terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Partidos políticos e Estado


EROS ROBERTO GRAU
 O Estado de S.Paulo

Em dezembro de 2012 anotei aqui mesmo, neste espaço de O Estado de S. Paulo, que qualquer insurgência contra a face do Estado que o Supremo Tribunal Federal é afrontaria a ordem e a paz sociais, prenunciaria vocação de autoritarismo, questionaria a democracia. Pretenderia golpeá-la. Por isso - escrevi - é necessário afirmarmos, em alto e bom som, o quanto de respeito e acatamento devemos ao Poder Judiciário e em especial, hoje e sempre, ao Supremo Tribunal Federal. Quem o agride investe contra as instituições democráticas, afronta a Constituição (O STF e a República, 8/12, A2).

Diz a Constituição, em seu artigo 17, ser livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos. Desde que resguardados, contudo, a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana.

Observar o regime democrático, um dos traços que alinham horizontes no dinamismo dos partidos políticos, reclama a observância, entre outros parâmetros, do quanto os romanos prescreviam ao afirmar a regra do honeste vivere.

Viver honestamente, mandamento que alguns não observaram. Aqueles referidos como "companheiros injustiçados" em congresso do Partido dos Trabalhadores, aos quais se hipotecou solidariedade.

Quem concluiu que alguns descumpriram o dever de viver honestamente - e concluiu na e pela sua voz enquanto uma de suas porções, o Supremo Tribunal Federal - foi o Estado. Quem o afirmou, no processo judicial conhecido como "mensalão", foi o Estado brasileiro. Pois a autoridade do Estado é uma totalidade indivisível, sua organização em funções - legislativa, executiva e jurisdicional - prestando-se unicamente a aprimorar seu funcionamento.

Não há ideias novas em matéria de política e direito. Qualquer uma delas, podemos descontraidamente sustentar, já há de ter sido enunciada, in illo tempore, por um grego ou um romano. A afirmação da existência de três partes nos governos vem de Aristóteles, na Política. Quando essas partes estiverem em bom estado, a Constituição estará, também, em bom estado. E as Constituições distinguem-se umas das outras, prossegue Aristóteles, segundo a forma de organização e composição dessas partes. A terceira delas faz justiça. Bom estado significa, no contexto da exposição aristotélica, bem ordenadas. O sentido do estarem em bom estado essas três partes pode ser encontrado, na Ética a Nicômaco, na ideia de composição, justa medida, virtude no valor médio. Aristóteles está imediatamente atento, hoje diremos, às funções legislativa, executiva e jurisdicional do Estado.

Por isso causa espanto e estupor, horroriza mesmo o fato de um partido político, reunido em congresso nacional, desagravar "companheiros injustiçados", inusitada e desabridamente afrontando o Estado. O que vimos foi um partido político investindo não contra outro partido político (por isso são "partidos"), porém contra o próprio Estado. Contra o bom funcionamento do Estado, em benefício do qual deveriam concorrer.

Pois a auctoritas do Estado, digo-o outra vez, é uma totalidade indivisível. Isso desejo repetir, visto que os amigos do alheio, os que descumprem a regra do honeste vivere, pretendem ocultá-lo, supondo-se capazes de tapar o sol com peneira.

O mais grave está em que essa agressão ao Estado - insista-se neste ponto: o Judiciário é uma face do Estado -, isto é, o mais grave é a circunstância de tal agressão ter sido perpetrada em presença do anterior presidente da República e de quem lhe sucedeu, sem que, ao que consta, nenhum deles se tenha oposto a essa desmedida afronta à própria soberania e ao regime democrático.

O que se pretende? Viver honestamente, dever do cidadão, é regra que vincula não apenas cada um, individualmente, mas também os que institucionalmente representam grupos em que se compõem. Ou acaso supõem, os que falam por esse ou aquele partido, não ser vinculados pelas regras que prescrevem a honestidade? Que loucura é essa que autoriza aos partidários dos condenados pelo Estado enquanto Poder Judiciário investir contra quem os condenou, o próprio Estado?

O homem, disse Paulo Mendes Campos, um dos nossos poetas de verdade, é um gesto que se faz - ou não se faz. A liberdade consiste em afirmarmos o que os do nosso tempo denominam Estado de Direito. Defendê-lo, eis o gesto que incumbe aos homens corretos. O Estado de Direito, ainda que apenas formal, em sua expressão possível no modo de produção social que praticamos, será mera ficção se não nos curvarmos ao quanto o chamado Poder Judiciário decide em sua derradeira instância, soberanamente. Qual decidiu o Estado brasileiro em sua face judicial, na expressão do Supremo Tribunal Federal. Negá-lo, isso é inconcebível se não pretender, quem o negue, subverter a ordem e apropriar-se da res publica. Em termos bem claros, recorrer a uma ditadura excludente da moralidade.

O que na ponta da linha aterroriza, além de horrorizar, é o fato de o pretexto da defesa dos interesses dos humildes prestar-se à apropriação mensaleira. Quem diz que é assim é o Estado brasileiro, por quem representa um dos seus três Poderes, o Judiciário. Tristes tempos. Tempos que prenunciam, no silêncio incontido dos que consentem com afrontas à soberania e ao regime democrático, a volta ao passado.

Há 50 anos, o pretexto da defesa da democracia justificou violência em nome da defesa das liberdades. Temo, de repente - não mais que de repente, qual diria Vinicius -, que a História se repita não como tragédia, mas como farsa. Desta feita a pretexto, desgraçadamente - embora justificável -, da defesa da moralidade. É inconcebível que um partido político pregue escancaradamente, em benefício de condenados pelo Supremo Tribunal Federal, a desobediência ao Estado.

EROS ROBERTO GRAU, PROFESSOR TITULAR APOSENTADO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), EX-MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (APOSENTADO), É MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS 

Gool


Benjamin Steinbruch

Mais algumas horas e estaremos todos comemorando com familiares e amigos a passagem do Ano-Novo. Em momentos como esse, não há razão nem clima para falar de problemas, abordar polêmicas ou fazer críticas.

O dia do Ano-Novo, por tradição, deve ser voltado para pensamentos positivos e para esperanças de realizações no período que se inicia. Assim, enumero aqui minha singela lista de desejos para o Brasil e os brasileiros neste 2014 que começa logo mais sob chuvas de fogos em todo o país.

Imaginemos, então, que tudo vai dar certo para o Brasil e os brasileiros no novo ano. Claro que, como não há milagres nessa matéria, o país continuará sendo um emergente, nome pomposo pelo qual há algumas décadas passou-se a rotular os países com grande potencial e nível médio de desenvolvimento econômico e social. Mas muita coisa boa pode acontecer.

Em minha lista aparecem em primeiro lugar o emprego e a renda. Que o país continue a criar vagas de trabalho e que a renda média do brasileiro se mantenha em alta. O trabalho digno, além de prover recursos financeiros, realiza o ser humano. Não existe nada mais triste e desagregador para as famílias do que o desemprego.

Para que haja sempre mais trabalho, é preciso expandir a atividade produtiva. Que venha, então, o crédito sem juros exorbitantes tanto para investimentos quanto para o consumo. Que as autoridades tenham bom-senso para manter as taxas em níveis civilizados e procurem aliviar a carga tributária da sociedade como um todo.

A expansão da atividade produtiva depende também do mercado internacional. Então, que a economia mundial volte a crescer de forma sustentável, que a China retome o ritmo chinês, que os EUA mantenham sua recuperação, com a manutenção da política monetária não conservadora, e que a União Europeia saia da enrascada em que se meteu.

Por aqui, que o câmbio seja favorável ao exportador para melhorar a competitividade do produto manufaturado brasileiro, mas sem ultrapassar limites que possam causar impacto
inflacionário.

A eficiência dos serviços públicos aumenta quando o governo divide essa responsabilidade com o setor privado. Por isso, que as concessões tenham continuidade e que a fórmula encontrada para rodovias e aeroportos, que deu resultado, possa ser adotada em outras áreas, como a de ferrovias e hidrovias.

Para transformar o Brasil e os brasileiros, o país precisa de políticas públicas vigorosas nas áreas de educação, saúde e sociais em geral. Que elas tenham seguimento para que melhorem os índices de desenvolvimento humano, mortalidade infantil e distribuição de renda. E também para que todas os jovens brasileiros, dos 5 aos 21 anos, pelo menos, possam ter a oportunidade de frequentar uma escola.

Que tenham sequência as reivindicações sadias nas áreas sociais, para a melhor distribuição de gastos públicos, para o combate à corrupção e à burocracia, para a melhoria da mobilidade urbana, para que haja mais segurança nos grandes centros urbanos e para outras causas. E que sejam respeitados os direitos de manifestação e opinião, desde que sem agressões a pessoas ou atos de violência contra o patrimônio público ou privado.

Se caminhar por aí, o país estará num bom caminho. Ter esperança pode parecer pieguice ou ingenuidade para alguns. Ao olhar para trás, porém, é possível ver quanto já avançamos nas últimas décadas. A despeito das dificuldades, o Brasil é hoje indiscutivelmente melhor do que aquele dos anos 1980. Nada teria mudado no país se não houvesse democracia e se os brasileiros não tivessem desejos, planos e esperança.

Por fim, que o Brasil ganhe a Copa do Mundo. Vença dentro do campo, num ambiente de paz, alegria e fair play. E também fora do campo, com boa organização e a conclusão a tempo dos projetos de estádios, hotelaria e infraestrutura urbana.

Depois disso, que se abra um debate amplo sobre os problemas nacionais, de forma que os brasileiros sejam bem informados para votar com consciência e responsabilidade para a Presidência da República e para os demais cargos públicos nas eleições de outubro. Paz e felicidade no Ano Novo!

Benjamin Steinbruch é empresário, diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração e 1º vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Escreve às terças, a cada duas semanas, no caderno 'Mercado'.

Jogos de guerra na Ásia


As três maiores economias do mundo –EUA, China e Japão– estão envolvidas em preocupante agitação militar no leste da Ásia. O pretexto é um punhado de ilhotas no oceano Pacífico; o pano de fundo é o aumento calculado da agressividade de Pequim em suas disputas territoriais com os vizinhos.

A atual escalada começou há pouco mais de um mês, quando Pequim decretou que uma vasta porção do mar do Leste da China passaria a ser zona de defesa aérea. Pela resolução, quem quiser sobrevoar essa área precisa notificar as autoridades chinesas.

O perímetro estabelecido pela China, contudo, inclui uma área sob domínio sul-coreano e parte de um arquipélago em disputa com o Japão, atualmente administrado por Tóquio –as ilhas Diaoyu, ou Senkaku (para os japoneses).

Num desafio à China, os EUA, aliados do Japão, enviaram dois bombardeiros B-52 à região, no final de novembro. Dias depois, japoneses e sul-coreanos seguiram o exemplo. Não houve retaliação.

Mais recentemente, o governo japonês anunciou inédita estratégia de segurança nacional, com aumento de 5% de gastos nos próximos cinco anos, totalizando US$ 240 bilhões. Os recursos adicionais serão empregados sobretudo em melhorias na vigilância do arquipélago Diaoyu/Senkaku.

Houve, além disso, tensão no campo simbólico. Na semana passada, o premiê do Japão, Shinzo Abe, foi ao santuário Yasukuni, em Tóquio, dedicado a japoneses mortos em conflitos desde 1868.

A visita, a primeira do gênero desde 2006, gerou duros protestos na China e na Coreia do Sul, que consideram o local um símbolo do passado militarista japonês.

O endurecimento da China em disputas territoriais –houve episódios semelhantes com Filipinas e Vietnã– coincide com sua ascensão ao posto de segunda maior economia do mundo, o que se deu em 2010. Há, ademais, a percepção de que os EUA têm no leste da Ásia uma de suas prioridades militares a curto e médio prazo.

A fim de evitar confrontos, mecanismos internacionais de negociação sobre segurança e limites territoriais precisam ser aprimorados. Não interessa a ninguém um conflito militar envolvendo as maiores economias do mundo, duas das quais são potências nucleares.
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FAÇA RODAR SEU CICLO PDCA PESSOAL!!!


Adaptado por Fred Domingos 

No cotidiano das organizações de sucesso, a utilização de ferramentas de gestão, planejamento e tomada de decisões são imprescindíveis, estabelecendo padrões e estabilidade no presente e crescimento certo no futuro, assim como o futuro de cada um de nós, atualmente, fazem parte do interesse  dessas instituições. 

Dificilmente, em nossa vida pessoal, utilizamos esses mecanismos, que são comprovadamente reconhecidos como ferramentas excelentes de planejamento; seja por falta de "tempo" ou por acreditarmos que será muito complexo e trabalhoso.

Pois bem, agora é a nossa hora! Porque não rodar o ciclo PDCA em nossas vidas???

Imagine-se como uma organização, sim, você será o Presidente de VOCÊ/SA...

Estabeleça um plano de Gestão, é simples, basta que você sempre mantenha o foco em seus objetivos (Escopo); cumpra o programado e conheça algumas regras a sobre o Ciclo PDCA adotado pelas grandes organizações. Então vamos lá! 
Primeiro passo - definir qual é o foco do PDCA e escrever seu plano de vida, lembra, seu plano de gestão. 

É fácil dizermos que colocaremos a nossa vida toda em um único cenário. Mas sabemos que sempre fizemos planos grandiosos e muitos deles nem saíram da esfera do planejamento. Então, para que o nosso PDCA seja factível, faremos uma visão simples, porém objetiva.

Para definir façamos o seguinte: 

Item 1 – O foco deve vir pautado naquilo que você acredita ser capaz de fazer (Plano Exeqüível). Assim, descubra quem você é e qual é a sua missão. Não vale coisas muito amplas e generalistas, basta ser simples. Exemplo: minha missão é fazer as pessoas  se sentirem seguras e com seus direitos garantidos, por isso serei Advogado, farei um curso de Direito.

Item 2 – pergunte-se: O que preciso para que isso aconteça?
Faça uma relação de atividades básicas que são necessárias para que a sua missão aconteça. Busque fazer perguntas bem francas sobre o que você precisa. Essa é a hora de você fazer e refazer seu plano, então não tenha medo de rever todos seus sonhos. 

Item 3 – definidos todos seus sonhos e alinhados ao seu foco, passe agora a escrever todos, estabelecendo prazos para serem cumpridos. E não vamos colocar prazos muito longos e nem muito curtos, pois o primeiro desmobiliza porque você tem tempo demais e o segundo desmotiva por não alcançar os resultados esperados. Peça sempre a alguém de sua confiança para alinhar com você os prazos. Uma força extra nessa hora de planejamento de vida é sempre bem vinda.

Segundo passo. Faça acontecer. 

É a segunda parte mais difícil do PDCA para nossa vida pessoal. Para nós, é sempre possível deixar para a próxima segunda-feira. Por isso, para que você possa cumprir seus prazos, crie uma penalidade para o não cumprimento de seu plano. Essa penalidade deve ser com algo sempre que você dá muito valor: assistir a um jogo, ver filmes, ir para a balada. O ser humano gosta de ter sanções. Portanto, não dê mole para você mesmo. Seja assertivo. Cumpriu tem direito. Não cumpriu perde o direito. E não se esqueça de ter sempre em mãos seu plano com prazos. Procure colocá-lo num local visível. 

Terceiro passo. Controle todas as atividades. 

Assim como falamos acima, lembre-se como no ditado “acordado não é caro”. Então controle, controle e controle. Não aceite ser condescendente consigo mesmo, lembre-se que você está tratando do seu futuro, por conseguinte, faça cumprir sempre suas metas e controle todos seus passos. 

Quarto passo. Avalie suas ações e aja corretivamente. 

Nunca se esqueça que, mesmo tendo disponibilizado um bom tempo no plano, ele sempre  pode ser melhorado e nunca ficará tão perfeito. Por isso, pense que atrasos poderão existir, mas não são desculpas para não correr atrás de suas metas. Assim, se não cumpriu sua meta, faça uma análise e crie uma ação corretiva às atividades com atrasos. E o que você cumpriu com facilidade, faça uma reflexão sobre isso.

Reflita sempre sobre as mudanças de mentalidade, pois cada etapa vencida e cumprida nos revela outras estratégias de sucesso. Nunca deixe de registrar todas as oportunidades de melhoria, mas dê mais atenção àquelas que sejam alinhadas com sua visão. Anote isso: oportunidades aparecem em todos os instantes para quem tem o olho treinado para vê-las. 

Seja mais feliz fazendo seu PDCA girar!
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sábado, 28 de dezembro de 2013

Mundo caminha para regimes ditatoriais apoiados nas tecnologias

Irene Pimentel


A "tremenda crise" de segurança que se vive hoje em dia no mundo está a transformar as democracias em ditaduras, ao abrigo de excepções que estão a destruir os valores ocidentais, defendeu hoje a académica portuguesa Irene Pimentel.

Em declarações à agência Lusa no Tarrafal, norte da ilha cabo-verdiana de Santiago, onde participa na primeira conferência internacional sobre a Rota dos Presídios no Mundo Lusófono, a historiadora portuguesa alertou para os perigos de as excessivas medidas de excepção estarem a destruir a democracia.

"Estamos numa tremenda crise, que não sabemos muito bem onde vai dar. O grande problema é que as próprias democracias, que não podemos dizer que são ditaduras, têm excepções, estabeleceram regimes de excepção para determinadas categorias, como terroristas ou bombistas, criando administrativamente uma nova legitimidade e uma nova lei, completamente fora da lei da democracia", advertiu.

Salientando o "caso típico" de Guantanamo, a "prisão" norte-americana localizada em Cuba, Irene Pimentel criticou o facto de ainda existirem, nos dias de hoje, campos de concentração que estão a perverter a democracia e liberdade dos cidadãos.

A professora da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, que dissertou sobre "O Sistema Concentracionário na Europa e no Mundo", realçou que, em nome de "eufemismos" ligados, por exemplo, à Lei Patriótica ("Patriot Act") norte-americana, se possa prosseguir com a tortura.

"Há aquela frase célebre de (António Oliveira) Salazar: «Uns safanões a tempo para que os temíveis bombistas não provoquem perda de vidas humanas, de mulheres e crianças». Com esse argumento, actualmente, está a dar-se cabo da democracia. Quando estamos a fazer excepções em democracia, estamos a dar cabo dela", sublinhou.

Questionada pela Lusa sobre para onde então se caminha, Irene Pimentel respondeu que poderá estar-se a caminhar para "novas ditaduras", diferentes das que se conhecem, "porque não há referências e os contextos são diferentes", salvaguardando ainda que a tecnologia actualmente ao dispor ajuda "tremendamente" ao processo.

"Estamos em transformação, sem quase darmos por isso, de uma democracia para ditaduras. Por exemplo, hoje em dia, não é preciso na Europa, ou em Portugal, instaurar a censura tal como ela existia na ditadura. Basta controlar os «mass media», pôr os jornalistas a ganharem pouco, a estarem disponíveis para tudo, etc, e, de repente, temos um pensamento único, sob a capa da pluralidade", avisou.

Recuando no tempo, e comparando com os campos de concentração portugueses nas antigas colónias em África, Irene Pimentel sublinhou que a lógica actual não é de extermínio, como o que se passou na Alemanha nazi, mas de neutralização dos opositores, tal como o Estado Novo fez, primeiro, com os antifascistas, entre 1936 e 1954, e, depois, com os nacionalistas, em Angola, Cabo Verde, Guiné e Moçambique.

"Não creio que eram campos para matar, mas se as pessoas morressem não vinha grande mal ao mundo. Era sobretudo neutralizá-los, afastá-los, para que não houvesse mais interferências", disse, admitindo que o caso do campo da Machava, em Moçambique, foi mais longe na eliminação física dos opositores.

"Mas nada se pode comparar com os campos de concentração da Alemanha nazi, sobretudo depois de 1941, com Dachau, Buchenwald e Auschwitz", frisou, lembrando a "fase de extermínio", sobretudo de judeus.

Lusa/SOL 25 de Outubro, 2013

Ensino medíocre

FOLHA Editorial 

Em pouco mais de duas décadas, de 1991 a 2012, as matrículas no ensino médio deram um salto de 120% no país. A clientela passou de 3,8 milhões para 8,4 milhões de alunos, a maioria deles (87%) em escolas públicas, sobretudo nas redes estaduais (85%).

Há um processo acelerado de inclusão em andamento, mas ainda aquém do que o Brasil precisa. De cada centena de crianças no ensino fundamental, 75 chegam ao ensino médio e só 57 o concluem; apenas 14 conseguem fazer faculdade, e 7 a terminam.

Inundadas de estudantes com deficiências de aprendizado, as escolas oficiais têm de acolhê-los a despeito das restrições orçamentárias impostas a governos estaduais endividados, e o fazem com um corpo docente desmotivado por salários baixos e, pior, sem a qualificação necessária.

O quadro aparece sem meias-tintas em levantamento realizado –a pedido desta Folha– pelo Inep, instituto de pesquisa do Ministério da Educação (MEC). Com base em dados do Censo Escolar de 2012, constatou-se que 55% dos professores de ensino médio dão aulas em disciplinas para as quais não têm formação específica.

A partir do sexto ano do ensino fundamental (antigo ginásio), o docente precisa ter curso de licenciatura na área em que atua. Mas, entre a intenção da lei e a prática social, como de hábito no Brasil, verifica-se enorme hiato.

De qualquer ângulo que se considere, a figura tem contornos assombrosos: só 18% dos professores de física têm formação na matéria; na Bahia, Estado em pior situação, meros 8,5% contam com licenciatura; mesmo na rede particular de ensino, pouco mais da metade possui formação específica.

O governo federal despertou para o descalabro há alguns anos, mas as ações de enfrentamento são tímidas. Um Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio foi lançado há um mês pelo MEC com números grandiloquentes, sob medida para a propaganda eleitoral: 495.697 docentes, 7 milhões de alunos e 20 mil escolas envolvidos.

Tudo se resume a mais uma bolsa federal: R$ 200 mensais para que professores aceitem fazer, no horário e no local de trabalho, cursos de aperfeiçoamento. Melhor que nada, mas ainda muito pouco.

A solução real só virá a médio e longo prazos: atrair os melhores alunos da universidade para a docência. Se salários muito melhores são por ora impossíveis, dadas as restrições fiscais, há que buscar outros incentivos. Por que não um plano de carreira promissor, que recompense no futuro o investimento presente numa profissão hoje desprestigiada?

Falta inovação e liderança no setor. Aceitar menos que isso é contentar-se com um ensino medíocre.
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segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Sociedade anestesiada

A "direita" no Brasil não resolveu a questão social e o que investiu em infra-estrutura não foi o suficiente, apesar de ser na época o possível, para diminuir a desigualdade social. A "esquerda" está a muito mais tempo no poder, no Brasil, do que a "direita", não investiu em infra-estrutura, preocupou-se em "tentar" reduzir a desigualdade social por intermédio da "sensação" de melhoria do poder aquisitivo, que permite ao eleitor comprar mais bens mas perder em saúde (carestia e ineficiência do sistema de saúde público e privado), mobilidade urbana, educação, segurança, qualidade de vida e inflação. 

Ambos não cumpriram seus deveres constitucionais. Não seria a hora de se abandonar esta estúpida dialética ideológica e procurar resolver os graves problemas pelos quais o eleitor os elege?

E o senhor eleitor, não estaria na hora de ser mais responsável na sua democracia participativa e deixar de ser um imbecil manipulável pela mídia?

Ano que vem será um ano caro, inseguro e dificílimo e a sociedade continua anestesiada.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

A educação brasileira

A sociedade se habituou a mediocridade da educação, seus sistemas e suas idiossincrasias pois abriu mão de acompanhar, de perto, a recente reforma educacional brasileira quando, "representando" a sociedade que ficou em casa  vendo televisão, sindicatos, ONG e demais associações de educadores e "especialistas" coalharam um importante instrumento de reforma com corporativismo e ideologia, condenando, sobremaneira, o futuro dos jovens furtando-lhes a oportunidade de um emprego decente e sustentável tornando, cada vez mais distante, a redução da desigualdade social e o atingimento do desenvolvimento social pleno.

A educação brasileira
O Estado de S.Paulo


O Brasil está avançando na educação, mas os países desenvolvidos e muitos países em desenvolvimento estão avançando ainda mais. Esta é uma das conclusões do relatório de 2012 do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, na sigla em inglês), mantido pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Realizado a cada três anos, o estudo foi elaborado com base nos rankings de três provas - matemática, ciência e leitura - aplicadas a estudantes de 15 anos de 65 países ou regiões econômicas delimitadas (como é o caso da província chinesa de Xangai).

Ao todo, submeteram-se às provas do Pisa de 2012 510 mil estudantes, dos quais 19.877 eram alunos brasileiros de 837 escolas. A amostra representa os aproximadamente 28 milhões de alunos dessa faixa etária nos países avaliados. O objetivo da avaliação é aferir o quanto os alunos aprenderam em sala de aula e se conseguem aplicar o conhecimento adquirido na solução de problemas reais em seu dia a dia.

Com 391 pontos, os estudantes brasileiros ficaram em 58.º lugar na prova de matemática, numa posição próxima à dos estudantes da Albânia, Jordânia e Tunísia. Em 2003, a média foi de 356 pontos. O ranking dessa disciplina em 2012 foi liderado pelos estudantes de Xangai e Cingapura, que obtiveram 613 e 573 pontos, respectivamente. A média dos estudantes dos países da OCDE foi de 494 pontos. Entre os países da América Latina, o Brasil ficou abaixo do Chile, México, Uruguai e Costa Rica e acima do Peru e da Colômbia.

Na prova de leitura, os estudantes brasileiros obtiveram 410 pontos - menos do que na edição anterior do Pisa. E, na prova de ciências, permaneceram estagnados, com 405 pontos. Essas pontuações são consideradas baixas pelos pedagogos. Os estudantes na faixa dos 400 pontos têm graves problemas de proficiência. Não dominam a leitura e a escrita. Não aprenderam o mínimo previsto de matemática, tendo dificuldade de fazer cálculos. E têm conhecimentos rudimentares em ciência. Já as notas entre 550 e 600 pontos sinalizam que os estudantes têm formação refinada, dominando habilidades fundamentais para lidar com as tarefas da vida cotidiana.

Os números do Pisa de 2012 mostram que, apesar de o acesso à escola ter melhorado em todos os níveis, nas últimas décadas, a qualidade do ensino evoluiu pouco. Professores do ensino fundamental, por exemplo, não conseguem transmitir informações mínimas para justificar a diplomação de seus alunos. O tempo das aulas também é insuficiente, apesar de a Lei de Diretrizes e Bases da Educação recomendar jornada de tempo integral. Desestimulados, desvalorizados e com salários aviltados, muitos docentes da rede pública acomodaram-se no corporativismo sindical.

Incapazes de suprir a escassez de professores de matemática, física, química e biologia e de valorizar o magistério público, na última década as autoridades educacionais agitaram bandeiras mais vistosas do que eficazes. De modo contraditório, deixaram o ensino médio à própria sorte e alargaram as portas de acesso ao ensino superior. Em vez de cuidar da formação básica, perderam tempo com políticas de cotas raciais e desperdiçaram recursos escassos instalando universidades onde não havia demanda. Criaram um ambicioso programa de bolsas de graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado no exterior sem, antes, oferecer cursos eficientes de língua estrangeira. E, em nome de uma fantasiosa "democracia escolar", acenaram com a obrigatoriedade de eleições diretas e gestões colegiadas, inclusive na rede privada.

O Pisa também avalia aspectos como a satisfação dos alunos com a escola e como eles se sentem no ambiente escolar. Um dos indicadores é o que analisa o quanto o aluno se sente incluído na escola. No Pisa de 2003, 8% dos estudantes brasileiros disseram que se sentiam sozinhos. No Pisa de 2012, o índice chegou a 19%. Isso mostra, além de uma sensação de abandono, a consciência que parte significativa de nossos adolescentes tem da inépcia dos responsáveis pela política educacional do País.
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segunda-feira, 25 de novembro de 2013

O custo de enterrar a fiação

Gostaria que ao lerem este editorial, considerem algumas questões na busca da infra-estrutura para redução de desigualdade (considerar este tipo e dimensão de projeto para os 5 565 municípios -afinal não devemos ser excludentes tampouco preconceituosos, ou seja, TEM que ter dinheiro para TODAS cidades, SÃO 5 565, jamais se esqueçam desse número!!):

- a promoção, também, de saneamento básico de qualidade;
- o aumento do poder aquisitivo das classes E e D;
- aumento do acesso a itens de tecnologia avançada;
- o impacto ambiental e a "indústria indenizatória" ambiental;
- a carência de 8 milhões de unidades habitacionais.

Tendo tais parâmetros em foco, agora prossigam na leitura e considerem o quão difícil se é gerir um país como o nosso.


O custo de enterrar a fiação
O Estado de S.Paulo

Desde que foi aprovada, há oito anos, pela Câmara Municipal a Lei 14.023, que obriga concessionárias, empresas estatais e operadoras de serviço a enterrar todo o cabeamento instalado no Município - redes elétrica, telefônica, de TV e assemelhados -, São Paulo ensaia a execução de planos destinados a tornar isso realidade. A regulamentação da lei, que data de 2006, estabelece a necessidade de, a cada ano, transferir 250 quilômetros de cabo dos postes para o subsolo. Apesar disso, a capital tem hoje somente 7% de mais de 30 mil quilômetros de fios e cabos enterrados.

O problema é que a lei determina o que fazer, mas não estabelece quem vai pagar a conta dessa obra que, pelos cálculos da AES Eletropaulo, chegaria a R$ 100 bilhões - o equivalente a duas vezes o seu patrimônio. A empresa não quer assumir esse custo - pelo menos não sozinha -, porque a seu ver estão em jogo principalmente questões de urbanismo. Mas, para a Prefeitura, quem usa espaço público para explorar uma atividade comercial lucrativa não pode fugir a essa responsabilidade.

Há exageros de todos os lados. A estimativa da Eletropaulo, de R$ 5,8 milhões por quilômetro de fiação transferida para o subsolo, é considerada alta demais, uma vez que em outros países, como os Estados Unidos, o custo foi a metade disso. Ela calcula que somente para enterrar a fiação do centro expandido seriam gastos R$ 15 bilhões e as obras durariam no mínimo dez anos.

Pressionada pelos planos divulgados no início do ano pelo prefeito Fernando Haddad, que anunciou sua intenção de fazer valer a lei, a Eletropaulo divulgou as conclusões de um estudo feito pela consultoria McKinsey a respeito. Um dos modelos sugeridos nesse trabalho prevê que 80% dos custos sejam financiados por meio de isenção fiscal sobre serviços relacionados ao enterramento (ISS) e aos equipamentos (ICMS). Esse total incluiria também contribuições a serem feitas pelo governo federal e pelas demais empresas que utilizam a rede aérea. Os 20% restantes seriam repassados à tarifa paga pelos consumidores, o que representaria aumento de 5% a 10%.

O reajuste seria gradual, conforme o andamento das obras, por um prazo de 30 anos, correspondendo ao período de amortização dos investimentos. Conta de luz de R$ 100,00, por exemplo, aumentaria progressivamente até atingir R$ 110,00, valor que seria mantido, com os reajustes normais, por pelo menos três décadas.

O investimento é alto, mas os ganhos por ele proporcionados são incontestáveis, considerando as questões de urbanismo, segurança e qualidade do serviço prestado. Dados da Eletropaulo mostram que os desligamentos na rede aérea são de quatro a cinco vezes mais frequentes do que na subterrânea. A cada ano, os paulistanos permanecem no escuro pelo menos dez horas. Esse total seria reduzido para duas horas.

Em seguida ao anúncio feito em janeiro, de que pretende livrar São Paulo do emaranhado de fios que polui a paisagem urbana, o prefeito Fernando Haddad criou a Câmara Técnica de Gestão de Redes, que trabalha no planejamento dessa operação em conjunto com as empresas concessionárias de energia, telecomunicações, telefonia e dados. Uma das ideias em discussão, considerando que a maior parte dos custos decorre da perfuração do subsolo, é entregar o projeto para empreiteiras no modelo de parceria público-privada. Elas construiriam as galerias para abrigar os cabos e as alugariam para as companhias que precisam dessas estruturas. O custo seria dividido, reduzindo o impacto na tarifa para o consumidor e nos cofres públicos.

A melhoria trazida pelo enterramento das redes vai muito além da redução do desconforto causado pelos desligamentos frequentes. São Paulo é uma cidade de serviços e um apagão de uma hora nos eixos comerciais, onde empresas atuam conectadas a todo o mundo, traz prejuízo incalculável à economia do País. No trânsito, nas escolas e no comércio, o impacto é igualmente muito grande. Todos ganharão, portanto, com o fim das redes aéreas de fiação.
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domingo, 24 de novembro de 2013

Todos querem roubar o Estado

 Cid Gomes
Veja 

O governador do Ceará diz que enfrentar as empresas que se juntam para superfaturar os contratos e emperrar as obras públicas é um desafio permanente dos governantes

Cid Gomes lembra muito seu irmão mais velho, o ex-governador e ex-ministro Ciro Gomes, no quesito da língua solta. Em três horas de conversa em seu gabinete, criticou políticos, tribunais de contas, órgãos de fiscalização e empreiteiras que só querem "tirar um pedaço do governo do estado”. Defendeu-se das acusações recentes que recebeu envolvendo o uso de dinheiro público (“Quem fez a lei de licitação acha que todo governante é ladrão") e arriscou um prognóstico para as eleições de 2014: Marina Silva, por simbolizar o “novo", engolirá Eduardo Campos, que personifica o velho político. Mas, como o mundo ideal não existe, no fim, os eleitores acabarão escolhendo o “mundo real", personificado por Dilma Rousseff, a quem ele apoia.

O que é essa marca de bala aqui na janela de seu gabinete? É de tiro?

Não. é de bilada de baladeira.

De quê?

“Bila" é bola de gude em “cearês”. “Baladeira” é estilingue. Uns black blocs tentaram invadir o palácio e arremessaram várias dessas em direção à janela. Uma pegou. Mas o Ceará não é um lugar em que o radicalismo tenha a conivência do Estado, como em outros lugares. Black blocs aqui não é coisa que se sustente. Aqui nós prendemos, não tivemos tolerância

 O que as manifestações de junho ensinaram aos governantes?

Essas manifestações são cíclicas. Já aconteceram, diminuíram e vão se radicalizar de novo. A essência foi o questionamento de como um país que consegue fazer a Copa e construir estádios como o Castelão (em Fortaleza) não tem capacidade para resolver os problemas de saúde. educação e segurança. Isso comprometeu a popularidade dos governantes e levou as pessoas à busca por  nomes novos. Mas esses nomes não apareceram. O cabra pensa: "Não estou satisfeito, mas quem tem para votar? Aécio? Serra? Marina? Eduardo?”. Quando as pessoas veem as alternativas,acabam voltando para a Dilma. O mundo ideal não existe. No mundo real, a Dilma é a melhor alternativa.

 0 que a presidente Dilma tem a mostrar para convencer o eleitorado a lhe dar mais quatro anos?

Ela tem o compromisso com o brasileiro que precisa mais do governo. Tem muita gente que gostaria que nem existisse Estado — o sujeito que produz, entrega parte para o Estado e recebe de volta uma infraestrutura toda deficiente, por exemplo. Mas, para a maioria da população, o Estado é a solução. E, para esse povo, a Dilma tem o que mostrar. O governo dela é realizador. Sei que há projetos que não foram concluídos, mas a dificuldade de fazer uma obra no Brasil é enorme.

 Por quê?

O Executivo não está capacitado para acompanhar o nível de exigência das instâncias licenciadoras e fiscalizadoras. Eu vivo isso aqui no Ceará. Foi-se o tempo em que, para fazer alguma coisa, você precisava só do projeto e do recurso. Hoje isso é menos da metade.

0 senhor se refere aos mecanismos de controle? Acha que seria o caso de afrouxá-los?

Fiscalizar é sempre bom, mas tem um problema. Como o Brasil passou muito tempo sem fazer obras, os órgãos fiscalizadores se aparelharam mais do que os realizadores. Há mais engenheiros no Tribunal de Contas do que no DNIT. E essa turma tem muito poder. Ela diz que há um suposto so-brepreço numa obra e para tudo sem ter a certeza do problema. Os governantes têm de enfrentar simultaneamente as duas faces da moeda.

Quais são essas duas faces?

Fui fazer o cinturão das águas, a maior obra hídrica do estado. Dividi em cinco lotes e coloquei os preços. Mas todas as grandes construtoras queixaram-se de que o preço estava  baixo e fizeram um boicote para que não aparecessem interessados e a licitação fosse anulada. Queriam, com isso, forçar o governo a elevar os preços. Briguei e fui em frente sem as grandes construtoras. Aí o Tribunal de Contas apontou que havia um suposto sobrepreço. Enfrentei as duas críticas, de quem achava o preço alto e de quem achava o preço baixo. Depois de um tempo o tribunal liberou. Mas perdi com isso seis meses. O Brasil precisa urgentemente de uma tabela de preços para obras e compras públicas.


O senhor é acusado de ter gastado dinheiro em excesso na compra de carros para a polícia. Essa tabela evitaria esse problema?

Vão criticar sempre. Criticam quando a polícia não tem carro e criticam quando compro carro bom. Falavam da Hilux (caminhonete da Toyota) da polícia do Ceará. O poder público tem que comprar sempre o mais barato? Isso é um barato que sai caro. Quem fez a lei de licitação acha que todo governante é ladrão.

O senhor levou sua sogra de carona para a Europa em um jatinho alugado pelo governo estadual. As críticas também foram injustas?

Já pedi desculpas públicas por isso. Não fiz de má-fé. Legalmente, todos os processos concluíram que não houve prejuízo para os cofres públicos. Mas, pela comoção que isso causou, pedi desculpas. Nem eu viajei mais de jatinho para fora do país nem levei mais minha sogra.

E a contratação de um bufê com caviar e escargot para seu gabinete, ela foi correta?

Não é o governador que escolhe o cardápio. é um funcionário de terceiro escalão. Isso é pura demagogia. Um dos itens era uma bombinha de camarão com caviar, uma entradinha que custa 50,80 reais o cento. Isso não é para eu comer no dia a dia. Quando estou aqui, mando comprar um franguinho assado com baião de dois em uma televisão de cachorro. O bufê é para eventos. É um contrato de 3 milhões de reais em quatro anos. Sinceramente, é esse o problema do estado? Sabe quanto economizei na contratação da linha leste do metrô? Duzentos milhões de reais. É aí que se economiza. Não com demagogia, mas brigando com todo mundo.

 Brigando com quem?

Com todo mundo. Economizar não é fácil. Você se indispõe, deixa gente insatisfeita. E não é gente fraca não, é poderosa: empreiteira, construtora. Os cabras juntam quatro ou cinco construtoras grandes e se acertam no Brasil inteiro: "Você fica com o metrô de São Paulo, eu fico com o de Brasília e eu com o de Fortaleza". Chegam aqui na cara de pau para dizer o resultado da licitação que você ainda vai fazer. Aí, o governo tem de lutar para ter gente interessada, atrair concorrentes. Só nessa linha leste do metrô foram sete ações judiciais, todas para impedir a participação de alguém. E o Estado sempre querendo o maior número de participantes. Entre o preço orçado e o preço que, no final, ganhou, consegui economizar 200 milhões de reais. Mas foi uma batalha. Todo mundo só quer ganhar o seu, tirar um pedaço do dinheiro do Estado.

Não há obra pública sem corrupção?

O governo está sempre correndo atrás. O único reconhecimento que um governante tem é quando entrega uma obra. É uma briga danada para projetar, para licenciar, para fazer concorrência. Minha angústia é essa. Nesse caso do metrô, economizei dinheiro e, o mais importante, vou conseguir concluir a obra no meu governo. Mas é difícil demais, homem. O projetista se junta com a construtora para acertar sobrepreços. O concreto é superestimado, o asfalto é superestimado. É brabo, amigo. Todo mundo quer pegar dinheiro do Estado.

As empresas envolvidas no cartel de trens em São Paulo atuaram no Ceará?

Se não tivesse havido essa investigação, eu teria levado fumo aqui, teria levado um prejuízo de mais de 1 milhão de reais. Como aconteceu esse negócio lá a turma ficou com medo.

 Seu irmão Ciro também gosta de uma briga. É uma característica de família?

Deve ser. Eu sou mais condescendente, o Ciro não aguenta ver um cartaz de "Fora, Cid”. Ele acha isso fascismo, nazismo. No sábado mesmo (há duas semanas) rasgou o cartaz de um manifestante. O Ciro é um cara extraordinário, mas é inegável que tem um pavio curto que o impediu de chegar mais longe.


0 seu grupo político, com uma interrupção de quatro anos, está no poder desde 1987. Mas o Ceará ainda apresenta indicadores sociais muito abaixo da média nacional. Não é um resultado fraco? Os resultados demoram, mas aparecer. Na educação, por exemplo, o Ceará em 2007 era o  11  estado entre os dezesseis do Norte e do Nordeste. Em 2011, pulamos para o primeiro lugar. São dados objetivos.

Mas há outros setores em que o seu governo fracassa, como a segurança pública. Só no último ano os homicídios cresceram 18%.

O que é de estrita responsabilidade do poder público é mais fácil. Construir uma escola, comprar equipamento e colocar professores só depende do poder público. Já segurança não depende só da infraestrutura. Eu dupliquei o número de delegacias de polícia e a melhora não apareceu. Há um fenômeno de chegada do crack no Nordeste e no Norte — 75% dos homicídios estão relacionados ao narcotráfico. Se não tivesse havido tanto investimento, estaria ainda pior.


0 senhor defende uma reforma política que fortaleça os partidos, mas acaba de se filiar ao Pros, um partido de aluguel. Não é uma contradição?

Eu não tinha de mudar de partido, mas fui forçado a deixar o PSB. Aí fui ver as alternativas e o Pros foi a melhor escolha possível. É um pequeno esforço de criar um partido que lute pela redução de impostos. No absoluto, isso contrasta com o que eu penso. Defendo a necessidade de um Estado forte, Estado forte pressupõe impostos.

Mas um partido que defende um Estado mais forte não é justamente o PSB?

Eu me identifico com o PSB, mas não tinha como ficar e apoiar a candidatura de Eduardo Campos.
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sábado, 23 de novembro de 2013

Cuide de Sua Integridade Intelectual


Stephen Kanitz


O futuro é para ser feito, não para ser previsto.

Esta é a grande linha divisória que divide administradores de um lado, e os sociólogos, cientistas políticos e acadêmicos de outro.

Muitos cientistas sociais tentam prever o futuro, para administradores o futuro é feito com suor e lágrimas.

A maioria dos administradores não pretende ficar rico assessorando especuladores, porque a maioria acredita que o futuro não dá para ser previsto.

O máximo que cada um de nós pode fazer é ter uma vaga ideia do que poderá acontecer, podemos saber o jeitão da coisa, e nada mais.

Existe sim uma luta de classe neste país, mas é entre aqueles que acham que o futuro é científico e previsível e aqueles que acham que o futuro traz surpresas que precisam ser bem administradas.

É a luta de classes entres os intelectuais que acham que sabem, e o resto da população que acha que não sabe tanto, mas trabalha produzindo coisas todo dia, não ideias.

E, para piorar a situação, a maioria dos intelectuais não é motivada por dinheiro. Se fossem não escolheriam a profissão de acadêmicos.

Intelectuais são movidos por prestígio, entrevistas na imprensa, plateias e programas de televisão.

Aparecer em público ou simplesmente aparecer, é a sua moeda de troca, a sua motivação.

E aí a questão que todo intelectual é forçado a enfrentar é: devo dizer o que eu penso, ou devo dizer o que a plateia quer ouvir.

Se meu compromisso é com a integridade intelectual, a minha opção é a primeira.

Se meu compromisso é com a vaidade, a segunda opção é que vence.

Ser pobre e ao mesmo tempo desconhecido é a morte para o intelectual.

Pobreza foi o preço que ele pagou para conseguir a fama intelectual.

Todo professor reclama de seus baixos salários, e com razão.

Intelectual paga um preço muito alto se disser algo que nenhum veículo publica ou jornalista quer ouvir.

Woody Allen retrata este personagem no filme Zelig. Zelig é uma pessoa tão amável, tão desejosa de agradar que concorda com tudo o que a pessoa ao lado diz. 

Só que Zelig acaba indo ao psiquiatra com sério problema. Ao querer ser todo mundo, ele acaba sendo ninguém.

Sendo ninguém, e não tendo opinião própria, ele acaba esquecido, o contrário do que o intelectual politicamente correto maria vai com a onda do momento pensa.
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Produtividade: dá para conciliar trabalho e estudos?



Existem métodos de planejamento que ajudam a lidar com o volume de tarefas e auxiliam você a manter o equilíbrio


Por Christian Barbosa


A maioria das pessoas tem o primeiro contato com a real necessidade de administrar o tempo e suas atividades, de maneira mais efetiva e rigorosa, ao conquistar o primeiro emprego e, ao mesmo tempo, iniciar em um curso de graduação – alguns alunos lidam com isso ainda no ensino médio. É nessa fase que o número de tarefas aumenta e que muitos alunos pensam em desistir do primeiro estágio, para dedicarem tempo somente aos estudos. Não é fácil, mas é possível ter tempo para trabalho e estudos, e abdicar do trabalho pode não ser uma boa alternativa logo de começo.

Primeiro porque, ao terminar o curso, vai ser mais difícil achar vaga para profissionais que não tiveram nenhuma experiência de estágio ou qualquer tipo de vivência prévia. Segundo, quem deixa de trabalhar, acaba tendo a tendência de abusar de atividades circunstanciais (afinal, você não estuda todos os dias, não é verdade?) como as redes sociais, passeios com a mãe, baladas fora de hora, etc. E terceiro: não adianta deixar para depois, mais cedo ou mais tarde você terá de aprender a se organizar e ser mais produtivo em menos tempo, do contrário, esqueça a ideia de ser um profissional de resultados no mercado de trabalho.

Sabendo disso, não enlouqueça! Existem métodos de planejamento que ajudam a lidar com o volume de tarefas e auxiliam você a manter o equilíbrio. Veja cinco passes básicos para que trabalho e estudos entrem em harmonia:

1- Escreva suas atividades: não deixe nada na cabeça, registre o que tem para fazer em uma agenda, caderno, celular ou um software de planejamento. Se você não anota, fica impossível de planejar e logo de arrumar tempo! A dica é ter apenas um lugar para registrar, ou você vai se perder! Registre tudo, da vida, escola, trabalhos, TCC e outras atividades que precisam ser realizadas no trabalho;

2- Trace seu planejamento: com todas as atividades em mãos (tente conseguir o máximo que puder de um semestre), passe para o seu método de anotações todas as tarefas, distribuindo-as com a antecedência de ao menos três dias do termino do prazo. Isso lhe dará mais mobilidade no dia a dia, fazendo com que cumpra tudo no prazo e ainda ganhe um tempo para descansar ou adiantar novas tarefas;

3- Cuidado com as urgências: atividades urgentes são aquelas que não estavam programadas para acontecerem, e o tempo para realizá-las está curto, ou já acabou. São as atividades que chegam em cima da hora, que não podem ser previstas, mas que geralmente causam estresse. Para evitá-las, reserve de 30 minutos a 1 hora do seu dia para esses imprevistos. Não esqueça de colocar tempo nas suas anotações!

4- Evite as atividades circunstanciais: sabe aquela atividade que, se você não tivesse perdido seu tempo com ela, não faria a menor diferença? Essas são as tarefas circunstanciais, aquelas que nos fazem perder tempo a toa, como navegar por horas na internet sem propósito. Lute contra elas! Dica: a noite, ao chegar em casa, vá direto para o banho e comece a se preparar para o próximo dia. Evite deitar no sofá para assistir TV – com o cansaço e a preguiça, certamente você passará horas em frente a TV e irá dormir mais tarde do que realmente precisa, sem ter produzido nada neste período, nem ter descansado;

5- Foco! Mas nenhuma dessas dicas pode ser realmente eficaz se você não tiver definido de maneira clara quais são os seus objetivos (ex. conquistar determina vaga dentro da empresa, ou terminar no menor tempo possível o curso, para iniciar outro). Além disso, é de extrema importância que você esteja 100% focado em conquistar esses objetivos, o que significa que, algumas vezes, a preguiça pode até aparecer, mas você terá de ser mais forte e seguir com o seu planejamento.

Preparado para iniciar sua vida profissional e acadêmica de uma maneira mais produtiva? Foco nos estudos e objetivo claro no trabalho, essas são as peças chaves para conciliar ambas as atividades de maneira equilibrada e sem estresse.
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sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Memórias do século XXI




As previsões sobre o futuro estão quase sempre erradas. Mas quem disse que é para as pessoas saberem o que vai acontecer com elas amanhã?
Por Max Gehringer

Hoje é 20 de agosto de 2124, quarta-feira, que no Brasil agora chama Wednesday, já que o português foi oficialmente banido quando nos tornamos o 67o Estado dos United States of Wide America, em 2095. Teve quem não gostou, claro, principalmente depois que a Floresta Amazônica virou a Tropical Disney World, mas a maioria apoiou porque finalmente pôde tirar passaporte americano sem aporrinhação e passou a receber salário em dólar. É verdade que muitos brasileiros ainda conservam um ranço xenófobo, o que é meu caso, por isso este relatório está sendo escrito em nossa antiga língua-mãe, que eu só domino porque nasci lá no distante 1980. Fiz 144 anos, trabalho há 126, estou forte e saudável, mas já ouço insinuações de que minha carreira entrou no plano vegetativo. A vida corporativa do século XXII não é justa com o pessoal da sexta idade, como eu: basta a gente chegar aos 140, e começa a ser discriminado no trabalho... 

Os velhos tempos me dão saudade (uma de nossas poucas palavras que entraram no Mega Dicionário Americano, como sinônimo para "senseless feeling"), apesar de quase mais nada ser como era. Por exemplo, eu nasci com unha, cabelo e dente, últimos resquícios de nossa ascendência selvagem. E na juventude pratiquei zelosamente um ato denominado "sexual" para a reprodução da espécie, coisa que, hoje, a ciência simplificou muito: basta ir a qualquer McDonald's, comprar um kit de óvulo e espermatozóide (o número 3 tem sido o preferido pelos consumidores, porque acompanha uma Coca-Cola grátis) e inseri-lo num tubo plugado a um sistema embrionário - cujo nome técnico é "tamagoshi". Aí, é só redigitar a configuração desejada do genoma e depois ir clicando os comandos para as cargas vitais de proteínas. Simples. Em seis semanas, aparece a ficha fitoergométrica da criança, os custos de alimentação e educação e a mensagem "Are you sure you want to give birth?" Meu filho mais novo, o 365A27W648, vulgo "8", agora deu de ser curioso e me perguntar porque no meu tempo as coisas eram tão complicadas. Eu tentei explicar para ele que o tal ato ia além da simples reprodução, que a gente sentia prazer em copular, e ele fez aquela cara de nojo, típica de adolescente recém-saído da universidade. Mas, tudo bem, ele tem só 4 anos, um dia talvez entenda melhor. 

Eu sei, estou divagando, desculpem. Não é das reviravoltas da natureza que este relatório trata, e sim das relações no trabalho. Meu hiperboss vai fazer uma apresentação no mês que vem, em Urano - com o criativo título de "Como Enfrentar os Desafios do Século XXII" -, e pediu minha colaboração. Ele quer mostrar às novas gerações a evolução da interação entre empresas e funcionários ao longo dos últimos 150 anos, desde a chamada "Era Jurássica Trabalhista" (1980-2020) até o aparecimento do "Homo Pizza", no final do século XXI. E me escolheu porque eu vivi todas as etapas do processo, além de ser o único por aqui que ainda sabe usar algarismos romanos. Então, vamos lá: 

TRANSPORTE 
Os empregados acordavam de manhã e iam para seu local de trabalho dirigindo um veículo pesadão e lerdo, que funcionava queimando derivados do extinto petróleo, chamado "automóvel" - não sei bem por que esse nome, que significa "move-se por si mesmo", já que o tal veículo só se movia sob comando humano e, algumas vezes, nem assim. Mas a maior dificuldade era enfrentar o "trânsito", do latim transire, "ir para a frente", e esse era exatamente o problema, já que o trânsito quase nunca ia em frente, e daí originou-se uma frase de uso muito comum, "Atrasei por causa do trânsito", que literalmente significa "Fiquei para trás porque fui para a frente". Ou seja, aquele povo era duro de entender. O mais incrível é que, apesar de tanta confusão e contrariando a lógica, as pessoas ainda conseguiam chegar ao que chamavam "local de trabalho". 

LOCAL 
O sistema jurássico de trabalho era coletivo, e as empresas até usavam jargões como "teamwork" para incentivar essas aglomerações, sem atentar para o fato de que elas eram uma fonte de proliferação de micróbios. O ponto de encontro era o escritório, um lugar onde os funcionários escreviam, daí a origem da palavra. Eram áreas enormes, onde pessoas se amontoavam em cubículos e passavam a maior parte do tempo produzindo "documentos", cuja principal finalidade era a de servir como evidência física de que as pessoas estavam ocupadas. Após produzidos, os documentos eram imediatamente "arquivados", de preferência em lugares onde nunca mais pudessem ser localizados. Isso na época tinha o mesmo nome de hoje, "burocracia". A diferença é que os atrasados do século XX faziam tudo com oito cópias, e nós, 150 anos depois, conseguimos reduzir para sete. 

INDIVIDUALIDADE 
O primeiro passo para erradicar o coletivismo inútil foi o "SoHo" (Small office, Home office), uma sigla surgida aí por 2000, que permitia aos funcionários trabalhar, confortável e produtivamente, em suas próprias casas. No Brasil, uma das conseqüências imediatas do SoHo foi o aparecimento de uma variante esperta, o "SoNo". O que obviamente implicou num aumento brutal da quantidade de documentos produzidos, porque só assim os chefes acreditariam que seus funcionários estavam acordados em suas casas. Depois do SoHo veio o "SoCo", aí por 2050. O "Co", todo mundo sabe, significa Chip office. Foi quando as corporações conseguiram implantar um microchip em cada funcionário para controlá-lo 24 horas por dia, desde o batimento cardíaco até o nível de atividade dos neurônios. Uma das características do SoCo que mais agradou às chefias - além do comando de "wake up call" - foi a possibilidade de emitir um choque elétrico remoto quando o funcionário atrasasse a remessa de um documento. 

JORNADA 
Trabalha-se oficialmente 2 horas por semana, mas já há rumores de que a jornada será reduzida para 100 minutos semanais. O que, tirando o tempo necessário para o sono e as inconveniências fisiológicas - que não sofreram alterações nos últimos 100 000 anos -, dá umas 120 horas ociosas por semana. O professor Domenico De Mais (autor do livro o Ócio Criativo), que vive em estado de hibernação metafísica na Itália, afirma que isso é um absurdo, e defende a tese de que no futuro trabalharemos 100 minutos por ano. Mas o problema, mesmo, é que nunca conseguimos nos acostumar com o ócio. Por isso, nossa maior fonte de renda atual é a hora extra - fazemos, em média, 14 delas por dia, inclusive aos sábados. 

EFEITOS COLATERAIS 

Hoje, as megacorporações vêm se questionando se essa troca do trabalho grupal pelo individual foi realmente um progresso. Primeiro, porque ninguém mais conhece ninguém, já que os "colegas" viraram imagens digitalizadas. Segundo, porque todo mundo ficou sedentário e engordou uma barbaridade. E terceiro porque os antigos executivos eram estressados, e os novos sucumbem à depressão, o que acarreta muitos suicídios (ou, em linguagem ciberneticamente correta, self alt+ctrl+del). O maior guru de administração do século XXII - Tom Peters, vivendo confortavelmente em estado gasoso, num tubo de ensaio - publicou recentemente um artigo que está causando uma comoção corporativa. Ele defende a tese de que "nada substitui o contato humano". Incrível, dizem seus fiéis admiradores, que ninguém tivesse pensado nisso ainda. 

EMPREGO 
Conseguir um bom emprego hoje em dia não é difícil. O duro é se manter nele, porque as exigências para resultados de curtíssimo prazo aumentam cada vez mais. O tempo médio de permanência num emprego é de 28 horas. Daí o conceito em moda ser o da habilidade para saltar de galho em galho, ou "businessbilidade", que se resume a três fatores: experiência cósmica, formação galáctica e ser bem relacionado com quem manda. 
SEXO 
As diferenças entre sexos não são mais limitantes para o preenchimento de um cargo. Não porque tenha acabado a discriminação, mas porque acabaram os sexos. A antiga classificação "masculino/feminino/outros" caiu em desuso a partir do momento em que os assim chamados "homens" e "mulheres" equilibraram seus níveis de testosteronas e estrógenos. A ambivalência chegou a tal ponto que hoje os dicionários só registram a palavra "testículo" como sinônimo de "pequeno teste aplicado a estagiários". 

HIERARQUIA 
Nos tempos primitivos, as posições hierárquicas eram decididas ou por competência ou por protecionismo. Mas levava vantagem quem acumulava mais diplomas. Tudo mudou a partir do momento em que foi implantado o sistema de "Transferência Integral de Informações", pelo qual qualquer ser humano, quando completa 2 anos de idade, é acoplado a um megacomputador Deep Blue e absorve, em 15 minutos, o conhecimento acumulado pela espécie nos últimos dez milênios. Tem aí uma novíssima teoria dizendo que isso nos transformou numa raça de esponjas, e que o grande diferencial atual é saber pensar por conta própria, em vez de enfiar o dedo no nariz e dar um "retrieve". Segundo a teoria, há uma minoria de pensantes que consegue se perpetuar nas chefias porque tem "Inteligência Psicoemocional", ou seja, uma combinação balanceada de "instinto", "conhecimento" e "autocontrole". Eu acho que já ouvi isso antes, só que não me lembro bem quando foi. 

RELACIONAMENTO 
Os funcionários têm abertura para se comunicar fora do trabalho, desde que respeitem o conceito-chave do século XXII: Lógica Absoluta, ou seja, os assuntos devem ficar restritos aos negócios. Sentimentos e emoções, manifestações consideradas contraproducentes, estão proibidas desde 2104. Mas sempre tem quem não sabe aproveitar a liberdade: nosso maior problema social são os subversivos que se reúnem escondidos para praticar o maior delito da atualidade: rir e contar piadas. Não é por acaso que o maior best-seller desta semana é o cibertexto de auto-ajuda "Você Pode Ser Feliz, Desde Que Ninguém Saiba". 

INFERNET 
A arcaica Internet, uma rede de comunicação que causou furor no fim do século XX, e que hoje é citada como exemplo de paranóia coletiva, foi substituída pela Infernet, à qual todos somos plugados logo ao nascermos. A palavra veio do latim infernus, "subterrâneo", uma analogia a seu formato de raízes que alimentam o caule central. O caule, de onde saem e para onde convergem todas as informações, é a Suprema Inquisição, cuja regra é "Todos somos iguais perante Deus". Sendo que Deus, como todos sabem, é Bill Gates. Embora corra por aí o boato de que quem manda, mesmo, é o ACM. 

CONCLUSÃO 
Em meus 144 anos, vi o futuro ir acontecendo, e aprendi pelo menos uma coisa: as previsões estavam sempre erradas. Acho que descobri o porquê. Outro dia achei um livro antigo, que já caiu em desuso por ser a negação da lógica. De qualquer forma, lá foi escrito, há milhares de anos, que cada dia é diferente do outro, exatamente "para que o homem nunca possa descobrir nada sobre seu próprio futuro" (Eclesiastes, 7, 14). 

Em 1999, no auge de uma carreira bem-sucedida que o levou à direção de grandes empresas (Pepsi, Elma Chips e Pullman), MAX GEHRINGER tomou uma decisão raríssima no mundo corporativo: abriu mão do poder e das mordomias de alto executivo para dedicar seu tempo a escrever e a fazer palestras pelo Brasil. Max escreve regularmente para VOCÊ s.a., Exame, Revista da Web!, Vip e Placar (todas publicadas pela Editora Abril). Recentemente, Max lançou seu segundo livro, Comédia Corporativa (Editora Campus). O humor e a sensibilidade dos textos de Max vêm de sua vivência prática num mundo que ele conhece degrau por degrau: seu primeiro emprego, aos 12 anos, foi de auxiliar de faxina. O último: presidente da Pullman. 
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quinta-feira, 21 de novembro de 2013

E o fim do ano está chegando...

Caros amigos, gostaria de lhes convidar a uma singela reflexão e ela tem muito a ver com a enorme quantidade de notícias veiculadas na mídia acerca de um evento banal, sim, no fundo banal, mas que a própria sociedade está se encarregando de dar vestes de essencial, a prisão dos mensaleiros.

Enquanto esta ação diversionária orquestrada pela mídia sempre preocupada no sensacionalismo muito mais do que no esclarecimento, algo de podre no reino da Dinamarca ocorre no planalto central.

Estamos encerrando o mês de novembro e dezembro terá menos do que quinze dias úteis antes do recesso parlamentar. Sei que o tema é árido, a esmagadora maioria não gosta de política, mas o ano que vem será crítico em termos de gestão pública no limite de uma sufocante carga tributária, ou seja, majoração de preços essenciais no intuito de se fazer caixa para municípios pois o que eles terão que recolher aos cofres federais tenderá a aumentar. Ou seja, para este ano que finda, 2013, a presidente ainda não passou o restante dos orçamentos municipais e estaduais para que governadores e prefeitos cumpram com seus calendários orçamentários. Em outras palavras, se iniciar dezembro, em menos de quinze dias, a exemplo do ano passado, partidos e deputados terão que deliberar por uma nova redistribuição de recursos por intermédio dos fundos de participação de municípios e dos estados. Equivale a dizer que nem todos os 5 565 municípios receberão o tanto que recolheram para a presidente e, pior ainda, terão que rolar para o ano que vem as dívidas atuais com fornecedores, construtoras, empresas de transporte, lixo etc etc. A lei determina que no ano que vem, pague-se, primeiro, estas dívidas (restos a pagar) e depois o funcionalismo (este em torno de 47% do orçamento de muitos municípios.

Chato este papo, não? Chato falar de política e não de futebol, não? Mas é que ano que vem começa com grandes despesas, haverá calor, incidência de epidemias, aumento nos consumos de energia, apagões, problemas de mobilidade urbana, enchentes, problemas com renegociação de coleta de lixo, manutenção de obras de orçamento etc, etc, etc e os prefeitos, todos no vermelho devido ao atraso do ano corrente, tendo que usar os minguados repasses de fim de ano para pagar os débitos deste corrente ano, pagamento de pessoal e juros e serviços de dívidas com a União. 

Enquanto isto, na mais gritante crise de gestão pública, a presidente lança mão da mídia para desviar a atenção da sociedade com os casos dos mensaleiros, depois os da PEC 122, PEC 300 e várias outras artimanhas.

A redução da desigualdade está cobrando sua fatura, ou seja, com pouquíssimo investimento em infra-estrutura, para se ter a sensação de bem-estar geral dos eleitores, os financiamentos e redução de linha branca irão continuar, ou seja, em crise de infra-estrutura de distribuição de energia elétrica, geladeiras, máquinas de lavar, ar-condicionados, liquidificador, ferrros de engomar, chuveiros elétricos serão vendidos aos montes com o mesmo padrão de suprimento de energia cujo HBV, horário de verão, não permitirá, sequer, uma manutenção descente.

Amigos, ainda mais por ser ano eleitoral e uma flagrante dificuldade em se gerir, a contento, os graves desafios do país, haverá uma forte tendência a, novamente, se investir no consumo. Não temos infra-estrutura para tal, tampouco capacidade de fornecimento de energia, para ficar com apenas estes dois problemas. Ademais, o aumento de carros nos pátios das montadoras impeliu o governo a manter a redução de IPI e aumentar o financiamento facilitado, ou seja, mais carros nas ruas sem melhoras, significativas, na mobilidade urbana. 

Enfim, amigos, minha parte estou fazendo. Muito mais urgente do que se saber a consistência do coco dos mensaleiros na prisão, é saber o quando e como o restante do orçamento de sua cidade será repassado, ou não. Os aumentos de tarifas e impostos municipais, se forem autorizados pelos vereadores, É LEI!! E vai pesar no bolso.

Procuro lhes ajudar a ver nossa situação além do canto de sereia governamental. Ano que vem será crítico para muitos de nós.
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