sábado, 11 de janeiro de 2014

Sobre Querubins, Dante e lagostas


Assim como Mandela, Roseane Sarney é mais um exemplo da fenomenal capacidade que a mídia tem de manipular a atenção e sentimentos da sociedade. Não tenho apreço por políticos, a experiência na cidade do poder por mais de dez anos permitiu-me uma proximidade com muitos, hoje no poder, mais do que queria, todavia ainda muito menos do que minha capacidade de perplexidade diga que "agora eles já atingiram o máximo da capacidade de imputar danos sociais".

Entendo que desde a mordaça que o Estadão sofreu pela clã Sarney que eles tentam se livrar dos grilhões jurídicos, agora com uma muito bem elaborada conjunção de efeitos e fatos administrativos banais e corriqueiros passando a ser a "nova novela da globo", muito bem manipulada por aquele periódico. Nossa sociedade interage com sua realidade por intermédio de "novelas", via de regra factóides muito bem estruturados. 

Sim, de fato as novelas hoje exercem um atrativo muitíssimo forte. Como a Hidra de Lerna, procuro nem olhar para a tela para não virar estátua de pedra, sobretudo há dois dias quando fui orientar uma amiga em seu trabalho acadêmico. Ela gosta muito de ler e emprestei-lhe alguns clássicos e livros de muita densidade reflexiva e conversávamos sobre temas muito densos. Ao chegar em sua residência, estruturando em seu caderno a metodologia para início de sua pesquisa acadêmica, deparei-me com ela ligada na tela da televisão hipnotizada pela trama onde habita o ser homossexual que, recentemente e sob o afã e sofreguidão do universo facebookeano, tem exarado mais pensamentos filosóficos muitíssimo mais visitados do que Platão, Sócrates e similares, vencendo até, e de longe, a quantidade de posts com a face de Chico Xavier, também no mesmo universo repleto de platitudes. Pois é, tal estulta figura hipnotizando uma cidadã, leitora contumaz ao ponto de quase ignorar meu esforço em lhe ajudar nos curtos e raros intervalos de sua puxada jornada de trabalho corporativo e após cuidar, em rotina notívaga, de seus afazeres domésticos.

Enfim, de nada adianta tentar explicar a cidadãos com embocadura intelectual e nível de vida suficiente para manipular iphones, ipads, ipod etc. Aprendi que nível financeiro e informativo não é passaporte para fora do país da estupidez, contumaz diria. Aprendi, também, que quando não se quer, nem um sinédrio inteiro se evade de uma cidade em chamas aos estridentes gritos e trombetas de arautos quase afônicos e resfolegantes.

Adiantaria falar em controladoria de gastos públicos? Adiantaria falar em unidade gestora que concentra gastos de outras unidades da mesma natureza? Não, não adianta, pois na estratosfera coberta de névoa da insensatez, muitos possuidores de iphones pensam que a governadora entrou em seu carro, dirigiu até o supermercado mais caro que tem na cidade para encomendar e consumir, de chofre, quilos e quilos de lagosta enquanto o estado que ela governa afunda na lama. Adiantaria falar que, ainda que ela quisesse, sua dieta sendo arroz, feijão e rapadura, isso de nada resolveria o problema prisional ou da violência que grassa todo território nacional e a sociedade  distraída e, como sempre, a reboque?

Preocupa-me o fato de a sociedade "cansada de tanta corrupção" não faça a menor idéia de como as coisas públicas funcionam. Também fazem pouquíssima ou nenhuma vontade de conhecer. 

Como é que uma sociedade consegue aceitar e estimular parentes a engrossarem os exércitos de funcionários públicos onde as despesas de orçamento são dez vezes superiores às destinadas a educação, saúde, saneamento e segurança e ainda ter a cara de pau de reclamar quando algum evento oriundo das deficiências que ela, célere, fagueira e avidamente contribui e estimula?

Como é que pode se fica tranquilo com uma sociedade que não faz a menor questão de conhecer os meandros e complexidades da gestão pública querer eleger alguém que promete o impossível e, em muitas situações, o ilegal perante as leis vigentes e achar que tudo irá se resolver em poucos meses? Como é que uma sociedade que acha que um ministro, por ser negro e por ter cumprido uma lei formal, sem absolutamente nenhuma experiência adminstrativa pública como gestor e ordenador de despesas, possa virar presidente de um país complexo e cobiçado como o nosso? Por esse mesmo motivo que surgiram Lula, bom de papo, falastrão e sua cria, ambos sem qualquer experiência pública prévia, hoje dominam o cenário nacional sem nenhuma preocupação em serem ameaçados, pois colocaram a coerência, vontade e ética nos seus bolsos, bem no fundo de seus bolsos.

Enfim, tinha uma vaga esperança que a sociedade acordasse para o que temos: pessoas saindo de classes econômicas mais baixas, consumindo muito em cidades cada vez mais velhas, caras de serem mantidas, cada vez mais aglomeradas em espaços urbanos onde os ambientalistas bloqueiam judicialmente qualquer tentativa de incomodar borboletas e pássaros estrilantes e serelepes e nós, cidadãos, cada vez mais espremidos em ruas estreitas e estreitadas pelo enorme volume de veículos, acelerando a pulsação cardíaca a cada sinal que fica amarelo, pois pode ser que o armagedom e o juízo final venha na face de um pueril querubim, muito hábil em manusear um portátil trombeta anunciando o fogo da degradação eterna no umbral do universo dantesco.
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