segunda-feira, 6 de julho de 2009

HOMO HOMINI LUPUS

Breves considerações sobre a perversidade humana.

“O homem é um lobo para seu semelhante.”
César em discurso no Senado Romano.

Os dias atuais têm mostrado à nossa sociedade níveis assustadores de violência. Esteja ela nos presídios, ruas, vizinhanças ou mesmo lares, se apresenta de forma aterradora e desconcertante, dado, muitas vezes, os motivos fúteis que a desencadearam.
Talvez a mídia, no afã de produzir uma estrela... nova estrela, para essa peça danteana sobre a condição humana... ou melhor, sobre a “divina comédia humana” - dada a nossa pretensa semelhança com Deus- esteja avultando uma realidade que faz parte do dia-a-dia das sociedades ao longo da história das civilizações.
Barbar Tuchman, historiadora americana, em seus fascinante livro sobre as decisões insensatas de governantes e generais do passado, questiona a perversidade desnecessária dos conquistadores sobre as populações subjugadas. Inclui também as expedições sob o manto da Inquisição, onde pessoas pereceram à guisa de uma clarificação espiritual e religiosa.
A compensação das tropas recrutadas pela coroa espanhola, em apoio às expedições dos papas e cardeais, nas Cruzadas, no intuito de levar o evangelhos aos novos e ignóbeis povos, incluía o domínio total sobre pequenos povoados, permitindo-se a escravidão, o estupro e a morte. Têm-se aí o extermínio de mais de 20.000 pessoas no sul da França, sob a égide do papa Inocêncio III. Haveria necessidade?
Um jornalista americano, ao fazer um levantamento sobre a Segunda Guerra, escreveu um livro, próximo a 1958, chamado “The evil inside us.” – A maldade dentro de nós-. Naquela oportunidade ele discorre sobre a virulenta modificação de comportamento dos soldados alemães, e também cidadãos, a maioria de formação luterana, sobre soldados e populações dos países, fossem eles capturados ou capitulados. Haveria necessidade de carnificina sobre desarmados?
James Bacque, jornalista canadense, por outro lado, aponta a mesma violência, em seus livros “Other Losses”- Outras Perdas- e “Crimes and Mercies”- Crimes e Perdões- dessa vez por parte de tropas americanas e cidadãos franceses, sobre os civis e soldados alemães, presos nos campos de concentração ou retirados das caravanas quando em transferência entre campos, e linchados, havendo a conivente aquiescência de generais americanos e aliados, que fechavam os olhos e comemoravam a “justiça” feita fora dos campos de batalha, bem como a economia de recursos para a manutenção dos prisioneiros.
Henry Morgenteau, secretário do Tesouro Americano, desenvolveu um plano, ainda em 1944, que tornaria o solo da Alemanha estéril e aniquilaria a indústria daquele país. De acordo com relatórios arquivados na Biblioteca do Congresso, mais de cinco milhões de pessoas pereceram de fome nos anos de 45, após o armistício, até 1950. O plano Morgenteau teve a aquiescência de Franklin Delano Roosvelt e Henry Truman, dois ícones de retidão e defesa da democracia e igualdade dos povos. Haveria necessidade de se exterminar também velhos, mulheres e crianças?
Maquiavel alertava o príncipe para não utilizar-se de violência desnecessária sobre os povos conquistados, a fim de não gerar a ira, permitindo-lhe uma dominação até “desejada” por parte daqueles de menor desenvolvimento econômico e bélico.
A violência vem coexistindo entre populações israelenses e palestinas desde a formação do Estado de Israel, para se considerar apenas o momento contemporâneo. Os motivos para alguns podem ser fúteis, para aqueles é religioso e étnico. A prevalência da raça e da crença individualizada em Deus está acima da cidadania, da cortesia, do perdão.
Livres da ameaça alemã e da tirania do jugo comunista, o mundo assistiu, estarrecido, na guerra da Bósnia civis maltratarem, estuprarem, cegarem e martirizarem cidadãos muçulmanos e croatas, em nome da limpeza étnica. Isso deu-se em contrapartida aos mesmos sofrimentos aplicados, no passado, aos “justiceiros” pelos, agora, sofredores.
Serra Leoa, Timor Leste e Caximira, região disputada entre Índia e Paquistão, são exemplos recentes de como o homem pode massacrar o semelhante, ainda por motivo fútil para nós, “desenvolvidos” e justificáveis para eles.
Buscamos a razão do ódio dentro do comportamento aceitável de uma conjunção social, mesmo que efêmera, que ampara os atos brutais contra as ameaças ao nosso credo ou ponto de vista.
Muitos mártires sucumbiram na mãos de assassinos que acreditavam estar causando um bem, uma justiça. Gandhi, Martin Luther King, Indira Gandhi, dentre muitos são remarcáveis exemplos.
O povo americano foi privado de seu maior pacificador, que conseguiu unificar uma nação dividida pela guerra de secessão, que tinha como mote, até reconhecido pelo Congresso, o direito à posse de homens como escravos, com toda a justificável violência conseqüente. Lincohn sucumbiu a um tiro, dado pelas costas, por um “agente da liberdade” que correu, feliz e regozijado, após o feito, entre as cadeiras do teatro, bradando: “Sic semper tiranus!!!”- Abaixo a tirania!!!... De quem?!
Para o homem de moral e espírito fraco, a distância entre a retidão e tirania era ditada pela oportunidade. Um ditado popular nos diz que a “oportunidade faz o ladrão”, enfim, faz-nos sucumbir a maldade.
Estamos, então, lidando com o homem, o ser humano, o racional, superior aos demais seres vivos na Terra. Ele produz a violência desnecessária.
A percepção de que a violência é fruto, somente, de falta de educação e desemprego cai por terra nos exemplos de crimes recentes e também do passado, mostrando-nos que o agressor surge das mais variadas castas sociais, matizes ideológicas e níveis econômicos.
Temos, também, que aceitar a dimensão da nossa falha “humanidade”, que se escora na vertente racional de nosso ser, que nada mais faz do que desenvolver métodos sofisticados de sofrimento alheio.
Temos que perceber que somos humanos, falíveis, tentáveis e efêmeros.
Temos, então, que rogar por força nas orações para impedir a fraqueza de nosso espírito, quando tivermos a prevalência sobre o semelhante, a fim de coibir que a vilania aflore, e venha a ser justificada pela justiça humana.
A busca da razão da violência não se encerra no elemento externo à nossa vontade. Também não reside nas aludidas entidades espirituais maléficas que nos dominam em momentos de fraqueza espiritual, ou quando nossa “razão” é entorpecida por qualquer agente estranho, seja ele a bebida ou o ritual de cânticos ensandecidos, verificados em gangues de ruas ou torcidas organizadas.
Motivos existirão lá fora e coexistirão em nosso espírito...sem luz e enfraquecido, não importando o nível intelectual que tenhamos atingido. Devemos vigiar e orar para que não nos tornemos presas da oportunidade justificável.
César, em discurso no plenário do Senado Romano, fazia um balanço das conquistas de seus exércitos ao mesmo tempo em que relatava os costumes sociais e religiosos com os quais se deparavam. Terminou sua preleção com uma frase que se tornou provérbio: “Homo Homini Lupus”, o homem é um lobo para seu semelhante.
Ao perceber, em outra ocasião, a iminente morte vinda pelas mãos de seu fiel lugar-tenente Brutus, divaga sobre a existência do ódio e violência entre os seres humanos ao responder ao seu algoz numa pergunta dissuasiva sobre a dita revolta dos súditos:
“A maldade, caro Brutus, não está nas estrelas, mas em nós, simples lacaios.”

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