A Educação brasileira precisa ser assumida pela sociedade e não tutelada por políticos e especialistas. A responsabilidade de se entregar um concludente de cursos desabilitado para o mercado é grande e, no fim, com métricas lenientes, acaba por gerar uma exclusão do egresso no mercado.
As instituições de ensino tem a fundamental responsabilidade de preparar cidadãos aptos a transitar no complexo e variado mercado brasileiro e não especializados em temas sociais o que não é o que o mercado demanda e exige.
Creio que as novas métricas sejam uma aproximação mais coerente para não excluir o novo diplomado do mercado em meio a uma realidade de 14 milhões de desempregados.
Expectativas do MEC, altas como nunca
Quais os problemas do novo critério usado para dizer que o aluno atingiu aprendizado adequado?
*ERNESTO MARTINS E TADEU DA PONTE, O Estado de S.Paulo 05 Setembro 2018
A apresentação pelo Ministério da Educação (MEC) dos resultados de aprendizagem do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), na quinta-feira 30/8, apontaram um cenário alarmante. De acordo com os dados, somente 1,6% dos alunos do terceiro ano do ensino médio apresentaram em 2017 aprendizado adequado em Língua Portuguesa. Cenário tão negativo nunca havia sido apresentado. Em 2015, de acordo com o movimento Todos Pela Educação, 27,5% tinham aprendizado adequado na disciplina.
Até essa divulgação, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e o próprio MEC nunca haviam sinalizado qual pontuação na escala Saeb indicava uma aprendizagem adequada dos alunos. Educadores e formuladores de políticas públicas utilizavam critérios extraoficiais, feitos por organizações e especialistas para fazer esse tipo de interpretação. A mais empregada era a do Todos Pela Educação, construída por um comitê de pesquisadores conceituados, que incluem José Francisco Soares e Reynaldo Fernandes, ex-presidentes do Inep, e Ruben Klein, um dos mais renomados estatísticos a atuar em educação.
No entanto, pelo novo critério do MEC, a pontuação exigida para dizer que um aluno atingiu o aprendizado adequado é muito mais alta que a antiga, do Todos Pela Educação, assim como as utilizadas por muitos Estados que fazem suas avaliações a partir da escala do Saeb.
Enquanto o Todos Pela Educação considera como aprendizagem adequada para o quinto ano do ensino fundamental 200 pontos, o MEC coloca 275 pontos. Essa é a pontuação que o Todos Pela Educação sinaliza como adequada para o nono ano. Em Matemática, o Todos Pela Educação considera como adequado 225 pontos, enquanto o MEC exige 275 pontos, “apenas” 50 pontos a mais, o equivalente a cerca de três anos de aprendizagem.
Já para o ensino médio, o Todos Pela Educação sinaliza 300 pontos em Língua Portuguesa e 350 em Matemática como adequados, enquanto o MEC elevou a barra a 375 pontos para ambas as disciplinas. Com isso o porcentual de alunos com aprendizado adequado por cada um dos critérios se mostra bem diferente. No Todos Pela Educação, 29,1% dos alunos do terceiro ano do ensino médio teriam aprendido o adequado em Língua Portuguesa e 9,1% em Matemática. Já para o MEC, esses porcentuais cairiam drasticamente: 1,6% em Língua Portuguesa e 4,5% em Matemática.
Outro aspecto que chama a atenção é que, pelo critério do MEC, ficou mais difícil para o aluno conquistar uma boa pontuação em Língua Portuguesa. Quando foi criada a escala Saeb se padronizaram os resultados de Português e Matemática com o mesmo valor: 250. No entanto, apesar de terem o mesmo valor, entendia-se que os alunos dominavam menos Matemática, isto é, apesar de igual, a média 250 em Matemática representava um nível de conhecimento menor. Então, para o Todos pela Educação, a fim de ter um aprendizado adequado em Matemática no nono ano eram necessários 300 pontos, ante 275 em Português. Para o MEC, essa diferença não é necessária. A régua para ambas as disciplinas está padronizada no mesmo valor: 350.
Mas, afinal, quais os problemas desse novo critério do Ministério da Educação?
O problema não é mudar o critério nem torná-lo mais exigente. A questão é que não está claro o que fundamenta essa “régua mais alta”. Além disso, há um evidente descasamento com as referências usadas por especialistas, técnicos e formuladores de políticas públicas, que têm sido amplamente utilizadas no Brasil e servem para fazermos comparações históricas. Por exemplo, entendermos quanto um município ou Estado avançou ao longo de diferentes edições do Saeb.
Os atuais resultados sugerem um cenário ainda pior. Se apenas 1,6% dos alunos aprendem o adequado em Língua Portuguesa, que é tão importante para o entendimento de outras disciplinas, pode-se, então, dizer que, para o MEC, a educação brasileira está um verdadeiro caos. Essa interpretação pode ser muito desestimulante para municípios que conseguiram avanços importantes nos últimos anos.
Um bom exemplo é o de Sobral, que constantemente é usado como referência. O ano de 2017, de acordo com o critério do Todos Pela Educação, seria o primeiro em que a cidade cearense teria conseguido 70% dos alunos com aprendizado adequado (79,8% em Língua Portuguesa e 74,5% em Matemática), meta do movimento para 2021. No entanto, se considerarmos o critério do MEC, apenas 13,4% dos alunos demonstraram aprendizado adequado em Língua Portuguesa e 38,5% em Matemática. Além dessa diferença muito expressiva, o município estaria muito melhor em Matemática, o que é difícil de explicar por todo o trabalho de referência feito em leitura.
Além do desestímulo, a mudança de critério sem esclarecimentos causa grande confusão para jornalistas, educadores e gestores. Os resultados positivos comemorados no passado não eram positivos? O que era adequado não é mais? O que conceituados especialistas sugeriam antes eram critérios com baixas expectativas? Difícil de acreditar que eles tenham errado por tamanha diferença.
A educação brasileira tem grandes, complexos e urgentes desafios. Ninguém discorda. É uma pena, portanto, a divulgação de uma metodologia nova sem esclarecimentos, gerando confusão na análise de resultados. Há que considerar o efeito sobre as políticas públicas, principalmente nos Estados, onde os resultados não são animadores. Gostaríamos de discutir neste texto evidências que podem apontar caminhos para a melhoria dos resultados. Mas para isso precisamos entender onde os alunos estão, o que sabem e o que não. E isso só pode ser feito com diagnósticos divulgados de forma fundamentada, consistente e transparente.
*RESPECTIVAMENTE, DIRETOR-FUNDADOR DO INTERDISCIPLINARIDADE E EVIDÊNCIAS NO DEBATE EDUCACIONAL (IEDE); E PROFESSOR DO INSPER, MEMBRO DO COMITÊ TÉCNICO DO IEDE
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