Claudia Safatle - Valor Econômico
Após pacote de reformas será a vez do Imposto de Renda negativo
A área econômica do governo resolveu “radicalizar” na proposição de reformas para não cair na mesma vala do presidente Mauricio Macri, da Argentina, que não conseguiu ser reeleito e devolveu o poder aos peronistas. O governo também não quer ficar exposto a um eventual enfrentamento de manifestações de protesto que, no Chile, paralisaram o governo de Sebastián Piñera.
O argumento dos assessores oficiais, porém, é de que o Brasil já passou por movimentos de protesto em 2013 e que a eleição de Jair Bolsonaro foi uma resposta da sociedade às questões então colocadas pelos manifestantes.
Avalia-se, na equipe econômica, que Macri foi lento demais e titubeante na proposição das reformas necessárias para tirar a Argentina da crise. Hoje a situação no país vizinho é dramática: déficit público da ordem de 6% do PIB, recessão (queda de -3,1% do PIB), inflação galopante (de 55% ao ano) e cerca de 35% da população urbana está na linha da pobreza.
O acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que daria ao país vizinho acesso a cerca de US$ 57 bilhões, foi considerado pelo presidente eleito, o peronista Alberto Fernández, como “impossível” de cumprir”.
Aqui o governo preparou um pacote de grande porte, com quatro emendas à Constituição (PECs), que derrubam tabus e revolucionam a política fiscal.
O próximo passo, segundo fontes oficiais, será de mudanças radicais também na área social. Pretende-se criar um programa de renda mínima mediante o Imposto de Renda negativo que daria uma nova cara ao Bolsa Família.
O IR negativo pressupõe a definição de uma determinada linha de renda. Quem receber acima dela paga um percentual de imposto e quem estiver abaixo recebe uma fração do tributo. O IR negativo foi concebido por uma política britânica, Juliet Rhys-Williams, nos anos de 1940. A ideia foi abraçada pelo economista americano Milton Friedman, pai do liberalismo que inspirou Paulo Guedes, ministro da Economia, que foi seu aluno em Chicago.
O pacote de reformas de Guedes é ambicioso. Chamado de Mais Brasil, ele pretende construir um novo pacto federativo que desindexa, desvincula e desobriga o Orçamento de despesas públicas; redefine a repartição de receitas do pré-sal entre a União, os Estados e os municípios, faz uma ampla reforma administrativa e cria a figura da Emergência Fiscal.
O ente da federação que se encontrar em estado de emergência fiscal poderá cortar despesas obrigatórias tais como pagamento de salários do funcionalismo mediante redução da jornada de trabalho e suspensão de reajustes salariais acima da inflação.
O gatilho para disparar a situação de emergência é a desobediência à “regra de ouro”, que proíbe o governo de se endividar para pagar gastos correntes. A União, portanto, já está na situação que lhe permitiria reduzir jornada de trabalho e os salários dos servidores. Neste ano o governo pediu crédito suplementar de R$ 258 bilhões ao Congresso para cobrir a insuficiência de recursos.
Um aspecto importante do pacote de medidas para consertar os desequilíbrios fiscais decorrentes do aumento sistemático do gasto público é a criação do Conselho Fiscal da República. Neste terão assento os presidentes da República, da Câmara, do Senado, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Contas da União (TCU), além do presidente da Associação dos Tribunais de Contas dos Estados (Atricon).
A ideia é que estejam todos muito bem informados da real situação da precariedade das contas públicas antes de tomar decisões que eventualmente piorem a situação. E caberá ao TCU ser uma espécie de ordenador das linhas de ação dos tribunais estaduais para que fiscalizem, de fato, as finanças estaduais e municipais, em vez de serem meros avalistas de práticas contábeis equivocadas.
No Chile, a “ponta do iceberg” que fez eclodir manifestações de protestos por todo o país foi o aumento da tarifa do metrô. Mas o que ganhou notoriedade nos últimos dias foi a palavra “desigualdade”, com manifestantes insistindo que a diferença social entre ricos e pobres no país é excessiva.
No Brasil, a desigualdade de renda é abissal. É importante que o governo não se preocupe somente com o corte de gastos, mas que esteja muito atento à rede de proteção social necessária para que o peso do ajuste não caia sobre os mais pobres. A ideia do Imposto de Renda negativo é bem interessante e o Bolsa Família, pelo universo que alcança, é um programa muito barato.
Investidor aflito
Investidores internacionais ficaram muito aflitos com a ação da prefeitura do Rio que, sob as ordens do prefeito Marcelo Crivella, derrubou as cancelas e estruturas do pedágio da Linha Amarela por causa de disputas com a concessionária Lamsa.
Crivella, em seguida, enviou projeto de lei à Câmara dos Vereadores que autoriza a encampação da Linha Amarela. O prefeito pediu, ainda, que a tramitação do projeto seja em regime de urgência.
Dados da Controladoria-Geral do município indicam que a Taxa Interna de Retorno (TIR) aplicada pela concessionária é de 30,57%, bem acima dos 10,90% previstos em termo aditivo. Essa seria a prova de que a Lamsa está tendo rentabilidade superior à estabelecida contratualmente, às custas dos preços dos pedágios.
Desde o episódio, assessores do governo federal têm recebido telefonemas de investidores que perguntam, afinal, qual é mesmo a “segurança jurídica” que têm os empreendimentos no país.
Segurança jurídica, porém, tem que ser uma via de duas mãos e compromissos contratuais precisam ser respeitados pelas partes.
E é melhor não partir para a ignorância e sair quebrando patrimônio que acabará sendo pago pelos cidadãos consumidores.
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