terça-feira, 15 de julho de 2014

Panóptico corporativo

Empresas adotam arranjos com espaços abertos em seus escritórios e alguns efeitos colaterais podem ser infaustos
por Thomaz Wood Jr.  


Eles vêm aos milhares. Nas primeiras horas da manhã é possível vê-los caminhando em caravanas, deixando as estações metroviárias ou descendo dos coletivos. Alguns, mais jovens, tentam a sorte no trânsito com suas bicicletas. Os mais graduados chegam de carro e desaparecem nos subterrâneos das torres de vidro. O destino é um só: os escritórios das grandes corporações, onipresentes em nossa paisagem econômica.

Até o século XIX, trabalhar era cuidar das coisas da terra. A Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra, tirou homens, mulheres e crianças do campo e os trouxe para os galpões insalubres das fábricas. O século XX testemunhou outra grande migração laboral, dessa vez das fábricas para os escritórios.

Passamos dez, 12 horas por dia em escritórios. Eles se tornaram nossas cavernas do dia, a nos proteger das intempéries e a nos impor patologias. Além de abrigar e obrigar o trabalho, os escritórios são também sinalizadores de status: a localização, os móveis e a decoração dos postos de trabalho revelam quem é centro e quem é periferia na organização.

Para as empresas, o porte e a forma dos escritórios respondem a uma questão básica: como colocar o maior número de pessoas no menor espaço possível, mantendo o melhor nível de controle, sem, no entanto, prejudicar a produtividade? Comprimir centenas de funcionários em pequenos espaços pode ser tentador, mas pode gerar impacto negativo sobre a qualidade do trabalho realizado. É preciso buscar o equilíbrio.

No livro Cubeb: A secret history of the workplace, o jovem autor Nikil Saval explora as origens e a história dos cubículos, ou baias, nas quais grande parte de nós hoje trabalha. Saval observa que o design de um escritório pode exprimir relações de hierarquia, controle e autoridade. Lembra que a origem dos cubículos data da década de 1960, obra do designer Robert Prost, que buscava um arranjo flexível, que favorecesse a autonomia e a liberdade de ação.


A intenção era boa, porém, as empresas viram no modelo uma solução econômica para empacotar seus funcionários menos graduados em pequenos espaços. O autor explica que, por diversos motivos, incluindo as tirinhas satíricas de Scott Adams, as baias passaram a ser associadas com tudo de ruim que pode ocorrer no trabalho: impessoalidade, falta de sentido, frustração e as mais diversas doenças ocupacionais.

Agora, uma nova mudança está em curso. Há alguns anos, grandes empresas descartaram suas baias em prol de um novo (ou não tão novo) modelo: os escritórios abertos. Maria Konnikova, em texto veiculado no início de janeiro de 2014 no website da revista The New Yorker, apresenta interessante compilação de estudos científicos sobre a vida e o trabalho nos escritórios abertos.

Em um levantamento baseado em mais de cem estudos realizados sobre o trabalho em escritórios, o psicólogo Matthew Davis concluiu que, embora os arranjos abertos promovam entre os funcionários senso de propósito e sensação de pertencer a uma organização moderna, o modelo reduz a capacidade de concentração, inibe a criatividade e reduz a satisfação no trabalho.

Uma pesquisa feita por psicólogos da Universidade de Calgary em uma empresa canadense concluiu que a mudança para um arranjo aberto fez com que os profissionais se sentissem mais distantes uns dos outros, insatisfeitos e ressentidos, provocando queda na produtividade.

Além do desempenho e da produtividade, a saúde dos indivíduos também é afetada. Um estudo realizado na Dinamarca, por Jan Pejtersen e colaboradores, revelou que, quanto maior o número de pessoas trabalhando em um único ambiente, maior a quantidade de funcionários que tiram licença por motivos de saúde.

Konnikova observa que barreiras físicas provêm sensação de privacidade, o que favorece o desempenho. Espaços abertos retiram a capacidade de os indivíduos controlarem seu próprio ambiente, gerando insegurança e prejudicando o resultado. Nem mesmo os profissionais mais jovens, frequentemente entusiastas dos escritórios abertos, acostumados a distrações e a trabalhar em regime de multitarefa, são capazes de evitar as consequências adversas do arranjo aberto. A busca das empresas pelo panóptico ideal para controlar corpos e mentes ainda não chegou ao capítulo final.
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