sábado, 31 de março de 2012

A piada que oprime

O Estado de S.Paulo
Alguns membros de uma jovem geração de comediantes no Brasil perderam o tom. No seu repertório incluíram, entre outras coisas, piadas que relativizam a gravidade do estupro, reciclam clichês pré-abolicionistas, espalham desinformação histórica e repisam estigmas de todo tipo - de classe, de gênero, de feição física, estética, e assim por diante. Piadas, pois, sem muita nuance ou sensibilidade crítica. Parte do público se cansou e, mais atento a essa modalidade de discriminação, passou a denunciar ou até a recorrer às vias judiciais. Embora, ao que parece, tais reações tenham surgido a partir de episódios isolados nos últimos meses, a ocasião suscita, uma vez mais, a pergunta sobre as responsabilidades e os limites do humor (e da profissão de humorista).

A pergunta, de imediato, poderia ser abordada pelo ângulo jurídico. Teríamos, nesse caso, de investigar se há algum choque entre direitos individuais ou coletivos, tanto do humorista quanto daqueles que se sintam afetados pela piada, e resolver o caso concreto a partir desse contraste e ponderação. Essa pergunta, porém, pressupõe outra mais importante e abrangente: numa sociedade comprometida tanto com a proteção da liberdade quanto com a promoção da igualdade, como lidar com a piada discriminatória? Independentemente do que diga a lei, até onde se deve tolerar o humor que fere esses valores? Supondo que nosso dever de tolerância não seja ilimitado, como e quando reagir?

Num mundo imaginário de sujeitos inteiramente autônomos, delega-se tal problema à consciência dos indivíduos e ao debate público. Críticos culturais, jornalistas e cidadãos em geral dariam conta de manter o mau gosto e o preconceito sob controle, sem necessidade de intervenção do aparato legislativo e judicial. Todos seriam igualmente livres para se expressar e as ideias que, eventualmente, resistissem ao escrutínio público e à censura social sobreviveriam. As outras, reprovadas no teste de qualidade, cairiam no esquecimento. O próprio humorista, para se manter relevante, teria de negociar informalmente com o seu público as margens do aceitável. Calibraria, a partir daí, uma medida de autocontenção para não desaparecer nesse livre e exigente mercado de piadas. Em suma, a autorregulação se bastaria.

O pacote da autorregulação do humor e da comunicação social não é só um devaneio teórico. Ao contrário, cumpre papel crucial nas interações cotidianas. Apesar disso, praticamente nenhuma democracia liberal o comprou por inteiro. Descrentes da capacidade de a "mão invisível" prevenir violações e abusos de direitos, sistemas jurídicos tiveram de aparar as arestas. Perceberam, por exemplo, que, em nome de valores como a dignidade, seria desejável prever sanções contra abusos da liberdade de expressão, como os tipificados pelo que chamamos de "crimes contra a honra" (a calúnia, a injúria ou a difamação).

Outros sistemas jurídicos, entre eles a maioria das democracias contemporâneas, não pararam por aí. Ao notarem que o abuso da liberdade de expressão, mais do que ofender a honra de indivíduos particulares, pode também silenciar ainda mais os grupos em situação de exclusão estrutural, passaram a coibir práticas discriminatórias em sentido mais amplo. Entenderam que a promoção da igualdade de status requer o combate ativo à exclusão não apenas socioeconômica, mas também simbólica. Certos grupos vulneráveis e sistematicamente privados de canais de expressão receberam essa proteção adicional (como os negros no Brasil, por meio da lei que sanciona o racismo).

Tais normas jurídicas não impõem restrições à liberdade apenas para proteger outros valores, não a subordinam a outros direitos supostamente mais importantes. Preocupam-se, antes de tudo, em preservar as mínimas condições sociais em que a própria liberdade possa ser exercida. Voltando ao caso deste texto: o ataque verbal ao autorrespeito de pessoas que, por suas próprias circunstâncias e características, já encontram enormes obstáculos para driblar os estigmas que lhes atribuem pode corroer, curiosamente, as condições de tolerância e reciprocidade necessárias para a própria existência do humor.

Os alvos desse estilo de humor são os mais fáceis e previsíveis: as mulheres, os deficientes, os negros, os homossexuais, os gordos, os imigrantes. Não que esses grupos, como tantos outros, não possam servir de matéria-prima para piadas inteligentes. Existe, no entanto, uma diferença entre a piada que oprime, pura e simplesmente, e a piada que convida a um exercício de autoironia, que é engraçada porque estimula os ouvintes a rirem de si mesmos, sem pôr sua própria dignidade em jogo. A linha entre uma coisa e outra não é tão tênue assim.

Na sua obsessão juvenil por serem politicamente "incorretos", alguns humoristas acabam fazendo o oposto. Numa cultura política opressora como a brasileira, nada mais politicamente "correto" e seguro do que se proteger atrás do opressor, nada mais bem-comportado do que falar exatamente o que ele quer ouvir. Não subverte as regras do jogo, não desestabiliza as relações de poder e ofende exatamente aqueles que a nossa História já se encarregou de subjugar. É um tiro no próprio pé.

O humorista, enfim, pode ser um agente de transformação cultural e política ou pode ser exatamente o contrário. A piada pode ajudar a desarmar, ridicularizar e reverter um preconceito, ou pode ser veículo para disseminar um pegajoso discurso de desprezo, disfarçado pelo manto do humor. Praticar o humor do primeiro tipo exige coragem moral, ousadia intelectual e empatia. Dá mais trabalho. Já o segundo se consegue com boa dose de preguiça mental, docilidade política e submissão ao senso comum. Comediantes que deixaram uma herança libertária e emancipatória perseguiram o primeiro caminho. Entre os novos comediantes brasileiros, alguns ainda desconhecem tal diferença. Não são estes que merecem nossa risada.



CONRADO HÜBNER MENDES, é doutor em Direito pela Universidade de Edimburgo (Escócia), doutor em Ciência Política pela USP; é autor do livro 'Direitos Fundamentais, Separação de Poderes e Deliberação' (Saraiva.2011) 
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sexta-feira, 30 de março de 2012

Um diálogo insólito...ou melhor, um papo cabeça.

Uma experiência da qual saí nocauteado. Tenho que me atualizar com urgência.
"Mudou o Natal ou mudei eu??"





- Mas você não se interessa pelas novidades da internet?
- Não, respondi. Por que? Prossegui.
- Você me perguntou o que é um meme. Todo mundo sabe!
- Menos eu. P'ra que serve? É mesmerismo?
- Quê?
- Deixa p'ra lá. P'ra quê saber de tudo na internet?
- P'ra ficar ligado. P'ra não ser alienado. Um monte de razões óbvias. Você assiste tevê?
- Não. Joguei a toalha há algum tempo.
- Por quê? Quié isso cara. Coisa absurda!!
- Não acho. É tudo hoje teatralizado.
- Como assim?
- Ué, já viu os repórteres nos jornais? Já viu os gestos teatrais em cada notícia? 
        Já reparou a mão do microfone e a outra? Já reparou nas pessoas escolhidas para as rápidas entrevistas? 
        Já reparou no editoramento do vídeo?
- Não. 
- Pois é, aliás as notícias também são "selecionadas" e para mim não interessam.
- Como cara, quer ficar alienado?
- Não. Você me acha alienado.
- Claro, quem não assiste televisão e não conhece bem a internet só pode ser alienado.
- Ah! De fato. Reconheço. Bem, o que você acha de sua geração?
- A minha? Bem mais antenada que a sua. Tem nem comparação.
- Tem certeza? Como?
- Ah! Hoje tá todo mundo ligado. Todo mundo se conversando. O que acontece no mundo num instante tá sendo transmitido para todo mundo.
- Ah, você fala da interconectividade.
- Claro, viu o Oriente Médio? 
- O que tem lá?
- Não soube da Primavera Árabe? A revolta contra a ditadura? Todo mundo conectado no Face e no twitter. Todo mundo se organizou e colocou os ditadores para correr?
- Ah, é?  E o Líbia? Estão melhor agora? E a Síria? O ditador tá lá até agora. No Líbia saiu Gaddfi e a facção que está mandando está apertando mais do que antes.
- Ah, nadaver. O cara não se chama Kadafi?
- al-Qaddafi, Kadafi p'ra nós. Aliás "chamava". Ele morreu. O nome dele era Muammar. al-Qaddafi sobrenome emprestado de um título.  Ademais o conflito ali é norte e nordeste da África. No Oriente Médio só a Síria.
- Ah, é a mesma coisa!
- Não, não é. Quem te disse? O Twitter?
- É todo mundo, os jornais, todo mundo.
- Ah, sei. Se eu disser que a revolta foi por falta de emprego para sua geração, vai adiantar alguma coisa?
- Num acredito. Foi a ditadura. Por que?
- Deixa p'ra lá. Enfim, se eu disser que tem culpa da China no meio, o que você acha?
- Que você está viajando.
- Ah, sei. Bem, mudando de pau p'ra cacete...em que, no dia a dia, você acha que a internet ajudou mais você?
- Tá brincando? Em tudo.
- Ah, sei. Como?
- Tô mais antenado em política, meio-ambiente, educação, essas coisas.
- Ah, beleza. E o caso do Pará, o que você achou?
- Absurdo, querer separar só para ter mais político querendo mamar nas tetas.
- Ué, só por isso?
- Claro, por que mais?
- Já ouviu falar em Lei de Responsabilidade Fiscal? Fundo de participação dos municípios? Distrito Tributário?
- Não, e daí?
- Esse é um dos principais motivos.
- Você tá viajando cara. Todo mundo sabe que é para ter mais gente mordendo. Tem ricão querendo ficar livre dos impostos. Tem os caras do Codigo Florestal.
- Ah, e o que o Código tem a ver?
- Tudo, tá todo mundo sabendo.
- Eu não, diz aí.
- Ah, é muito complicado p'ra explicar e pelo jeito você não vai entender.
- Você tem razão. Aliás, você sabia que o Estado do Pará já está dividido há alguns anos?
- O quê, como, outros estados?
- Não, quilombolas.
- O quê, quem são esses caras?
- Deixa p'ra lá, muito complicado.
- Ah, tá, você tá viajando de novo.
- Trazendo p'ra perto da gente, o que está ajudando você então.
- Conscientização. Vê o caso dos prefeitos nas enchentes. Todo mundo roubando o dinheiro dos impostos.
- Sei, mas e o Tribunal de Contas dos Municípios?
- Deve tá tudo macumunado. Choveu, lascou. Vê o Recife?
- Peraí, o Recife tem o problema geográfico...
- Ah, mas se pararem a roubalheira e aplicarem o dinheiro não tem enchente...
Ia falar dos lixos nas ruas, da quantidade de novos edifícios etc, mas já tava sendo nocauteado...
- E os buracos nas ruas. Cadê o dinheiro do IPVA? Quando tiver passeata tô dentro.
- Peraí, o que é que tem o IPVA mesmo?
- Ih, cara, tá viajando, Imposto Sobre...
- Isso eu sei, qual é o problema dele?
- Não vê, o prefeito não utiliza ele bem. Arrecada e não usa.
- Você sabia que não é imposto municipal e sim do estado?
- O que é que tem a ver, é tudo igual.
- Não, não é. Você sabe o que é um imposto vinculante?
- Que m... é essa. Qué que tem a ver?
- Sei lá, ninguém no twitter ou no Face nunca falou nisso não?
- Não, e daí?
- Deixa, é complicado demais.  Então, alagamento e buraco nas ruas é só culpa do prefeito?
- É, de quem mais? Tá lá p'rá resolver isto.
- Sei, sei. Você e sua geração então pensa igual? Vê tudo igual?
- Claro, bem mais claro e esclarecido que a sua. Temos mais acesso a informação.
- É, tô vendo. E o "apagão de mão-de-obra"? Como é que fica?
- Qué que tem a ver?
- E os trabalhadores do exterior ocupando vagas aqui? Já viu como está o SUAPE?
- Ih, cara, aí é complicado...
- Eu sei, e a desindustrialização?
- O quê? Qué que tem a ver?
- Ué?!?! Não tá sendo discutido também não, no twitter e no Face?
- Não, os assuntos lá são mais light.
- Ah!! Tô vendo.
- É cara, mas ainda assim acho que você tá meio alienado.Quantos livros você já leu este ano?
- Dois, e você.
- Eu leio no Iphone. E no ano passado?
- Dez.
- Caraca, como é que você achou tempo?
- Eu não vejo televisão, já disse. Eu leio.
- Ué, não lê nenhum jornal? 
- Não. Eu escolho o que vou ler na internet, os de sempre.
- Ah, por isso você é um pouco fora de assunto.
- É, vai ver é por isso. Mas mudando, você vai votar em quem p'ra prefeito?
- Não sei, talvez no PT.
- E vereador?
- Sei lá, alguém do PT também. Que diferença faz?
- Você sabe o que um vereador faz?
- Direito não. Por que?
- Deixa p'ra lá.
- Tá legal, vão falar de futebol então. Você é o quê? Santa? Sport?
- Não assisto futebol.
- Não? UFC?
- Também não.
- Cara, você vive na lua. Pô, você tá alienado mesmo. Você com teu papo estranho viaja muito. Num dá nem p’ra conversar.
- É!! Você faz o quê na vida?
-Seu gerente de rede, trabalho p’ruma empresa p’ra prefeitura. E você?
- Sou piloto.
- Ah, logo vi. Nas nuvens. Valeu, to indo.
- Ok, vai pela sombra.
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Ganhos e perdas na senda da inovação -

WASHINGTON NOVAES
O Estado de S.Paulo 


Quase à mesma hora em que era sepultado em São Paulo, há duas semanas, o corpo do professor Aziz Ab'Saber, uma das figuras mais importantes do pensamento científico e ambiental brasileiro, chegava às mãos do autor destas linhas o livro Espécies Nativas da Flora Brasileira de Valor Econômico Atual ou Potencial, editado pelo Ministério do Meio Ambiente, sob coordenação do gerente de Recursos Genéticos, Lídio Coradin - obra importante para o País na área em que o falecido professor da Universidade de São Paulo (USP) foi um expoente.

Considerado referência em geografia no mundo, mas também em geologia, geomorfologia, biologia evolutiva, ecologia, autor de mais de 300 trabalhos acadêmicos, ex-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), condecorado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e outras instituições, o professor Ab'Saber era um homem simples e acessível, que aos 87 anos e com a saúde atingida não desistia da luta. A mais recente foi contra a versão de Código Florestal defendida pelos ruralistas - a seu ver, um forte retrocesso com graves consequências, principalmente por desprezar a variedade de cenários naturais no Brasil e a necessidade de regras diferenciadas para cada um.

O autor destas linhas conheceu-o pessoalmente em 1987, durante um debate promovido por este jornal sobre um dos programas da série Caminhos da Sobrevivência, que dirigia para a televisão. O debate era específico sobre um documentário a respeito da Bacia do Rio Tietê feito por Eduardo Coutinho. Havia muita confusão entre os debatedores, quando o professor Ab'Saber começou a falar. E a impressão de toda a plateia foi de que, a bordo da nacele de um balão, todos tinham subido ao céu e lá do alto haviam começado a enxergar a bacia do rio, hoje e na História: a ocupação humana, que começara pela planície, subira os morros e se estendera; os dramas causados pela ocupação desenfreada do solo e suas consequências na bacia hidrográfica, inclusive por causa do sepultamento sob o asfalto de dezenas de córregos e outros afluentes.

Pouco tempo depois, num debate em Mato Grosso do Sul sobre os dramas do Pantanal, quando se discutia a necessidade de desassorear o Rio Taquari, que já fora o grande leito da navegação no bioma e estava reduzido a um palmo d'água, o professor Ab'Saber, com seu saber, pôs a discussão no lugar: "Vocês podem planejar então desassorear o rio durante séculos, porque o desmatamento e a erosão que ele provoca, de fato, são problemáticos; mas a questão central está em que aquela região é de formação ainda recente, em evolução, e está no centro de um cone de terra com a base invertida para cima, milhares de quilômetros de diâmetro, que ejetam areia de baixo para cima; desassorear é útil, mas o problema mesmo durará séculos, milênios".

Era assim o professor Aziz Ab'Saber, que antes de cursar a USP e nela ser professor foi, ali mesmo, jardineiro. E com essa simplicidade seguiu pela vida fora. Fará muita falta ao País.

Ele certamente gostaria de ler o livro sobre as espécies brasileiras, porque era um dos defensores exponenciais da nossa diversidade vegetal - 13% das espécies do planeta, segundo o texto, que tem como objetivo "promover o uso sustentável de espécies da flora brasileira de valor econômico atual e potencial, utilizadas local e regionalmente". Isso significa, diz o livro, novas opções para a agricultura familiar, oportunidades de investimento industrial, contribuição para a segurança alimentar, redução da vulnerabilidade do sistema alimentar brasileiro e formatos de favorecimento de comunidades locais. E todos esses caminhos são importantes para a área medicinal, para a produção de cosméticos e aromáticos, para plantio e comercialização de alimentos, para seleção de espécies adequadas ao clima, etc.

No mundo já se conhecem 250 mil espécies vegetais, dizem muitos estudos (outros apontam números menores) e a maior diversidade está no Brasil. Mas, apesar dela - observa o livro -, a nossa dieta é "altamente simplificada e dependente de recursos genéticos externos", enquanto poucas das nossas centenas de espécies comestíveis estão disponíveis no mercado. E tanto é assim que a nossa agricultura depende de espécies vindas de outras partes do mundo - café, arroz, soja, laranja, milho, trigo; na silvicultura, de eucaliptos e pinheiros; e mesmo fora das espécies vegetais, como na piscicultura (tilápias africanas e carpas asiáticas), na apicultura (polinizadores africanos), na pecuária (bovinos indianos, caprinos asiáticos, gramíneas africanas).

Então, o conhecimento das nossas espécies é vital, já que a produção mundial de alimentos, em grande parte cartelizada no comércio internacional, hoje depende basicamente de apenas 150 espécies; 15 espécies respondem por toda a energia de que depende o ser humano - e só quatro (arroz, batata, milho e trigo) respondem por metade dessa energia, segundo a ONU. Entre as pouco mais de 150 espécies mencionadas, só duas são brasileiras: mandioca e amendoim. E a própria evolução da biotecnologia entre nós dependerá do avanço no conhecimento nessa área. Até mesmo na área de medicamentos, em que os números do comércio mundial variam entre US$ 20 bilhões e US$ 250 bilhões anuais. Mas a produção interna não passa de US$ 500 milhões/ano. Só temos registrados 512 produtos fitoterapêuticos derivados de 162 espécies vegetais.

O conhecimento na área, portanto, é decisivo, até porque a perda da biodiversidade no mundo avança celeremente e já se perderam pelo menos 25% das espécies, diz o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), que recomendou há dois anos ampliar para 17% as áreas terrestres protegidas e para 10% as áreas oceânicas.

Nas encruzilhadas que se apresentam para o Brasil em seu comércio exterior, em sua indústria, na política cambial, a inovação tecnológica será o fator preponderante nos próximos anos. Por isso são tão importantes os caminhos trilhados pelo livro.
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Leitura útil

Fazendo uso de minha prerrogativa de não ser acometido pela enfermidade do "politicamente correto", posto que pareço ser um composto biológico repulsivo a tal vírus, aproveito para tecer algumas considerações sobre nossa capacidade de buscar um livro ou uma leitura aproveitável. Enfim...


Somos, de fato, uma sociedade paradoxal. Ao mesmo tempo que se registra que 75% dos brasileiros não frequentam bibliotecas ou centros de pesquisa. Por outro lado, a indústria de livros , notadamente os de auto-ajuda, comemoram record de vendas.

Stephenie Meyer (Saga dos Vampiros) , J.K Rowlings (Harry Potter), Gaparetto, Augusto Cury, Paulo Coelho e padres estão comemorando vendas altíssimas.




É pertinente dizer que todo e qualquer tipo de leitura é válida? Depende, se fôramos uma sociedade desenvolvida e não tivéssemos tantos problemas estruturais e conjunturais que nos ancoram, inexoravelmente, na desigualdade e violência urbana, seria uma assertiva válida.

Quando me deparo com dados dando conta uma média de 3% de aprovação de bacharéis em Direito em exames da OAB. Com os conselhos de toda ordem (Medicina, Enfermagem, Engenharia, etc) informando que seus testes apontam em torno de 60% de aprovação, em plena segunda década do século XXI, equivale dizer que o hábito de leitura não só não se consolidou mas, para os expoentes, orienta para o lado errado que a sociedade demanda.

Quando vejo uma enorme quantidade de posts em redes de relacionamento acusando de gestão corrupta problemas de uso de verbas (i.e IPVA) acusando políticos de desvios de recursos em enchentes, estimulando campanhas contra alvos inatingíveis legalmente, exposição de torturantes fotos de crianças com fome na África e alhures, expõe-se, desta forma, uma profunda dificuldade de se entender adequadamente os fenômenos sociais que nos cercam.





Entendo, claro está, que leitura é um hobby e cada um lê o que bem entende, todavia, se quisermos, de fato, nos preocupar com redução de desigualdade social, violência urbana e desenvolvimento social já urge uma modificação de hábitos de leitura.

Além de romances vampirescos, leituras de auto-ajuda, espirituais toda uma gama estimulativa de visão introspectiva, nossa sociedade para vencer seus complexos desafios cada vez mais precisa que o cidadão olhe para fora de seu umbigo e se preocupe em interagir com o "coletivo" em busca do bem "comum" e não seu exclusivo do resto. Está no momento do cidadão se interessar por saneamento público, saúde, energia, transporte, mobilidade urbana, gestão orçamentária pública, educação etc etc. Uma miríade de temas que clamam e anseiam pela compreensão do televisivo cidadão comum.

Solução que vejo para tanto?  Leitura útil. Não se abandone os hábitos conquistamos, mas que não sejam, sempre, prioritários e sim subsidiários. 

A cidadania se constrói de forma constante. Leitura útil, amigos, leitura útil.
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Enigmas brasileiros -

NELSON MOTTA
O Estado de S.Paulo


Um país continental, com uma economia vigorosa e uma imensa classe média com crescente poder aquisitivo, deveria ser um fabuloso mercado para o transporte aéreo. Mas a Gol e a TAM tiveram juntas um prejuízo de R$ 1 bilhão no ano passado e em dois anos perderam metade de seu valor de mercado, mesmo vendendo passagens nacionais a preços abusivos (uma ponte aérea Rio-São Paulo custa R$ 2 mil em alguns horários) e voos internacionais muito mais caros do que em outros países. Do aumento do querosene à crise internacional e aos impostos locais, tudo se explica, mas ninguém entende.

Um país com 190 milhões de habitantes, que adora futebol, com poderosas redes de televisão e ricos patrocinadores, times e jogadores de fama internacional, torcidas apaixonadas e massiva cobertura gratuita da mídia, deveria ser o mercado dos sonhos para uma liga de futebol profissional, como as americanas e europeias, com o seu campeonato visto no mundo inteiro. Mas os clubes brasileiros estão todos falidos ou quase. De administrações desastrosas à corrupção e politicagem, do coronelismo da CBF às anacrônicas leis das sociedades esportivas, tudo se explica, mas ninguém entende.

Nosso país é mesmo difícil de entender. Aqui joga-se em tudo, bicho, bingo, cavalos, loterias, raspadinhas e mega-senas, explorados por bandidos ou pelo Estado, gerando montanhas de dinheiro sujo e de impostos.

Mas, em nome da moral e dos bons costumes, os cassinos são proibidos, até para turistas estrangeiros.

Nos anos 1930 e 40 eles eram o motor do mercado de turismo e entretenimento no Brasil, empregando milhares de pessoas e pagando fortunas de impostos, mas foram extintos por um decreto autoritário do presidente Dutra, há 66 anos, a pedido de sua esposa, dona Santinha, que era muito católica. Isso explica tudo, mas ninguém entende.

Aqui os partidos políticos recebem R$ 265 milhões de fundos constitucionais por ano e usam, vendem ou alugam horários milionários de rádio e TV, gratuitos para eles mas pagos pelo contribuinte às emissoras como renúncia fiscal. Mas querem o "financiamento público" das campanhas.
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Licença demorada e cara

O tema central é Energia. Em um país que necessita muito de energia para seu desenvolvimento e redução de desigualdade, o autor revela contradições na relação pública e privada dignas de um governo e sociedade cartorialistas. 

O difícil para se atingir o desenvolvimento é abrir mão de paradigmas. No caso, a preocupação com o meio-ambiente, novamente, coloca entraves no nosso desenvolvimento econômico. 

Por isso é que creio que o inconsciente da, então, candidata Dilma falou em Nova Iorque que o Meio-Ambiente era a principal ameaça ao desenvolvimento. Ela se corrigiu para manter-se politicamente correta, mas que tem a ver, lá isso tem.


Licença demorada e cara 
EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo


Não se conhecem valores precisos, mas certamente é alto o preço que, sem saber, o brasileiro paga pelo atraso nas obras de infraestrutura em razão da demora na concessão do licenciamento ambiental indispensável para sua execução. Em outubro do ano passado, o Ministério do Meio Ambiente publicou várias portarias que simplificam e aceleram o andamento dos processos de licenciamento dessas obras, mas os problemas acumulados pelos atrasos anteriores continuam a afetar muitos projetos, encarecendo-os.

Entre a decisão de iniciar uma obra no setor elétrico e a obtenção da licença prévia (a primeira de três exigidas até o início de operação do empreendimento) decorre em média um período de 958 dias - mais do triplo do prazo máximo de 285 dias estipulado para o órgão ambiental autorizar ou não o projeto -, de acordo com estudo do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) que o Estado (18/3) noticiou. A emissão da licença de operação, a última das três exigidas, demora em média 2.355 dias, ou seis anos e meio.

Em todo o mundo, a realização de grandes projetos empresariais, de infraestrutura ou de outra natureza está condicionada à observância de regras ambientais cada vez mais rigorosas. A realização da Rio + 20 em junho, com a participação de centenas de líderes mundiais, deverá estimular as ações nesse sentido, pois seu tema principal será o desenvolvimento sustentável, que busca não comprometer o patrimônio ambiental das futuras gerações.

No Brasil, no setor de energia, no entanto, surgiram muitos obstáculos à tarefa de compatibilizar o desenvolvimento com preservação ambiental. "Virou um processo muito complexo, com uma legislação cheia de furos e vazios", disse ao Estado o consultor Abel Holtz, que elaborou o estudo Agenda Ambiental junto com Adriano Pires.

Mais de 70% dos 428 projetos licitados ou autorizados entre 2008 e 2010 na área de energia não começaram a ser executados, de acordo com estimativa de Holtz, e um dos principais motivos é a questão ambiental. Alguns investidores já desistiram do projeto e solicitaram às autoridades a devolução da concessão que receberam.

Em certos casos, o atraso da concessão se deve aos próprios interessados, por causa da baixa qualidade dos documentos (Estudos de Impacto Ambiental e Relatórios de Impacto Ambiental) por eles apresentados aos órgãos oficiais. Em geral, porém, a demora se deve às dificuldades que surgem ao longo de um processo burocratizado e lento pela falta de qualificação do pessoal incumbido de analisar os casos, escassez de técnicos, influência de fatores políticos ou ideológicos no exame dos relatórios ambientais, superposição de funções entre órgãos públicos e até a judicialização do processo, pelo Ministério Público.

Dependendo da natureza do projeto e da localização do empreendimento, o licenciamento pode depender da avaliação de cinco órgãos do governo federal (fora as instituições estaduais e municipais). Se o projeto estiver em área indígena, o aval da Funai é indispensável. Em áreas habitadas por quilombolas, o processo terá de passar pela Fundação Cultural Palmares. Na parte arqueológica, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) terá de ser consultado. Nas áreas de doenças endêmicas, é indispensável ouvir o Ministério da Saúde. Em qualquer dos casos, a autorização final sempre será do Ibama.

A autorização pode vir acompanhada de condicionantes, ou seja, das compensações ambientais ou sociais impostas pelo órgão ambiental. Tudo isso eleva o custo do projeto. "Os custos da incerteza regulatória aumentam o orçamento dos programas socioambientais, representando quase 30% de todo o valor do empreendimento. E o orçamento final pode chegar a 50% acima dos valores iniciais previstos nos estudos de viabilidade", diz o estudo da CBIE.

Além de onerar o projeto, impondo custos adicionais aos consumidores, que pagarão a conta, o atraso do licenciamento ambiental trava o crescimento do País.
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Enigmas brasileiros

NELSON MOTTA
O Estado de S.Paulo


Um país continental, com uma economia vigorosa e uma imensa classe média com crescente poder aquisitivo, deveria ser um fabuloso mercado para o transporte aéreo. Mas a Gol e a TAM tiveram juntas um prejuízo de R$ 1 bilhão no ano passado e em dois anos perderam metade de seu valor de mercado, mesmo vendendo passagens nacionais a preços abusivos (uma ponte aérea Rio-São Paulo custa R$ 2 mil em alguns horários) e voos internacionais muito mais caros do que em outros países. Do aumento do querosene à crise internacional e aos impostos locais, tudo se explica, mas ninguém entende.

Um país com 190 milhões de habitantes, que adora futebol, com poderosas redes de televisão e ricos patrocinadores, times e jogadores de fama internacional, torcidas apaixonadas e massiva cobertura gratuita da mídia, deveria ser o mercado dos sonhos para uma liga de futebol profissional, como as americanas e europeias, com o seu campeonato visto no mundo inteiro. Mas os clubes brasileiros estão todos falidos ou quase. De administrações desastrosas à corrupção e politicagem, do coronelismo da CBF às anacrônicas leis das sociedades esportivas, tudo se explica, mas ninguém entende.

Nosso país é mesmo difícil de entender. Aqui joga-se em tudo, bicho, bingo, cavalos, loterias, raspadinhas e mega-senas, explorados por bandidos ou pelo Estado, gerando montanhas de dinheiro sujo e de impostos.

Mas, em nome da moral e dos bons costumes, os cassinos são proibidos, até para turistas estrangeiros.

Nos anos 1930 e 40 eles eram o motor do mercado de turismo e entretenimento no Brasil, empregando milhares de pessoas e pagando fortunas de impostos, mas foram extintos por um decreto autoritário do presidente Dutra, há 66 anos, a pedido de sua esposa, dona Santinha, que era muito católica. Isso explica tudo, mas ninguém entende.

Aqui os partidos políticos recebem R$ 265 milhões de fundos constitucionais por ano e usam, vendem ou alugam horários milionários de rádio e TV, gratuitos para eles mas pagos pelo contribuinte às emissoras como renúncia fiscal. Mas querem o "financiamento público" das campanhas.
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À beira do abismo

Desindustrialização deve ser um assunto obrigatório, hoje, na sociedade. Subtrai empregos, impostos, serviços e uma malha de benefícios sociais que culminam na redução da desigualdade e aumento da segurança.
Nos últimos nove anos a situação vem, paulatinamente, se agravando sem medidas firmes e concretas a serem adotadas por um governo que demonstra franca perda de liderança entre as principais Instituições do país.
Tinha que se voltar a novela "Nino, o Italianinho", só assim a sociedade se ligava neste crucial assunto.



ROBERTO FREIRE
BRASIL ECONÔMICO


A desindustrialização traz efeitos negativos sobre a economia, uma vez que o setor é o principal difusor de progresso tecnológico 

É uma temeridade, em tempos de crise, acreditarmos nas previsões sobre o desempenho econômico realizadas pelas instituições que tratam do assunto, entre elas, o nosso Ministério da Fazenda. Por outro lado, é relevante termos presente os dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre o crescimento da economia mundial para 2011-2012, estimado em cerca de 4%. Isto é, se os responsáveis pela política econômica mantiverem seus compromissos com a estabilidade financeira mundial.

Este resultado, contudo, será desigual. Os países desenvolvidos terão pequena recuperação do nível de atividade econômica. Seu crescimento estimado de 0,75% a.a, no primeiro semestre de 2011, subiu para 1,5% a.a., em 2012. Os países emergentes terão crescimento mais robusto, exceto o Brasil. Restrições de capacidade, aperto nas políticas fiscal e monetária e desaceleração da demanda externa fazem com que o crescimento médio se reduza de 7% a.a, no primeiro semestre de 2011, para 6%a.a, em 2012.

Segundo o FMI, quatro tipos de ameaças afetam a economia mundial: a primeira delas é a crise bancária e de endividamento nos países avançados; a segunda se refere às políticas fracas para lidar com o legado da crise das economias avançadas; a terceira está relacionada às vulnerabilidades nas economias dos países emergentes; e, por fim, a volatilidade dos preços das commodities e tensões geopolíticas.

No que diz respeito às economias emergentes, essas estão sujeitas ao risco de sobreaquecimento de suas economias que pode aumentar sua fragilidade financeira. O ritmo de expansão do crédito e o crescimento dos preços dos ativos têm permanecido elevados em vários países em desenvolvimento, como Brasil, Colômbia, Hong Kong, Índia, Indonésia, Peru e Turquia. Há ainda a possibilidade de bolha de ativos nos países emergentes, alimentada pela expansão do crédito bancário. Se a bolha estourar devido ao aumento da aversão ao risco dos investidores internacionais, poderemos ter um movimento de parada súbita de capitais externos para essas economias, seguido de queda acentuada nos preços dos ativos e crescente fragilidade do setor bancário. Na China, o ritmo de expansão do crédito, embora ainda esteja alto, começa a diminuir gradativamente.

No caso específico do Brasil, o que temos observado é um processo consistente de queda da participação da indústria de transformação no PIB. Essa "desindustrialização" tem efeitos negativos sobre o dinamismo da economia no longo prazo - uma vez que a indústria é a principal difusora do progresso tecnológico para a economia como um todo.

A continuidade desse processo na economia brasileira deverá, portanto, reduzir seu dinamismo no médio e longo prazos. Desde o segundo semestre de 2010, o PIB do país tem apresentado uma desaceleração bastante pronunciada, o que já reflete os efeitos do referido processo. Mas, ao que parece, o governo Dilma não consegue se livrar dos remendos localizados, como a prorrogação do IPI, desoneração da folha de pagamento e incidência da previdência no faturamento, conforme a reclamação dos setores envolvidos, como a melhor resposta aos perigos que enfrenta nossa indústria.
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quinta-feira, 29 de março de 2012

Reforço na escola

Reforço na escola 
CLAUDIA COSTIN
O GLOBO

Em março de 2009, ao tentar concluir um diagnóstico claro da Educação carioca, aplicamos uma prova nas escolas da Prefeitura do Rio para identificar se havia analfabetos funcionais entre os alunos do 4 ao 6 anos. Qual não foi a surpresa ao constatar que, numa cidade como Rio, sede dos maiores centros de pesquisa científica do país, contávamos com cerca de 28.000 alunos destas séries incapazes de ler ou entender frases curtas.

O esforço feito para resolver este triste problema passou por constituir um reforço escolar estruturado que desse conta não apenas de realfabetizar os analfabetos funcionais identificados (e, para isso, investimos na capacitação de mais de 1.100 professores da rede municipal), mas de corrigir problemas de desempenho dos alunos, medidos sistematicamente a cada prova bimestral unificada de Português, Matemática, Ciências e Redação. Mas envolveu, sobretudo, a melhoria da alfabetização inicial.

O Ministério da Educação inicia agora um importante programa para avançar na alfabetização de crianças pequenas. Pretende-se garantir que toda criança esteja alfabetizada antes de completar 8 anos. Não faz mais sentido aceitarmos que, por sabermos da baixa escolaridade dos pais e seu impacto na aprendizagem dos filhos, a alfabetização seja deixada para mais tarde. Se retardarmos a alfabetização, o apartheid educacional entre escolas públicas e boas escolas privadas só fará aumentar no 3, 4 ou 5 anos.

Aqui no Rio, lançamos um desafio: vamos tentar alfabetizar já no 1 ano. Fácil? Certamente que não. Muitos alunos não têm livros em casa, os pais não têm o hábito da leitura e não fizeram pré-escola. Mesmo assim, decidimos preparar material adequado para apoiar a ação dos professores, na forma de cadernos pedagógicos e aulas digitais, que podem ser projetadas nas salas. Tudo preparado por professores da nossa rede. Resolvemos também estruturar a rotina e o ambiente de sala de aula, para assegurar uma alfabetização mais efetiva, por meio do programa Casas de Alfabetização. Os pais também foram envolvidos e receberam cartilhas, em linguagem adequada, sobre como apoiar a alfabetização em casa.

Os resultados são animadores: na avaliação externa aplicada em toda a rede no 1 ano (crianças de 6 anos), 83% já estavam alfabetizados em 2011, sendo 30% em estágio avançado. Em termos percentuais, houve um avanço de 5,9% na proficiência média de leitura e 6,5% na de Matemática, em relação a 2010.

Enquanto as escolas comemoram este resultado, outro nos coloca também numa trilha muito positiva. O analfabetismo funcional do 4 ao 6 anos, que era de 14% dos alunos em março de 2009, caiu para 6,5% no fim de 2011. Ainda desafiador, mas um avanço considerável para o espaço de tempo de menos de 3 anos.

Dar um salto na qualidade da Educação demanda tempo, mas empenho, boa gestão e persistência estratégica podem colocar o analfabetismo funcional na escola como coisa do passado. Falta pouco!

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Segurança alimentar na AL e Caribe

Quando comecei a recolher material para minha tese de mestrado "Segurança Alimentar no contexto da Segurança Hemisférica" deparei-me com o problema de o Brasil considerar o tema APENAS na questão da desigualdade social e da restrição do acesso monetário ao alimento.
A questão é bem mais ampla do que o especialista abaixo estabelece. Pessoas pobres e de poder aquisitivo também sofrem da insegurança alimentar pela obesidade mórbida (também entre pobres), hormônios, alimentos contaminados de toda sorte e problemas na logística e validade dos alimentos disponibilizados para regiões da AL e Caribe.
O controle do acesso ao alimento, notadamente em regiões acidentadas com a presença de ilícitos (Peru, Colômbia, México, El Salvador etc) fazem das populações reféns de grupos, gangues etc
O que ele aponta nem o Brasil, com o estardalhaço de Lula querendo acabar com a fome no mundo, sucedeu. O tema é complexo e recebe menos atenção mundial do que o superaquecimento planetário. Como não tem promoção de ONG multimilionárias e com muita visibilidade, depende de ações de difícil articulação da OEA e FAO. Taí uma excelente bandeira e causa para se promover em nosso confuso país.



Segurança alimentar na AL e Caribe
José Graziano da Silva
Valor Econômico 

Erradicar a fome é um desafio em todos os cantos do planeta. E a América Latina e Caribe é a região em desenvolvimento em melhor condições de fazê-lo, superando o paradoxo de ser uma das maiores produtoras de alimentos do mundo e conviver com mais de 50 milhões de subnutridos.

Este será um dos temas em discussão nos próximos dias em Buenos Aires, durante a 32ª Conferência Regional da FAO para a América Latina e o Caribe, reunião ministerial que ajuda a definir as ações da organização em nível mundial e definir suas prioridades de trabalho na região.

A conferência aproxima a FAO dos países da região e garante que o trabalho da organização atenda às suas necessidades. É um exercício que se repete em diferentes regiões do mundo. Em meados de março, foi realizada no Vietnã a Conferência Regional para a Ásia e o Pacífico. Nessa reunião, que contou com a participação de 39 países, ficou clara a necessidade de estratégias regionais de arroz e aquicultura e de apoiar as pequenas ilhas do Pacífico na criação e fortalecimento dos circuitos locais de produção e consumo vinculados ao turismo.

O potencial da cooperação Sul-Sul para enfrentar os desafios, somada à vontade dos países em compartilhar seus conhecimentos, foi outra notável conclusão da conferência asiática e que tem grande potencial também na América Latina e Caribe.

Brasil e Argentina, entre outros países, possuem conhecimentos na área de agricultura tropical que pode ajudar o desenvolvimento de outros países da região e do mundo. No caso brasileiro, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) - pelo domínio tecnológico - e a Agência Brasileira de Cooperação (ABC) - por ser a cara da nossa cooperação externa - são atores fundamentais e precisam ter estrutura, institucionalidade e recursos adequados à contribuição que o Brasil pode e quer dar a nível mundial.

Da conferência em Buenos Aires, espera-se sair com prioridades claras para o trabalho da FAO na região e reafirmar o nosso compromisso conjunto para a erradicação da fome.

Isso não só é compatível com o desenvolvimento econômico, a gestão sustentável dos recursos naturais e a mitigação e adaptação às mudanças climáticas, mas também é uma contribuição para atingir esses objetivos.

Há uma grande convergência entre as agendas de mudanças climáticas e segurança alimentar: ambas exigem mudanças significativas no sentido de padrões mais sustentáveis de produção e consumo. Há poucos meses da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (Rio +20), temos a oportunidade e a necessidade de explorar essa convergência, que oferece a possibilidade de um novo caminho de desenvolvimento mais sustentável, inclusivo e que contribua na redução da desigualdade na América Latina e no Caribe.

Essa desigualdade se deve principalmente à concentração de renda e dos meios de produção. Por exemplo, a América Latina e Caribe é a região mais desigual do planeta em relação ao acesso à terra.

A insegurança alimentar é uma das manifestações da nossa desigualdade: a causa da fome na América Latina e no Caribe é a incapacidade dos pobres de comprar a comida de que necessitam. É um problema de acesso, esse é o nosso calcanhar de Aquiles.

Para resolver o problema, é necessária uma abordagem em âmbito social, econômico e produtivo. É essencial melhorar o acesso dos pobres em todos os sentidos: acesso a melhores empregos e renda; acesso a oportunidades; à terra e água.

As crises recentes recordam a vulnerabilidade que a região ainda tem: a inclusão social ainda depende, em grande parte, do crescimento econômico. No entanto, vários países conseguiram proteger a população vulnerável usando programas de transferência de renda e outras estratégicas de proteção social e incentivos econômicos e produtivos.

Esses programas são especialmente importantes nas áreas rurais, onde cerca de metade da população regional que vive em situação de pobreza extrema está localizada. Muitos são pequenos agricultores sem acesso a recursos naturais e apoio produtivo.

Apoiar esses agricultores familiares traz um duplo benefício. O setor representa uma das populações mais vulneráveis à fome mas, apesar da sua situação precária, é responsável por produzir a maior parte do alimento consumido na região.

Apesar de desempenhar importante papel, o setor ainda tem um grande potencial a ser desenvolvido. Os benefícios podem ser multiplicados se a agricultura familiar for vinculada a programas de transferência de renda, ao fortalecimento de mercados locais e também à alimentação escolar.

Não existem receitas mágicas para garantir o direito à alimentação, mas acabar com a fome não é tão difícil ou caro quanto mandar alguém à Lua. Erradicar a fome é uma meta possível, mas exige o compromisso de toda a sociedade e ações nos níveis nacional e internacional. A FAO está pronta para contribuir para esse objetivo, apoiando os países em seus esforços. Espero que a Conferência Regional em Buenos Aires dê um passo a mais, decidido, nessa direção.

José Graziano da Silva é diretor-geral da agência Food and Agricultural Administration (FAO).
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Tolices curriculares

O artigo ressalta a expressiva carga de ideologia na gestão dos conteúdos curriculares. Conforme ressalta o analista, estamos, cada vez mais, dissociados das necessidades do mercado.
Não admira o apagão de mão-de-obra e nossa baixíssima capacidade competitiva internacional.


Tolices curriculares
EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo 

Há dois meses, o Conselho Nacional de Educação (CNE) baixou a Resolução n.º 2/12, definindo as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, que é considerado desvinculado da realidade social e econômica do País, quando comparado aos programas do ensino fundamental e superior. Elaborada com base num extenso parecer aprovado uma semana antes pelo Ministério da Educação (MEC), a Resolução tem 23 artigos, muitos deles caracterizados por uma retórica vazia.

A Resolução, por exemplo, propõe a incorporação, como conteúdo obrigatório do currículo do ensino médio, "do reconhecimento e atendimento da diversidade e diferentes nuances da desigualdade da exclusão na sociedade brasileira". Também recomenda "a valorização dos direitos humanos, mediante temas relativos a gênero, raça e etnia, religião, orientação sexual, pessoas com deficiência". E enfatiza a importância de "práticas que contribuam para a igualdade e enfrentamento de todas as formas de preconceito, discriminação e violência" e de "atividades intersetoriais de promoção da saúde física e mental, saúde sexual e saúde reprodutiva e prevenção do uso de drogas".

Não são apenas esses os parágrafos da Resolução tautológicos ou ininteligíveis. "O trabalho é conceituado na sua perspectiva ontológica de transformação da natureza, como realização inerente ao ser humano e como mediação no processo de produção de sua existência" - diz o § 1.º do inciso VIII do artigo 5.º da Resolução. "A organização curricular deve oferecer tempos e espaços próprios para estudos e atividades que permitam itinerários formativos opcionais diversificados, a fim de melhor responder à heterogeneidade e pluralidade de condições, múltiplos interesses e aspirações dos estudantes", determina o inciso XI do artigo 14. "O projeto político-pedagógico, na sua concepção e implementação, deve considerar os estudantes e professores como sujeitos históricos e de direitos, participantes ativos e protagonistas na sua diversidade e singularidade" - reza o § 2.º do artigo 15 da Resolução. E vai por aí afora.

Além disso, a Resolução do CNE impõe ao currículo do ensino médio quatro áreas de conhecimento e nove matérias obrigatórias, chamadas de "componentes curriculares com especificidades e saberes próprios e sistematizados", subdivididas em doze disciplinas. O novo currículo vai na contramão dos países desenvolvidos, onde o ensino médio não tem um programa mínimo obrigatório. A diversificação é vista naqueles países como forma de adequar melhor o ensino à realidade cultural, econômica e social dos estudantes.

Não são de estranhar, portanto, as críticas que têm sido feitas à Resolução n.º 2/12. "O Brasil não diversifica e mantém a ideia de que todo mundo tem de fazer a mesma coisa", diz João Batista Araújo e Oliveira, do Instituto Alfa e Beto, depois de classificar o texto da resolução como "erudição boba". "É uma montoeira de matérias. O resultado é que ninguém aprende, só decora. No resto do mundo, há segmentação", afirma o economista Cláudio Moura Castro. "Acredito em soluções mais individualizadas e segmentadas, porque há muitas diferenças", assevera Priscila Cruz, do movimento Todos pela Educação.

Além das altas taxas de evasão, o ensino médio esbarra no despreparo dos alunos - por exemplo, 85% dos estudantes desse ciclo ingressam na 1.ª série da rede pública com um nível de conhecimento equivalente ao da 5.ª série do ensino fundamental. Segundo o MEC, 50,9% dos jovens de 15 a 17 anos não estão matriculados no ensino médio, onde o índice de reprovação é de 13,1%. Dos estudantes que completam as três séries do ciclo, metade obtém média inferior a 4 na prova objetiva do Enem.

Ao justificar a Resolução n.º 2/12, alguns membros do CNE alegaram que ela foi um "resultado de opções" e que "nem todo mundo pensa a escola do mesmo jeito". O que eles não conseguiram explicar é por que, em vez de definir diretrizes mais objetivas e realistas, optaram por um palavrório tolo e sem sentido, e por medidas inócuas, que só poderão aprofundar a crise do mais problemático dos três níveis de ensino.
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