sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Sequelas de Fukushima



JOAQUIM DE CARVALHO E EMICO OKUNO
O GLOBO


O Brasil não precisa correr risco, porque dispõe de abundantes recursos energéticos renováveis

Estimativas de risco de acidentes graves em usinas como Angra III baseiam-se em abordagens probabilísticas, e as normas de controle e garantia da qualidade dos componentes mecânicos e elétricos das usinas nucleares limitam em centésimos de milésimos a probabilidade de um acidente grave.

Depois do acidente de Fukushima, entretanto, quase todos os países nuclearizados resolveram aproveitar a lição daquela catástrofe e testar a segurança de suas centrais nucleares.

Os europeus encaminharam os resultados desses testes à Comissão Europeia, em Bruxelas — que os submeteu à avaliação de especialistas, que recomenda ações urgentes, tais como reforços das proteções das usinas contra enchentes e fenômenos sísmicos; e a introdução de bombas mais robustas para sistemas de refrigeração, inclusive para piscinas de armazenamento de combustíveis exauridos. Também urgente é a fixação de diretrizes para o procedimento de evacuação dos habitantes de regiões vizinhas às usinas. Com a aplicação dessas recomendações, o custo da eletricidade gerada nas usinas nucleares aumentará muito. Na França prevê-se um aumento de 20%. Se as novas normas forem aplicadas no Brasil, o aumento de custo inviabilizará as usinas nucleares, até em relação às termelétricas a bagaço de cana.

Por outro lado, por mais rigorosas que sejam as novas normas de segurança, sempre haverá uma probabilidade de acidente grave, porque não existe obra de engenharia 100% segura. Ocorre que acidentes nucleares se propagam pelo espaço e pelo tempo. Muitos anos depois de um acidente, dezenas de milhares de pessoas em regiões inteiras sofrerão males induzidos por exposição a radiações ionizantes, como está acontecendo em consequência do acidente de Chernobyl. Até 2005, foram registradas mais de 100.000 mortes entre os cerca de 600.000 empregados na descontaminação da usina — e estima-se que nas próximas décadas o câncer de tireoide afetará muitas dezenas de milhares de habitantes de regiões vizinhas.

Para Fukushima os números ainda não são conhecidos, porque as aberrações cromossômicas causadas pelas radiações e as consequentes lesões cancerígenas só aparecerão daqui a alguns anos e, pior, persistirão por várias décadas. Entretanto, já foram constatadas aberrações genéticas e disformias em insetos, como as borboletas da região.

O Brasil não precisa correr risco semelhante, porque dispõe de abundantes recursos energéticos renováveis. Se aproveitarmos 80% da capacidade hidráulica por explorar e 50% da capacidade eólica, poderemos estruturar uma “malha inteligente” interligando um sistema capaz de gerar anualmente cerca de 1,4 bilhão de MWh. Será suficiente para que, nos anos 2040, com a população em 215 milhões, atenda-se a uma demanda per capita próxima de 6.600 kWh por habitante por ano.

Joaquim de Carvalho é pesquisador do Instituto de Energia e Eletrotécnica da Univerrsidade de São Paulo

Emico Okuno é professora do Instituto de Física da USP
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quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Um erro ortográfico que vale milhões


 MARCOS H. MOURA MATSUNAGA
VALOR ECONÔMICO

A língua portuguesa é complexa, cheia de regras, exceções e, dependendo de como um texto é escrito, possibilita várias interpretações. O acréscimo ou omissão de um acento, vírgula ou a construção de uma concordância, adequada ou não, podem provocar mudanças em uma sentença inteira. Imagine o que isso pode acarretar na formulação de uma norma jurídica, ainda mais se tratando de tema delicado como é a cobrança de impostos.

Há tempos são debatidas as interpretações para a apuração do preço de transferência, regra que estabelece os limites fiscais para os preços praticados em operações com empresas ligadas no exterior, sob a metodologia do PRL 60 (Preço de Revenda menos Lucro).

Em 27 de janeiro de 2000, foi editada a Lei nº 9.959, que alterou a legislação então vigente para possibilitar a utilização do método PRL no cálculo dos preços de transferência de produtos aplicados na produção de bens nacionais. Uma vez que a forma de cálculo originalmente prevista na Lei nº 9.430, de 1996 aplicava-se apenas a produtos destinados à revenda (PRL-20), foi preciso readequá-la para possibilitar sua aplicação para os insumos importados, surgindo, então, o PRL 60.

Foi aí que começou a confusão. Claramente há um equívoco gramatical no texto legal trazido pela Lei nº 9.959, que torna impossível a aplicação literal da fórmula de cálculo do PRL 60. O legislador, ao tratar da margem de lucro de 60%, estabeleceu que tal margem é calculada sobre o preço de revenda do produto industrializado, após deduzidos os descontos concedidos, os tributos incidentes na venda, as comissões pagas e do valor agregado no país.

Em um primeiro momento, a interpretação inicial do método de cálculo foi dada pela Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal (IN SRF) nº 32, de 2001, que suprimiu apenas uma letra da Lei (o "d" no trecho "do valor agregado") para ajustar a concordância gramatical, estabelecendo que a margem de 60% seria calculada sobre o preço de venda "deduzidos os descontos, comissões, tributos e o valor agregado". Assim, foi corrigido o erro gramatical cometido e adotada uma solução interpretativa simples e direta.

Claramente há um equívoco gramatical no texto legal trazido pela Lei nº 9.959

Em novembro de 2002, porém, foi editada a Instrução Normativa SRF nº 243, trazendo uma nova metodologia para o cálculo. Apesar de manter a mesma linha de interpretação do texto legal prevista na IN SRF nº 32, extrapolou os limites da lei ao estabelecer o que deveria ser entendido como "valor agregado", acarretando em um aumento significativo na base de cálculo do IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) para a maioria dos contribuintes.

Surpreendente, contudo, é a tese adotada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para defender a legalidade dessa IN. Sustenta que esta traria uma interpretação mais favorável da lei e, dessa forma, o afastamento da IN, com a consequente aplicação da metodologia legal, resultaria em um cálculo dos preços de transferência ainda mais gravosos aos contribuintes. Trata-se de uma situação inusitada, na qual, para defender a patente ilegalidade da conceituação do "valor agregado" pela IN 243, após mais de dez anos da edição da lei, adota-se uma leitura inovadora do texto legal.

Não há dúvida de que a redação da Lei nº 9.430 contém um erro, que torna impossível interpretá-la literalmente. Também não há registro histórico sobre a intenção do legislador que forneça indícios sobre a forma de cálculo imaginada originalmente, em que pese ser mais fácil admitir um erro de digitação (acréscimo da letra "d") do que supor a supressão de uma alínea, o que seria um grave erro de técnica legislativa.

É fato, porém, que, diante das possíveis interpretações do texto legal, tanto a IN SRF 32, quanto a IN SRF 243 - que representam a interpretação oficial da Receita Federal do Brasil acerca do dispositivo legal - não estão alinhadas com a interpretação defendida pela PGFN, o que torna insustentável a alegação de que essa seria a "verdadeira" norma quista pelo legislador.

É importante mencionar que, em decisão recente, a 2ª Câmara da 2ª Turma do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) entendeu pela ilegalidade da IN 243 e apontou as situações absurdas que as metodologias de cálculo trazidas por essa instrução normativa e pela interpretação da PGFN trariam aos cálculos dos preços de transferência, afastando ainda mais as regras brasileiras do princípio do "arm's lenth", ou seja, de alcançar o valor da operação em condições de livre comércio entre partes independentes.

Desta forma, espera-se que a decisão mencionada reverbere nas demais câmaras julgadoras e possa trazer de volta ao rumo da justiça fiscal a jurisprudência daquela Corte administrativa.
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quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Investimentos fora do lugar na infraestrutura de transportes




Valor Econômico

O Brasil investe pouco e mal em infraestrutura. Os recursos oficiais para ampliar a rede de suporte à produção sempre foram insuficientes diante das enormes necessidades do país e essa é uma das causas do sucateamento de estradas e ferrovias, congestionamento de portos e da escassez de meios de transporte em importantes regiões produtivas do campo. O Tribunal de Contas da União, em auditoria realizada recentemente, joga mais luz nessas deficiências ao apontar que existe um importante descompasso entre as ações previstas pelo governo para o setor de transportes e aquelas que as entidades do setor agrário julgam necessárias e urgentes.

A conclusão surgiu da averiguação de 265 ações de infraestrutura sobre gargalos logísticos para a agropecuária, planejadas pelas estatais do Ministério dos Transportes e do seu cotejo com entrevistas com organizações que representam o agronegócio (Valor, 28 de agosto). Um dos resultados é que 40% das obras que o setor agrícola almeja simplesmente não constam dos planos do governo.

Seria errado imaginar que as aspirações do setor privado deveriam ser exatamente as do governo, que tem preocupações mais amplas, como a de compatibilizar o atendimento de demandas públicas, nas quais as das empresas podem não ser as mais relevantes ou imediatas.

Ainda assim, o descompasso é revelador e preocupante. A média não conta toda a história. É muito pequena a diferença de prioridades entre Estado e produtores nos investimentos planejados em rodovias, com um pouco mais de 5% de diferença. Em ferrovias, hidrovias e portos, mais de 50% das necessidades apontadas pelo agronegócio não estão sendo contempladas. Como boa parte dos investimentos agrícolas estão nas zonas de fronteira, Amazônia e Nordeste, onde em muitos casos a produção agrícola puxa o desenvolvimento, é grande o risco de construção de obras inúteis ou secundárias.

De um lado, após a estagnação do país dos anos 80 até meados da década de 90, a capacidade de planejamento do Estado foi severamente corroída e a gerencial, que nunca foi um primor, praticamente desapareceu. É um segredo público que, ainda que existisse dinheiro, faltariam bons projetos à burocracia brasileira, algo que hoje se vê à luz do dia. De outro, essa incapacidade reforça o peso da tradição do país, que é ruim. Boa parte das obras são guiadas pela baixa politicagem, têm prioridade reduzida, beneficiam quando muito uma minoria, - se não são elefantes brancos, como várias espalhadas pelo país - e frequentemente envolvem interesses escusos de enriquecimento pessoal e de empresas envolvidas nos projetos.

Essa realidade tem um custo muito alto para a capacidade competitiva do Brasil, mas sua nocividade não se esgota aí. O Banco Mundial estimou que os gastos com logística no país variam de 10% a 15% do Produto Interno Bruto, o que é pelo menos o dobro do consumido pelos países da OCDE, os mais desenvolvidos do mundo, ou dos Estados Unidos. Os produtores agrícolas, por exemplo, abriram novas fronteiras que se estendem hoje até o Norte, mas a infraestrutura de transportes não foi atrás e essa carência cobra um alto preço. É um fato comum e aberrante que transferir a soja dessas regiões para o porto de Santos custa mais do que mandá-la de Santos à China.

Gasta-se dinheiro que poderia ser economizado e perde-se, com a precariedade ou ausência de infraestrutura, milhões de toneladas de alimentos em um país com carência alimentar sérias e abundante população de baixa renda. O Brasil está entre os dez países que mais desperdiçam comida no mundo. (Adalberto Luiz Val, Valor, 27 de agosto). Cerca de 35% da produção agrícola, ou algo como 10 milhões de toneladas, se perdem entre o plantio e o consumo. As maiores perdas ocorrem antes de ser atingida a ponta final do consumo - 10% na colheita, 50% no manuseio e transporte e 30% nas centrais de abastecimento.

O Estado precisaria buscar rapidamente a capacidade perdida, que pode ser encontrada no setor privado e estancar os prejuízos da falta de planejamento. O governo Dilma ensaia o caminho das concessões e ele é o que promete melhores e mais rápidos frutos. O Estado não pode fazer tudo, mas pode se munir do poder de regulação e fiscalização inteligentes que garantam que tudo será feito por outros da maneira mais econômica e eficaz.
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A atrofia da indústria



O Estado de S. Paulo 

O governo terá de cuidar de uma grave deformação da economia brasileira - a atrofia da indústria -, se quiser conduzir o País a uma nova fase de crescimento prolongado e seguro. Sinais dessa atrofia são visíveis nos empréstimos do BNDES, com participação decrescente da indústria de transformação nos últimos cinco anos. É muito cedo para o Brasil se tornar uma economia de serviços, ou, em termos mais precisos, movida principalmente pela produção de serviços e de bens não materiais. Nos países mais avançados, a mudança na composição das atividades decorreu da expansão e da modernização dos serviços (incluídos os financeiros), do intenso desenvolvimento da produção científica e tecnológica e da conveniência de transferir boa parte da fabricação de mercadorias para outros países. Redução de custos foi um dos principais objetivos dessa transferência, realizada como parte de uma ampla redivisão internacional do trabalho. O cenário brasileiro é muito diferente, tanto pelas possibilidades da atividade industrial como pelas condições do setor de serviços.

O Brasil dispõe de uma vasta e diversificada base industrial, construída em décadas de muito esforço, e o setor manufatureiro pode ser, ainda por muito tempo, o grande motor do crescimento, o foco irradiador da modernização e o principal gerador de empregos de qualidade - se não for relegado prematuramente a um papel de menor importância. A indústria, no entanto, tem perdido dinamismo.

Entre 2006 e 2011, oscilou entre 45% e 50% a parcela da indústria nos empréstimos do BNDES. Nos anos seguintes essa fatia diminuiu, chegando a 36,5% em 2011 e a 26,1% nos primeiros cinco meses de 2012. A fração destinada ao setor de comércio e serviços aumentou seguidamente, até 61,4% em 2011 e 65,2% no período de janeiro a maio deste ano.

Como o BNDES é, de longe, a principal fonte de crédito para o investimento produtivo, o encolhimento da porcentagem destinada à indústria de transformação é um bom indicativo da timidez dos investimentos do setor manufatureiro, nesse período. Mas o governo federal nunca abandonou a retórica sobre o Estado como indutor do desenvolvimento nem deixou de anunciar ações de política industrial.

Nesses anos, no entanto, a indústria instalada no Brasil enfrentou dificuldades crescentes para competir no mercado internacional e chegou a perder participação no mercado interno de consumo. Não há segredo sobre isso: os fabricantes brasileiros têm-se mostrado incapazes de enfrentar os concorrentes estrangeiros tanto fora como dentro do País, apesar de alguns favores fiscais e do aumento da proteção a alguns segmentos. A perda do poder de competição é atribuível tanto ao custo Brasil - impostos, deficiências de infraestrutura, burocracia e outros fatores independentes das empresas - quanto à insuficiência de investimentos em máquinas, instalações e inovação.

Já se falou muito sobre os problemas rotulados genericamente como custo Brasil. A solução é essencialmente política e depende de reformas no setor público. Mas é preciso discutir por que a indústria de transformação tem investido menos que o necessário. Parte da resposta envolve o setor público: os empresários terão mais estímulo para fazer sua parte quando o governo fizer a dele, cuidando da infraestrutura, melhorando os impostos, etc. Mas há mais que isso.

As autoridades falam muito de política industrial, mas a retórica é desmentida na prática. É preciso rever, por exemplo, a estratégia do BNDES e o foco de sua atuação. O banco é hoje o principal investidor na indústria de celulose. Já se envolveu amplamente com o setor de frigoríficos e quase se meteu numa fusão de supermercados. É essa a sua missão? Mesmo como emprestador, tem-se dedicado principalmente a uma clientela restrita, formada por grandes empresas, incluída a Petrobrás. Não é essa a forma de estimular e de apoiar o crescimento e a modernização do sistema produtivo. Seja qual for a resposta, é com certeza diferente daquela oferecida, nos últimos anos, pelos estrategistas do BNDES.

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Uma carta, talvez uma decisão

Muita lucidez, sabedoria e senso de oportunidade histórica nesta mensagem, nesta carta.
Vale a pena ler, refletir e repassar.


Uma carta, talvez uma decisão
Roberto DaMatta

Recebi ontem uma carta assinada pelo meu amigo, o famoso embora aposentado brasilianista, Richard Moneygrand.

Diz a missiva:

Caro DaMatta,

Aproveito o julgamento do mensalão para manifestar o que penso como estudioso e apaixonado pelo Brasil. Sendo um marginal relativamente ao universo brasileiro, enxergo com mais clareza aquilo que vocês apenas veem. E ver, como dizia o nosso velho professor Talcott Parsons, é ter uma angulação especial. Daqui do velho Norte, onde tudo se faz ao contrário - estou, imagine, com o meu ar-condicionado ligado ao máximo e não sei se o meu fundo de pensão (estourado na infame bolha financeira descontrolada por Bush e seus asseclas) vai segurar a conta - quero, data venia, e com o devido respeito, dar minha pobre opinião.

Primeiro, uma consideração sobre a organização do vosso STF. Ele aposenta seus ministros após 70 anos, o que dissocia de modo negativo a pessoa do papel numa área onde isso não deveria ocorrer. Numa democracia igualitária cuja tendência é a anarquia organizada, como dizia Clifford Geertz, os juízes são como os antigos sacerdotes: o seu papel de julgadores do mundo não pode ser limitado pelo tempo. Eles têm que ser juízes para a vida e por toda a vida. O papel não pode ser esquecido e deve ser um fiel e simultaneamente uma faca permanente na cabeça de quem o indicou e do comitê legislativo que aprovou o seu nome. A vitaliciedade tira do cargo essa bobagem brasileira de uma aposentadoria compulsória aos 70 anos, o que, num mundo de idosos capazes, faz com que o presidente pense muitas vezes antes de indicar um indivíduo para esse cargo. Aquilo que é vitalício e só pode ser abandonado pela renúncia simboliza justamente a carga do cargo. Tal dimensão - a vitaliciedade - é mais coercitiva do que a filiação a um partido ou a crença numa religião. É exatamente isso que, no caso americano, faz com que ser um membro da Suprema Corte seja algo tão sério ou sagrado, tal como ocorre com o papado ou a realeza. Vejam como vocês são curiosos. No campo político, os personagens e partidos menos democráticos lutam e tudo fazem para obter a vitaliciedade no cargo, não é isso que está em jogo neste caso? Daí as vossas ditaduras. Mas quando essa vida com e para o cargo é positiva, vocês o limitam.

O resultado são juízes cujas decisões podem ser parciais e um tribunal sempre desfalcado, a menos que vocês decidam nomear juvenis para um cargo tão pesado quanto uma vida.

Um outro ponto para o qual desejo chamar a atenção - pedindo desculpas se promovo em você alguma antipatia, porque, afinal de contas, eu não sou brasileiro e, para vocês, até bater em filho e mulher é coisa que ninguém deve meter a colher, ou seja, só cabe à família - é dizer que aqui os julgamentos e os processos criminais começam enormes e acabam pequenos. O que se deseja de um juiz não é uma aula de Direito, mas uma decisão clara, reta e curta. Culpado ou inocente. Se inocente, rua e vida. Se culpado, as penas da lei e cadeia.

Ora, o que vemos neste vosso julgamento é uma novela. Na minha fértil imaginação, desenvolvi uma teoria e passei a entender por que vocês não sabem fazer cinema ou o fazem tão mal ou tão raramente produzem um cinema de primeira qualidade. Desculpe meu intrusivo palpite, mas eu penso que uma Justiça democrática é como um filme - depois de hora e meia a narrativa invariavelmente termina. Mas a Justiça nesse vosso país patrimonialista e democrático é como uma novela: o caso demora décadas para entrar em julgamento e, quando entra em cena, sofre um atraso de uma gestação para ser resolvido. Na vossa etiqueta jurídica, que, como diziam meus mestres de Direito, reproduz as vossas retóricas sociais, é impossível não ter uma divisão do trabalho barroco com relatores e revisores e, assim, com réplicas, tréplicas, e votos repetitivos, como se o mundo tivesse o mesmo tempo de um Fórum romano da época do nobre imperador Augusto.

Finalmente, e como último ponto, quero dizer algo sobre a opinião pública, claramente desconsiderada como inoportuna por um dos vossos juízes supremos, o dr. Lewandowski. É óbvio que nada, a não ser a consciência e o saber, deve pautar os juízes. Mas ele não julga para marcianos ou para o paraíso. Ele julga para o mundo e, num universo democrático, a opinião pública representa o poder da totalidade. Uma espécie de termômetro de tudo o que passa pela sociedade. Embora essa opinião apareça na mídia, ela é isso mesmo: um meio complexo e difuso, sem dono e com todos os donos, pelo qual os limites e os abusos se exprimem. Como disse, ninguém, muito menos um juiz do Supremo, deve ser pautado por ela, mas, mesmo assim, ela vai segui-lo, pautá-lo e, se for o caso, dele cobrar o que ela achar que ele deve à sociedade. Caso o sistema tenha como algo democrático. O juiz deve ser soberano, mas a opinião pública também tem sua soberania porque, como ensina o Tocqueville que vocês não leram, numa democracia ela conta muito mais do que nas aristocracias, porque ela existe antes da política e vai além dela.

Nas democracias, mesmo os que não sabem se igualam aos que sabem; e, pela mesma ousadia, os não ricos se igualam aos ricos, e é por causa disso que a igualdade aparece quando ela é desejada. Penso que esse é o caso do Brasil que vocês vivem neste momento.

Porque o que está em julgamento neste mensalão não é apenas um ponto de vista político no sentido trivial da palavra, mas o valor da crença da igualdade perante a lei. O que está em jogo é a questão de fazer política e de exercer o poder com responsabilidade e transparência. No fundo, disputa-se o resgate de fazer política partidária com dignidade.

Receba o meu abraço e boa sorte para o vosso Brasil,
Dick
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A escola que ficou na gaveta


A escola que ficou somente no papel

 RENATA MARIZ
Correio Braziliense 


Manifesto assinado por notáveis, como Anísio Teixeira, que definia diretrizes para um ensino de qualidade no Brasil, faz 80 anos sem sair do papel.


Manifesto criado por notáveis da área, como Anísio Teixeira e Cecília Meireles, completa 80 anos, e as diretrizes para um ensino de qualidade na época não avançaram. Aulas em tempo integral, qualificação de professores e infraestrutura ainda engatinham no país



No país que escalou posições em termos econômicos, tirou milhares da pobreza extrema e conseguiu solidificar suas instituições democráticas, a constatação feita 80 anos atrás, no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, continua atual. "Na hierarquia dos problemas nacionais, nenhum sobreleva em importância e gravidade ao da educação", começava o documento histórico, marco do movimento brasileiro que definiu, em 1932, as bases para a construção de uma escola pública de qualidade. Oito décadas depois da carta aberta assinada por notáveis como Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo e Cecília Meireles, as propostas lançadas, até hoje consideradas fundamentais para uma reforma educacional de verdade, tiveram avanços tímidos.

Embora o acesso à educação tenha melhorado, com 98% das crianças de 7 a 14 anos matriculadas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a qualidade do ensino não evoluiu no mesmo ritmo. E temas defendidos ainda pelos pensadores da Educação Nova — como escola integral, valorização do professor e instalações de qualidade para a aprendizagem — são reavivados de tempos em tempos pelos governos e pela sociedade. "O manifesto trouxe uma ideia de planejamento absolutamente inédita naquele momento da história brasileira. Mas esse grande objetivo foi derrotado. Hoje, vivemos de improviso no campo da educação", lamenta Romualdo Portela de Oliveira, professor de política educacional na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). Segundo ele, a "única vitória" nesses 80 anos é que os temas continuam em discussão.

O movimento encabeçado pelos pensadores, porém, rendeu frutos nos campos político, ideológico e jurídico. É de 1934, portanto na efervescência da mobilização, o primeiro dispositivo constitucional determinando que a educação é direito de todos, devendo ser garantida pela família e pelo poder público. A década de 1950 mostrou-se fértil em termos de experiências inovadoras, como o Centro Educacional Carneiro Ribeiro, inaugurado por Anísio Teixeira em Salvador, que unia formação acadêmica e lúdica. No período, surge também o método de alfabetização de Paulo Freire, transformado em programa nacional em 1962. O golpe militar bane muito dos modelos considerados "subversivos" e faz uma expansão do ensino com pouca qualidade. Com a reabertura política, o tema volta e permanece no topo da "hierarquia dos problemas nacionais", como disseram há 80 anos.
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terça-feira, 28 de agosto de 2012

UM NOVO PAPEL

Uma bela homenagem para um dos heróis de nossa infância.
Vale a pena a leitura.


UM NOVO PAPEL
Prof. Doutor Afonso Farias

Muito tempo faz... Sentado na sala de casa, uma televisão, imagem em preto&branco. Assistia-se a um jogo. Não era um jogo qualquer, era a seleção brasileira que se apresentava. 

Dez jogadores de linha e um goleiro no time principal. Conhecidos por suas qualidades excepcionais, os jogadores de linha desfrutavam de enorme fama, mas somente alguns – bem poucos – fizeram fortuna.

O goleiro era maravilhoso, mas criticado à época. Pessoa esforçada, humilde e séria. Todos sabiam do seu denodo, da sua competência e da sua vontade de vencer e contribuir para as vitórias do escrete nacional.

Foram  vitoriosos  ao  final,  venceram  todas  as  contendas.  Muitos foram endeusados e outros praticamente olvidados. O goleiro parece que foi um desses.  Romântico, amoroso e pessoa divertida, todos gostavam dele. Nunca economizava gentileza e simpatia.

O arqueiro era natural de Caratinga, em Minas Gerais, e defendeu Juventus, Portuguesa e Nacional, em São Paulo, e o Fluminense, no Rio de Janeiro. Foi atuando pelo clube carioca que ele acabou convocado para a seleção brasileira de futebol. 

Em especial, três jogos marcaram a atuação do atleta naquele julho de 1970: contra os selecionados da Inglaterra, do Uruguai e da Itália. Ele fez  a  diferença  nesses  embates.  Quem  duvidar  pode  assistir  ao  vídeo desses jogos.

Papel (como era conhecido na intimidade) colaborou sobremaneira para  a  conquista  do  tricampeonato  canarinho  no  estádio  Azteca,  na Cidade do México, em 1970. Só aqueles que viveram o momento sabem da importância da Taça Jules Rimet para o futebol do Brasil.

Atleta disciplinado e elegante sob as balizas,  Félix recebeu outro prêmio  significante  em  1970:  o  Belfort  Duarte,  que  homenageava  o jogador de futebol profissional que passasse dez anos sem ser expulso, tendo jogado pelo menos 200 partidas nacionais ou internacionais.

Como atleta, Papel foi campeão do Estadual do Rio de 1969, 1971, 1973, 1975 e 1976, além do Torneio Roberto Gomes Pedrosa em 1970.

Tempos  depois,  Félix  Miéli  Venerando,  para  sustentar  a  família, trabalhou na loja Ponto Frio, no Rio de Janeiro. Era mais um empregado com  mechas  brancas  nas  laterais  da  cabeça  e  óculos  pendurado  no pescoço. Ninguém (ou quase ninguém) sabia quem era aquele senhor.

Naqueles dias, por acaso, souberam do novo emprego do atleta e tentaram fazer  uma  matéria  com o  goalkeeper,  mas a  reportagem  foi negada pela chefia da redação de um grande jornal de circulação nacional.

No fundo, eles achavam que aquele sujeito não estava com essa  bola toda, talvez pensassem que ele nem a merecia.

Esse é o reconhecimento que recebem nossos ídolos, muitos deles atletas  responsáveis  e  que  proporcionaram  inúmeras  alegrias  ao  povo brasileiro.  São  jogados  ao  léu,  afastados  do  convívio  esportivo  e depreciados no lugar comum.

Parte  da  amargura  de  Félix  foi  compensada  pela   Lei  Geral  da Copa/2012, cujo texto incluiu os benefícios aos campeões mundiais pela seleção, de 1958 até 1970 no México. Depois disso, ele pode receber auxílio financeiro para tratar da sua doença incurável: enfisema pulmonar, a qual o contratou, em 24 de agosto último, para atuar em novas plagas.

Bom pai, marido, avô e atleta, hoje, Papel joga no Paraíso Futebol Clube,  no  Éden.  Obrigado  pela  alegria  proporcionada  e  por  ter  feito milhões de brasileiros orgulhosos naqueles dias (e até hoje) de 1970. Você não  viveu  em  vão...  Segue  em  tuas  defesas  e  também,  se  puderes, defende  a  todos  nós.  Um  abraço  forte  de  seus  admiradores,  meu camarada.
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Querendo que dê certo

O bom de se ler o que esta avó, no ápice de sua produção intelectual escreve é que, com as palavras e visão de uma cidadã normal, ela consegue rever e nos evidenciar o que é necessário para que os demais cidadãos se mobilizem a saiam do marasmo, de suas zonas de conforto e deixem de terceirizar a responsabilidade que é intransferível.
Cidadania requer maturidade, ação e responsabilização pelos resultados. 


Querendo que dê certo
Lya Luft
Veja


Querer que dê certo, a gente sempre quer: a nova turma na escola, o novo amigo, o vestibular, o primeiro emprego, o casamento, o filho, a decisão inescapável, o necessário e o fútil, a segurança e a aventura. Os planos do novo ano. Os desejos bons e também os menos nobres, de que alguém se ferre, que para ele dê errado – porque não somos santos. A construção da vida, tanta coisa. As pessoas queridas. O livro, o carro, o amor ou até a separação. A sobrevivência depois da morte de alguém especial. Que dê certo também o que nem é pessoal mas a todos atinge: o país, a democracia, a qualidade de vida, a dignidade de todos, a redução da desigualdade, o nível do ensino, da saúde, os cuidados com a seca, com a enchente, com os deslizamentos, com os horrores da saúde pública, com o excesso de faculdades pelo país, a insensatez das cotas que promovem a discriminação e o preconceito, e marcam como incompetentes os que se beneficiam delas. Que às vezes nem têm outro jeito, pois nivelamos por baixo: facilitamos as coisas em lugar de dar aos que precisam melhores condições, condições ótimas: isso seria o sensato. Mas somos insensatos; então, torcemos para que, apesar de tudo, dê certo.

Agora nos oferecem mais planos, projetos, pacotes, para que, finalmente, o país deslanche do seu marasmo, que pacotes anteriores não sacudiram direito. Eu quero muito que deem certo esses novos projetos. Estradas e ferrovias, para começar, pois o nosso transporte é mais um inqualificável fator do nosso inqualificável atraso. Portos e aeroportos. Espero que se incluam também saúde, ensino, segurança, que andamos cada vez mais violentos e todas as notícias negativas, que são muitas, saem mundo afora preparando os espíritos para 2016. Que sejam projetos inteligentes e possíveis; que tenham à frente gente supercompetente, embora competência seja mercadoria rara por aqui. Há gente demais improvisando, viramos o país do improviso, do puxadinho, do jeitinho, do palpite? Os muito competentes podem nem querer certos cargos e encargos. Sobretudo se ligados à política: aí tudo se complica, os jogos de poder, os postos dados por interesse, não pelo preparo e capacidade, tanta trama que nem conhecemos direito, mas de que sabemos o suficiente para ficar de cabelos em pé. Ou melhor é não saber, assim a gente se salvaria? Seja como for, eu, que me afasto da política o mais que posso – para preservar alguma qualidade de vida, de objetividade e de harmonia comigo e com o mundo –, eu, que não pertenço a nenhum partido porque são demasiados e confusos, porque brotam feito cogumelos e são mutantes como camaleões nervosos, eu mesmo assim me interesso extraordinariamente por este país. A ele dei filhos e netos, seres humanos decentes e bons, desses que como tantos outros são o sal da terra e para isso não precisam ter poder nem altos cargos: basta que existam e sejam como são. A este país Brasil dei e darei trabalhos e décadas de vida. Dele muito recebi também, nele quero sempre viver, e morrer. Nele estou por escolha consciente todos os dias de minha vida. Então, quero muito que os novos projetos deem certo, com tudo o que contiverem de bom (o medíocre que neles exista faz parte de sermos humanos).

Resta saber o que é “dar certo”. Um plano com bons projetos é um comecinho. Predominarem boas intenções será dar um pouquinho certo (tudo em diminutivos por enquanto). Ficar em mãos experientes e competentes, sem amadorismo, será dar bastante certo. Passar da utopia para entrar na realidade, com seriedade, seria ou será dar supercerto. Se tudo sair medianinho, já vai ser um avanço. Chegar a termo será quase um milagre: a gente não vê muito disso por aqui. Não acredito cegamente, pelo que temos experimentado de grandes palavras, grandes planos – e grande esquecimento. Mas eu quero, eu torço, eu apoio, eu espero, eu observo... e, quando puder, eu comento. Que eu possa comentar só coisas boas, coisas positivas e concretas, e dizer: “Finalmente está dando certo, viva a gente brasileira”.
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Doses mortais



ROBERTA MACHADO
Correio Braziliense


Resultados de pesquisas recentes reforçam os estragos causados no organismo pelo consumo excessivo de álcool. A terceira causa de óbitos no mundo tem ação devastadora no corpo até mesmo com ingestões moderadas



Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o consumo de álcool é a terceira causa de mortes no mundo, matando 2,5 milhões de pessoas todos os anos. No entanto, as vidas que são tiradas pelo consumo irresponsável dessa droga vão além dos acidentes de trânsito, dos abortos e dos danos ao fígado. As consequencias da ingestão da bebida são alvo de pesquisas que, ao longo dos últimos anos, têm sido capazes de mostrar que ela é nociva para diversas áreas do organismo, como o sistema cardiovascular, o cérebro e o coração. Mesmo teorias antigas, como a ligação entre o álcool e o câncer, têm sido reforçadas com experimentos inéditos que destacam a mensagem de que a droga pode ser mortal.
A relação entre a ingestão de bebidas alcoólicas e o surgimento de tumores é discutida há 30 anos, mas somente agora o processo foi testado em humanos. A pesquisa foi divulgada na semana passada, durante o Encontro Nacional da Sociedade Americana de Química. Sabe-se há algum tempo que o álcool, quando é metabolizado pelo corpo, transforma-se em uma substância chamada acetaldeído, um composto com potencial cancerígeno. Para mostrar pela primeira vez como o processo é danoso ao organismo, a pesquisadora Silvia Balbo, do Instituto do Câncer da Universidade de Minnessota, deu doses de vodca a 10 voluntários e analisou seus genes poucas horas depois.

Ela notou que o DNA deles apresentava uma grande quantidade de aductos, uma espécie de ligação que causa mutações no código genético. Essas combinações eram feitas justamente com o acetaldeído, formado a partir do álcool. A proteção contra esse processo está na enzima álcool desidrogenase (ADH), que converte o acetaldeído e impede que as ligações causem mutações. Mas não é possível depender da ANH em casos de bebedeira extrema. "Conforme aumentávamos as doses de bebida, observávamos mais aductos. Portanto, quanto mais a pessoa beber, mais tempo vai levar para o corpo eliminar os aductos e o álcool, e mais acetaldeído ficará no corpo", resume Silvia Balbo.

O mecanismo de proteção também falha em pessoas com uma variante ineficiente da ADH, em sua maioria asiáticos e pessoas de sangue indígena. "Tudo acontece num balanço de ativação de danos e reparos feitos por essas enzimas, mas há pessoas que ativam ou reparam mais. É óbvio que, no primeiro caso, existe maior risco de câncer", ilustra Gilberto de Castro Jr., oncologista do Instituto de Câncer de São Paulo (Icesp). Estima-se que 1,6 bilhão de pessoas estejam no grupo étnico de risco e que 10% dos casos de câncer sejam relacionados ao abuso do álcool. "Mas ninguém vai saber exatamente qual é o risco da pessoa, pois alguns desses mecanismos ainda são desconhecidos. Logo, a exposição deve ser evitada", alerta Gilberto.

De acordo com Silva Balbo, o consumo de álcool já é ligado a casos de câncer de fígado, de esôfago, de cólon, de mama e de cabeça e pescoço. Pesquisadores da Associação Norte-Americana para a Pesquisa do Câncer apontaram que quem bebe muito pode ter até 75% mais chances de desenvolver um tumor gástrico. Já a Associação Médica Americana (AMA) mostrou que há mais riscos de câncer de pâncreas para as pessoas que bebem mais de três drinques por dia — basta a mesma quantidade por semana para que uma mulher tenha 15% a mais de probabilidades de ter câncer de mama, e duas doses por dia para aumentar essa chance para 51%.

Riscos variados

Além do câncer, efeitos da bebida também são vistos nos sistemas cardiovascular, gastrointestinal e nervoso central. De acordo com especialistas, mesmo o consumo moderado pode causar danos permanentes no corpo. "Quanto mais gente em uma população beber álcool, mais problemas esse país terá, independentemente da moderação do hábito", resume Ilana Pinsky, psicóloga e vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead). O problema é ainda maior se o hábito for precoce. "É importante adiar o máximo possível o início do consumo. Estudos mostram que, quanto mais cedo o jovem inicia a ingestão de bebida alcoólica, maior a probabilidade de ele ter dependência na faixa dos 20 anos", alerta Pinsky.

Segundo a psicóloga, a bebida também pode atrapalhar a formação do cérebro do adolescente. A teoria foi comprovada em estudos como o da médica Alicia Ann Kowalchuk, que mostra que o consumo exagerado de álcool, mesmo isolado, afeta permanentemente o córtex pré-frontal, cujo desenvolvimento só termina aos 25 anos. "O álcool é neurotóxico e mata ainda mais células cerebrais sob altas concentrações de álcool no fluido cerebrospinal. No caso dos jovens, as conexões novas do córtex pré-frontal são mais suscetíveis aos efeitos tóxicos do álcool que as dos adultos", explica Kowalchuk.

Efeitos mais imediatos podem ser sentidos por pessoas que sofrem de problemas cardíacos, como a fibrilação atrial. Batizada de síndrome do coração de feriado, a combinação entre essa condição e a bebida excessiva resulta em uma chance 4,5 vezes maior de surgimento da palpitação cardíaca acelerada, que pode causar hipertensão. Outro experimento, realizado com ratos, ainda aponta que o álcool afeta a mitocôndria do coração, responsável por fornecer energia ao órgão. Isso ocorreria porque a substância aproxima a organela do retículo endoplasmático, sobrecarregando a mitocôndria com cálcio. Ainda há estudos indicando que a bebida alcoólica atrapalha a resposta imune do corpo, atrasando a recuperação de ossos quebrados ou desencadeando alergias.

Mas, talvez, o sinal mais claro dos efeitos negativos do álcool no corpo seja o mal-estar digestivo. De acordo um estudo divulgado pelo Colegiado Norte-americano de Gastroenterologia, basta apenas um drinque por dia para que uma pessoa sofra sintomas como gases, dores abdominais ou diarreia. De 198 pacientes estudados com esses sinais, 95% consumiam álcool com frequência.

Isso ocorre porque a substância leva a um crescimento de bactérias no intestino delgado, condição que pode levar à má nutrição. "O álcool rompe vários dos mecanismos de defesa do intestino delgado, que mantém a quantidade de bactérias sob controle. Quando essas defesas são quebradas, as concentrações de bactérias podem aumentar", ensina o autor do estudo, o médico Scott Gabbard. As consequências da bebida, aponta Gabbard, são similares às da síndrome do intestino irritado. "Se um paciente reclama de excesso de gases, inchaço e diarreia, é razoável considerar se abster do álcool para ver se há uma diminuição dos sintomas", completa.

Estudos contrários

Uma série de especialistas, no entanto, vai na contramão do senso comum, e aponta que o consumo moderado de álcool pode ser benéfico para o corpo. Um estudo da Universidade de Oregon, por exemplo, afirma que as pessoas que bebem têm uma densidade óssea mais resistente que os abstêmios. Segundo os pesquisadores, depois que um grupo de mulheres idosas cortou a bebida por duas semanas, os sinais da osteoporose aumentaram significativamente. Outro experimento feito com 600 biópsias de fígado mostrou que a bebida moderada pode diminuir pela metade o risco de infecção hepática gorda não alcoólica. Os autores apontam que a proteção é conseguida com apenas um drinque diário. Mas a própria equipe da Universidade da Califórnia, responsável pela pesquisa, alerta: se forem levados em conta os riscos de outras doenças no fígado, a recomendação médica é nenhum consumo de álcool.(RM)
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Dilema da escova de dente

Em uma breve crônica o jornalista evidencia a questão da educação ambiental, a vontade do cidadão comum em preservar o ambiente a partir do lixo de sua casa e a dificuldade em se consolidar a Política Nacional de Resíduos Sólidos, uma lei que, como muitas no Brasil, não pegam por falta de compromisso e seriedade dos cidadãos comuns, da sociedade civil organizada e, por fim, dos políticos de uma maneira geral.


Dilema da escova de dente
RUY CASTRO
FOLHA DE SP



RIO DE JANEIRO - Ouço dizer que o Brasil joga 768 milhões de escovas de dente anualmente no lixo. Deve ser verdade. À base de uma escova por mês, eu próprio contribuo com pelo menos 12 por ano para esse descalabro -assim que as cerdas começam a desbeiçar, lá se vai embora a escova. Ouço também que, no mundo, descartam-se 26 bilhões de escovas por ano, e que cada uma leva 450 anos para se decompor. É o horror, o horror.

A ideia de um novo apocalipse, não mais pela água ou pelo fogo, mas com o mundo sufocado por escovas de dente, lembra os filmes B americanos de terror dos anos 50, só que a sério. Bem que Woody Allen perguntava: "Por que as pessoas escovam os dentes quatro vezes por dia e fazem sexo duas vezes por semana? Por que não o contrário?".

Idem quanto à montanha de fraldas descartadas por mães zelosas e bem-intencionadas. Perguntei a uma delas quantas fraldas seu bebê teria consumido em seus primeiros três anos. Ela fez as contas: à média de cinco fraldas por dia, foram 1.825 fraldas por ano, donde 5.475 fraldas em três anos, fora as dorezinhas de barriga. Acho assustador que uma simples criança ainda em seus cueiros já tenha produzido tanto lixo.

Ouço ainda que outro produto capaz de entupir o mundo são os o.b.s, com pouco ou muito uso. À média de três por dia, durante cinco dias, uma mulher dispensa 15 o.b.s por mês. E quantas mulheres em idade de usar o.b. existem somente no Brasil? E na China? E no mundo?

Não admira que, depois de usados e despejados nas privadas, no lixo ou pela janela, trilhões de escovas de dente, fraldas, o.b.s, camisinhas, pilhas, lâminas de barbear, DVDs de André Rieu, embalagens de batata frita e que tais, levados pelos esgotos e correntes, estejam asfixiando rios, baías, oceanos. E agora, como escovar os dentes sem um certo sentimento de culpa?
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ClustrMaps do blog Assim Somos


Mapa de acessos ao blog Assim Somos

http://www3.clustrmaps.com/pt/counter/maps.php?url=http%3A%2F%2Fjeffersonws.blogspot.com%2F

Caros amigos, após três anos de trabalho voluntário e dedicado no Blog Assim Somos, é uma grata surpresa descobrir que ele já foi visitado em países que cobrem todos os continentes do mundo, em quase noventa países diferentes.

Muito grato a todos pela gentil validação a meu esforço em contribuir para que nossa sociedade seja melhor, a cada dia.

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Por quê?

Uma muito essencial e pertinente revisão de posturas e compromissos éticos que nossa sociedade ainda não se apercebeu, fora pela anomia ou pela mais completa e inexorável perda de referenciais públicos críveis que ressalte, estimulem e liderem tal essencial mudança proposta nas entre-linhas.
Vale a pena ler este "libelo" social.



Por quê?
ZERO HORA


Se somos um povo pacífico, ordeiro, criativo e empreendedor; se somos o maior país da América do Sul e a sexta economia do mundo; se temos uma democracia consolidada e desfrutamos de plenas liberdades; se contamos com uma produção agrícola exuberante, uma indústria forte e um promissor parque tecnológico; se a renda do trabalhador brasileiro está aumentando e milhões de pessoas estão ascendendo socialmente; se temos recursos naturais abundantes para promover a qualidade de vida de 190 milhões de brasileiros; se reduzimos significativamente o analfabetismo e ampliamos a rede escolar, por que o Brasil ocupa o constrangedor 88º lugar no ranking mundial de educação medido pelo Relatório de Monitoramento Global da Unesco entre 164 países?

Se temos uma juventude saudável; se nos orgulhamos da mistura racial de nossa população; se somos pentacampeões mundiais de futebol e multilaureados na alegria do Carnaval; se nossos talentos esportivos brilham nas competições internacionais; se nossas crianças e adolescentes são recordistas no uso de internet e de novas tecnologias digitais; se praticamente eliminamos as disparidades de gênero no acesso ao ensino e nossas mulheres conquistam cada vez mais espaço no mercado de trabalho; se nove entre 10 jovens brasileiros sonham com uma profissão que beneficie a sociedade; se as crianças e adolescentes brasileiros contam com um dos mais modernos códigos de proteção do mundo, por que 34,5% dos alunos do Ensino Médio não estão na série correspondente a sua idade?

Se 90% dos nossos jovens têm orgulho de serem brasileiros e 75% acreditam que o país está mudando para melhor; se está comprovado que a escolaridade é a principal porta da ascensão social; se o magistério é uma profissão digna e admirada pelas crianças, que amam as mestras quase como uma segunda mãe; se a sociedade reconhece a importância dos educadores na formação dos brasileiros do futuro; se existe um déficit significativo de docentes no Ensino Médio e Fundamental; se a era digital representa um desafio para profissionais que realmente desejam fazer a diferença, por que apenas 2% dos estudantes querem seguir a carreira de professor?

Se o progresso de um povo depende do desenvolvimento da matemática; se essa disciplina é a base de todas as ciências e todas as artes; se o domínio dos números e das operações é decisivo para o sucesso numa sociedade competitiva; se o desenvolvimento tecnológico está fundamentado em cálculos e logaritmos; se o Brasil é a terra de Malba Tahan, o professor, educador e pedagogo que usou álgebra e aritmética para escrever maravilhosos contos ao estilo das Mil e Uma Noites; se somos um povo criativo e vocacionado para os mais intrincados desafios, por que 89% dos estudantes chegam ao final do Ensino Médio sem aprender matemática?

Se o país já oferece escola para praticamente todas as crianças em idade escolar; se as escolas brasileiras vêm adotando sucessivos antídotos para a repetência, entre os quais a progressão continuada, e algumas redes públicas não mais reprovam nas três primeiras séries; se o trabalho infantil, um dos motivos do afastamento dos estudantes das escolas, está proibido no Brasil; se os jovens brasileiros têm facilidade para dominar as complexidades da tecnologia digital; se a infância e a adolescência são os períodos da vida em que o cérebro humano está mais propenso ao aprendizado, por que a maioria dos alunos brasileiros não aprende o esperado para a sua idade?

Se a escola é o caminho mais seguro para a formação dos jovens e para ascensão social de camadas expressivas da população; se a idade escolar é um dos períodos mais importantes e significativos da vida de um ser humano; se é nessa época que melhor se desenvolvem valores positivos, como a camaradagem, a ética e a cooperação; se um bom aluno será, sem muita margem para erro, um cidadão ordeiro, responsável e produtivo; se a oferta de aprendizado é a melhor herança que as famílias podem deixar para suas crianças e adolescentes; se a educação é reconhecida como o passaporte para um futuro digno, por que muitos pais não participam da vida escolar de seus filhos?
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segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Educação


AÉCIO NEVES
FOLHA DE SP 


Tornou-se lugar comum a defesa conceitual da educação como caminho seguro para o desenvolvimento dos estados nacionais.

Não é sem razão: as emblemáticas experiências de inúmeros países provam que a travessia para um outro patamar de qualidade de vida exige um decidido, concentrado e duradouro (para não dizer paciente) investimento na qualidade da educação pública. Esse direito praticamente nunca existiu para os brasileiros.

As avaliações do MEC têm sido claras mostram o quanto ainda estamos distantes de realizar a sonhada transformação do nosso ensino público -municipal, estadual ou federal- em escolas equipadas, professores motivados e bem remunerados e alunos preparados para a vida.

Ainda assim, ao ver os últimos números do Ideb, não posso deixar de ressaltar os resultados obtidos pelos alunos de Minas, que ficaram nos primeiros lugares na avaliação.

Muitos perguntam como o Estado conseguiu esse resultado, com tantas e graves diferenças regionais e o maior número de municípios entre os demais Estados brasileiros.

Eu respondo: priorizando o que é prioritário. Foi isso que levou Minas a ser o primeiro a universalizar o ensino fundamental de nove anos, o que, ao lado de outras medidas inovadoras no campo da gestão, tomadas ao longo dos últimos anos, criou as bases para os avanços já conquistados.

Sabemos que o país fez parte do dever de casa nos anos 90, quando universalizamos o acesso ao ensino fundamental sob a gestão do presidente Fernando Henrique. Daí em diante, poucos avanços foram registrados, como a extensão do ensino fundamental para nove anos e a implantação dos sistemas de avaliação de desempenho de escolas e alunos.

Nada de relevante ocorreu para reverter a baixa qualidade do ensino oferecido a crianças e jovens, o que coloca o Brasil em posição inferior a de muitos países menos desenvolvidos economicamente.

O fato é que, estando com a responsabilidade de traçar e coordenar uma política educacional para o país, função intransferível do governo federal, o MEC parece ensaiar novos passos sem a segurança necessária a quem responde já há uma década pelo futuro de uma geração inteira.

Impossível não temer as consequências para os nossos alunos do ensino médio na implantação da nova grade curricular anunciada. Se a necessidade de mudanças é quase um consenso entre especialistas, é bom lembrar que deve também caber ao MEC a responsabilidade de dotar os Estados dos instrumentos necessários a essa implantação.

A ausência de políticas públicas que requerem planejamento de médio e longo prazos tem sido um problema constante em todas as áreas que dependem do Estado brasileiro nos últimos dez anos.
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"Elas gostam de apanhar"



LUIZ FELIPE PONDÉ
FOLHA DE SP


"Reacionário, machista!", gritam os inteligentinhos que nada entendem da "vida como ela é"

"Elas gostam de apanhar." Esta é uma das máximas mais famosas de Nelson Rodrigues, nascido no dia 23 de agosto de 1912 no Recife. Esta afirmação ainda choca muita gente. "Reacionário!", "machista!", gritam os inteligentinhos que nada entendem da "vida como ela é".

É comum se dizer que Nelson está assimilado ao cenário cultural, mas não é verdade. A prova é que livros best-sellers como "Fifty Shades of Grey" ("Cinquenta Tons de Cinza"), de E. L. James, ainda causam ira em setores "progressistas" (a esquerda festiva da qual tanto falava Nelson), apesar de as mulheres "normais", que segundo Nelson são as que gostam de apanhar, estarem devorando o livro com imenso prazer.

No livro de James, Anastasia Steele, universitária, se apaixona pelo poderoso Christian Grey, de quem se torna amante, perdida nas delícias de uma relação "sadomasô light" à qual ela se deixa submeter. E gozará maravilhosamente na submissão. No primeiro momento em que ela o encontra, tropeça e cai, anunciando o domínio que Christian terá sobre ela. Na linguagem feminina comum, "ele tem pegada!". E o afeto feminino responde à "pegada".

Não se trata de dizer que Nelson está estimulando surras, mas sim que o desejo feminino passa pelo gozo da submissão ao macho desejado, dentro do jogo da sedução e do sexo. O "elas gostam de apanhar" no Nelson também fala do enlouquecer o homem, como no caso de adultério, e esperar dele uma bofetada acompanhada de "sua vagabunda", revelando o quanto ele ama esta mulher que o traiu. A psicologia rodriguiana parte da sua máxima "a vida é sempre amor e morte".

"A prostituta é vocação, e não a profissão mais antiga." Há uma relação íntima entre sexualidade feminina e a figura da prostituta como eterna promiscuidade temida. A mulher que nunca encenou "sua" prostituta no sexo nunca fez sexo.

"Dinheiro compra até amor verdadeiro." Imaginemos duas situações hipotéticas.

Hipótese 1: alguém convida você para um longo fim de semana na costa amalfitana na Itália. Executiva, hotel charmoso, longas caminhadas por ruas quietas e antigas, sem pressa, vinho (não "bom vinho" porque isso é papo de pobre querendo parecer rico, do tipo que os jovens chamam de "wannabe", gente que queria ser chique, mas não é).

Hipótese 2: alguém te convida para um fim de semana longo na Praia Grande, você pega oito horas de Imigrantes, trânsito infernal, o carro ferve, você fica na estrada esperando o socorro da Ecovias. Chega lá, apartamento apertado, cheiro de churrasco na laje por toda parte. Crianças dos outros gritando em seu ouvido.

Onde você acha que o amor verdadeiro nascerá? Se responder "hipótese 2", é mentiroso ou não sabe nada acerca dos seres humanos, vive num aquário vendo televisão e se olhando no espelho.

Antes de alguém dizer obviedades entediantes como "preconceito" (agora quando alguém fala para mim "preconceito", não levo mais essa pessoa a sério) ou "depende do contexto em que a pessoa nasce", esclareço: é fácil migrar da Praia Grande para a costa amalfitana, mas não o contrário. E quanto ao "preconceito": não se trata de preconceito, trata-se do tipo de verdade que todo mundo sabe, mas é duro reconhecer. Sim, o amor verdadeiro está à venda, e, enquanto você não entender isso, você permanecerá um idiota moral.

O reconhecimento desse fato torna você adulto, não torna você "melhor". E ser adulto é saber que o mundo não é um lugar "bom". Começando por você e eu.

Sábato Magaldi chamava o Nelson de "jansenista brasileiro". Jansenistas eram escritores franceses do século 17 que partilhavam uma visão de natureza humana na qual somos vítimas de desejos incontroláveis (ou pecado, na linguagem da época) e que, por isso, não conseguimos escapar dessa armadilha que é interior, e não "social". A raiz desse pensamento é a concepção de ser humano de santo Agostinho que eles herdaram. Pascal, Racine e La Fontaine foram jansenistas.

Eu acrescentaria que Nelson era um moralista. Moralista em filosofia é um especialista na alma humana. Proponho que ensinem mais Nelson na escola e menos Foucault.
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E Os 5.500 Outros Mensalões, Ninguém Comenta? - Kanitz

Todos projetos previstos para a gestão pública municipal foram aprovados pela Câmara dos Vereadores e referendados pelos Tribunais de Contas (Municipal, ou Estadual ou da União). Se um prefeito quiser mudar terá que apresentar um projeto onde a maioria dos vereadores precisam aprovar para, então, em rito processual seguir para a corte específica, aguardar apreciação, autorização e retornar à Câmara que avisará ao prefeito.
Já deu para se perceber o que significa ter o "apoio da maioria"?
Assim, quem estiver votando em um prefeito que venha fazer "mudanças" certamente estará estimulando a prática de mensalão.
Só que o cidadão em sua contumaz mania de não gostar de política acaba incitando um crime, crente que está abafando, crente que estará votando de forma consciente.
Enfim, talvez em 2083 a sociedade comece a se aperceber desses pequenos detalhes.


E Os 5.500 Outros Mensalões, Ninguém Comenta? 

O Blog do Stephen Kanitz

Os jornais estão repletos com notícias do mensalão do governo Lula, onde R$ 120 milhões foram distribuídos a deputados da base aliada para cooperarem na aprovação governamental.

Mas existem mais 5.500 outros mensalões, onde R$ 7 bilhões ou mais são distribuídos anualmente para 59.000 vereadores.

O blog do Max explica o que está acontecendo:

"Você sabia que dos 191 países da ONU, o Brasil é dos poucos que paga salário aos seus vereadores em todas as cidades?"

"E que até 1977, apenas vereadores das capitais brasileiras recebiam remuneração?"

"Que na maioria absoluta dos outros países – em cidades de pequeno porte – o trabalho dos vereadores é voluntário?"

Por ser um trabalho voluntário, a Constituição de 1988 achou que pelo menos o município deveria cobrir as despesas com o cargo, tipo viagens, estadia quando iam a capital, que definiram como um  "subsídio", bem diferente de salário.

 VI - o subsídio dos Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subsequente, observado o que dispõe esta Constituição. 

Administradores já enxergarão um erro crasso de administração, permitir que o próprio interessado determine seu próprio subsídio. Isto é contra uma das leis da administração, ninguém pode atribuir a si o seu próprio salário, remuneração ou subsídio.

Por isto, os salários de vereadores no Brasil aumentam sem parar. Violam uma lei da administração. Se vereadores violassem uma das leis da Física, haveria gozação geral por parte da imprensa e da opinião pública em geral.

59.000 vereadores a R$ 9.000,00 de subsídio ao mês soma R$ 6,9 bilhões por ano, que pode chegar a R$ 15 bilhões, porque o limite é até 5% das receitas das Prefeituras.

Isto é 150 vezes mais do que o mensalão do PT, e todos os partidos participam anualmente, mas sobre isto há um silêncio total. 

Por isto, o PT realmente acredita que a mídia quer desestabilizar o seu governo, porque nada se fala dos demais 5.500 mensalões, somente o do PT de 120 milhões.

Se o STF optar pela absolvição da maioria, o que é provável, prevejo o ressurgimento da questão Controle Governamental da Imprensa, porque claramente ela ignora os verdadeiros problemas deste país.
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Um prego no caixão do Mercosul




O Estado de S.Paulo

Mais um prego foi posto no caixão do Mercosul, com a decisão final do Senado paraguaio contra o ingresso da Venezuela no bloco. No próximo ano o Paraguai voltará a participar das decisões da união aduaneira, depois de cumprida a truculenta suspensão imposta pelos governos brasileiro, argentino e uruguaio. Haverá cinco presidentes nas reuniões de cúpula, mas a participação de um deles será considerada ilegítima por um dos sócios fundadores do clube. E como poderá funcionar esse clube, se os seus estatutos já foram desmoralizados quando três dos seus membros decidiram sobrepor as considerações políticas - ou simplesmente ideológicas - aos compromissos jurídicos?

O Paraguai foi suspenso do Mercosul porque as presidentes Dilma Rousseff e Cristina Kirchner decidiram classificar como golpe a deposição do presidente Fernando Lugo, mesmo sem evidência de violação de qualquer lei paraguaia. O presidente uruguaio, José Mujica, mostrou-se fraco e acabou aceitando as imposições de suas colegas.

Nesse momento, o processo de adesão da Venezuela ao Mercosul ainda tramitava no Senado paraguaio. Sabia-se da forte oposição ao projeto, mas faltava a decisão. Brasil, Argentina e Uruguai já haviam aprovado, mas o ingresso do quinto sócio dependia de uma resolução unânime. As presidentes brasileira e argentina quiseram aproveitar a suspensão do Paraguai para abrir a porta ao novo sócio. O presidente uruguaio, José Mujica, mostrou-se novamente fraco e acabou concordando, contra a opinião do vice-presidente e do ministro de Relações Exteriores de seu país. Nos dias seguintes, os dois criticaram severamente o golpe e denunciaram a violência contra as instituições do bloco.

Logo depois da queda de Fernando Lugo, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), o chileno José Miguel Insulza, comandou uma missão ao Paraguai. Em seu relatório, ressaltou a normalidade política no país, enquanto os governos de vários países, incluído o Brasil, insistiam em condenar como golpista a recém-instalada administração do presidente Federico Franco.

Nesta semana, finalmente, o Conselho da OEA examinou o assunto. A avaliação foi concluída sem consenso, mas a maioria dos embaixadores apoiou o relatório de Insulza. Não houve comunicado oficial sobre as manifestações, mas, segundo o representante paraguaio, Hugo Bernardino Saguier, 26 dos embaixadores foram favoráveis à opinião do secretário-geral. Apenas 8 foram contrários, incluídos, naturalmente, o brasileiro, o argentino e o venezuelano. Mesmo sem contagem oficial de votos, foi uma indubitável vitória do governo paraguaio. As próprias autoridades do Paraguai pediram o envio de observadores da OEA ao país, a partir de dezembro, para acompanhar a campanha, a preparação e a realização das eleições previstas para abril.

Na quinta-feira, o Senado paraguaio finalmente votou a proposta de ingresso da Venezuela. Houve 31 votos contrários e 3 favoráveis. Onze senadores faltaram. A decisão torna mais complicada a situação do bloco, já comprometida pela truculência das presidentes Dilma Rousseff e Cristina Kirchner e pela fraqueza do presidente José Mujica.

A legalidade do ingresso da Venezuela já era contestável quando foi decidida pelos três presidentes, na reunião de cúpula de Mendoza. Sem referência à hipótese de suspensão, o Tratado do Mercosul condiciona a admissão de um novo sócio à decisão unânime dos membros fundadores. Essa cláusula foi atropelada.

Outras decisões políticas do Mercosul dependem também de unanimidade. Como se poderá atender a essa condição, depois da volta do Paraguai, se o governo paraguaio rejeitar a presença do quinto sócio? Mesmo sem esse problema, o bloco já estaria em péssimas condições, pela mediocridade de seus objetivos diplomáticos e até por sua incapacidade de funcionar como simples zona de livre comércio. Promissor em seus primeiros anos, o Mercosul é hoje um bloco paralisado e um entrave a qualquer iniciativa mais ousada e mais inteligente de seus membros. Melhor seria enterrá-lo como união aduaneira e retomar com seriedade os objetivos iniciais.
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A Lei de Newton e as universidades no mundo

José Flávio Sombra Saraiva*

Correio Braziliense



A universidade é do mundo, como sua essência sugere. A evolução milenar dessa instituição global não impediu, na seta do tempo, efervescência e debates calorosos. O processo civilizatório conferiu a seus titulares, professores e cientistas, lugar de destaque.

A liberdade de pesquisa e a autonomia decisória permitiram, por meio do mérito, do talento e da criatividade, a ruptura epistemológica e as descobertas. Abriu-se oportunidade para gente inventiva, corajosa, que se dedica ao ofício da pesquisa difícil e à formação de novas gerações, bem como à socialização dos conhecimentos pela extensão universitária.
As universidades levaram o homem à Lua, criaram o chip, encontraram novas formas de energia, romperam a velha física. Aprendemos a compreender os limites do planeta, as relações entre a produção e o consumo, bem como o lugar da humanidade na revolução tecnológica e na vida social globalizada.

Ao saírem dos claustros na direção das paragens da Terra, as universidades laicizaram o pensar, aperfeiçoaram o conhecimento empírico, trouxeram o método e renovaram o sentido socrático da nossa eterna ignorância. Criaram redes multinacionais e forças profundas que permitem a cientistas e professores lideranças acadêmicas pela experiência acumulada. Eles se reconhecem da Índia ao Canadá, do Japão ao Peru, da Inglaterra à África do Sul, na função específica que possuem na sociedade do conhecimento.

As universidades são o centro nevrálgico do desenvolvimento dos países avançados. Cuidam bem desse patrimônio intangível. Sabem que não há futuro senão pela tensão do conhecer, sem peia, na busca científica pura. As dificuldades dos laboratórios, os caminhos erráticos das descobertas, o sofrer para chegar à Lei de Newton, hoje conhecida por meninos nos primeiros anos de escolarização, evidenciam seu peso histórico.

O Brasil entrou atrasado nesse mundo feito de universidades. E segue zonzo em seu caminho na construção de um parque universitário como exige o mundo de um país com pretensões de escala mundial. Burocratizou-se em demasia a universidade pública federal brasileira, tornando-a uma repartição controlada pelo poder central, em que a criatividade é contida, em parte, pela energia devotada às atividades que não são o seu centro. Sua autonomia constitucional tornou-se, pouco a pouco, apenas uma quimera.

Há dois graves problemas. Reconhecidos professores e pesquisadores, respeitados na métrica internacional da produção do conhecimento, sentem a universidade brasileira perder qualidade. Emergiram os administradores, obedientes aos regulamentos do rei, a administrarem migalhas como se fosse a reitoria um almoxarifado da Esplanada. A conjugação desses fatos impede o mover de energias reais para o que deve ser uma universidade em um país como o Brasil.

Greve nas universidades federais brasileiras é universal como a Lei de Newton, passa governo e vem governo, no conluio do quase nada. Os professores veem suas carreiras desprestigiadas no quadro dos altos salários da burocracia estatal. E os dirigentes das universidades gostam de flertar os governantes, fazer carreira fora, passar para o outro lado, como se nota nos seus currículos. Optam pela legenda, pelo partido, pelo arranjo, pela claque.

Há apartheid entre a sala do gestor e o cientista, entre o partido e o professor que ama seus alunos. Achacados pela onda do patrulhamento imposto, seguem os produtores de ciência e formadores dos jovens brasileiros seus caminhos solitários.

O Brasil, um dos últimos grandes países da América Latina a possuir sistema relativamente respeitado de produção de ciência, deveria rever o modelo. Começaria por mudança na governança das universidades públicas nacionais, que não mais suportam eleições plebiscitárias de administradores. A regra deveria ser o mérito ou a capacidade de administrar, preferencialmente por análise de currículos, com supervisão meritocrática externa e profissional. Nas grandes universidades do mundo, ninguém sabe o nome do reitor, mas declamam de cor os sobrenomes dos seus prêmios Nobel.

Seria esse um bom passo para o difícil caminho da desejada integração do Brasil ao mundo. Uma universidade sem o mérito como princípio básico, mesmo que "democrática", pode ser qualquer coisa, menos uma universidade.



Ph. D. pela Universidade de Birmingham, Inglaterra, é professor titular de relações internacionais da UnB e pesquisador 1 do CNPq
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