segunda-feira, 30 de abril de 2018

EMPODERAMENTO: O CONCEITO QUE A ESQUERDA TORNOU INDIGESTO

30 de abril de 2018

Por Roberto Rachewsky, publicado pelo Instituto Liberal

“Empoderamento” é uma daquelas palavras que se tornaram essenciais, indispensáveis para a esquerda vegetariana, e mesmo a carnívora, no cardápio das perversões linguísticas que produzem.

Eu já escrevi sobre ela há muito tempo dizendo que é um conceito que se tornou indigesto.

Fazendo uma analogia, é como se a esquerda, para impor o pós-modernismo empurrando seus termos goela abaixo da sociedade, criasse uma fábrica de embutidos especializada em pegar palavras específicas e tirar o seu conteúdo original, reciclando a matéria prima, impregnando-as com substâncias tóxicas.

Eu não sou fã de embutidos porque não sei o que tem ali dentro.

Ninguém com bom gosto engole essa palavra “empoderamento”, porque a fábrica de embutidos da esquerda pós-moderna se encarregou de recheá-la com coisas que fazem mal.

Ocorre que não podemos, como seres humanos, animais que se alimentam com as palavras, irmos dispensando-as até voltarmos aos tempos das cavernas onde apenas grunhíamos.

Por sinal, é nisso que a esquerda quer nos transformar, em primitivos seres selvagens vivendo na miséria, comendo plantas, agrupados em estado natural, como se todos quisessem viver nos lamaçais de Woodstock fazendo sexo livre, ouvindo Joan Baez e Bob Dylan, amortecidos por nuvens de maconha, financiados pela mesada dos pais.

Precisamos reverter esse processo!

Não faz sentido deixar a esquerda dar às palavras o sentido que ela quer para servirem de alimento ao seu voraz apetite pelo poder.

Dissecar cada palavra, analisá-la, desembuti-la para desintoxicá-la, recondicioná-la para recolocá-la no mercado com o conteúdo apropriado é a única forma de venceremos essa verdadeira guerra linguística das salsichas e dos salsichões idiomáticos.

Empoderamento do seu próprio ser é algo que os indivíduos precisam descobrir para resistir, e reverter os resultados nessa luta desigual que travamos contra o estado e seus protegidos associados, esses que querem viver cheios de privilégios à custa dos nossos direitos.

‘Pais-helicóptero’ estão criando filhos simplesmente ‘inempregáveis’


Julho 03, 2017  


‘Pais-helicóptero’ são os pais que estão sempre girando em torno dos filhos. Praticamente os embrulham em plástico-bolha, criando uma corte de jovens adultos que têm dificuldade de ter um desempenho satisfatório no trabalho e em suas vidas.



‘Pais-helicóptero’ pensam que estão fazendo o melhor, mas, na verdade, estão prejudicando as chances de sucesso dos filhos. Em particular, estão arruinando as chances de que os filhos consigam um emprego e consigam mantê-lo.

‘Pais-helicóptero’ não querem que seus filhos se machuquem. Querem suavizar cada golpe e amortecer cada queda. O problema é que essas crianças superprotegidas nunca aprendem como lidar com a perda, com o fracasso ou com o desapontamento — aspectos inevitáveis da vida de todos.

A superproteção torna quase impossível que esses jovens desenvolvam a tolerância em relação à frustração. Sem esse importante atributo psicológico, os jovens entram na força de trabalho em grande desvantagem.

‘Pais-helicóptero’ fazem coisas demais pelos filhos, portanto, essas crianças crescem sem uma ética de trabalho saudável e sem habilidades básicas. Sem essa ética de trabalho e habilidades necessárias, o jovem não será capaz de realizar muitas das tarefas exigidas pelo local de trabalho.

‘Pais-helicóptero’ superprotegem seus filhos e os privam de qualquer consequência significativa por suas ações. Com isso, eles perdem a oportunidade de aprender lições de vida valiosas a partir dos erros que cometem; as lições de vida que iriam contribuir para sua inteligência emocional.

‘Pais-helicóptero’ protegem suas crianças de qualquer conflito que possam ter com seus colegas. Quando essas crianças crescem, não sabem como resolver dificuldades entre eles e um colega ou supervisor.



As pessoas resolvem problemas tentando coisas, cometendo erros, aprendendo e tentando novamente. Esse processo cria confiança, competência e autoestima. ‘Pais-helicóptero’ impedem que seus filhos desenvolvam todos esses importantes atributos que são necessários para uma carreira de sucesso.

‘Pais-helicóptero’ pensam que seus filhos devem vencer qualquer coisa. Todo mundo que participe de um evento esportivo deve ganhar um troféu. Todos devem conseguir uma nota de aprovação, mesmo que sua tarefa esteja atrasada ou malfeita.

Em um local de trabalho funcional, há apenas um vencedor de uma competição, e apenas um trabalho de alta qualidade é recompensado. Se as crianças crescem pensando que independentemente do que façam irão vencer, não perceberão que, na verdade, têm de trabalhar duro para conseguir ter sucesso.

Esses jovens mimados ficarão arrasados quando continuarem perdendo competições, se saindo mal em entrevistas ou sendo demitidos de seus empregos. Não entenderão quanto esforço é realmente necessário para ser um vencedor no mundo do trabalho.

Esses jovens carecem de competência e ação por nunca terem tido de resolver um problema ou completar um projeto sozinhos. Esperam que outros façam essas coisas para eles, assim como seus pais sempre fizeram. Em essência, não podem pensar ou agir por si mesmos.


A criação-helicóptero inculca uma série de atitudes negativas nas crianças. Elas crescem com grandes expectativas de sucesso, independentemente de quanto tempo ou energia investem, e sentem que merecem tratamento preferencial — sendo que nenhum dos dois comportamentos cai bem com seus colegas ou chefes.

Em uma entrevista de emprego, os futuros empregadores podem ser dissuadidos pela atitude excessivamente egocêntrica de um jovem ou alarmados por sua falta de habilidades básicas.

A aura de ignorância e incompetência de um jovem, combinada com expectativas de recompensas imediatas e substanciais sem relação com o desempenho, pode ser o beijo da morte em qualquer entrevista para um bom emprego.

Quando os pais decidem acompanhar seu filho de 20 e poucos anos em uma entrevista de emprego, isso mina qualquer confiança que um empregador possa ter nesse funcionário em potencial. “Por que”, os empregadores podem se perguntar, “alguém procurando emprego precisaria trazer a mamãe ou o papai na entrevista, a menos que esse jovem seja mais uma criança do que um adulto?”.

Mesmo de pequenas maneiras, os ‘pais-helicóptero’ paralisam seus filhos. A criança adulta de ‘pais-helicóptero’ vai fazer sua pausa para o café e então sair da copa sem ter limpado sua sujeira ou lavado sua xícara. Podemos imaginar como isso causará ressentimento entre seus colegas.

Esses jovens esperam que “alguém” limpe sua coisas, da mesma forma que sua sujeira foi sempre limpada quando eram crianças. Não percebem que já não há ninguém os seguindo, limpando sua sujeira, seja física, interpessoal ou profissional.

Barb Nefer, em um artigo publicado no site WebPsychology, diz que a geração do “milênio está sendo fortemente atingida pela depressão no trabalho. Um em cada cinco trabalhadores [20%] já sofreu de depressão no trabalho, comparado a 16% da Geração X [nascidos entre 1960 e final dos anos 70] e dos ‘baby boomers’ [nascidos entre 1943 e 1960]”.

Nefer destaca que, de acordo com um “‘white paper’ da Bensinger, DuPont & Associates, os ‘millennials’ têm desempenho inferior no trabalho e índices mais altos de absenteísmo, bem como mais conflitos e incidentes de advertência por escrito”, fatores que “podem afetar o desempenho no trabalho”.

De acordo com um artigo de Brooke Donatone publicado pelo Washington Post, uma nota de 2013 na revista “Journal of Child and Family Studies revelou que universitários que tiveram criação-helicóptero relataram níveis mais altos de depressão”.

O artigo do Washington Post também destaca que uma “criação intrusiva interfere no desenvolvimento da autonomia e da competência. Por isso, a criação-helicóptero leva a uma maior dependência e menor habilidade de completar tarefas sem supervisão dos pais”.

Às vezes, a melhor forma de ‘estar presente’ na vida dos filhos é não estar.

Os artigos acima deixam claro que a ‘criação-helicóptero’ está contribuindo para um crescente índice de depressão entre jovens bem como para uma incapacidade de ter um desempenho otimizado no local de trabalho.

Se você é um pai ou uma mãe que quer que seus filhos sejam bem-sucedidos na carreira quando adultos, precisa estar ciente de quaisquer tendências relacionadas à criação-helicóptero em você ou em seu parceiro.

Amar seus filhos significa guiá-los, protegê-los e apoiá-los. Não significa sufocá-los, superprotegê-los ou fazer tanto por eles que nunca aprendam a pensar por si mesmos, a lidar com desafios ou com o desapontamento e fracasso.

A coisa mais amorosa que você pode fazer como pai ou mãe é dar um passo atrás e deixar seu filho cair, se preocupar e resolver as coisas sozinho. Às vezes, a melhor forma de “estar presente” na vida de seu filho é não estar. É assim que você os capacita a desenvolver confiança, competência, autoestima e inteligência emocional.

Hoje os jovens precisam de pais que os ajudem a se tornar adultos úteis. Isso significa girar menos em torno deles e embrulhá-los menos em plástico-bolha e empoderá-los mais para que façam coisas por si mesmos, resolvam coisas por si mesmos e aprendam a lidar com as dificuldades, tudo por si mesmos.

http://resilienciamental.com/2017/07/03/pais-helicoptero-estao-criando-filhos-simplesmente-inempregaveis/

domingo, 29 de abril de 2018

Liberdade e democracia



O liberalismo busca o progresso sem brigar com a realidade histórica e sem ignorar as limitações dos sistemas econômicos, políticos e sociais

         
O Estado de S.Paulo - 22 Abril 2018

O País chegou a tal ponto de degradação política e moral que já será um grande avanço – quase uma revolução – se os eleitos no pleito deste ano forem pelo menos honestos. No entanto, as urnas não deveriam servir somente para purgar a política nacional dos malfeitores que ora a infestam, como se apenas a partir disso todo o resto se resolvesse. Pois nem a corrupção é o único mal do País nem sua eventual superação será o lenitivo mágico que lançará o Brasil no rol dos países desenvolvidos.

Para que a Nação consiga transformar finalmente seu enorme potencial em riqueza sólida, mudando o patamar de nosso até agora medíocre desenvolvimento, é preciso ter claro como se chegou ao lastimável estado de coisas atual. E não é necessário muito esforço para constatar que grande parte dos problemas que nos atormentam deriva do fato incontestável de que jamais se experimentou no País o ideário liberal em sua plenitude.

Esse ideário é tratado, historicamente, como anátema pela maior parte da classe política, receosa de se vincular a uma concepção que tanto valoriza a iniciativa privada e a responsabilidade do indivíduo, em evidente contraste com o conforto inconsequente pelo estatismo. Entre as duas concepções, é evidente que a segunda tem muito mais apelo eleitoral imediato, pois oferece ao eleitor a ilusão de que o Estado tudo proverá, criando com o cidadão uma relação de dependência – e não somente no aspecto econômico, mas também no político e no social, pois dessa relação muitos brasileiros esperam obter direitos e benefícios os mais diversos.

Não parece ser por outro motivo que, no atual estágio da campanha eleitoral para a Presidência da República, os candidatos mais bem colocados sejam campeões do antiliberalismo. Mesmo entre aqueles que se apresentam como candidatos de “centro” – portanto, com potencial para incorporar em suas propostas as ideias liberais –, houve quem dissesse que o “liberalismo completo” é “a incivilização”.

Ainda não apareceram candidaturas eleitoralmente viáveis com coragem para dizer aos eleitores que a visão estatista, que tem predominado no Brasil, está na essência dos graves problemas do País, inclusive, ou a começar, pela corrupção que tanto tem mobilizado a opinião pública.

Ao contrário, muitos eleitores continuam a acreditar – é o que dizem as pesquisas – que os tão desejados “direitos sociais” são um favor dos líderes políticos que se apresentam como defensores do povo e que, por isso, merecem gratidão e voto. Esse favor de certa forma se materializou na Constituição de 1988, considerada sagrada pelos populistas, que não apenas resistem a reformá-la para torná-la mais realista, como contribuem decisivamente para piorá-la. Não à toa, quanto mais direitos são incorporados à Constituição – pois papel aceita tudo –, menor tem sido a capacidade do Estado de fazê-los valer.

Há, portanto, um enorme desafio à frente, que vai muito além da superação da crise legada pela trágica aventura lulopetista. É preciso empreender uma mudança cultural no País, fazendo com que os valores liberais – sobretudo a aposta na capacidade criativa e inovadora dos cidadãos livres numa ordem democrática – deixem de ser confundidos com exploração e ganância. O liberalismo busca o progresso sem brigar com a realidade histórica e sem ignorar as limitações dos sistemas econômicos, políticos e sociais. E isso é o exato oposto do populismo estatólatra, cuja força eleitoral reside justamente nas utopias simplificadoras que alimenta.

Deve-se portanto aproveitar a visibilidade proporcionada pela campanha eleitoral para convencer os eleitores de que o Brasil só será plenamente desenvolvido se abandonarmos o modelo estatista e adotarmos como premissas o livre mercado e a liberdade do indivíduo – numa democracia com instituições sólidas e com um Estado regulador, e não produtor. Não há outra maneira de alcançar o avanço técnico e humano. A história está repleta de exemplos dessa revolução, que pode perfeitamente ser reproduzida aqui – desde que, claro, haja líderes políticos que consigam enxergar além de seus interesses eleitorais imediatos.

Socialismo e intervencionismo

HUMBERTO ALENCAR

Não passe mais vergonha! Entenda porque o socialismo nunca deu certo! E o intervencionismo vai na mesma linha.

Ao contrário do que pode parecer numa análise superficial, a possibilidade de obtenção de lucros numa economia é tão ou mais importante para quem consome produtos e serviços, do que mesmo para os empreendedores e empresários que os ofertam no mercado. Quando alguém compra por exemplo uma roupa numa loja o valor pago não fica totalmente com o proprietário. O valor é usado para pagar funcionários, aluguel, impostos e apenas uma parte fica com o dono do estabelecimento. Esse valor é a remuneração pelo seu tempo, dinheiro e risco do negócio. Sem a possibilidade de lucro, porque alguém se preocuparia em ofertar roupas no mercado?
É graças à possibilidade de lucro que os indivíduos trabalham duro para si mesmos, de forma essencialmente egoístas, mas acabam melhorando a vida de quem consome seus produtos e serviços. Por que alguém trabalharia horas, investiria seu dinheiro e assumiria todos os riscos se não houvesse a possibilidade de lucros? O fato é que ninguém faria. E quanto maior for a possibilidade de lucrar numa economia, mais haverá produtos e serviços à disposição dos consumidores a custos menores. 
O que leva a existir clínicas veterinárias operando 24 horas por dia? Seria porque alguns veterinários sentem insônia e querem trabalhar durante as madrugadas? Ou porque esses, pensando em si mesmos, enxergam uma possibilidade de lucros maiores do que trabalhar durante o dia? O mesmo vale para chaveiros que funcionam na madrugada, que “salvam” muitas pessoas, mas cobram mais caro do que um serviço diurno. Ambos, o veterinário e o chaveiro só estão pensando em si mesmos, e em obter mais lucro. No entanto, é a possibilidade de lucros que faz com que pessoas totalmente estranhas, quem vende determinado produto ou serviço e quem consome, possam fazer trocas vantajosas entre si. 
Quando chegamos num supermercado e encontramos aquela variedade imensa de produtos, alguns raros como frutas importadas, cervejas especiais, carnes nobres, vinhos diferenciados etc. Toda essa mágica, só é possível graças a uma palavra: lucros. E quanto menos interferência do Estado houver nesta questão, maior serão os benefícios dos consumidores. A problemática da interferência do Estado na economia faz com que a possibilidade de lucro fique difícil de estimar. Isso porque qualquer intervenção ataca o centro da tomada de decisões que é o preço. O preço numa economia livre é o bem mais precioso. É a informação pura. 
No Brasil por exemplo, foi implantada a desastrosa política chamada “carteirinha de estudante”. Por mais bem-intencionada que seja, a sua concepção já é um desastre em si porque ataca o preço de mercado, que é a informação mais importante para os agentes tomarem decisões. Assim, como os empreendedores do meio artístico irão calcular a possibilidade de lucros ao ofertar um determinado serviço? E quem garante ao formulador da política que não piorou a situação dos estudantes ao invés de melhorar? A intervenção tende a diminuir os empreendedores que queiram gastar seu tempo, trabalho e capital, num ambiente de negócios incerto, em que seja mais difícil estimar a possibilidade de lucros. A diminuição de oferta por si só já afeta os estudantes, diminui as opções de consumo, bem como o próprio preço geral dos serviços. 
Em casos extremos de intervenção na economia como o modelo socialista, o próprio cálculo econômico fica impossibilitado já que para que exista é necessário haver propriedade privada dos produtos, ter liberdade para comercializar todos bens e serviços e consequentemente formar um preço de mercado. O elemento básico do cálculo econômico é o preço. É o preço que condensa todas informações de um produto ou serviço. Graças ao preço podemos saber qual é a utilidade atribuída aos bens pelos indivíduos, qual é o estoque e qual é a disponibilidade do que vai ser consumido. É graças ao preço que é possível ter um histórico de produção, quanto custou os insumos utilizados, o valor da mão de obra, o capital e a tecnologia empregada. Tudo está refletido no preço.
O trabalho do empreendedor é antecipar quais serão os preços no futuro com base no custo de produção, que é possível graças a todos os preços dos insumos. No início do século XX, Mises explicou que sem o preço não existe planejamento racional na economia, o que tornaria inviável o modelo socialista. Na prática a experiência da União Soviética de socialismo para sobreviver a isso, usava preços ocidentais para seus produtos, mas que eram distorções já que não entrava no preço fatores como a escassez e as especificidades locais. 
Se os benefícios dos consumidores são melhor atendidos numa economia onde haja a maior possibilidade de lucros, o que dizer do modelo socialista que restringe totalmente a possibilidade de lucros? A tendência obviamente é a escassez de produtos e a falta de opções ao consumidor, além da total falta de incentivos à inovação empresarial. 
Uma economia estatizada como num modelo socialista, os bens não são mais privados, e sendo públicos não há mais trocas voluntárias entre os indivíduos. E sem as trocas voluntárias não existe mais o conceito de preço. E sem preço não é possível realizar qualquer cálculo econômico. Antes de tudo, preço é informação. E como alocar racionalmente os recursos da economia se não existe a base essencial de informação que é o preço?
Quanto mais possível seja obter lucros numa economia, maior tende a ser o benefício dos consumidores. No modelo socialista o benefício de quem consome produtos e serviços é o menor, já que como ninguém pode lucrar, não há incentivos para a atender qualquer demanda de quem quer consumir. E sendo as necessidades humanas ilimitadas, o sistema socialista restringe a população ao menor grau possível de satisfação.

“Estamos perdidos no passado”


Delfim Netto
Valor Econômico 27 04 18


Antônio Delfim Netto chega aos 90 anos, no dia 1º de maio, como um dos mais influentes economistas do país. Suas opiniões têm sido uma referência no debate nacional há pelo menos cinco décadas. Durante esse tempo, Delfim andou pelos extremos - foi de bruxo do "milagre econômico" nos anos de chumbo a oráculo da esquerda no governo do PT. Mais recentemente, participou da elaboração do Ponte para o Futuro, programa de reformas do MDB, que é a base do governo de Michel Temer.

Foram tantas idas e vindas na política econômica doméstica dos últimos anos que, mesmo não sendo um pessimista, Delfim, hoje, se rende aos fatos: "Nós estamos perdidos no passado! O Brasil não pode mais continuar da forma que está!", afirma. Até meados dos anos 1980, o país crescia mais do que o mundo, lembra ele. Desde então, cresce menos do que a economia mundial
"Nós estamos nos afastando do mundo. Cometemos erros brutais!", lamenta Delfim, e completa com uma conclusão melancólica: "O que é o Brasil hoje? Vamos falar a verdade, sem rebusco, sem complicação: o Brasil é uma colônia da China".

O nível de judicialização da atividade administrativa, combinado com a politização da Justiça, tornou o Brasil "inadministrável!", adverte. "Se o presidente que assumir em 2019 não for capaz de impor a sua orientação, se não for capaz de reunir o concílio dos cardeais - o presidente do Supremo e o presidente do Congresso - e dizer que cada um tem que voltar para a sua caixinha e seguir o livrinho, a Constituição, não vai funcionar. Vai acabar sendo impichado."

O exemplo de que as coisas não vão bem vem de todos os lados, em pequenas doses. Delfim contou, indignado: "O metrô de São Paulo tinha dois sindicatos, um relativo ao metrô público e o outro, o sindicato das linhas concedidas, dos trabalhadores do setor privado. O do setor privado sempre se recusou a fazer as greves políticas que o outro está acostumado a fazer. Pois bem: em uma decisão agora, o Superior Tribunal do Trabalho incorporou o sindicato do setor privado ao do setor público. Essa decisão é uma violação da Constituição, que no artigo 173 diz [ele pega um exemplar da Carta de 1988 e começa a ler]: '... a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessário aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei'".

Os sinais da decadência do país estão, para ele, em questões aparentemente triviais: "Hoje tem mais de 5 milhões de brasileiros de 17 a 24 anos estudando em cursinhos para fazer concurso público! Essa casta que se apropriou do poder, sem controle social, é tão extraordinária que se tornou o objetivo da sociedade!".

Dos 20 anos da ditadura militar, Delfim comandou a economia brasileira por 13 anos. Foram 7 anos à frente do Ministério da Fazenda nos governos dos generais Costa e Silva e Garrastazu Médici (de 1967 a 1974) e 6 anos como titular da pasta do Planejamento, precedido de uma breve passagem pelo Ministério da Agricultura, durante a Presidência do general João Batista Figueiredo (de 1979 a 1985). Com a democratização, foi eleito deputado federal por cinco mandatos (de 1987 a 2007) e teve participação ativa na elaboração da Constituição de 1988.

Em 1975, um ano após a posse do general Ernesto Geisel na Presidência da República (1974-1979), Delfim foi enviado a Paris onde, por três anos, assumiu o comando da embaixada brasileira. O exílio foi a forma de Geisel abortar a pretensão do ex-ministro de candidatar-se ao governo de São Paulo e vir a ser, eventualmente, candidato à Presidência da República.

São dos tempos de Paris as primeiras notícias sobre a existência do Relatório Saraiva, documento no qual o coronel Raimundo Saraiva, então adido militar da embaixada brasileira, fazia denúncias de corrupção, como a cobrança de comissões sobre empréstimos de bancos franceses pela embaixada chefiada por Delfim. Como chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI) e já escolhido sucessor de Geisel, Figueiredo despachou dois agentes para a capital francesa, para apurar aquelas denúncias. O relatório nunca foi divulgado, as tais denúncias não foram comprovadas e o general, ao assumir a Presidência, o convidou para a pasta da Agricultura em março de 1979.

Após cinco meses, Delfim substituiu Mário Henrique Simonsen no Ministério do Planejamento para pilotar o naufrágio do país que, àquela altura, estava quebrado. O roteiro daquela turbulência é bem conhecido: o México declarou moratória da dívida externa e levou de roldão o mundo subdesenvolvido para a tenebrosa crise da dívida. No Brasil esse período ficou conhecido como "a década perdida".

Os burburinhos sobre o czar da economia eram variados. Uns diziam que ele era sócio de Amador Aguiar no Bradesco, outros que ele era um dos donos do Bordon, o frigorífico de Geraldo Bordon que muitos anos depois passaria para as mãos dos Irmãos Batista (Joesley e Wesley), transformando-se na JBS. Nada foi provado.

Na manhã do último dia 6 de março, Delfim viu os agentes da Polícia Federal entrarem na sua residência com mandato de busca e apreensão. Era mais um desdobramento da Operação Lava-Jato, destinado a apurar se o economista recebeu propina das empreiteiras para montar um consórcio que disputou o leilão da usina de Belo Monte. Os policiais levaram os celulares.

Sobre o episódio, ele explica: "Meu papel foi muito simples. Fui estimulado pelo então líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral [PT- MT], a organizar um outro consórcio, porque só tinha um concorrente [formado pelas grandes empreiteiras]. Meu papel, na verdade, foi simplesmente reunir as pessoas. Esse consórcio tinha as pequenas empresas, que eram subcontratadas pelas grandes empreiteiras em todas as suas obras. E tinha a Mendes Júnior, que havia coordenado Itaipu! Portanto, não é possível dizer que o consórcio, que venceu o leilão de Belo Monte em uma disputa pública, não tinha capacidade para tocar a obra!". O concorrente, que ele chama de "cartel", desistiu do leilão.

Eu devia ser remunerado com honorários por conta de ter estimulado [a formação de um outro consórcio para estabelecer competição no leilão], só isso. Aí acontece o seguinte: o governo decide juntar tudo. Faz uma lambança, juntando vencidos e vencedores numa única coisa. E misturaram a minha remuneração, meus honorários com essa lambança política."

Não ficou clara a razão pela qual a PF considerou o pagamento a Delfim como "propina", já que essa denominação é usada para caracterizar o pagamento feito a um funcionário público em troca de vantagem indevida. Delfim é um consultor privado.

"Há um equívoco mortal nesse troço, que eu espero que seja esclarecido. Espero que o Ministério Público, a Polícia Federal entendam esse fato elementar: que eu não tenho nada que ver com a patifaria que foi feita depois. E o que eu recebi - que é 20% do que eles falam [dos R$ 15 milhões mencionados, ele teria recebido, portanto, uns R$ 3 milhões], se for tanto - são honorários pelos serviços prestados. A demonstração do serviço foi o leilão."

O fato de ter sido envolvido em uma operação da Lava-Jato não o leva a criticar as investigações. "A Lava-Jato é um ponto de inflexão na história do Brasil. Ela pôs a nu um incesto entre um Estado que estava aparelhado e uma parte do setor privado. E nunca mais o Brasil vai ser o mesmo. Isso nunca mais vai se repetir", acredita.

O ex-ministro condena, no entanto, o processo de punição, que não é determinado pela investigação, mas acaba sendo aplicado às empresas e não somente aos seus donos, como pessoas físicas. "Está se desmontando aquilo que foi construído ao longo de mais de 50 anos, que é a formidável expertise do Brasil em obras de infraestrutura!", afirma.

Quando Delfim começou na vida pública, como secretário da Fazenda do governo de São Paulo, o Brasil já contava com uma indústria razoável, mas era um país fortemente dependente do café, produto que respondia por cerca de 60% das exportações.

Ele formou-se em economia pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), escola que ajudou a se consolidar, onde teve intensa vida acadêmica e hoje é professor emérito. Em 1958, Delfim obteve o grau de doutor com a tese sobre "O Problema do Café no Brasil". O grande problema do Brasil era como se desvencilhar da forte dependência do café sem diminuir a sua produção.

Costa e Silva já havia sido designado como o próximo presidente da República e Delfim foi convidado a fazer uma exposição sobre a economia brasileira para o general. "Fiz a exposição por uma manhã inteira, em um apartamentozinho em Copacabana. Mostrei para ele aquela dependência do café, que representava 60%, 65% das nossas exportações. A demanda de café tinha características próprias, era inelástica, e o café tinha problema de oscilação da produção. Minha ideia era reduzir a dependência do café sem diminuir a sua produção. Era preciso aumentar a participação dos demais setores", conta ele.

Pouco depois desse primeiro e único encontro com Costa e Silva, Delfim foi convidado para ser o seu ministro da Fazenda, cargo que assumiu em março de 1967.

Durante os anos em que ditou a política econômica brasileira, operou o "milagre econômico" no país, com altas taxas de crescimento e inflação de dois dígitos, mas decrescente. Medida pelo IGP-DI, a inflação, que era de 39,1% em 1966, caiu para 15,6% em 1973, ano do primeiro choque de preços do petróleo, que elevou a inflação para 26,9% no ano seguinte.

Entre 1967 e 1974 o país cresceu a uma taxa média de 9,91% e dobrou o Produto Interno Bruto (PIB). Uma façanha que nunca mais se repetiu. Para se ter uma ideia do dinamismo que isso representou, basta notar que nos últimos 30 anos cresceu a uma taxa média de 2,18% ao ano.

Entre 1967 e 1980, o valor das exportações industriais brasileiras, quando comparadas com o valor das exportações do mundo, crescia 15% ao ano. Em 1980, o café representava 15% das receitas de exportação. No início da década de 1980, o Brasil tinha, segundo o ex-ministro, uma das indústrias mais sofisticadas do mundo.

Delfim diz que "o trabalho de salsicharia" foi pôr Roberto Campos, no Planejamento, e pôr Octávio Bulhões, de quem foi assessor, na Fazenda. Quando assumiu a pasta da Fazenda, ele conta que mudou radicalmente o viés da política econômica, antes voltada para o controle da inflação por meio de restrições monetárias em prejuízo do crescimento. Ele implementou a reforma tributária feita por Bulhões/Campos, criou a Zona Franca de Manaus, adotou uma série de incentivos às exportações e uma política cambial bem competitiva. Além disso, regou a economia com o alongamento do prazo de recolhimento de impostos das empresas e fez uma política de rendas baseada no controle de preços e salários. "Era a concepção keynesiana de que sem uma política de rendas não se chegaria ao pleno emprego com uma inflação estável."

Delfim não pertenceu e nem pertence a uma escola do pensamento econômico. "A economia não é uma ciência. É uma religião com várias igrejas [ou seitas]. Nela o átomo grita, xinga, vota", diz, em uma das suas principais críticas aos economistas que se julgam portadores de uma "sabedoria divina".

Foi Roberto Campos quem deu ao crescimento desse período a alcunha de "milagre econômico", segundo Delfim. "O Campos era um gozador e dizia: 'Na Alemanha não teve milagre, milagre tem é no Brasil mesmo!'." Para ele, "não houve milagre algum, porque milagre é efeito sem causa. O que teve foi muito trabalho dos brasileiros!".

Assim como se atribui a Fernando Henrique Cardoso a frase "Esqueçam o que escrevi", que ele sempre negou ter pronunciado um dia, firmou-se a convicção de que é de Delfim - que também nega - a declaração "É preciso primeiro fazer o bolo crescer para depois distribuir", em uma referência ao crescimento com concentração de riqueza do "milagre". Ele contesta a autoria e o mérito da frase, que, argumenta, é a negação do que ocorreu no período em questão.

Sem se lembrar de onde ela surgiu, Delfim alfineta, em tom de blague: "Essa frase provavelmente foi inventada pelo Fernando Henrique quando ele pensava que era socialista. Como é que você desenvolve sem consumir? Só num país socialista, autoritário, é que você poderia investir tudo e deixar o povo esperando o consumo". E defende: "Durante esse período de forte expansão da economia, foram criados 15 milhões de empregos. Quem consumia eram os próprios brasileiros! Tanto que o Lula sempre dizia: 'Eu só consegui comprar o meu Volkswagen em 1973 porque naquele tempo a gente deixava uma fábrica, atravessava a rua e já tinha outro emprego'".

Delfim conheceu Lula em 1983, quando o governo preparava a nova política salarial preconizada no decreto-lei 2045 e buscou apoio do líder sindical. O decreto, porém, foi derrubado no Congresso. Desde então, sempre teve com o ex-presidente uma relação amigável, que foi se estreitando com o tempo de convivência no Congresso.

"O Lula é uma inteligência privilegiada, não adianta discutir. E também não adianta discutir o fato de que ele foi ajudado, externamente, por um período onde houve ganhos nas relações de troca. O fato é que ele distribuiu esses ganhos diretamente para o andar de baixo."

Nos oito anos de governo Lula, Delfim foi uma espécie de conselheiro do então presidente, juntamente com o economista Luiz Gonzaga Belluzzo. Hoje ele sintetiza o prestígio que Lula desfruta de uma parcela significativa dos eleitores: "O estômago do andar de baixo é que sente saudades do Lula".

Da gestão de Dilma Rousseff, o ex-ministro não economiza críticas. "Até 2011 eu acho que a coisa ainda não estava tão desarrumada. Começou a desandar, na verdade, a partir de 2012, quando ela introduziu um voluntarismo profundo ao mexer no setor elétrico e ao tentar controlar os juros sem dar para o [Alexandre] Tombini [presidente do Banco Central] as condições fiscais adequadas." Em 2014, ano da reeleição de Dilma, foi quando "tudo desandou de vez" e, para se reeleger, a então presidente, mesmo sabendo que aquele modelo havia se esgotado, dobrou a aposta. "Ela fez um combate feroz ao programa do adversário e, terminada a eleição, na semana seguinte adotou o programa do adversário." Dilma andou 180 graus sem dar uma explicação aos seus eleitores. "Foi uma desilusão monstruosa!", arremata.

Michel Temer, de quem é amigo, apesar de todo o desgaste, está fazendo um governo reformista, assinalou. Delfim revela uma grande admiração pelo trabalho que está sendo conduzido pelo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn. "Para se ter liberdade de movimento de capitais, é preciso que o juro externo mais o risco-país sejam muito parecidos com o juro real interno. E estamos nos aproximando dessa situação. Talvez essa seja a maior contribuição... maior não, porque eu acho que o Ilan está fazendo coisas muito interessantes. Eles realmente estão trabalhando em uma mudança da política monetária, um 'aggiornamento' importante para reduzir essa desesperadora diferença entre a taxa de juro que você toma o dinheiro e a taxa de juro que você aplica, o spread."

Delfim expia alguns pecados que seus adversários não perdoam. Um deles foi ter assinado o Ato Institucional nº 5, na noite do dia 13 de dezembro de 1968 - o mais duro golpe que permitiu à ditadura fechar o Congresso Nacional, cassar mandatos e suspender o direito de habeas corpus para crimes políticos. "Se as condições fossem as mesmas e o futuro não fosse opaco, eu repetiria. Eu não só assinei o Ato Institucional número 5 como assinei a Constituição de 1988", disse o ex-ministro em 2013, à Comissão Municipal da Verdade Vladimir Herzog. "Com o AI-5 eu aproveitei para fazer tudo o que precisava ser feito", completou, em outra ocasião.

Um segundo pecado atribuído a Delfim foi a manipulação do índice de inflação em 1973. Em documento que Mário Henrique Simonsen, que o sucedeu na Fazenda durante o governo Geisel, enviou ao Conselho de Desenvolvimento Econômico (CDE), constava que a inflação daquele ano havia sido de 22% e não de 15%, conforme o índice oficial. Ele, por mais de uma vez, explicou: "Nunca mexemos no índice de preços, mas na formação dos preços. Só havia levantamento de preços no Rio, mas trabalhávamos de madrugada com gente em Curitiba, Belo Horizonte. Às 3h30 da manhã, um dizia que estava chovendo no Rio e ia faltar abobrinha. Então, desviávamos um caminhão de abobrinha de São Paulo para o Rio. Imagine se era possível chegar para o dr. Eugênio Gudin [da FGV] e dizer para ele dar 'uma ajeitadinha no índice'". Simonsen acusou Delfim de colocar, no índice de inflação, o preço tabelado da carne. "Eu desafiei o Mário a trazer uma fotografia do 'Jornal do Brasil' mostrando que tinha fila para comprar carne. Se o preço tabelado não fosse o verdadeiro, teria fila." E admitiu: "Você pode dizer que a inflação no país era pouco maior do que a registrada no Rio. Mas, quanto maior a inflação registrada, mais alta será a que você vai ter à frente".

Nos últimos tempos, ele tem se encontrado com alguns pré-candidatos à Presidência da República. Recentemente, esteve com o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, filiado ao PSB, partido pelo qual deve se candidatar ao Palácio do Planalto. Ambos eram palestrantes em um seminário em São Paulo e, encerrada a participação, foram almoçar.

"O Joaquim está fazendo um estrago!", comentou Delfim. Na última pesquisa Datafolha, o nome do ex-ministro do Supremo e relator do mensalão apareceu com 9% das intenções de voto, no cenário sem a candidatura de Lula. Joaquim Barbosa estaria, portanto, em terceiro lugar, empatado com Ciro Gomes, do PDT, e atrás de Jair Bolsonaro (com 17%) e de Marina (15%).

"Acho que o Joaquim pode ir para o segundo turno. Ele é um sujeito muito culto, tem um prestígio danado e é um cara honestíssimo. Outra coisa é que boa parte dos pardos e negros vota nele. É o Obama, né?"

O arquiteto Oscar Niemeyer, que viveu 105 anos, quando completou 90 anos respondeu à insistente pergunta de um jornalista em um programa de televisão, que queria saber como era chegar a essa idade: "É uma merda!". Ao responder a essa mesma pergunta, Delfim, com bom humor, disse: "É uma grande alegria, pena que passe tão depressa. Eu sempre brinco: o ano, hoje, passa mais rápido do que seis meses. A rapidez do tempo é proporcional à idade".

sábado, 28 de abril de 2018

Rota do desperdício


Pagar ao setor automobilístico para tornar-se mais competitivo, por meio do programa Rota 2030, pode ser um erro enorme e custoso, como foi o fracassado programa Inovar Auto
          
O Estado de S.Paulo

26 Abril 2018 

Pagar ao setor automobilístico para tornar-se mais competitivo, por meio do programa Rota 2030, pode ser um erro enorme e custoso, como foi o fracassado Inovar Auto, uma das obras-primas do desgoverno petista. Mas o governo, tudo indica, vai continuar pagando. Um ministro e um representante da indústria deram como certo, depois de uma reunião com o presidente Michel Temer, na terça-feira passada, o lançamento, em breve, do novo programa. “Estamos quase lá”, disse ao sair do encontro o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Antonio Megale, segundo informou a Agência Estado. “Falta apenas concluir os textos”, de acordo com o ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Jorge, citado pelo jornal Valor. As informações iniciais coletadas em Brasília indicaram um projeto híbrido, moldado pelas propostas do Mdic, favoráveis aos benefícios, e pelas objeções do Ministério da Fazenda. O resultado poderá ser híbrido, mas continuará sendo ruim, porque a ideia básica é insustentável como política econômica.

Desde o segundo semestre do ano passado o governo vem adiando o anúncio do projeto, por causa da resistência do Ministério da Fazenda. Se faltassem outros argumentos, a experiência da generosa e improdutiva distribuição de favores fiscais e financeiros a grupos e setores, no período petista, deveria servir como advertência.

Inovação pode tornar a indústria mais competitiva, beneficiá-la e beneficiar também o País, mas estarão os dirigentes do setor automobilístico interessados em investir, no Brasil, em pesquisa e desenvolvimento? Não muito, a julgar pela conversa do presidente da Anfavea. As montadoras, havia dito Megale na segunda-feira passada, são multinacionais e decidirão investir onde for mais barato. Traduzindo: pouco lhes interessa investir neste país para abastecer seu mercado e os mercados de países compradores, atuais ou potenciais, de produtos brasileiros.

A resposta da indústria aos incentivos ganhos até agora foi abaixo de pífia. Suas exportações são enviadas a poucos destinos e em grande parte vinculadas ao acordo automotivo Brasil-Argentina, um conhecido pacto de mediocridade. Mas também é preciso levar em conta outros pontos.

Ainda na segunda-feira o presidente da Anfavea atribuiu ao poder público um papel mais amplo que o de incentivar investimentos e esforços de inovação. “Quando a coisa não está alinhavada com o governo, começamos a ter iniciativas independentes”, disse o representante da indústria. Segundo ele, o setor já começava a se desorganizar por causa do atraso do Rota 2030. Notável: o setor precisa do governo para orquestrar suas iniciativas?

O texto final, segundo se informou em Brasília, será uma fusão da proposta original do Rota 2030 com a Lei do Bem, em vigor há alguns anos. O benefício fiscal poderá ficar limitado ao Imposto de Renda e à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, com alcance menor que o pretendido inicialmente. Mas o abatimento fiscal do valor investido em pesquisa e desenvolvimento poderá passar dos 60% previstos na Lei do Bem para 160%.

Esses detalhes, no entanto, nem chegam a ser as questões principais. O dinheiro do Tesouro será muito curto por vários anos e é preciso, sim, considerar esse ponto. Mas ainda falta responder à pergunta mais importante: será o Rota 2030 o uso mais vantajoso de recursos públicos?

Outros setores e segmentos se têm mostrado competitivos sem tantos favores. O governo pode empregar o dinheiro desse incentivo em ações mais vantajosas para o País. Quanto aos custos das empresas, pode-se atacá-los com programas horizontais – válidos para todos – de modernização tributária, controle da inflação, corte de juros, diminuição de burocracia e formação de capital humano. Há muito por fazer para tornar toda a economia mais produtiva e competitiva.

O melhor caminho, como ensina a experiência internacional, é o das políticas de alcance geral, com atenção, é claro, a pontos estratégicos, como as prioridades em educação. Políticas verticais podem ser boas para os amigos da corte. O País é algo mais amplo.

Riscos na janela


Economia mundial vai relativamente bem, mas parte das boas notícias implica temores

A economia mundial vai relativamente bem, segundo as projeções mais recentes do Fundo Monetário Internacional (FMI). Entretanto os riscos financeiros são crescentes e, guardadas as proporções, começam a se assemelhar aos que redundaram na enorme crise do fim da década passada.

Estima-se alta de 3,9% para o Produto Interno Bruto mundial em 2018 e 2019, um pouco acima (0,2 ponto percentual) do que se calculava em outubro.

De lá para cá, houve importante revisão nas expectativas para a expansão do PIB dos Estados Unidos neste ano (de 2,3% para 2,9%), em grande parte devido às medidas de cortes de impostos e aumento de gastos patrocinados pelo governo do republicano Donald Trump.

Os emergentes também mostram dinâmica positiva. A alta recente dos preços das matérias-primas e a retomada do comércio internacional, a despeito dos riscos de protecionismo, favorecem o crescimento desses países.

Juros amigáveis no mundo rico e ampla disponibilidade de crédito são mencionados pelo FMI como as principais razões para a boa perspectiva de curto prazo. Apenas os EUA estão subindo suas taxas por enquanto, mas em ritmo lento e ainda insuficiente para restringir consumo e investimentos.

Se as indicações do banco central americano se mantiverem, os juros devem chegar a 3% ao ano, nível mais próximo da normalidade, apenas em 2019-20. Na Europa, a taxa básica ainda é nula, e não se espera que suba neste ano.

Na média dos países ricos, apenas em 2021, ou ainda mais adiante, a política monetária deve retornar aos padrões usuais.

Uma parte das boas notícias, porém, implica riscos mais à frente. Como vem caindo a ociosidade nas empresas, e o desemprego, sobretudo nos EUA, se aproxima dos menores patamares da história, a alta do consumo pode provocar pressões inflacionárias —o que anteciparia uma elevação dos juros.

O ímpeto gastador de Trump, aliás, reforça tais temores.

Outro perigo se relaciona aos excessos financeiros. A abundância de dinheiro na praça levou às alturas os preços de ações e títulos de empresas e bancos. Enquanto isso, o endividamento agregado em todos os países equivale a 225% do PIB mundial, 12 pontos percentuais acima do que se observava antes da crise de 2009.

Em suma, a janela favorável da economia mundial continua aberta, o que dá alívio ao Brasil neste momento de incerteza política. Mas não se pode descartar a possibilidade de uma nova crise no próximo quadriênio, o que aumenta a urgência dos ajustes domésticos.

Segurança jurídica para os portos

Gesner Oliveira 
Viabilizar novos investimentos em logística de maneira célere e aderente às melhores práticas internacionais é fundamental para o país

O setor portuário é o segundo segmento mais importante da infraestrutura de transportes brasileira, atrás do rodoviário. Daí a importância de eliminar o enorme déficit de capacidade do setor; para tanto, a segurança jurídica é essencial. Essa questão está ausente no atual debate.

A regulação desse setor tem sido negligenciada historicamente. Apesar do papel estratégico, a atividade portuária ocorria de forma descoordenada até 1993, quando a Lei de Modernização dos Portos foi bem-sucedida em inserir a iniciativa privada na operação portuária e modificar o papel do poder público, solucionando alguns gargalos logísticos.

Passados 20 anos, no governo Dilma, com a chamada "MP dos Portos", o Estado assumiu posição mais intervencionista, centralizando novamente as principais decisões relativas aos portos na Antaq e na Secretaria Especial de Portos. O excesso de intervencionismo e a burocracia muitas vezes atrasaram projetos de investimento, em vez de acelerar.

Em maio de 2017, o presidente Michel Temer assinou o chamado "Decreto dos Portos", com o objetivo principal de desburocratizar os procedimentos para operação das concessões, arrendamentos e autorizações para terminais de uso privado.

A MP e o decreto resultaram em regulação pouco flexível e em grande nível de judicialização. As medidas enrijeceram o setor e causaram desequilíbrio dos contratos, prejudicando a economia como um todo.

Num setor dinâmico, flexibilidade e velocidade de reação são chaves na competitividade de mercado. Do contrário, ocorrem prejuízos sistemáticos e aumento dos custos portuários, com consequente elevação do Custo Brasil.

Por sua vez, o decreto afeta 114 contratos, sem privilégio a nenhuma empresa específica, e pode viabilizar os investimentos necessários mediante garantia da vigência dos contratos.

Estima-se que o decreto tenha potencial de desbloqueio de investimentos de cerca de R$ 23 bilhões, gerar um incremento na produção nacional de quase R$ 70,5 bilhões, com a criação de mais de 1,3 milhão de postos de trabalho, permitindo uma expansão da massa salarial da ordem de R$ 12 bilhões e aumentando a arrecadação de tributos em cerca de R$ 4,6 bilhões.

Apesar de suas limitações, o decreto pode gerar benefícios importantes para o país como um todo, com a liberação de investimentos que levarão à melhoria das atividades nos portos, tornando-os mais eficientes.

Outros importantes setores para a logística também são prejudicados por questões contratuais. Para viabilizar novos investimentos no setor ferroviário imediatamente, é necessária a prorrogação, preferencialmente antecipada, de alguns dos atuais contratos de concessão.

Caso contrário, esses investimentos só poderão ser executados em um novo contrato, após o término do atual, o que pode levar até dez anos.

Viabilizar novos investimentos em logística de maneira célere e aderente às melhores práticas internacionais é fundamental para o país retomar a trajetória virtuosa de crescimento. Além dos impactos que trariam nesse momento em que a economia está fragilizada, quanto mais se postergam as decisões, menores os benefícios que serão capturados com sua antecipação.

Gesner Oliveira
Sócio da GO Associados, é professor de economia da FGV-SP; foi presidente da Sabesp (2007-11, governos Serra, Goldman e Alckmin) e presidente do Cade (1996-2000, governo FHC)

Rumo à Eletrobras do futuro

Moreira Franco 
Estamos falando da pulverização --ou democratização-- do controle entre distintos donos, mantendo o poder do governo em decisões estratégicas
26.abr.2018 

A Eletrobras é a empresa que tem o maior volume de negócios em eletricidade do país, com potencial de se tornar uma das maiores e mais rentáveis empresas do setor no mundo.

Mas, mesmo com a eficiente gestão atual, a empresa corre o risco de ser mais uma vez capturada por interesses de grupos de privilegiados, que desejam manter regalias, financiadas por meio de elevadas tarifas de energia ou de aportes de capital da União —só em 2016, o governo injetou R$ 3 bilhões para socorrer a Eletrobras.

A empresa está diante de uma encruzilhada: priorizar os investimentos —levando energia a mais pessoas, a preços menores— ou dar as costas aos brasileiros, cobrando altas tarifas, que atendem a um grupo de privilegiados. O aparelhamento da empresa tem causado perda de valor e de relevância. E a empresa está sem capacidade de reação. Modernizar a Eletrobras não é uma escolha; é uma necessidade.

Há duas formas de salvar a empresa. Caberá à sociedade, por meio do Congresso Nacional, fazer a escolha. A primeira implica bilionários aportes da União. Opção difícil para um país com déficit de R$ 159 bilhões e que precisa de recursos para áreas como educação, saúde e segurança.

A segunda opção consiste na geração de valor, por meio da gestão da empresa, para a volta do crescimento. Estamos falando da pulverização —ou democratização— do controle entre distintos donos, mantendo o poder do governo em decisões estratégicas, com a valorização das ações que ele já detém na empresa. 

O presidente Michel Temer encaminhou projeto de lei que vai modernizar a Eletrobras, escolhendo o caminho da eficiência e da sustentabilidade em todas as suas vertentes: social, ambiental e econômica. Optou por estancar a sangria de recursos públicos, que vão pagar prejuízos e privilégios.

A única forma de evitar que o trabalhador, o consumidor e o contribuinte fiquem em um eterno ciclo de pagamento de passivos é justamente anular os instrumentos que dão origem a esses passivos. Não se trata de uma discussão financeira, e sim de um compromisso com o futuro. Defendemos um debate claro e transparente: 

1. A pulverização do capital deixa a Eletrobras menos exposta à corrupção, com boa governança. As principais empresas de energia no mundo são corporações, algumas atuantes no Brasil, como Enel, Engie, Iberdrola, AES e EDP. No mundo, empresas como Apple e Coca-Cola são corporações.

2. Diversos estudos demonstram que a modernização não implica aumentos tarifários ao consumidor.

3. Democratizando o controle da empresa e estabelecendo limites à formação de blocos de controle, evitamos que outra companhia assuma o controle. Essa é a forma de garantir que a Eletrobras seguirá como uma grande empresa brasileira, independente e autônoma.

4. Esse modelo valorizará o capital do governo brasileiro na empresa. A diluição do controle vai atrair investidores para financiar a retomada do crescimento da empresa e vai assegurar a energia de que o Brasil precisa para crescer. 

5. Tendo sua base de capital fortalecida e com governança, a Eletrobras ganhará musculatura financeira e será capaz de atrair talentos do setor.

6. Uma Eletrobras forte pagará mais impostos e dividendos para o governo. Isso significa mais recursos para áreas como saúde, educação e segurança. Basta ver os exemplos da Embraer e da Vale.

7. A modernização da empresa significa também recursos para o rio São Francisco. Na proposta, a bacia do São Francisco terá um montante financeiro anual superior a todos os investimentos que a Eletrobras fez em meio ambiente em 2016. 

O setor elétrico mundial avança com o desenvolvimento das energias renováveis e da livre participação do consumidor como gestor de sua própria conta de luz. Essa revolução traz ganhos a toda a sociedade, acolhendo empresas que se prepararam para a chegada desse futuro. O Brasil não pode ficar de fora dessa revolução pela qual passa todo o mundo.

A modernização da gestão da Eletrobras é um dos grandes debates de 2018. Não dá para esperar mais. Essa nova Eletrobras será melhor, mais forte e mais justa socialmente. Ganha a sociedade, ganha a empresa, ganha o Brasil.

Moreira Franco
É ministro de Minas e Energia; filiado ao MDB-RJ, foi ministro da Secretaria-Geral da Presidência (2017-2018, gestão Temer), da Aviação Civil (2013-2015, gestão Dilma) e governador do Rio (1987-1991)

Para inglês não ver

Aprovado no Senado, PL 428 objetiva induzir a administração pública ao gasto eficiente
         
JOSÉ SERRA*, O Estado de S.Paulo

26 Abril 2018 

No Brasil de hoje prevalece grande insatisfação com a qualidade dos serviços públicos, notadamente nas áreas de saúde, educação e segurança. Não poderia ser diferente, pois, até agora, os recursos destinados a essas áreas têm sido insuficientes ou mal empregados, ainda que vultosos.

Por isso é fundamental promover – até para estabelecer prioridades – avaliações transparentes e sistemáticas, nas três esferas de governo, dos custos e benefícios das políticas sociais postas em prática. E, paralelamente, reconhecer que será preciso reforçar as ações do Estado, tornando-as mais fortes e eficientes.

Nesse contexto, conviria começar por uma avaliação das experiências internacionais bem-sucedidas, com o intuito de subsidiar a formulação e a implantação das reformas em nosso país. Foi com base numa dessas experiências que se introduziu na agenda legislativa do Congresso o Projeto de Lei 428/2017, que objetiva criar no País um instrumento de gestão de gastos semelhante ao adotado em várias democracias modernas: o Plano de Revisão Periódica de Gastos. Esse projeto, apresentado na semana passada, acaba de ser aprovado quase por unanimidade no Senado. A rapidez deveu-se não só a entendimentos políticos, mas, sobretudo, à compreensão pelas forças políticas da sua importância, o que aumenta o otimismo quanto a uma rápida tramitação na Câmara.

Com o objetivo induzir a administração pública ao gasto público eficiente, o PL 428 institucionaliza no País um sistema permanente de revisão dos gastos, conhecido internacionalmente como Spending Reviews. É um modelo que já tem sido testado em diversos países – Austrália, Canadá, Reino Unido, Holanda e Dinamarca –, especialmente depois da crise de 2008, com bons resultados.

Os planos de revisão de gastos adotados pelos países da OCDE são instrumentos para garantir sustentabilidade fiscal a partir de um objetivo bem específico: propor alternativas para redução de gastos ou para dar prioridade a gastos mais importantes. Segundo Marc Robson, renomado especialista no tema, os países que adotam Spending Reviews geram economias ou ganhos de eficiência persistentes, de 2% a 3%, mesmo nos gastos obrigatórios. No Brasil isso poderá significar economia de até R$ 40 bilhões.

A proposta aprovada no Senado foi inspirada pelo encontro dos Poderes Legislativo e Executivo que se realiza anualmente nos Estados Unidos – o famoso State of Union. Previsto na Constituição, esse evento político é dos mais relevantes na democracia americana. Na abertura dos trabalhos do Congresso, o presidente dos Estados Unidos apresenta aos membros do Parlamento as condições do país e o que precisa ser feito – tudo transmitido e até debatido pela maioria dos meios de comunicação.

A Constituição brasileira também prevê o encontro entre os Poderes. De acordo com seu artigo 84, cabe ao chefe do Poder Executivo “remeter mensagem e plano de governo ao Congresso Nacional por ocasião da abertura da sessão legislativa, expondo a situação do País”. Essa solenidade, entretanto, não suscita ainda maior interesse na sociedade. O próprio Congresso tende a encará-la como um ato de natureza cerimonial. Por seu turno, o governo prepara um documento formal, em geral desinteressante.

O que se impõe como medida prioritária é a apresentação pelo presidente da República, na abertura das sessões legislativas a cada ano, de um verdadeiro plano de revisão de gastos, que apresente avaliações de custo e benefício de cada programa governamental. Paralelamente, devem ser apresentadas as medidas necessárias para o aprimoramento das políticas públicas, incluindo uma agenda legislativa consistente com esse programa.

O documento elaborado pela Presidência deve consolidar as alternativas de economia de gastos com base em avaliação sistemática e no cenário fiscal – que demonstre as consequências de manter a inércia dos gastos. As propostas devem ser apresentadas de maneira transparente, com prioridades e medidas específicas de poupança ou eventual deslocamento de recursos para ações prioritárias. É esta a missão de um governo eficiente: privilegiar programas com maiores benefícios para a sociedade, reduzindo desperdícios e encerrando políticas públicas que não deem resultado.

A instituição do Spending Review, em lei, garantira ao País uma sistemática de revisão de gastos não associada a grupos políticos. Todos os presidentes da República, independentemente de ideologias e crenças, teriam a obrigação de mostrar à sociedade a situação das contas públicas e o que precisar ser revisado para preservar a sustentabilidade fiscal e o desenvolvimento do País.

A criação desse sistema permanente de revisão de gastos é essencial para a sobrevivência do novo teto de gastos, aprovado pelo Congresso em 2016, que impede o crescimento real da despesa pública nos próximos dez anos. Nesse novo regime fiscal, repriorizações, escolhas alocativas, economias orçamentárias e ganhos de eficiência têm de ser a essência do processo orçamentário.

A prática de Spending Reviews nos permitirá avançar na maneira de fazer políticas públicas. A sociedade poderá acompanhar melhor as ações do governo, a evolução dos principais gastos e a qualidade dos programas de ajuste fiscal. Trata-se de uma medida que reforça o espírito da responsabilidade fiscal: “Uma ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e se corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas”.

No Reino Unido, as revisões periódicas de gastos são a marca registrada das finanças públicas desde 1998. A grande vantagem do modelo é a ampla aceitação pública e política. No período de 2010 a 2014, o Tesouro daquele país economizou cerca de 81 bilhões de libras.

O Brasil pode fazer o mesmo: uma gestão fiscal que economize, de fato, e não um ritual “para inglês ver”.

* JOSÉ SERRA É SENADOR (PSDB-SP)

Falta de pressa

Acreditamos que o tempo trabalha a nosso favor, e optamos por ignorar evidências
         
William Waack, O Estado de S.Paulo

26 Abril 2018 

Um dos aspectos mais fascinantes da crise política brasileira e do comportamento de elites pensantes é a perda da noção de tempo. Não se detecta sentido de urgência no trato de qualquer questão essencial para arrancar o País do buraco ao qual teríamos chegado de qualquer jeito – à incompetência, irresponsabilidade e voracidade de governos do PT e seus associados devemos “agradecer” por terem apressado nosso encontro com a hora da verdade (a de que estamos ficando velhos sem termos ficado ricos).

Sociedades caem vítimas de seus próprios mitos com mais frequência do que se pensa. Para permanecer em tempos recentes, e como caricatura para ilustrar o argumento, pensem nos nazistas (que se achavam imbatíveis) ou nos soviéticos (que se achavam donos do futuro). No caso brasileiro, o título do clássico de 1941 de Stefan Zweig – Brasil, Um País do Futuro – às vezes parece uma maldição. É óbvio que o livro não tem a menor culpa disso, mas a postura de boa parte de elites aqui sugere terem se tornado adeptas da crença de que o futuro nos pertence e inevitavelmente será risonho. Como se sabe, em História não há o inevitável.

Em outras palavras, acreditamos que o tempo trabalha a nosso favor, sobretudo quando lidamos com prazos mais dilatados, e optamos por ignorar evidências. A principal chama-se janela demográfica, que está se fechando e foge ao nosso controle. Nos acostumamos a crescer nos últimos 30 anos incorporando ao mercado de trabalho um número grande e aparentemente inesgotável de jovens mal qualificados. Para crescer e enfrentar agora a competição lá fora teremos de melhorar índices de produtividade estagnados há décadas, e com menos jovens à disposição – algo que já se reflete no eleitorado: pela primeira vez a proporção de jovens entre 16 e 24 anos diminuirá em 2018 em relação à última eleição, enquanto cresce o peso relativo dos eleitores acima dos 60.

Para quem comemora o aumento da nossa renda per capita nos últimos, digamos, 15 anos, cumpro aqui o papel chato de lembrar que a diferença para a renda per capita dos países avançados permanece inalterada, ou até um pouco pior para nós. Embora briguem sobre quais fatores afetam diretamente o crescimento de países, economistas não duvidam da forte influência exercida por uma taxa mínima de investimento anual. A nossa é baixíssima e piorou, pois o setor público, do qual tanto dependemos, perdeu essa capacidade de investimento. Em outras palavras, estamos jogando contra o tempo. 

Há outros sinais preocupantes, dos mais variados, indicando que nós gostamos de acreditar que as coisas se resolvem por decurso de prazo. Abominamos o sistema político-eleitoral, por exemplo, mas deixamos passar recente oportunidade para reescrever as regras das próximas eleições, que provavelmente asseguram a permanência de boa parte das figuras e dos métodos que detestamos. E, recentemente, ao considerar o habeas corpus para Lula, o Supremo Tribunal Federal forneceu um exemplo acabado da mentalidade dos estamentos burocráticos que mantém o País sob seu firme domínio: a mentalidade que prefere manipular prazos e evita abordar frontalmente problemas difíceis.

Filmes e exposições na Alemanha lembraram no ano passado os 75 anos do suicídio de Stefan Zweig (um dos escritores mais populares na Europa na metade do século 20) e sua mulher, ocorrido em Petrópolis. Ainda em vida seu livro sobre o Brasil como um país do futuro tinha sido criticado como ingênuo. Consigo entender o que Stefan Zweig, transformado em “Kulturpessimist” pela catástrofe europeia daquela era, enxergou como esperança no Brasil. O problema é a nossa falta de pressa.

Governar no vermelho


Sem reformas e uma ampla agenda de ajustes do Estado, as contas caminharão para o colapso
www.folha.com.br

Projeto de lei orçamentária indica que a Previdência consumirá R$ 758,5 bilhões em 2021, 36% a mais que o esperado para este ano- Fernando Frazão - 

O projeto de lei orçamentária para 2019, cujas principais balizas foram divulgadas pelo governo na última quinta-feira (12), mostra que a situação das finanças públicas continua dramática.

O quadro apontado não chega a surpreender —despesas previdenciárias cada vez mais altas e progressiva asfixia da máquina pública. A novidade está na previsão de permanência das contas no vermelho até 2021, pelo menos. 

As metas de déficit primário (a diferença entre receitas e despesas, excluído o pagamento de juros) para este ano e o próximo foram mantidas em R$ 159 bilhões e R$ 139 bilhões, respectivamente.

Entretanto a projeção do rombo para 2020 subiu quase 70%, para R$ 110 bilhões. Pela primeira vez, além disso, foi divulgada a expectativa para o ano seguinte, também negativa em R$ 70 bilhões. 

O projeto indica que a Previdência consumirá R$ 758,5 bilhões em 2021, 36% a mais que o esperado para este ano. O espaço para despesas discricionárias —aquelas sobre as quais o governo tem margem de controle, incluindo obras e outros investimentos— cairá praticamente à metade no período, para R$ 52,4 bilhões.

Se já hoje se mostram precários os serviços à população, o que dirá nesse cenário futuro.

Tudo isso a despeito da esperada volta do crescimento econômico, que impulsiona a arrecadação. O governo projeta alta do PIB de 3% para 2018 e 2019, seguida por uma desaceleração modesta, para 2,3% e 2,4%, nos anos subsequentes.

A razão apontada é que, na falta de reformas que alavanquem a produtividade, o país retornaria ao padrão de expansão tímida das últimas décadas após esgotado o empuxo inicial da saída da recessão.

É possível que o resultado orçamentário seja melhor, dado que não estão previstas receitas de concessões e novas medidas para reforçar a arrecadação. A queda dos juros, além disso, proporciona algum alívio ao reduzir a velocidade de aumento da dívida.

Ainda assim, os limites estão se impondo rapidamente. Além da dificuldade para cumprir o teto de gastos, o governo terá problemas crescentes para atender ao dispositivo constitucional que proíbe bancar dispêndios cotidianos com endividamento.

A conclusão é inescapável. Sem a continuidade das reformas, sobretudo a previdenciária, mas também uma ampla agenda de ajustes do Estado, as contas caminharão para o colapso.

Nenhum candidato sério poderá ignorar ou esconder essa realidade durante a campanha, sob pena de cometer um novo estelionato eleitoral e pôr em risco sua gestão.

editoriais@grupofolha.com.br

sexta-feira, 27 de abril de 2018

Legado a ser preservado

- EDITORIAL O ESTADÃO
ESTADÃO - 27/04

Rejeitar o legado de reconstrução do País promovido por Michel Temer é apoiar a volta da inflação, o aumento dos juros, a diminuição dos investimentos
Vez ou outra se noticia que uma das prioridades do presidente Michel Temer na construção das alianças partidárias é assegurar que o candidato a ser apoiado pelo Palácio do Planalto nas próximas eleições se comprometa com a defesa do que o governo federal realizou desde maio de 2016, quando Dilma Rousseff foi afastada do cargo por força do processo de impeachment. Na campanha eleitoral de 2018, Michel Temer estaria preocupado com a defesa do seu legado.

Todo governante tem o direito de buscar valorizar aquilo que considera terem sido suas principais realizações durante o mandato. Trata-se de uma necessidade que, muitas vezes, supera o cálculo político-eleitoral. O que está em jogo é a defesa do seu nome, da sua honra, da sua história.

No caso do atual governo, no entanto, a defesa do que foi feito desde maio de 2016 vai muito além de uma questão de ordem pessoal do presidente Michel Temer. A posição de cada candidato sobre as conquistas e os objetivos do atual governo será fundamental para que o eleitor possa escolher conscientemente em quem depositará o seu voto nas eleições do segundo semestre.

Deve-se reconhecer que os índices de popularidade de Michel Temer não são animadores. A ter em conta apenas a popularidade do presidente, a impressão é de que a campanha será muito mais fácil para os candidatos de oposição. Dentro dessa lógica, seria uma tarefa inglória a defesa do legado de Michel Temer.

Tal visão das coisas é, no entanto, enganosa. A disjuntiva que se apresenta nas eleições deste ano é muito mais profunda do que ser governista ou ser oposição. É saber como os candidatos se posicionarão a respeito dos temas fundamentais para o País – se apoiam ou não a reforma trabalhista, se estão de acordo com uma política fiscal responsável, capaz de assegurar as condições para uma inflação baixa e uma taxa de juros civilizada, se estão dispostos a levar adiante a reforma da Previdência, se mantêm o compromisso de promover a abertura comercial do País, tendo como foco o crescimento da produtividade interna. Enfim, se apoiarão as muitas reformas já feitas e se comprometerão com o prosseguimento da agenda de reformas necessárias para o crescimento econômico e social.

De certa forma, é fácil atacar Michel Temer na campanha presidencial. Os institutos de pesquisa indicam que ele não dispõe de muitos apoiadores. No entanto, não é nada fácil atacar o que ele pôs em andamento durante o seu governo. Foram muitos os erros cometidos no plano político por Temer desde que assumiu a Presidência da República, mas há muito o País não via um governante disposto a enfrentar de forma tão clara os principais desafios nacionais.

É, portanto, um tremendo equívoco eleitoral colocar-se contra a agenda de reformas de Michel Temer, já que significaria pleitear o retorno ao populismo irresponsável dos governos petistas, que, como é amplamente sabido, geraram a mais grave crise econômica e os maiores escândalos de corrupção de que se tem notícia.

Rejeitar o legado de reconstrução do País promovido por Michel Temer é apoiar a volta da inflação, o aumento dos juros, a diminuição dos investimentos, o emperramento do mercado de trabalho. Não parece que sejam esses os sonhos dos brasileiros.

O governo de Temer está longe de ser perfeito. Mas é inegável a existência de um legado de realizações e de projetos em linha com as necessidades do País. Desprezar o que foi feito seria um imenso retrocesso. A crise foi profunda e a recuperação econômica é um processo lento, muitas vezes árduo, mas indispensável. Há, certamente, algumas correções de rumo a fazer. O que não há é espaço para titubeios e, muito menos, para novos experimentos populistas. Trata-se de continuar o bom trabalho começado por Michel Temer.

A defesa das realizações do atual governo é uma questão de honestidade com o eleitor. Quem assumir a Presidência da República em 2019 terá grandes desafios pela frente, mas nada comparável à situação deixada por Dilma Rousseff e o PT em 2016, com o País afundado na pior crise de sua história. Cada um pode e deve ter sua opinião política, mas é preciso respeitar os fatos. O Brasil de 2018 está em condições muito melhores do que em 2016 – e é preciso continuar nesse caminho.

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