domingo, 17 de fevereiro de 2019

AMAZÔNIA: “A MARCHA DA INSENSATEZ”

Quando fui o professor-chefe do Curso de Política e Estratégias Aeroespaciais, na Universidade da Força Aérea RJ, convidamos o Gen Ex Heleno, então Comandante Militar da Amazônia, para proferir uma manhã de palestras aos coronéis da FAB alunos daquele curso.
Eu já havia assistido a várias palestras, inclusive no CMA, antes contudo JAMAIS havia assistido a uma palestra tão abrangente e profunda, rica em detalhes e visão prospectiva. 

O que posso dizer é que a sociedade brasileira TEM MUITA SORTE de tê-lo como o atual GSI -pessoa essencialmente certa em uma função de elevadíssima criticidade estratégica.
O artigo abaixo do Gen Paiva mostra a dimensão e complexidade acerca da Amazônia.


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AMAZÔNIA: “A MARCHA DA INSENSATEZ” I (02-04-2013)

General da Reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva

Nos anos 1980, a historiadora Barbara Tuchman publicou o livro A Marcha da Insensatez – de Troia ao Vietnam, um best-seller mundial. Usou eventos históricos para mostrar como governantes criam condições objetivas para futuros desastres ao decidirem movidos por ambições políticas e vaidades, sem compromisso com anseios e necessidades de seus povos e nações. Insensatez qualifica a política impatriótica dos últimos governos brasileiros, na Amazônia, mesmo cientes da secular cobiça de potências estrangeiras, manifestada em sucessivas tentativas de suprimir ou limitar a nossa soberania na região.

Nos anos 1850, Matthew F. Maury, oficial da Marinha dos EUA, propugnava a abertura da navegação na bacia amazônica e a sua ocupação por contingentes de negros após a abolição da escravatura naquele país. Em 1904, a Questão do Pirara resultou na perda de 19.600 Km2 do território nacional para a Guiana Inglesa, então colônia britânica. São apenas dois de muitos exemplos dessa cobiça.

A partir dos anos 1990, com a queda da URSS, os aliados da OTAN não tinham mais ameaça militar a seus territórios, ganhando liberdade de ação para se projetar em âmbito global. Cunharam então o conceito de novas ameaças, na verdade pretextos para justificar a expansão e impor globalmente seus interesses. Aí se insere a questão indígena.

Líderes mundiais propuseram publicamente a ingerência internacional no aproveitamento das riquezas dos espaços pouco explorados de outras nações, tendo estadistas como Mitterand (1989), John Major (1992) e Gorbachev (1992) citado nominalmente a Amazônia. Hoje, as potências estrangeiras são mais sutis, usando ONGs, grupos privados e organismos internacionais como a OEA e a ONU na vanguarda, para pressionar pela autonomia das terras indígenas (TIs) brasileiras e impedir projetos nacionais de desenvolvimento na região. Querem preservar hoje para explorar amanhã, impondo acesso privilegiado aos recursos amazônicos à revelia dos interesses e direitos brasileiros.

Essa marcha da insensatez começou com a demarcação da TI Ianomâmi (1991) e prosseguiu com as do Alto Rio Negro (1998), Vale do Javari (2001), Tumucumaque (2002), Raposa Serra do Sol (2005) e Trombetas-Mapuera (2008) que cobriram, perigosamente, a fronteira ao norte e a sudoeste do rio Amazonas. Todas nos governos Collor, FHC e Lula. Em todo o Brasil, 608 TIs já ocupam 13% do território nacional, área igual às do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e sul de Minas Gerais somadas. Tudo para apenas 800 mil indígenas, separados dos 200 milhões de irmãos brasileiros pela política segregacionista de governos complacentes com a campanha desnacionalizadora e separatista de ONGs estrangeiras, temerosos de reações internacionais.

A marcha avançou em 2007 quando o governo votou pela Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas na ONU, aceitando que eles tenham autogoverno, autodeterminação, instituições políticas e sistemas jurídicos próprios, constituam nações indígenas e vetem atividades militares e medidas de governo nas TIs. É autonomia superior à dos estados da Federação. Com 608 TIs, como ficará a governabilidade do País? O artigo 42 daquela Declaração ampara a intervenção internacional para obrigar o seu cumprimento, agredindo soberanias e patrimônios nacionais e tornando inócuo o artigo 46, que garante apenas a integridade territorial e unidade política dos Estados. Se o Congresso aprovar a Declaração com a qual o governo Lula concordou, o Brasil terá limitado a própria soberania ao reconhecer, em seu interior, 608 nações indígenas estrangeiras, para a comunidade global que não reconhece o índio como brasileiro. Os indígenas poderão exigir o cumprimento da Declaração. Se não forem atendidos e se revoltarem, havendo repressão do governo, solicitariam a intervenção da ONU com base em Resolução de 2005 – “Responsabilidade de Proteger”. Povo, território, nação e instituições políticas formam um estado-nação.

A marcha foi reforçada, mais uma vez pelo governo, ao lançar o Programa Nacional de Direitos Humanos 3 (2009), onde preconiza tornar constitucionais os instrumentos internacionais de direitos humanos não ratificados pelo Congresso Nacional. Se isso acontecer, caem as 19 ressalvas constantes na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a demarcação da TI Raposa Serra do Sol, que resguardam a soberania nacional em todas as TIs. A Portaria nº 303/2012 da AGU, que regulamentaria essas ressalvas, foi suspensa pelo ministro da Justiça após pressões de praxe. Uma decisão da mais alta Corte do País contestada com êxito por ONGs estrangeiras e movimentos internos. Um absurdo!

O senador roraimense Mozarildo Cavalcanti (Diário do Senado Federal, 23-09-2005, p. 31758) condenou a demarcação da TI Raposa Serra do Sol em terras contínuas e evidenciou a pressão internacional, reconhecida pelo então Presidente da República. Disse o senador: “O Presidente Lula, na última audiência em que tive com Sua Excelência, (---) perguntou: quantos eleitores têm em Roraima? (---) Sua Excelência balançou a cabeça e disse que estava sendo pressionado pela USP, pela OEA, pelas ONGs europeias”. A propósito, o Príncipe Charles, criador da ONG Prince's Rainforests Project, que promoveu diversos encontros na Europa com lideranças indígenas e políticos brasileiros, defendendo aquela demarcação em terras contínuas, foi recebido por Lula às vésperas da reunião decisória do STF sobre o tema em março de 2009. Coincidência ou pressão?

A soberania na Amazônia já é limitada, de fato, coroando a marcha da insensatez empreendida por lideranças que colocaram projetos pessoais e vaidades acima do interesse nacional ou, com espírito mercantilista, negociaram soberania pensando gerar retorno econômico-financeiro ao País como se dignidade nacional fosse mercadoria de troca. A Nação, omissa, também é responsável.

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