sábado, 3 de agosto de 2013

Pobres filhos de Francisco

GUILHERME FIÚZA
O GLOBO


O governo do PT montou em dez anos uma orgia de gastos públicos sem precedentes — e sem investimentos, sem projetos. A inflação é o efeito colateral mais visível desse golpe


O Brasil sofre de orfandade crônica. Está sempre procurando um pai. De repente o país saiu às ruas, indignado. Parecia ter finalmente entendido que seus problemas não se resolvem com a aclamação de bonzinhos profissionais, e seus melodramas de esquerda. A popularidade dos governantes despencou. O povo sentira o colapso administrativo do populismo, e queria ação. Aí chegou o Papa Francisco.

Milhões de brasileiros saíram às ruas novamente, e o resto do país grudou na tela da TV. O povo revoltado com o império do blá-blá-blá estava, agora, derretido com as palavras bondosas de Francisco. Euforia geral: papai chegou. Vejam como o Papa é simples! Notem como é despojado, com seu carro modesto de janela aberta! Olhem o Papa preso no engarrafamento, sem medo do povo! Vivam os novos tempos!

É comovente ver um povo se lambuzar todo com essas esmolas de esperança.

Esmolas valiosas, aliás, para os profissionais da bondade que andavam chamuscados. Até a presidente da Argentina veio tirar foto com o sorridente Francisco em Copacabana. Cristina Kirchner acaba de vitaminar sua ditadura do bem, com poderes de intervenção estatal na mídia, enquanto sua foto com o Papa bonzinho circula em material de propaganda por todo o país. Como é barato lavar uma reputação...

Dilma Rousseff sabe disso, e também não perdeu a pechincha de Francisco: pegando uma carona na aura imaculada do santo homem, despejou um discurso petista daqueles mais satânicos, cheio de autoexaltações paranoicas e fraudes retóricas convictas. Dilma disse que as manifestações de rua são sinal de dez anos de êxito do PT. E o Papa ouviu sorridente. Deus abençoe a cara de pau.

O desfile de simplicidade e despojamento de Francisco, que custou uns 300 milhões de reais ao contribuinte, foi uma bênção para o governo popular. Não há mau humor no Brasil que sobreviva ao carnaval, e a micareta cristã veio a calhar.

Como se sabe, os brasileiros acham que ajuntamento de gente é sinônimo de grandiosidade. Da mesma forma que as passeatas contra tudo (e contra nada) foram saudadas como um novo Maio de 68, as multidões que atravancaram o cotidiano carioca em torno de Sua Santidade viraram o “show da fé”, o alvorecer da boa vontade franciscana etc. De muvuca em muvuca, de mistificação em mistificação, o país vai caminhando epicamente para lugar nenhum.

Recitando sua cartilha progressista, Francisco declarou que não gosta de jovem que não protesta. Pronto: quem mandou você, estudante alienado que só pensa em estudar, ficar em casa? Está excomungado. Por que não fez como o jovem que foi à passeata em Belo Horizonte com um cartaz pedindo “Jô titular!” — um brado indignado para que Felipão escalasse o artilheiro do Atlético-MG? Esse não vai para a lista negra do Papa.

Assim é o populismo: calcula o que a multidão quer ouvir e manda bala. “Se uma pessoa é gay, busca Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?”, disse Francisco, levando à apoteose o presépio progressista. Bem, vamos ajudar esse Papa simpaticíssimo e responder quem é ele: é o representante máximo de uma religião que não tolera as relações homossexuais. Caberia então perguntar ao novo Papa: está propondo uma mudança radical na doutrina do catolicismo? Está indicando que a Igreja deverá aceitar o sexo entre iguais, portanto sem fins reprodutivos?

Se o Papa responder que sim, estaremos diante de uma revolução. Mas se ele não responder — e ele jamais responderá —, a declaração sobre os gays terá sido só uma frase de efeito. Um truque político.

O Brasil revoltado que foi às ruas e invadiu palácios deveria estar farto de truques políticos. Deveria estar farto, ou ao menos desconfiado, de líderes que trazem o paraíso na garganta. As manifestações estouraram porque a vida piorou. E a vida piorou por causa do “show da fé” numa administração fajuta, disfarçada por alegorias e bandeirolas progressistas.

O governo do PT montou em dez anos uma orgia de gastos públicos sem precedentes — e sem investimentos, sem projetos, pura alimentação do parasitismo político. A inflação é o efeito colateral mais visível desse golpe. Mas Dilma acaba de declarar, tranquilamente, que a sua Disneylândia de ministérios não afeta as contas públicas. E que a inflação era um problema no governo Fernando Henrique, não no de Lula e no seu. O PT é especialista em falsidade ideológica por falta de contraditório. Tudo cola. A mentira progressista tem perna longa — pelo menos mais longa que a dos manifestantes ninja, que andam muito e nunca chegam.

Acaba de sair novo relatório de superfaturamento milionário no Dnit — aquele mesmo Dnit que levou à queda do ministro dos Transportes, na famosa faxina de Dilma. Isto é: a ordenha prossegue normalmente. Onde está a mídia ninja? Melhor rezar para Francisco.
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Um comentário:

  1. As nações estão carentes de heróis, que vale "endeusar" um ser humano que tenha a grande coragem de andar entre o povo e mostrar-lhes que não precisam ser tratados como feras, prontas para devorar uma celebridade. Mas por que precisamos tanto de um ícone? Por que não nos bastamos? Mas venha Francisco!!! Mostre, ensine que podemos acima de tudo sermos BONS!! Um grande abraço Margarete Jaira

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