SETE SINAIS DE SUB-DESENVOLVIMENTO
Jornal da Tarde 15 novembro de 1999
J.O. de Meira Penna
Há alguns anos escrevi um artigo, sob este mesmo tema, sugerindo uma maneira de se empreender um tratamento sintomático do sub-desenvolvimento. Há certos traços universais de comportamento popular corriqueiro que nos permitem aquilatar imediatamente se qualquer cidade ou país é do Primeiro ou do Terceiro Mundo. Vejam sete exemplos:
1) Falta de respeito pelas passagens de pedestres (zebras) nas ruas de grande movimento. Nos países do 3º Mundo o automóvel é ainda um sinal de status, como o cavalo da antiga nobreza. Na hierarquia do subdesenvolvimento, o pedestre é um ser desprezível que pode, impunemente, ser atropelado quando atravessa a rua;
2) Correlato desse comportamento, surge o alto índice de acidentes de tráfego. Temos a triste honra de registrarmos um record mundial nesse particular, não obstante o recente Código de Trânsito
3) Vandalismo nos bens públicos, "orelhões", bancos de jardim, poltronas de cinema, assentos de ônibus, sinais de trânsito etc. O direito de propriedade é pouco respeitado, quer seja público, quer privado;
4) Sujeira nos lavatórios públicos. A limpeza vai melhorando à medida que nos encaminhamos para o Sul do país. A linha divisória, entre "os dois Brasís" de que falava Jacques Lambert, passa por S. Paulo. O triunfo do Sujismundo nas ruas e outras áreas coletivas corresponde, nos trópicos, à limpeza dos corpos, ao contrário do que ocorre na Europa onde o hábito do banho foi, outrora, coibido pelo puritanismo cristão;
5) A ausência comum de troco nas pequenas transações é sinal de falta de previdência ou, comumente, da presença de inflação. Ninguém pensa a longo-prazo. Raros são os previdentes e, por conseguinte, reduzida a poupança. A dificuldade no câmbio é outro indicio de economia primitiva. Nos países de moeda "séria" ou conversível, o câmbio é uma operação banal de cambista, sem qualquer intervenção burocrática. Em áreas atrasadas que só produzem latifundiários, pobres, padres, mafiosos, políticos e mães prolíficas, o câmbio de moeda é acompanhado de muito palavreado, de papelada, assinaturas, conversa fiada e cantoria;
6) A descortesia no atendimento em repartição pública, vigorante nos países sub-desenvolvidos, revela a burocracia como uma classe patrimonialista arrogante, preguiçosa e inepta que considera os cidadãos privados, contribuintes, como o proletariado a ser explorado. As filas intermináveis diante dos guichês são um indicador poderoso da existência da antiquíssima Nova Classe patrimonialista...
7) A ausência de informação pública, como por exemplo sinais de trânsito ou indicações de destinação nas avenidas e estradas, é muito característico. Quando viajamos na América do Norte e Europa ocidental, só precisamos de um simples mapa, sem nos perder ou indagar o caminho a nativos desconhecidos. Ao sul dos Alpes, dos Pirineus ou do Rio Grande do Texas, muda a situação: Você sempre corre o risco de extraviar-se. Na Ilha da Fantasia que é a capital do país e cidade de intensa imigração, só se vislumbram endereços ou indicações precárias ou herméticas sobre ruas, avenidas, bairros e logradouros públicos importantes. O fenômeno é um indício grave do pouco apreço que dedicamos à Informação e ao conhecimento em geral.
A democracia liberal moderna é aquela que distribui igualmente pela população os serviços e informações que todo cidadão tem o direito de obter e o dever de respeitar. Ora, como se pode obedecer às leis e regulamentos quando eles existem aos milhares, podem “não pegar”, são confusos, contraditórios, incoerentes e deliberadamente mal redigidos para favorecer grupos corporativos interessado? Civismo de parte da cidadania e eficiência de parte do governo é o que se pede... A observação conclusiva é que, nos países do Terceiro Mundo os indivíduos podem ser muito espertos e inteligentes, a coletividade é invariavelmente burra. Povo pobre é povo burro, dizia o admirável aforismo de Gilberto Amado. O que distingue o Terceiro Mundo do Primeiro é que ele não passou pela Idade da Razão. Não foi influenciado por Descartes que salientava a clareza e a precisão como Métodos para Bem Conduzir o Pensamento. No Terceiro Mundo a gente não gosta de pensar. Menos ainda pensar racional e praticamente sobre a relação de causa e efeito. O conhecimento e a informação são deixados a uma pequena minoria de "intelectuais" que o monopolizam para, com isso, adquirir poder e prestígio.
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