quarta-feira, 19 de setembro de 2012

A mão 'visível' do governo



 Flavia Lima, Alessandra Bellotto e Karla Spotorno 
Valor Econômico


As ações da Cesp caíram 27,5% apenas no pregão do dia 12 de setembro - a maior queda em um único dia registrada no ano. Após um período de incertezas, os papéis da Usiminas têm a melhor performance em setembro, até o dia 17, em alta de 41%.

O desempenho dessas ações está diretamente ligado a medidas formuladas pelo governo. Nas últimas semanas, a equipe econômica anunciou aumento das tarifas de importações, ampliação do número de setores que ganham com a desoneração da folha de pagamento e um pacote que reduz tarifas de energia e impõe novas regras para renovação das concessões, dentre outras medidas.

A percepção é a de que este é um momento de presença mais forte do Estado, e que isso não vale somente para o Brasil, mas para o mundo. É o que a equipe do fundo CSHG Verde chamou de "Bull Market In Politics", em carta a seus clientes em abril deste ano. A ideia é que existem ciclos políticos assim como existem ciclos econômicos. E, segundo o que a equipe via naquele momento, mudanças estruturais na economia global somadas ao esgotamento do modelo de crescimento brasileiro (com perda de competitividade e endividamento do consumidor), traziam o país a um ponto em que uma resposta política aos desafios era inevitável.

Ao investidor, no entanto, a questão é: como agir em um mercado que não caminha escorado apenas nos fundamentos das empresas? À parte as considerações sobre a eficácia da mão cada vez mais visível do governo sobre agentes e setores econômicos, o que os especialistas afirmam é que ao investidor cabe compreender a dinâmica e, assim, alocar seus recursos de maneira eficiente. "Independentemente de juízo de valor, o objetivo do investidor é ganhar dinheiro. Para isso, é preciso entender a lógica do governo e tentar traduzi-la na escolha dos papéis", diz Jorge Simino, diretor de investimentos da Fundação Cesp.

"O investidor está num restaurante chamado Brasil e esse é o cardápio. Se ele não quer esse cardápio, não vá a esse restaurante", afirma outro gestor que preferiu não ser identificado. Para Lika Takahashi, estrategista da Fator Corretora, se o investidor escolher certo [e investir nos setores beneficiados pelas medidas do governo], pode se dar bem. "A questão é que muitos acabam escolhendo as ações meio que na sorte".

Escolher acertadamente, dizem os analistas, passa pela tradução correta dos acontecimentos: há uma preocupação clara do governo com o ritmo de crescimento em 2013. O esforço é recuperar parte da competitividade da indústria brasileira afetada pelas importações, sem, contudo, mexer com o câmbio - o que está sendo feito via desonerações tributárias e corte nos custos de energia.

Assim, apesar de o tombo das ações das elétricas provocado pelo pacote de energia ter roubado todas as atenções na última semana, Andrew Campbell, estrategista-chefe da corretora do Credit Suisse, lembra que vários outros segmentos da economia foram, na verdade, beneficiados pelas medidas recentes. E é aí que o investidor deve se socorrer.

Na avaliação geral, o maior ganhador é o setor de bens de capital, com empresas como Randon, Iochpe-Maxion, Weg, Mahle Metal Leve e Autometal. Essas empresas se beneficiam do aumento da tarifa de importação, do pacote do setor elétrico e da desoneração da folha de pagamento - fora a retomada do crescimento local.

"Mas é preciso atenção porque alguns destes papéis já subiram bastante", diz Hamilton Moreira Alves, estrategista do BB Investimentos. Para ele, o investidor deve olhar também o que, mesmo tendo subido, ainda está atrasado, como siderurgia e mineração.

O setor de siderurgia se beneficia do aumento da tarifa de importação e do pacote do setor elétrico. Nesse segmento, um dos papéis que mais subiram nas últimas semanas foi Usiminas. No ano, contudo, a ação ainda sustenta o nono pior desempenho do Ibovespa, em queda superior a 23% (até dia 17).

Para Campbell, do Credit Suisse, Usiminas é destaque entre as empresas beneficiadas por operar com uma rentabilidade menor no setor (o que aumenta o impacto da medida), pelo tipo de aço que produz (plano) e por ter capacidade ociosa de produção. O papel, porém, é visto com desconfiança. A casa elevou a recomendação para Usiminas, mas não indica a compra. "A situação melhorou, mas não dá para dizer que os problemas ficaram para trás", diz. "Além disso, as ações já subiram muito".

Para Simino, da Fundação Cesp, os setores conectados ao crescimento doméstico voltam a ser óbvios, enquanto as ações com características mais defensivas - como os papéis do setor elétrico - vão precisar de muito "stock picking", ou seja, avaliação caso a caso, para voltar a fazer parte das carteiras. Já Flavio Sznajder, sócio-gestor da Bogari Capital, destaca Cosan e os setores de bancos e educação (ligados ao mercado interno e com gestão que pode trazer melhoras ao longo do tempo).

Para o Credit Suisse, Brasil Foods é uma aposta interessante em consumo, com múltiplos mais baixos que os das varejistas. Fora que o setor, que tem uso intensivo de mão de obra, foi incluído no pacote de desoneração de folha de pagamento. Papel e celulose é outro segmento que se beneficiou de mais de uma das medidas. Nesse universo, a recomendação do Credit Suisse é Klabin.

Aos que se perguntam se mais setores ainda podem ser afetados, Sznajder, da Bogari, diz que o investidor deve entender que a bolsa tem riscos e que não há fórmula mágica. "Estudar muito para não ser pego de surpresa e comprar barato pode ser o melhor caminho".
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