programas ineficazes e continuidade de ações positivas e aprovadas pelas comunidades. No caso brasileiro, porém, o verbo descontinuar significa apagar vestígios da gestão anterior e colocar em seu lugar a moldura do governo seguinte.

Se a estratégia objetiva elevar os perfis de novos governantes, e não a modernização de processos ou mesmo a calibragem de programas já existentes, a conclusão é de que, no País, a expectativa de mudança fica só na promessa. A descontinuidade administrativa, aqui entendida como retorno ao ponto de partida, adquire o paradoxal significado de continuísmo. Expliquemos: os governantes que se sucedem promovem mudanças de forma, mas não de fundo, consolidando o jogo de soma zero: o ganho de um é a perda de outro, o que o anterior faz o posterior anula. A alternância do poder não significa, nesse caso, a mudança de valores e padrões de comportamento tradicionais, a racionalização das estruturas, a criação de ações e programas voltados para a melhoria do bem-estar coletivo, a substituição de critérios políticos por parâmetros de desempenho e a distribuição mais equitativa de recursos materiais e simbólicos. Em suma, o campo das reformas clamadas pela coletividade é substituído pelo território das conveniências pessoais. A dinâmica, apontada como atributo do rodízio de poder, submete-se à estática (e estética) condizente com a glorificação dos mandatários. Ora, esse custo alto que a democracia paga acaba corroendo parcela das riquezas de uma nação.

Imaginemos, por exemplo, se a política urbana e de meio ambiente fosse uma linha contínua, sempre avançando na régua dos governos, desde os idos de 1985, quando foi criado o Ministério do Desenvolvimento Urbano e do Meio Ambiente. Veríamos, hoje, as tragédias e catástrofes que assolam a vida nacional? Pouco provável. O fato é que o esforço de coordenação das políticas urbana e ambiental, que se enxergava naquela pasta, fragmentou-se ao longo das administrações, a partir de 1989, quando suas atribuições se repartiram em quatro Ministérios. Criaram-se, desde então, diversos órgãos que se foram acomodando aos novos comandos ministeriais. A divisão de programas e espaços foi se amoldando aos interesses partidários, na esteira da complexidade que a política vem adquirindo nos últimos anos. O efeito sanfona - vai e vem - dos formatos ministeriais contribui, sobremaneira, para "a filosofia das novas soluções" que os gestores públicos expõem quando iniciam sua jornada. Nas novas planilhas, prioridades são afastadas; nomes de programas ganham rotulação criativa, atendendo aos parâmetros do Estado da fosforescência e novas ênfases são arrumadas. Como a vasta seara social é a que rende mais frutos na colheita eleitoral, é em torno dela que se processam as mais fortes ações de (des)continuidade. Programas assistencialistas, e de evidente viés populista, passam a ser a "bola da vez" em todos os recantos. Para coroar a festança os governantes, com a maior cara de pau, pegam carona no velho refrão: "É melhor ensinar a pescar que dar o peixe".

Parte da aguerrida estratégia da descontinuidade que descamba no continuísmo de métodos convoca ao palco de guerra políticos e burocratas, estes querendo avocar domínio do conhecimento técnico, aqueles erguendo a bandeira da vitória nas urnas. Mais uma vez, os efeitos são deletérios: mudança de rumos nas ações de governo, desestímulo de equipes, tensão nos ambientes, animosidade e chantagens. Diante dessa radiografia cheia de furos, a pergunta é: como atenuar os rombos do custo Brasil do desperdício decorrente da descontinuidade? Sementes de racionalidade, felizmente, começam a florescer. A começar pela defesa intransigente da ideia de que territórios que exijam intensa e insubstituível identidade técnica sejam administrados por perfis condizentes com seu escopo. Outro caminho que pode servir para contornar os obstáculos é a própria democracia participativa. Um corpo de representantes da comunidade - escolhidos no seio de entidades respeitadas da sociedade civil - poderia apontar os programas que devem ser continuados e as ações que precisam ganhar nova rota. A parceria entre União e Estados, resultando em programas integrados, também se apresenta como alternativa para evitar os estragos de desgovernos.

Não existe, porém, melhor baliza para os governantes que o bom senso. E não é difícil saber onde está o bom senso em matéria de administração pública. É só tentar descobrir o que é novo e o que é obsoleto. O que vou fazer é algo efetivamente inovador ou essa ideia é coisa desgastada?

Srs. governantes, meditem sobre a pergunta. Jorge Luis Borges escreveu: "Somos nossa memória, somos esse quimérico museu de formas inconstantes, essa pilha de espelhos rotos". Pois bem, olhem para esses espelhos. Mesmo rotos, eles poderão mostrar aos governantes de boa vontade uma aurora brilhante na administração.

JORNALISTA, PROFESSOR TITULAR DA USP, CONSULTOR POLÍTICO E DE COMUNICAÇÃO
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Entre grades



VERISSIMO - O Estado de S.Paulo

O Vladimir Nabokov certa vez deu uma curiosa explicação sobre a origem do seu romance Lolita. Disse que sua inspiração fora a notícia que lera em algum lugar sobre uma experiência feita num jardim zoológico em que ensinaram um gorila a desenhar, e o primeiro desenho feito pelo gorila foi das barras da sua jaula.

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Se Nabokov não estava deliberadamente tentando enlouquecer um entrevistador - afinal, o que o gorila entre grades tem a ver com a história da paixão de um homem mais velho por uma menina de 12 anos, e seu trágico desfecho? - sua resposta pode ter vários significados. Um deles é o confinamento dentro do próprio texto que é a sina de todo autor, mais evidente no caso do narrador de Lolita, um prisioneiro do seu estilo tanto quanto da sua obsessão por ninfetas. Como o gorila artista dentro da sua jaula, o narrador escreve sobre os seus limites. O seu verdadeiro assunto é a linguagem.

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Humbert Humbert, o narrador de Lolita, escreve em vários níveis de paródia. Parodia a vulgaridade americana do ponto de vista de um intelectual europeu mas também faz uma a paródia do intelectual europeu deslocado e ridicularizado no Novo Mundo, em que o autodesprezo pela sua impostura cultural se mistura com a culpa. Mas ele não pode se livrar nem do seu pedantismo nem da sua obsessão. Lolita está cheio de jogos de palavras, imagens preciosistas, símbolos obscuros, referências literárias - toda a parafernália da ostentação intelectual mobilizada para um só fim, o de justificar uma paixão incomum. Tanto o gorila quanto o Humbert Humbert descrevem o que os separa do mundo.

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No livro A Última Tentação de Cristo de Kazantzakis há um diálogo em que um personagem diz a outro que seus olhos não entendem a mensagem de um profeta porque não veem nada além das palavras. "Mas o que as palavras podem dizer? Elas são as grades negras de uma prisão onde o espírito grita para ser ouvido." No seu livro Speak, Memory (Fala, memória) o próprio Nabokov diz que está "cativo num zoo de palavras". A ideia das palavras como grades que impedem a expressão do espírito ou como uma insatisfatória seleção sem alternativas de animais atrás das cercas de um zoo deve ter ocorrido a muitos autores. Em toda a fascinante literatura da Clarice Lispector, por exemplo, se repete este choque com o limite da linguagem, esta incapacidade angustiante de dizer o indizível, de ultrapassar as grades. O que se quer dizer está sempre lá fora, além das palavras.

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"A glória de Deus é encobrir, mas a glória dos reis é tudo investigar", disse Salomão (Provérbios 25:2). Substitua-se "reis" por escritores e artistas e sua busca de glória pela investigação de toda a experiência humana e seus mistérios, e chegamos ao Nabokov e seu gorila. Nunca ultrapassaremos as grades. Podemos no máximo sacudi-las com mais ou menos talento ou vigor, mas resignados à ideia de que a verdadeira glória de Deus começa onde termina a linguagem.

Pois se trata de um Deus ciumento, senhor de todas as nossas paixões, e indisposto a compartilhar sua glória, ou sua literatura, com quem quer que seja. Mesmo o Nabokov ou a Clarice. 
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Cocaína, prisão, educação

MARA GABRILLI
FOLHA DE SÃO PAULO 

Os desafios para combater o tráfico são imensos e exigem tanta coragem e esforço quanto para que avancemos em políticas educacionais

Patricia e Funani são sul-africanas. Karima é marroquina; Rodora, filipina; Ligia, moçambicana; Ireri, mexicana; Hadja e Jéssica são francesas. Estão cumprindo pena em São Paulo por tráfico de drogas.

Fui apresentada a elas pelo secretário de Estado da Cultura, Andrea Matarazzo, por meio de um projeto cultural da Funap (Fundação de Amparo ao Preso) nas penitenciárias. Falei de superação e cidadania para 120 presas enquanto a ocupação do Complexo do Alemão no Rio dominava as manchetes dos jornais.

Essas estrangeiras refletiram sobre liberdade e sobre serem prisioneiras de suas escolhas de modo tão profundo que percebi uma enorme diferença de acesso à educação em relação às brasileiras. Não que ir à escola impeça as escolhas erradas, mas favorece, sim, a reinserção social.

O Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), a avaliação educacional mais relevante do mundo, procura medir também a capacidade dos estudantes de refletir, argumentar e comunicar. A mais recente, divulgada no início de dezembro, apontou uma melhora na educação brasileira, porém ainda ocupamos a 53ª posição em leitura e ciências e a 57ª em matemática, em ranking de 65 países.

A leitura é a habilidade mais valorizada. Para ter a nota mais alta, o estudante deve combinar múltiplas e diferentes partes de informações independentes, de contexto não familiar, em ordem precisa. Só 1,4% dos alunos atingiram esse nível.

E ali estava a francesa Hadja, presa em uma penitenciária no Brasil, que resumiu minha palestra para algumas sul-africanas que não dominavam o português e que se queixaram de que haviam perdido muito do conteúdo.
Compreendeu e sintetizou diante de todos uma explanação em uma língua que não é a sua e a traduziu para um terceiro idioma. A França ocupa a 22ª posição no Pisa.

Pergunto-me o que leva pessoas talentosas como Hadja, que podem ter outras oportunidades, a violar seus corpos, carregando cocaína dentro deles. Segundo a Polícia Federal, desde 2008 as prisões por tráfico de drogas no Aeroporto Internacional de Cumbica aumentaram 253%. Em 2010, a ONU apontou o Brasil como o principal corredor de cocaína do mundo.

Em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, a violência imposta pelo narcotráfico faz com que as crianças moradoras das favelas tenham mais problemas de aprendizagem do que seus colegas que não moram em áreas de risco. Mas são essas as crianças que mais precisam das oportunidades da educação para sair da pobreza.

Os desafios para combater o tráfico nas cidades e nas fronteiras são imensos. Exigem tanta coragem e esforço quanto para avançar em políticas para uma educação universal e de qualidade. Ambos são complexos, multifacetados e vitais para melhorar a qualidade de vida, especialmente dos mais excluídos.
Por isso, aguardo com ansiedade conhecer as medidas que serão tomadas pelo novo governo, já que há muito a ser feito e a investir nessas áreas no Brasil.

MARA GABRILLI, psicóloga, publicitária, é vereadora de São Paulo pelo PSDB e deputada federal eleita.
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Espigas chochas

Caros amigos e todos os que me dão a honra de seguir este blog.
Relações internacionais e comércio exterior são atividades para serem conduzidas por estadistas e não amadores.

Desculpem os que deram 87% de aprovação, mas o que a França irá propor faz parte de uma aproximação acidentada ocorrida desde 2009 muito além do propósito de vendas dos caças.
A questão individualizada de querer ser um líder reconhecido mundialmente, poderá colocar a nova presidente de saias justas.

No fim, como nossa destinação é agrícola em função de nossa baixa capacidade de produção de alto valor agregado em função de nossa eternamente patinante educação básica e técnica, o que nos resta de diferencial competitivo é a agricultura.

A questão de estoques reguladores de alimentos em âmbito mundial está mirando nossa independência de produção e de comércio exterior.

O Barão do Rio Branco já dizia que entre países não há amizades, há interesses.
É por isso que para dirigir um país complexo como o Brasil tem que se ter preparo intelectual.
Vale a pena acompanhar o tema.

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Celso Ming 
O Estado de S.Paulo

Desde José do Egito os dirigentes políticos tratam de garantir suprimentos de grãos para a população.

E foi quando tratava de abastecer Roma com carregamentos de trigo que Pompeu, o Grande, proferiu uma frase que se tornou lema de inúmeras companhias de navegação: "Navegar é preciso, viver não é preciso", ordenou ele ao capitão de seus navios que insistia em permanecer no porto para não ter de enfrentar uma tempestade.

O presidente da França, Nicolas Sarkozy, prepara-se para assumir a presidência rotativa do Grupo dos 20 (G-20) e avisou reiteradas vezes, a última delas em sua participação no Fórum Econômico Mundial realizado essa semana em Davos (Suíça), que vai propor a criação de um sistema global de estoques reguladores de alimentos. Ele acha que a disparada dos preços das commodities está colocando em risco a segurança alimentar da humanidade.

Há razões para desconfiar de que Sarkozy quer apenas montar um esquema que aumente os subsídios agrícolas na França e em toda União Europeia, e, nessas condições, recuperar a boa vontade do eleitor.

Estoques reguladores podem funcionar dentro de um determinado país quando se trata de reduzir as perdas provenientes de quebras de safra. Mas não fazem sentido em escala global.

Também desde José do Egito sabemos que há períodos de espigas cheias e vacas gordas sucedidos por períodos de espigas chochas e vacas magras. No entanto, em escala mundial, quando há um ano de seca em um continente, há ano de boas chuvas em outra parte. A produção mundial tende a se compensar reciprocamente.

A atual escalada dos preços apenas em parte se deve a quebras de safra, como é o caso do trigo, cuja cultura foi duramente atingida em 2010 pela seca na Ucrânia, um dos grandes produtores. Para Sarkozy, o principal fator de alta é a especulação financeira no mercado de derivativos. Segunda-feira, criticara a versão preliminar de um relatório da União Europeia que concluiu que a especulação global na área é irrelevante. Sarkozy recomendou que o documento fosse publicado no Dia da Mentira, ou seja, em 1.º de abril. Ele parece ter interesse em que se eleja a especulação como responsável por tudo porque também defende a criação de um imposto mundial sobre transações financeiras (uma espécie de CPMF global), aparentemente porque quer contar com mais dinheiro na mão.

É difícil escapar do diagnóstico de que o principal acelerador dos preços é mesmo o aumento do consumo, especialmente pela população asiática, cujo poder aquisitivo cresce rapidamente. Além de mais demanda para alimentação, cada vez maior volume de grãos está sendo canalizado para a ração animal e para a produção de etanol, especialmente nos Estados Unidos e na Europa.

A criação de um sistema global de formação de estoques reguladores tenderia a novas distorções. Os preços subiriam ainda mais porque, além de atender ao consumo crescente, seria preciso canalizar a produção para os armazéns.

Além disso, o simples crescimento dos estoques seria fator de derrubada de preços e, portanto, de desestímulo da produção, especialmente em países de produtividade mais baixa. Aparentemente, Sarkozy está forçando esse projeto para reforçar o orçamento de subsídios do Plano Agrícola Comum (PAC), da União Europeia, e compensar com novas jogadas a mediocridade de seu governo.
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Como cego em tiroteio


FERREIRA GULLAR
FOLHA DE SÃO PAULO

Muitos juristas insistem na complacência que favorece o criminoso e fere o direito dos cidadãos
EM BOA hora, o ministro da Justiça demitiu o novo secretário nacional de Políticas sobre Drogas, que mal assumira propôs acabar com a pena de prisão para o pequeno traficante. A ideia era trocar a prisão por penas alternativas e assim evitar que ele seja aliciado pelo crime organizado dentro das penitenciárias. Ou seja, se não for preso, para de traficar. Você acredita nisso? Sou a favor de penas alternativas para autores de delitos menores e, sobretudo, quando não significam ameaça grave à sociedade. Não há por que meter na cadeia o sujeito que deu desfalque ou o autor de pequenas burlas no fisco. A prisão se torna indispensável para o homicida, o estuprador, o assaltante. No entanto, com frequência, se sabe de estupradores e homicidas que voltam a atacar graças a privilégios que a lei lhes concede, como o de passar o Natal com a família. Eles saem da cadeia, não retornam e voltam a estuprar e matar.

Há muita coisa errada na aplicação da justiça no Brasil. Todo mundo sabe disso. Mas muitos juristas insistem na complacência que favorece o criminoso e fere o direito dos cidadãos. Um ministro da Justiça chegou a propor a revogação da lei que pune o crime hediondo, alegando que como não reduzira esse tipo de crime, mostrou-se dispensável. Esse é o mesmo raciocínio com que se pretende pôr fim à repressão ao tráfico de droga, sob o pretexto de que, apesar dela, o tráfico cresceu.

Mas paremos para refletir: não faz séculos que a sociedade pune criminosos? Não obstante, a criminalidade continua a crescer. Devemos, então, acabar com a Justiça e todo o aparato policial, uma vez que se mostraram incapazes de reduzir o crime? Essa é uma conclusão simplista, que ignora as inúmeras causas da criminalidade. Se o comércio de drogas tem aumentado, apesar da repressão aos traficantes, é que estes contam com a colaboração preciosa de centenas de milhares de consumidores de drogas. Entre estes estão desde os garotos de escola, os adolescentes das favelas até gente bem posta na vida, como executivos, artistas, esportistas etc. O que explica o aumento do consumo de drogas, mais que a ineficiência da repressão, é a adesão crescente de pessoas de todas as classes sociais. Basta raciocinar, honestamente, sem sofismas: quando o comércio de automóveis aumenta é porque aumentou o número de compradores de automóveis. A solução do problema do tráfico está na redução do número de consumidores de drogas. E isso só se conseguirá promovendo uma ampla campanha de esclarecimento (entre outras medidas) em nível nacional e internacional, a fim de que os jovens entendam o que a droga tem de destrutivo e nefasto. Se se conseguir reduzir o consumo, reduzir-se-á consequentemente a produção e o tráfico.

No entanto, não vejo quase ninguém preocupado com isso. Raramente li ou ouvi declarações de autoridades ou militantes nesse campo que considerem a redução do número de consumidores a medida prioritária para combater o tráfico de drogas.

Em vez disso, defende-se a descriminalização das drogas e a não punição dos consumidores, que seriam, todos eles, vítimas patológicas do vício e, como tais, devem ser tratados e não punidos. Na verdade, do mesmo modo que a maioria dos consumidores de bebidas alcoólicas não é alcoólatra, a maioria dos consumidores de drogas as consume socialmente. Desse modo, pensando ajudar os que são de fato vítimas, livra-se da repressão a grande maioria dos que consomem drogas socialmente e mantêm o mercado do tráfico.

Como se isso não bastasse, surgiu agora essa nova proposta tão ou mais desastrada que aquela: livrar de prisão o pequeno traficante, que logo contou com a adesão de especialistas nesse assunto. Um deles chegou a afirmar que quem a isso se opõe é "moralista", como se consumir drogas fosse uma conquista ética e combatê-las, um retrocesso moral. A alegação de que o pequeno traficante, se preso, será aliciado pelo crime organizado, não tem cabimento, uma vez que, se ele foi preso, é porque já traficava. Trocar a prisão por trabalho comunitário seria ampliar sua área de atuação, agora sob proteção oficial.
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OS PREOCUPANTES NÚMEROS DA DENGUE

O GLOBO

Na semana que passou, dois episódios ligados à questão da dengue foram o sinal de que, tendo o país entrado na temporada de alto verão - e consequentemente de temperaturas propícias à reprodução do Aedes aegypti -, a luta contra a doença volta a entrar na ordem do dia. O primeiro aceno de que o front da guerra ao mosquito está reaberto partiu do Ministério da Saúde, ao tornar obrigatória a notificação em 24 horas dos casos graves decorrentes da contaminação e das mortes por ela provocadas. O segundo serve como preocupante advertência: em Mato Grosso, deu-se o primeiro óbito de 2011 de uma vítima da dengue. Pelo histórico de outros anos, a este registro infelizmente deverão se seguir outros em todo o país. 

A decisão do Ministério da Saúde é obviamente acertada, mas vem carimbada com a marca da lentidão com que, em geral, o poder público tem partido nas sucessivas corridas contra a ação do mosquito. A comunicação compulsória das mortes por dengue se incorpora com alguns anos de atraso ao arsenal de medidas para combater o mal provocado pelo Aedes aegypti. Por definição, tais notificações são um instrumento imprescindível para evitar epidemias. Ora, o país tem enfrentado grandes surtos da doença há pelo menos uma década e meia. O caráter sazonal dessas irrupções, portanto, já justificava a adoção do sistema de informações compulsórias há alguns anos. De qualquer forma, espera-se que, com a oficialização de tal providência, o país passe a contar com um eficiente instrumento administrativo para enfrentar a doença. 

Os ataques do mosquito à saúde da população brasileira são preocupantemente crescentes. Em 1996, a doença infestava 1.753 municípios e, dez anos depois, já se alastrava por quase 4 mil do total de 5.560. Hoje, seguramente o número é maior. Entre 2009 e 2010, os casos de dengue quase triplicaram no país: de acordo com dados do Ministério da Saúde, mais de um milhão de pessoas foram infectadas ano passado (contra 323 mil em 2009). O registro de óbitos saltou de 298 para 592 no mesmo período. O Estado do Rio ocupa uma posição destacada neste quadro: até 16 de outubro de 2010, 18.800 casos haviam sido notificados pela Secretaria de Saúde fluminense, contra 6 mil no ano anterior. 

Também no Centro-Oeste houve um significativo avanço da doença (203 mil casos em 2010 contra 70 mil no ano anterior). No Sudeste, o aumento foi de 364%. Mas foi na Região Sul que se verificou a variação mais inquietante na curva de infecção, com um aumento de quase 2.800% no número de pessoas infectadas (que pulou dos 1.450 casos registrados há dois anos para 42 mil notificações em 2010). Além dessa mudança no perfil epidemiológico da região, constataram-se no Sul os primeiros casos de infecção em municípios situados na serra. Estes dados projetam um quadro em que, para combatê-lo, cada parte - Estado e população - precisa assumir seu quinhão de responsabilidade. Aos organismos da área de Saúde e poderes públicos em geral deve-se cobrar programas efetivos de prevenção da doença e, nos casos de infecção, de atendimento às vítimas, de modo a, no mínimo, reduzir as estatísticas de morte; e à população cabe erradicar hábitos que facilitem e estimulem a proliferação do vetor (afinal, o mosquito da dengue não nasce só no quintal do vizinho). É uma luta de todos. 
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Caso Battisti, questão de somenos?

Paulo Brossard

Ainda não se passou um mês do termo do maior e melhor governo da história do Brasil, segundo a versão de seu protagonista, assoalhada aos quatro ventos, e sua sucessora continua a ter de digerir capítulos indigestos da herança recebida.

O caso da extradição do italiano Battisti é um deles e não é dos menos expressivos. Curiosamente, o presidente expirante aguardou até o último dia de seu mandato para, louvando-se em parecer da Advocacia-Geral da União, e com base nele, negar a extradição. Nesse entretempo, não cessaram manifestações de entidades de alta responsabilidade. Uma delas do Parlamento Europeu... outra do chefe de Estado da República Italiana dirigida à presidente da República do Brasil.

Não quero e não devo rediscutir teses que o Supremo Tribunal Federal já enfrentou, decidiu, e que poderá ter de voltar a pronunciar-se à vista e consequência do conflito arquitetado, mas posso e devo fazê-lo como cidadão e como estudante de temas jurídicos, a fim de opinar acerca da singularidade da emergência; contudo desejo limitar o campo de apreciação aos seus termos mais singelos e objetivos.

Tendo sido encaminhado ao Supremo Tribunal Federal o pedido de extradição formulado pelo Estado italiano, processada a querela, a decisão derradeira seria da Corte Suprema, como se lê na Constituição, artigo 102, “compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente a guarda da Constituição cabendo-lhe: I – processar e julgar originariamente g) a extradição solicitada por Estado estrangeiro”. Foi o que se deu, tendo o Supremo Tribunal determinado que, quanto à entrega do extraditando, o presidente da República tinha obrigação de agir nos termos do tratado firmado entre o Brasil e a Itália.

Ora, tratando-se de competência originária e cabendo ao Tribunal Supremo processar e julgar a extradição, nele começa e termina o julgamento da extradição requerida, pois só a ele compete processar e julgar a extradição requerida. Em matéria de extradição, em lei alguma se reserva atribuição à Advocacia-Geral da União. De mais a mais, convém lembrar que o presidente da República não é parte do processo de extradição. Partes são o requerente e o extraditando.

Quando o ex-presidente, no último dia de seu mandato, praticamente “recorreu” da decisão do Supremo Tribunal Federal para um serviço de assessoramento do Poder Executivo, embora não houvesse recurso, na prática “cassou” o acórdão do Supremo Tribunal, prolatado em processo originário e portanto irrecorrível. Ainda mais, o então presidente da República deixou de observar o expresso na ementa do acórdão da extradição, aliás, transitado em julgado:

“(...) Obrigação apenas de agir nos termos do Tratado celebrado com o Estado requerente. (...) Decretada a extradição pelo Supremo Tribunal Federal, deve o Presidente da República observar os termos do Tratado celebrado com o Estado requerente, quanto à entrega do extraditando.”

Ainda mais, o Executivo atribuiu-se a prerrogativa de ignorar o julgamento do Supremo e, ignorando-o, a ele atribuir o caráter de mera opinião. Ora, o Supremo Tribunal Federal não dá opiniões a ninguém; sendo órgão máximo do Poder Judiciário, não lhe cabe emitir pareceres para fins acadêmicos, mas processar e julgar conclusivamente.

Para encerrar, se bem me lembro, em nenhuma das extradições requeridas, processadas e julgadas pelo Supremo Tribunal Federal, a douta Advocacia-Geral da União teve acesso. Esta parece-me a situação a que o país foi jogado, como se a questão fosse de somenos.

*Jurista, ministro aposentado do STF
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A Toalha de Mesa

Um novo pastor, recentemente formado, e sua esposa, que foram encarregados de reabrir uma igreja no bairro de Brooklyn, NY. Chegaram no início de outubro, entusiasmados com a oportunidade.
Quando viram a igreja, observaram que havia muitos estragos e um grande trabalho a ser feito. Sem se deixar abater, estabeleceram como meta deixar tudo pronto para o primeiro serviço: o culto de Natal.
Trabalharam sem descanso, consertando o telhado, refazendo o piso, pintando... e, muito antes do Natal, em 18 de dezembro, tudo estava pronto!
Mas, no dia seguinte, 19 de dezembro, desabou uma terrível tempestade que durou por dois dias.
No dia 21, o pastor foi até a igreja. Seu coração doeu... viu que o telhado tinha quebrado e que uma grande área do revestimento de gesso decorado, da parede do santuário, logo atrás do púlpito, havia caído.
O pastor, enquanto limpava o chão, pensava em como resolver a situação.
No caminho de casa, pensando em adiar o culto de Natal, observava as vitrines, enfeitadas para a época, quando notou um bazar beneficente e parou por instantes.
Uma linda toalha de mesa, de crochet, na cor marfim, com um crucifixo delicadamente bordado no centro chamou-lhe a atenção.
Era do tamanho exato para cobrir o estrago atrás do púlpito. Comprou-a e voltou para a igreja.
Começou a nevar. Apressou seus passos e quando chegava à porta da igreja, uma velha senhora vinha correndo em direção contrária tentando pegar o ônibus, o que não conseguiu.
O pastor convidou-a a entrar para esperar pelo próximo, abrigando-se do frio que viria 45 minutos depois.
Ela sentou-se num banco e nem prestava atenção no pastor que já providenciava a instalação da toalha de mesa na parede. Ao terminar, afastou-se e pôde admirar o quanto a toalha era linda e servia perfeitamente para esconder o estrago.
Então, o pastor notou a velha encaminhando-se para ele. Seu rosto estava lívido e perguntou:
-- Pastor, onde o senhor encontrou essa toalha de mesa?
O pastor contou a história. A mulher pediu-lhe que examinasse o canto direito inferior para encontrar as iniciais EBG bordadas.
O pastor fez o que a mulher pediu e, intrigado, confirmou.
A mulher disse:
-- Essas são as minhas iniciais.
Ela havia feito essa toalha de mesa há 35 anos, na Áustria. Contou que, antes da guerra, ela e seu marido estavam "bem-de-vida". Quando os nazistas invadiram seu país, combinaram fugir: ela iria antes e seu marido a seguiria uma semana depois. Ela foi capturada, trancada numa prisão e nunca mais viu seu marido e sua casa.
O pastor ofereceu a toalha, mas, ela recusou, dizendo que estava num lugar muito apropriado. Insistindo, ofereceu-se para levá-la até sua casa; era o mínimo que poderia fazer. Ela morava em Staten Island e tinha passado o dia no Brooklin para um serviço de faxina.
No dia de Natal a igreja estava quase cheia. Foi um lindo trabalho.
Ao final, o pastor e sua esposa cumprimentaram os fiéis um a um à porta e muitos diziam que retornariam.
Um velho homem, que o pastor reconheceu pela vizinhança, permaneceu sentado, atônito.
O pastor aproximou-se e, antes que dissesse uma palavra, o velho perguntou:
-- Onde o senhor conseguiu a toalha de mesa da parede? Ela é idêntica à uma que minha mulher fez, muitos anos atrás, quando vivíamos na Áustria, antes da guerra. Como poderiam existir duas toalhas tão parecidas?
Imediatamente, o pastor entendeu o que tinha acontecido e disse:
-- Venha... Eu vou levá-lo a um lugar que o senhor vai gostar muito.
No caminho o velho contou a mesma história da mulher. Ele, antes de poder fugir, também havia sido preso e nunca mais pôde ver sua mulher e sua casa, por 35 anos. Ao chegar à mesma casa onde deixara a mulher, três dias antes, ajudou o velho a subir os três lances de escadas e bateu na porta.
Creio que não há necessidade de se contar o resto da história. Quem disse que Deus não trabalha de maneira misteriosa?
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domingo, 30 de janeiro de 2011

HP Orquestra


Direitos e liberdade


O mesmo se aplica à recriminação de adeptos de certos cultos religiosos. Neste caso situavam-se o umbandismo e o candomblé, que chegaram a ser havidos como sinônimos de macumba. "Pais de santo" fumando charutos, "pombas giras" rodopiando pelos terreiros, ora se propunham a eliminar males espirituais dos fieis, ora se propunham a colocá-los nos inimigos desses mesmos fieis. Nestas condições, havia liberdade de recriminar o umbandismo e o candomblé, o que, se muito, apenas desagradava seus adeptos.

Nem o espiritismo estava totalmente isento de severas críticas e denúncias de mistificações. Hoje em dia, dizem, separa-se o joio do trigo. Uma coisa é o umbandismo dos Orixás do bem, outra, completamente diferente, é o umbandismo dos Exus do mal. Uma coisa é o espiritismo de Alan Kardec e Chico Xavier, outra, completamente diferente, é o baixo espiritismo praticado por espertalhões e enganadores. Muito recentemente, diante de declarações do apresentador de televisão José Luiz Datena, o Ministério Público Federal, considando-as ofensivas aos ateus, exigiu respeito ao direito dos céticos não acreditarem na existência de Deus.

Uma vez reconhecido o direito de alguém declarar-se umbandista, ou espirita, sem sofrer discriminação, quem for contra deverá sempre ressalvar não ser contra o bom umbandismo, ou o bom espiritismo, porém, contra as más práticas desses credos relligiosos. Obviamente, assim também se daria com o bom e o mau comportamento homossexual. Aqui, porém, volta-se à estaca zero: como estabelecer o que é bom e o que é mau nessas crenças e opções ? O que é bom na minha opinião, pode ser mau em outra.

Direito e liberdade são dois institutos fundamentais dos seres humanos, que andam de mãos dadas. Para ter direitos, é preciso ter liberdade. Porém, como ter liberdade, se os direitos, a cada dia que passa, diminuem os seus  limites ? Esta é uma questão delicada de resolver, mas, para causar algum alívio, pode-se afirmar que ambos, sobrevivendo juntos, quando um novo direito provoca a abolição de uma liberdade, em compensação, acaba criando outra.

Então, o que isso quer dizer ? Quer dizer que estamos dentro de um círculo vicioso, o qual, no decorrer dos tempos, aumenta ou diminui de tamanho, mas, nunca se extingue, ora fazendo prevalecer um dos seus efeitos, ora outro, sempre de acordo com as vontades dominantes, sejam elas de homossexuais, umbandistas, espiritas, ou ateus. 

Dessa conclusão, é possível formular um intrincado raciocínio, daqueles de dar nó na cabeça. O ateu passou a ter o direito de não ser marginalizado por duvidar da existência de Deus. Em decorrência, suprimiu-se a liberdade dos não-ateus de se referirem, impunemente, aos ateus, como desalmados, discípulos do diabo e coisas do gênero. Porém, os mesmos não-ateus e terceiros, se, num dado momento da vida, decidirem rever suas crenças, passaram a ter a liberdade de optar pelo direito de desacreditar em Deus, tornando-se, portanto, ateus, sem sofrerem ataques mais contundentes.

É ou não é de tirar o sono dos mais refinados pensadores ? No dia em que esse complicado "mecanismo" for aplicado às paixões futebolísticas, vai ser uma interminável batalha jurídico-legal entre as torcidas dos bambis, gambás, porcos, urubus, pós-de-arroz e assemelhados !
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O estopim da revolta


O Brasil acaba de realizar sua sexta eleição direta consecutiva para a presidência da República, após os longos anos da ditadura militar; a questão social entrou definitivamente na pauta dos governantes, mas existe um grupo que parece se esforçar por minar os alicerces da democracia e trata-se justamente de um dos que mais deveria estar comprometido na sua preservação: o dos políticos.

Generalizar é sempre perigoso, mas o mau comportamento da classe política brasileira na manutenção de privilégios tem deixado poucas exceções ou, no máximo, o silêncio cúmplice. Os políticos têm se transformado numa casta, que, ao invés de servirem ao Estado e à população, deles se servem.

A história é cheia de exemplos, à direita e à esquerda, da construção de castas privilegiadas em governos, que provocaram as suas ruínas. No caso do parlamento em um regime democrático, a questão é ainda mais grave, já que se tratam de representantes do povo. Estão lá, porque os colocamos. Seria simplista dizer que o povo precisa votar melhor. Ou uma meia verdade. De fato, elegemos muita gente ruim, mas na maioria das vezes não sabemos que são inescrupulosos assim. A melhoria da educação e o aperfeiçoamento do processo democrático serão os melhores mecanismos de correção destes desvios, mas o curto prazo exige medidas reparadoras.

A classe política precisa estar alinhada à população que representa, e não distante, desfrutando de uma realidade inimaginável para a maioria dos brasileiros. Altos salários, passagens, mordomias e vantagens impensáveis para o trabalhador. Mal passara um mês que os parlamentares elevaram os próprios salários para ofensivos R$ 26 mil, considerando todos os ganhos indiretos que já possuem, surge a aposentadoria dos ex-governadores, que se acumulam com os subsídios que recebem em suas voltas à Câmara e ao Senado, totalizando salários astronômicos, incompatíveis com a realidade brasileira.

 Parlamentares não são funcionários públicos. São cidadãos, eleitos pelo povo para determinados cargos. Devem ser remunerados adequadamente durante o período dos mandatos, nos quais devem contribuir para a Previdência, com desconto na fonte, como qualquer trabalhador de carteira assinada. Ao fim do seu mandato, continuam a contribuir em outros locais para onde voltam ou passam a trabalhar. Nada justifica uma situação de privilégios, que cria anomalias como a de José Sarney, que recebe como ex-presidente, ex-governador e senador, sustentando a si e aos seus com o dinheiro público.

O propósito deste artigo está longe do moralismo, que costuma atender aos interesses da direita, aliás majoritária nas benesses, já que esteve a maior parte do tempo à frente do poder. O oportunismo não respeita ideologias e traz decepções, como a de ouvir do ex-governador do Acre, Jorge Viana, do PT, que recebe a aposentadoria porque está prevista em lei. Viana, com sua trajetória combativa e responsável, sabe muito bem que nem tudo que é legal é moral. Aguarda-se uma manifestação sua nos grandes jornais onde encontra espaço.

Mas o que se busca alertar é que este tipo de comportamento fermenta revolta na população. Se o parlamento fosse no Rio, o aumento de salário dos parlamentares dificilmente sairia, pois haveria um cerco popular que obrigaria a revogação no ato. Nunca se sabe onde um cidadão irá se imolar, como aconteceu na Tunísia, ou de onde virá o estopim que acenderá a revolta. Mas é prudente não brincar com fogo diante de situações explosivas, cujas conseqüências são imprevisíveis.
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Eu não! Quero não! Posso não!!


Hoje resolvi aproveitar a manhã ensolarada para caminhar  na praia. A maré estava baixa e convidativa e o sol, apesar de ardente tinha o charme de um “quê” de nordestinidade na linda praia de Boa Viagem.

Claro que em busca do caminhar paradisíaco tive que desviar de poças de lama oriundas de refluxos de esgotos dos prédios na região de IPTU mais caro do nordeste. Ainda assim estava resoluto. Atravessei um breve caminho de grama desviando aqui e ali de alguns resíduos pouco recomendáveis para publicação escrita e alcancei a areia.

O simpático odor de maresia vindo dos sargaços estimulou-me, em lembranças, a uma breve corridinha tipo trote pisando com os pés em meio ao rasteiro matagal baixo de sargaços. Algumas manchas denunciavam algum porão ou casco de navio ou barco pequeno lavado na distância inalcançável da vigilância marítima.

Bem, vamos para a areia. Ainda assim muito deliciosa e refrescante. Tirinhos daqui, soslaios de lá sigo eu feliz já mudando a pose e encolhendo sutilmente a barriga para não estragar o cenário.

Claro está que tal “portrait” caberia melhor com um fundo musical, tipo assim trailer de filme hollywoodano. Só que no meu caso era um tal sucesso dateniano ratínico “eu não, quero não, posso não, minha mulher não deixa não...”

Não tem problema, não serei importunado pelo camelô, afinal um trotezinho e logo esta desgrama some em meio ao som da maré. Ledo engano, o sacana estava com um triciclo.

Lá fui eu prosseguindo em meu lírico trajeto procurando ver outras benesses da paisagem entre latas de cerveja de 500 ml (lei neste país não é para pegar mesmo) e algumas camisinhas. Fico pensando no risco da areia no meio da transa mas parece que tem-se um quê de masoquismo ou as sereias andam dando muito mole, pois o numero já era incomodativo. Isto porque parei de contar pois podia ganhar uma raquetada de frescobol ou um tronco de alguém disputando uma bola na peladinha básica, mas ambas ilegais...mas a galera não tá nem aí mesmo...enfim.

E o rit musical me perseguindo e o pior é que o cara fez um "mix" com o mesmo refrão com duração de quase meia hora. 


A caminhada já me lembrava o cansaço dos cinqüenta e o sutil, não tão sutil assim, vá lá, sobrepeso e o que imaginei de caminhada alegre, leve, lúdica já se tornava um castigo. Considerei mirar para a maré baixa, mergulhar e nadar até a África, juro. Tive que voltar, já havia perdido o tesão.

Inevitavelmente tive que pensar em coisas inapropriadas para um domingo sem clássico importante pensando em nossa morena idiossincrasia que convive, pacificamente, com o dolo e culpa de delitos sociais tido como leves, com o golpe e o total descompromisso com o bem-estar público, pois afinal, um camelô desfilar tranqüilamente em uma praia do IPTU mais caro do nordeste sem se preocupar com um eventual juiz ou autoridade curtindo a areia para mandar lhe prender por crime fiscal e tributário...nem pensar. Mesmo porque os guardas que patrulham o calçadão não acham nada anormal um camelô andar com DVD pirata ou vender latas de cerveja de meio-litro e saírem, tranquilamente, na direção de seus veículos após o dia ensolarado.

E assim, prosseguimos felizes e lampeiros inseridos nesta caricatura de sociedade democrática em rumo ao eterno título de país “em desenvolvimento”.

Pode ser que nosso comportamento leniente com leis inicie algum tipo de movimento para modificar lá pelo ano de 2083...quem sabe?  
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Balanço breve

Míriam Leitão
O GLOBO


No primeiro mês, a presidente Dilma descansou o Brasil da intensidade torrencial do ex-presidente Lula. Falou como chefe do executivo e não como chefe de propaganda do governo em eterna campanha. Deu o tom certo - grave, solidário e objetivo - na visita ao pior desastre humano vivido no país. Errou nas relações políticas, assustou na decisão sobre Belo Monte.

Neste primeiro mês, deu para sentir mais uma vez a grande vantagem da regra democrática da alternância do poder. Mesmo quando é o mesmo grupo político, os estilos são diferentes e a mudança é sempre encantadora, ainda que seja na continuidade.

O saldo é sem dúvida positivo neste alvorecer do governo novo, mas há pontos de dúvida e preocupação em erros e omissões. Dilma sabe - e todos sabemos - que o Brasil se governa em coalizão e os partidos que ela tem são estes, são estes os líderes partidários. Talvez ela tenha errado na avaliação do poder de alguns. O ex-presidente José Sarney não é tão decisivo no controle da base partidária do PMDB para que mereça as donatarias que recebeu. Nas vésperas de eventos internacionais importantes, num país que tem um déficit de US$10 bilhões em turismo, a escolha de Pedro Novaes para atender a um coronel no seu ocaso é uma insensatez. A pasta do Turismo já é excessiva, mas ele teve ainda reafirmado o poder sobre o ministro das Minas e Energia, que sempre foi seu preposto. De Furnas, entregue às mesmas facções do PMDB, jamais se poderá esperar algo diferente das tenebrosas transações que o país já viu e teme a repetição.

No Itamaraty, começa a se respirar outro ar. O "celsismo" fraturou a Casa de Rio Branco de forma dolorosa. O Brasil perdeu bons talentos nos quais investiu, no momento mesmo em que estava para colher o melhor da sua maturidade. Foram muitos os que no ápice da carreira, na qual eles e o país investiram anos e esforços, foram deslocados, por mesquinharia, para funções que os subutilizaram. Se cada um dos talentos diplomáticos encostados na burocracia viveu seu drama pessoal, o maior prejudicado foi o próprio Brasil, que perdeu força e talento. Caberá a Antonio Patriota o reatamento das relações do Itamaraty com ele mesmo; caberá a ele também a correção de rumos estranhos à nossa tradição, como a cumplicidade com atentados aos direitos humanos, e a distorção da diplomacia bicéfala. Todo presidente tem assessor internacional; mas é esdrúxulo haver dois chanceleres.

No caso dos passaportes especiais, a ordem do governo foi clara e correta: rever toda a lista dos que receberam esse direito, e limitar essa concessão a quem está - e apenas no período em que está - a serviço do país. O benefício parece pequeno e é emblemático num país onde a ideia de que há fidalgos é tão antiga; onde o "sabe com quem está falando" é um cacoete tão arraigado. Uma limpeza na lista dos superpassaportes melhora o país.

A relação com a maioria das empresas de comunicação ficou muito tensa ao fim do governo Lula, porque o Planalto fez uma confusão entre o poder concedente e a vontade de controlar conteúdo. A primeira ideia que saiu do Ministério das Comunicações no atual governo sobre regulação da mídia era de uma estultice sem paralelo: proibir as empresas de terem ao mesmo tempo jornal ou televisão e rádio na mesma cidade. O primeiro erro da ideia é o de que jornal é concessão; nunca foi. TV e rádio são concessões. Sobre esses setores o governo tem o poder concedente e regulador; desde que não o use para censurar. O segundo erro foi pensar em veículos de comunicação como se fossem prisioneiros do espaço físico na era da internet. Felizmente, o ministro Paulo Bernardo foi socorrido pela lógica e passou a expressar ideias mais contemporâneas nessa delicada área, em que a tecnologia é fonte de mudança constante e em que a liberdade é valor permanente.

A presidente Dilma pode estar cometendo um erro político perigoso. Não ocupar a pauta do Congresso com propostas do Executivo significa ficar refém da pauta do Congresso e aprisionar o governo em batalhas laterais. Pelo que circulou nestes primeiros 30 dias, Dilma teme o desgaste de propor grandes reformas; quer mudanças incrementais. A falta de ambição inicial pode deixar a presidente ao sabor das escaramuças determinadas pelas brigas entre grupos de interesse de sua fragmentada base parlamentar.

Nesse começo de ano, de governo e de legislatura, dois tristes fatos não têm a ver com a presidente. São defeitos anteriores. Um é o escândalo das aposentadorias para ex-governadores. Acintosas, inconstitucionais. Há fatos até exóticos como o do governador de dez dias com ganho vitalício, mas o pior do evento é verificar a coalizão suprapartidária. Bons e maus políticos, integrantes de partidos do governo e da oposição, parlamentares apontados como exemplos éticos e velhas aves de rapina, todos foram igualados no mesmo usufruto de um privilégio inaceitável. O único alívio vem dos que não pediram a vantagem. O segundo fato é a quarta presidência do Senado para a mesma pessoa. Um seguidor do twitter escreveu tudo: "parece notícia velha". José Sarney comandar o Senado pela quarta vez ofende a democracia, revoga esperanças, convoca o desânimo cívico.

Um fato triste desse começo de governo tem a ver direta e integralmente com a presidente Dilma. Ela está inteiramente convencida de que Belo Monte é um projeto bom. E, no entanto, persistem dúvidas ambientais, climáticas, geológicas, hidrológicas, processuais, financeiras e fiscais no projeto. O caminho de fazer Belo Monte pela força do fato consumado e das licenças arrancadas ao arrepio da lei não fará bem à biografia da presidente e vai marcar seu governo.

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O terrorismo e a economia russa

O terrorismo é um tipo de conflito de difícil controle e antecipação no mundo, notadamente quando se inclui a questão de direitos humanos na equação. Quem pratica atos de terrorismo, via de regra, não se dobra e entrega outros ou táticas por intermédio de interrogatório clássico.

Na Rússia a questão vai um pouco mais além em função das regiões separatistas que aportam uma grande importância estratégica para a federação e, também, recebem algum tipo de "auxílio" de outras potências levando o tema para além da questão de liberdade e de igualdades.

De toda forma é um tema que deve ser sempre acompanhado por qualquer sociedade organizada.





Novo atentado em Moscou coloca em xeque a política de combate ao terrorismo de Dmitri Medvedev – e pode afastar investidores internacionais

Na segunda-feira, 24, a capital da Rússia, Moscou, foi novamente atingida por um ataque terrorista. O local escolhido dessa vez foi o aeroporto Domodedovo, que fica a 22 quilômetros de Moscou e serve como principal porta de entrada para a cidade. A explosão matou pelo menos 35 pessoas, incluindo oito estrangeiros, e deixou outras 170 feridas, dezenas em estado grave. O atentado, ocorrido às vésperas da participação do presidente Dmitri Medvedev no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, levantou suspeitas sobre a capacidade do governo russo de mostrar aos investidores estrangeiros que é um país seguro. Em sua fala no encontro, Medvedev buscou sublinhar que a segurança será reforçada e listou várias razões para mostrar que o país representa ótimas oportunidades de negócio. A principal dúvida é se ele conseguirá espantar os temores internacionais – há algumas semanas a consultoria Maplecroft classificou a Rússia como o décimo lugar do mundo mais arriscado para se fazer negócios no mundo.

“Os investidores sabem dos riscos, mas vão continuar colocando seu dinheiro na Rússia”, diz Cliff Kupchan, analista do Eurasia Group. “Eles só darão as costas para o país se locais com concentração de estrangeiros, como aeroportos, voltarem a ser atacados. Aí sim a Rússia terá problemas”. Segundo Kupchan, o presidente Dmitri Medvedev deve agora agir em três frentes para evitar a desconfiança dos investidores: conduzir de maneira transparente as investigações do atentado, adotar fortes medidas para minimizar os problemas econômicos da região do Cáucaso, como o desemprego e a pobreza, e reforçar a segurança, sobretudo nos aeroportos.

O ataque no aeroporto Domodedovo, o maior em termos de tráfego de passageiros da Rússia, colocou em xeque a credibilidade da política de combate ao terrorismo adotada pelo governo. As cenas de corpos espalhados pela área de desembarque internacional fizeram os russos reviver as lembranças dos atentados suicidas que deixaram 39 mortos em duas estações do metrô de Moscou nove meses atrás – e mostraram que o dinheiro injetado nas regiões conflituosas nos últimos anos para diminuir as desigualdades sociais não foi suficiente. É preciso mudar também as estratégias de policiamento. “A cada ataque surgem novas ações para reforçar a segurança na Rússia, mas elas são aplicadas rigorosamente somente por alguns meses”, diz Pavel K. Baev, professor pesquisador do International Peace Research. Logo após o atentado, o governo decidiu intensificar as revistas em todos os aeroportos do país, o que causou enormes filas. Medvedev também acusou as autoridades de Domodedovo pela falha na segurança e demitiu o chefe da polícia de transporte de grande parte da Rússia ocidental, Andrei Alexeyev, por causa do relaxamento nas medidas de segurança.

Essa foi a primeira vez que terroristas atingiram um aeroporto russo. Segundo especialistas, a escolha da área de desembarque internacional para detonar a bomba foi estratégica. Não só porque fez vítimas de outros países, mas também porque ocorreu num local que está frequentemente livre de policiamento. “É difícil dizer que o atentado ocorreu por causa de uma falha na segurança”, afirma Lev Koshlyakov, vice-diretor geral da empresa aérea russa Aeroflot, a maior do país e com 49% de capital estatal. “Os terroristas agiram numa área sem barreiras de segurança. Eles poderiam ter atacado qualquer lugar público, como um supermercado ou um cinema.”

Até a tarde de sexta-feira (28), nenhum grupo havia assumido a responsabilidade pelo ataque. Como de costume, coube ao primeiro-ministro Vladimir Putin a tarefa de acalmar a população com uma retórica batida. “Não tenho dúvidas de que os responsáveis serão descobertos. A represália é inevitável”, disse. Ele também afirmou que os tchetechenos, provavelmente, não são os responsáveis pela ação, gerando especulações de que os autores do atentado seriam de outra região do Cáucaso, como Inguchétia e Daguestão, onde há insurgentes islâmicos. A reação da população depois do ataque mostra que os russos estão se acostumando com o terrorismo – o aeroporto continuou a funcionar normalmente após a explosão da bomba. “Isso significa que o governo não está sob pressão para encontrar uma solução para o problema, algo percebido como impossível”, diz o professor Pavel K. Baev. Resta saber se os investidores internacionais vão se comportar assim se um novo atentado contra estrangeiros acontecer.



Linha do Tempo
Outros atentados - Ataques que marcaram a história recente da Rússia 
Setembro de 1999
Dois ataques a bomba em edifícios residenciais em Moscou deixam 255 mortos e 700 feridos, o pior atentado terrorista da capital. A ação é atribuída a extremistas muçulmanos do norte do Cáucaso 

Outubro de 2002 
Cerca de 40 rebeldes tchetchenos atacam um teatro na rua Dubrovka, em Moscou, e fazem mais de 700 reféns. Após quatro dias de impasse, forças especiais russas invadem o local usando um gás. Os terroristas e 130 reféns morrem, quase todos intoxicados pelo gás 

Um carro-bomba estacionado perto de uma lanchonete do McDonald's, em Moscou, mata uma pessoa e fere oito 

Julho de 2003 
Duas suicidas tchetchenas matam 16 pessoas e ferem cerca de 60 durante um festival de rock a céu aberto em Tushino, Moscou 

Dezembro de 2003 
Um suicida detona uma bomba em frente ao Hotel Nacional, nos arredores do Kremlin e a cerca de 50 metros da Duma (câmara baixa do Parlamento); seis pessoas morrem e 14 ficam feridas 

Fevereiro de 2004 
A explosão de uma bomba em um dos vagões do metrô de Moscou, a cerca de 300 metros da estação Paveletskaya, mata 41 pessoas e fere cerca de 250 

Agosto de 2004 
Duas tchetchenas detonam explosivos quase ao mesmo tempo em dois aviões em pleno voo: um cai em Tula; o outro, em Rostov-on-Don. Morrem 90 pessoas. Elas partiram do aeroporto Domodedovo. Investigações realizadas na época do atentado concluíram que as mulheres conseguiram passar pela segurança e embarcar sem mostrar identificação após subornarem funcionários 

Uma bomba explode na entrada da estação de metrô Rizhskaya, em Moscou, deixando 9 mortos e 51 feridos. Um grupo fundamentalista denominado Brigadas de Al Islambouli assume a autoria do atentado 

Setembro de 2004 
Um grupo de 35 terroristas tchetchenos, entre eles algumas mulheres, invade uma escola em Beslan, na província separatista da Ossétia do Norte; o confronto com a polícia deixa 335 mortos, dos quais 156 crianças 

Agosto de 2006 
Uma bomba mata 14 e fere 61 pessoas num mercado em Cherkizovo, no subúrbio de Moscou. Realizado por extremistas nacionalistas russos, o ataque tinha como alvo imigrantes que trabalhavam no local 

Março de 2010 
Duas mulheres-bomba detonam explosivos nas estações de metrô de Lubyanka e Park Kultury, em Moscou, matando 39 pessoas e deixando outras 90 feridas. O grupo terrorista islâmico Emirado do Cáucaso reivindica o ataque 

Entrevista
Papo rápido 
Pavel K. Baev, professor pesquisador do International Peace Research e especialista na questão do Cáucaso 

Qual é o nível de segurança dos aeroportos russos? 
Esta é a primeira vez que um aeroporto na Rússia é atingido por terroristas. As medidas de segurança até então adotadas tinham como objetivo impedir atentados em aviões. O acesso à área de desembarque internacional do Aeroporto de Domodedovo, assim como nos demais aeroportos da Europa, é livre de controle. 

O ataque provocará mudanças significativas na política de segurança dos aeroportos russos? 
Certamente. Todo ataque terrorista traz novas medidas de segurança, mas, tipicamente, elas são aplicadas na Rússia com rigor somente por alguns meses. Em seguida, já ocorre um relaxamento. 

Qual é o significado do ataque? 
O ataque foi muito simples, diferentemente das ações terroristas praticadas no passado no país, em que o planejamento e a sofisticação eram visíveis. Eles escolheram um alvo simples, não sincronizaram o ataque com outra ação e não usaram um superexplosivo. É difícil entender a mensagem dos terroristas, mas eles estão conseguindo provar novamente que o governo russo não oferece estabilidade e segurança para a população. 

Por que o ataque aconteceu? 
Muito provavelmente o ataque foi causado pela guerra civil na região do Norte do Cáucaso. É um fenômeno complexo, e os rebeldes não têm uma estrutura unificada e quartéis-generais para coordenar redes variadas. De fato, a instabilidade na Tchetchênia é resultado de diferentes fatores. Lá, uma nova geração de rebeldes tem se formado e seu principal alvo é o regime brutal de Ramzan Kadyrov. No Daguestão, aliás, não é possível distinguir as guerras entre clãs corruptos de ataques terroristas. O descontentamento local, que toma a forma do radicalismo islâmico, é resultado da corrupção das autoridades. A minha leitura da situação é que a rede do Daguestão está por trás do ataque no aeroporto de Moscou, onde o máximo de ressonância é garantido. 

O ataque pode ser classificado como uma provocação para aumentar as tensões políticas e étnicas no país?
Questões étnico-políticas na Rússia, e em Moscou em particular, têm estado muito claramente em alta. É certo que o ataque vai agravar a situação. Eu não acho que o atentado seja uma provocação com o objetivo de aumentar a violência étnica, mas é uma prova de que as autoridades russas não possuem uma estratégia eficiente para estabilizar o Norte do Cáucaso. O crescimento da tensão trabalha contra a estratégia de modernização do presidente Dmitri Medvedev – incoerente como só ela.
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