Um mal alimentado por nossa idiossincrasia morena.
O entorno do poder aglutina a todos, independentemente de alinhamento ideológico ou ético.
Aparelhamento
ANTONIO DELFIM NETTO
FOLHA DE SP
O Brasil tem avançado institucionalmente desde a Constituição de 1988, entretanto, em matéria de administração pública, a situação é ainda muito precária.
O dramático crescimento do Estado e a tendência ao "aparelhamento partidário" são facilitados pela estabilidade, pela maior remuneração e pela melhor perspectiva de benefícios futuros do funcionalismo. Esse é um fator preocupante para a organização de um setor público eficiente, transparente e, de fato, republicano.
É um grave equívoco pensar que o "grande aparelhador" foi o Partido dos Trabalhadores, para "fincar" sua "ideologia" no Estado. A história revela que ele é exatamente igual a todos os outros que chegaram ao poder. O supostamente virtuoso PSDB fez rigorosamente o mesmo. Na prática, a "ideologia" é só codinome elegante da "fisiologia"!
Os partidos sem ideologias aparentes não têm como esconder-se. São alvos fáceis dos que se pretendem "ideológicos" e diretamente marginalizados como "fisiológicos".
Nada disso é novidade. A disputa entre o janismo e o adhemarismo, em São Paulo, mostrou isso com toda crueza e deselegância: quem ganhava a eleição demitia, no primeiro decreto, todos os funcionários não estáveis admitidos pelo antecessor.
O processo foi se aperfeiçoando. Quem -quando no poder- pode fazer um concurso manipulado para dar estabilidade aos seus correligionários não perde a oportunidade de fazê-lo. A Prefeitura de São Paulo mostrou isso há menos de 20 anos.
Quando os concursos são controlados por grupos já instalados e que se pensam portadores da ideologia "verdadeira", a tendência é dirigi-los para cooptar os "seus", como mostraram o PSDB e o PT recentemente. O caso do Ipea é paradigmático: com o PSDB, ele perfilhava um pretensioso cientificismo acadêmico, que vive no mundo do pensamento; sob o comando do perseverante e competente Marcio Pochmann, abandonou o alfabeto grego e mergulhou na mais lamacenta, profunda, íntima e bruta realidade brasileira!
Talvez o pêndulo tenha caminhado rápido demais. Sendo membro do conselho do Ipea, creio que a presidenta fez uma boa arbitragem. Nomeou o ilustre economista e renomado pesquisador Marcelo Neri, com respeitável formação neoclássica, mas que construiu seu nome metendo a mão em problemas cruciantes que afligem o cidadão brasileiro.
A propósito, os atuais estudos do Ipea podem dar melhor suporte às políticas públicas. Por exemplo, seus trabalhos recentes sobre o diferencial dos salários entre os setores público e privado. Eles mostram a validade dos argumentos do governo na disputa que terminou na greve insensata do funcionalismo federal.
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