segunda-feira, 4 de junho de 2012

O protecionismo brasileiro



O Estado de S.Paulo

Indústrias instaladas na Zona Franca de Manaus (ZFM) vinham reivindicando há algum tempo uma proteção para produtos ali fabricados, sob o pretexto de que uma "invasão" de similares importados poderia levar a um desemprego em massa na região. O lobby foi suficientemente forte para que o governo federal baixasse o Decreto 7.741, em 31 de maio, elevando para 35% as alíquotas do IPI sobre motocicletas, aparelhos de micro-ondas e de ar-condicionado importados e nacionais, com exceção dos produzidos na ZFM, onde se concentram 90% da produção brasileira desses itens. Ou seja, produtos similares aos da lista, que forem fabricados em São Paulo ou no Rio Grande do Sul, receberão o tratamento tributário dado a produtos chineses ou tailandeses - e isso para "proteger" as ineficiências produtivas da Zona Franca de Manaus.

Medidas tomadas para defender a indústria instalada no País da concorrência externa dificilmente ficam limitadas a um setor ou a poucos setores. O aumento da alíquota do IPI em benefício da ZFM toma como precedente a elevação, em setembro do ano passado, de 30 pontos porcentuais da alíquota desse tributo sobre automóveis que não tivessem um conteúdo nacional de 65%, englobando todos os carros importados, com exceção daqueles produzidos em países com os quais o Brasil mantém acordos automotivos. O objetivo era declaradamente proteger toda uma cadeia produtiva, favorecendo a produção de componentes, partes e peças de veículos no País.

Acontece, porém, que os insumos destinados à industrialização na ZFM são beneficiados por uma redução de 88% do imposto de importação. Ou seja, a taxação sobre produtos acabados, agora concedida, não tem nada a ver com os materiais que os compõem.

E, pior, age em detrimento de produtores de outras regiões do País. Além do subsídio da tarifa alfandegária, restituição de impostos estaduais, variando de 55% a 100%, isenção do IPTU e taxas de serviços municipais, as indústrias instaladas na ZFM podem gozar de redução de 75% do Imposto de Renda Pessoa Jurídica, inclusive adicionais de empreendimento considerados como prioritários para o desenvolvimento regional, calculado sobre o Lucro de Exploração até 2013 e isenção de PIS/Pasep e da Cofins nas operações internas. Os produtos montados naquela área estão também isentos do IPI. Isso contradiz a informação, que chegou a ser divulgada na semana passada, de que as motos, micro-ondas e aparelhos de ar-condicionado originários da ZFM "continuariam" pagando o imposto à razão de 20%.

Seja como for, este não parece ser um problema de difícil solução. Depois de ter taxado a importação de automóveis, o governo ainda há pouco isentou ou reduziu substancialmente o IPI para carros novos produzidos no País até o fim de agosto deste ano, como forma de estimular a demanda e "puxar" o crescimento econômico. O mesmo pode ser feito para motos, micro-ondas e aparelhos de ar-condicionado, para acelerar o ritmo de atividade pela via do consumo.

Como contrapeso a essas desonerações, o governo decidiu, igualmente em 31 de maio, corrigir para cima a tabela de incidência do IPI sobre as chamadas bebidas frias, como cerveja, refrigerantes e água. Esta seria uma forma de compensar os cortes de impostos por meio do Plano Brasil Maior, declaradamente destinado a estimular a competitividade da indústria nacional.

As coisas não vão parar por aí. Como O Globo noticiou, o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, declarou nessa quarta-feira (dia 30), que o resultado das contas do governo, de janeiro a abril, possibilita a continuidade da política que vem sendo adotada. "O que estamos procurando fazer é manter o (superávit) primário e ativar a economia da melhor forma possível, atacando os principais gargalos", disse ele.

Os resultados são duvidosos, mas uma coisa é certa: a barafunda tributária só tem aumentado no País, que se credencia para conquistar novamente o campeonato mundial do número de horas exigidas para pagar imposto. No ano passado, o País ficou em 1.º lugar no ranking, com 2.600 horas gastas para as empresas cumprirem suas obrigações com o Fisco. Já basta, segundo a ONU, a OMC e a OCDE, o recorde de protecionismo.
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