terça-feira, 28 de maio de 2013

O outro custo Brasil

Este economista especializado em educação faz uma precisa análise de nossa atual dificuldade em tornarmo-nos mundialmente competitivos. 
Vale a pena a leitura e difusão.


O outro custo Brasil
Cláudio de Moura Castro
Veja 


 Os macroeconomistas não se cansam de denunciar o custo Brasil: trapalhadas na laxa de câmbio, juros altos, transportes precários, burocracia asfixiante. CLT atrasada e por aí afora. Mas não é só isso. As indústrias grandes, balizadas pelo mercado internacional, tendem a ser eficientes e produtivas. É o caso dos automóveis, aviões e produtos em que empresas de Primeiro Mundo trazem os projetos ou impõem a qualidade. Mas observo o meu cotidiano e noto a presença insidiosa de outro custo Brasil, ou seja. a mediocridade insuportável de parte significativa do nosso parque industrial. Cercam-nos de produtos de qualidade lastimável.

 A história explica. Quando se abrem os portos, as importações invadem o país. Sem condições mínimas de competir, as tentativas de fabricação eram afogadas pelas importações baratas. Salvaram-nos aos debates internacionais, que criaram condições para produzir localmente. São as duas grandes guerras e a crise de 1929.

 No pós-guerra, criam-se proteções e reservas de mercado para nossas manufaturas, diante da invasão dos importados. Graças a elas, houve continuidade na industrialização, com a fabricação de uma gama extraordinariamente ampla de produtos. Nas indústrias melhores, criam-se padrões de desenho, engenharia e qualidade. Mas a reserva teve como efeito colateral habituar os brasileiros a muitos produtos sem qualidade, feitos por uma industriazinha de roça.

 Note-se o contraste com países da Ásia (Japão. Coreia do Sul. Taiwan e China) cuja indústria já foi criada para exportar. Portanto, seu primeiro desafio é oferecer uma boa relação entre o preço e a qualidade no mercado internacional. Assim sendo. os consumidores domésticos recebem o que passou pelo crivo dos europeus e americanos.Como a avassaladora maioria dos nossos produtos industriais não cruza fronteiras, o consumidor fica à mercê da mediocridade das pequenas fabricações.

 Vejamos os exemplos. O controle remoto do portão já vem de fábrica funcionando precariamente. Cai ou enferruja o cabo da vassoura. Enguiça o mecanismo para elevar o assento da cadeira de escritório. A ducha higiênica vaza. O sol derreteu a fibra da parte de baixo do meu aquecedor solar (e o conserto foi porcalhão). Fui ver um chinês, que me pareceu muito mais bem construído.

 Comprei várias luminárias residenciais. Ao desmontá-las, vi que as chinesas, de mesmo preço, têm uma engenharia melhor e o acabamento é superior (copiaram dos americanos?). As nossas são mal pensadas, pois o fio precisa ir aonde não quer. Custa trabalho e paciência convencê-lo. Com o calor da lâmpada, partiu-se o vidro de uma que havia no teto da sala, e ela desabou em mil pedaços. Algumas há com parafusos cuja fenda é rasa e larga demais, desafiando as chaves de fenda.

 Pode ser impressão minha, mas acho que o prego americano é um pouquinho melhor que o local. O plástico injetado tem rebarbas. Enferrujam os parafusos sujeitos ao tempo. Nos que fazem os serralheiros, o local da solda sempre enferruja. Isso para não falar nas lajes que vazam e nos azulejos que despencam da fachada dos prédios. Se fosse possível importar casas da China, nossa construção civil ruiria. Muitos dos nossos produtos são mais caros, piores ou ambos.

 O que fazer? Em primeiro lugar, tomar consciência de que nossa produção tende a ser de péssima qualidade (e vivam as exceções). Nem é problema de design, é desenho mesmo, antes de quaisquer pretensões estéticas. Mas ambos precisam de tônicos fortes. Não basta o Sebrae cuidar da gestão da empresa. Justificam-se políticas de certificação e apoio público para promover a qualidade. E, também, não esquecer os anabolizantes para a raquítica educação dos fabricantes.

 A concorrência é um santo remédio. No caso dos veículos, deu um jeito nas nossas "carroças"". Precisamos muito dela. mas na dosimetria certa, para o paciente não morrer do remédio. E há a grande lição dos orientais: copiar de quem sabe fazer. Todos imitaram sem pejo. Primeiro fazem igual, depois fazem melhor.

 Uma sugestão: todo industrial que vai à Disney deveria passar vários dias nas lojas de ferragens da vizinhança, comprando produtos parecidos com os que fabrica — para desmontá-los, ao chegar em casa. Quem sabe o governo financia a viagem?
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