A mão de obra desempregada, subempregada ou mantida à margem do mercado de trabalho é raramente analisada como um fator de produção ocioso
O Estado de S.Paulo - 17 Agosto 2018
O maior desperdício cometido no Brasil é também o mais cruel. É a subutilização de 27,64 milhões de pessoas, ou 24,60% da força de trabalho, um enorme recurso produtivo em parte paralisado e em parte utilizado muito abaixo de seu potencial. A noção de capacidade ociosa é quase sempre associada, quando se analisam as condições da economia, a máquinas e equipamentos parados nas fábricas, nas fazendas e em outras unidades de produção. A mão de obra desempregada, subempregada ou mantida à margem do mercado de trabalho é raramente analisada como um fator de produção ocioso e, sob esse aspecto, comparável, portanto, ao capital físico paralisado.
Em junho, a mão de obra subutilizada incluía 12,96 milhões de desempregados, 6,51 milhões de indivíduos ocupados em jornadas insuficientes e 5,39 milhões de integrantes da força de trabalho potencial. Esta última parcela corresponde a pessoas fora do mercado apesar de terem idade e condições para produzir.
A porcentagem de mão de obra subutilizada ficou estável entre o primeiro e o segundo trimestres deste ano. No período de abril a junho foi maior, no entanto, que em igual período de 2017, quando esse contingente correspondia a 23,80% da força de trabalho total, formada pela soma das pessoas no mercado e daquelas potencialmente empregáveis. Neste grupo se encontram algumas das experiências mais dramáticas. A mão de obra potencial é formada por indivíduos dispostos a ingressar na população ativa e pelos desalentados. Estes desistiram, pelo menos por algum tempo, de participar do mercado por causa de condições muito adversas.
O aumento dos desalentados - de 4 milhões para 4,8 milhões entre o segundo trimestre de 2017 e o segundo deste ano - é um dos indicadores mais claros do emperramento do mercado de emprego apesar da recuperação, mesmo lenta, da atividade econômica.
Esse emperramento é um dos sinais mais fortes e mais preocupantes da insegurança dos empresários. Mesmo quando revelam algum otimismo quanto à evolução dos negócios, eles mostram pouca disposição para contratar pessoal e para investir em máquinas, equipamentos e instalações. Essa cautela tem sido mostrada seguidamente em levantamentos da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
A fabricação de bens de capital, isto é, de máquinas e equipamentos, tem sido uma das atividades industriais com maior crescimento desde o ano passado, mas isso se explica basicamente como recuperação depois de uma longa fase de retração. Boa parte das compras, é razoável supor, deve ser destinada à reposição e à substituição de bens depreciados ou desatualizados.
De modo geral, a indústria ainda tem de colocar em operação um grande número de máquinas e equipamentos antes de cuidar de novos investimentos. Em junho, a indústria operou com 76,7% da capacidade instalada, nível pouco inferior ao de um ano antes (77,2%), segundo a CNI. Mais investimentos poderiam movimentar um número importante de fábricas fornecedoras de bens de capital e de insumos básicos, mas para investir mais os dirigentes de empresas precisariam de maior confiança e de visão mais clara do futuro, algo muito difícil diante da enorme incerteza política.
Mais contratações também teriam múltiplas consequências positivas. A mais evidente seria a melhora das condições de vida de milhões de pessoas e de famílias assoladas pelo desemprego e pela subutilização da mão de obra. Mais contratações permitiriam maior consumo e maior impulso à produção de bens e serviços. Isso produziria um ciclo virtuoso.
Mas também as contratações dependem da confiança empresarial. Hoje as incertezas são ligadas basicamente às eleições. Para bem avaliar o quadro convém lembrar mais um ponto: desemprego prolongado pode afetar a qualificação. Os desempregados por mais de dois anos eram 3,16 milhões no segundo trimestre. Como se enfrenta uma entrevista de emprego depois de tanto tempo fora da atividade?
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