Uma quente manhã, preso em um atacadão para compras do mês pelo menos para qualquer homem é desconfortável. Para mim beira o suplício.
Para amenizar o tédio sem deixar transparecer minha inquietude procuro me entreter nos detalhes. Cores e disposições físicas dos produtos são como anestésicos. Contudo, dependendo do grau de minha “sensaquez” (momento no qual minha sensatez some na curva da longa e tortuosa estrada), começo a reparar em outros detalhes para validar algumas teorias de marketing. Enfim, um olhar crítico cheio de “mavo” no mais claro português.
Começo a observar alguns funcionários entre os corredores – e não prateleiras- de produtos. Todos jovens com seus indefectíveis celulares disputando entre si suas funcionalidades, preços e capas, cada uma delas mais surpreendente e bodosa que a outra. Claro está que por ser o Recife, cores do Santa Cruz e do Sport disputavam acirradamente o troféu de refinamento duvidoso.
Duas jovens aproximaram-se das pilhas. A primeira ficou com a pilha de latinhas de coca-cola. Cerca de três mil dispostas em embalagens de doze unidades em um lote deixado, havia pouco tempo, por uma ragenta empilhadeira. Rapidamente ela concluiu sua tarefa anotando o resultado em uma planilha. Apresentou a soma ao supervisor que lhe indicou outra tarefa.
O jovem líder –para ficar na sintonia politicamente correta dos consultores e palestrantes de RH – por isso que este setor patina...- ao se dirigir para a segunda “colaboradoouura” esclamou espantado: “O que você está fazendo?” A jovem de pronto ponderou: “Viche!! É pra contar isto tudo?”
Ao peceber o que a jovem fazia, contanto saca por saca de farinha de trigo –bem mais fácil que a tarefa da primeira- percebi que meu maxilar afastava-se de seu contra-posto superior de forma constante e inexorável, dirigindo-se célere até topar com minha barriga, que pela idade já não é nenhum tanquinho e sim ribanceira.
Caros amigos, pode parecer implicância, contudo quando leio as propagandas e artigos de consultores e palestrantes organizacionais dando conta de um habitat corporativo cor-de-rosa onde colaboradores transbordantes de potencial e de conhecimento pronto a aplicá-los, sôfregos de entusiasmo e de empreendedorismo “auto-gerenciável”, fico a me perguntar “onde” os cabras enxergam isto, pois no Brasil por onde ando o cenário é outro, absolutamente outro.
Pela idade, a epitagórica jovem deveria pertencer a mais nova fornada da geração “Y” (eu não sei se o alfabeto dará conta de tanto modismo) dado o desembaraço com o qual ela manuseava seu fudêncio iphone (celular é pra fracos!!). Mas a canetinha tocando saca por saca foi lasca!! (no mais genuíno – e não Genoíno, note-se!- sotaque recifence).
Fico matutando qual foi a vantagem da grande idéia -alías, todo mundo acha que pode dar pitaco na Educação- de não se reprovar crianças no ensino fundamental. Bem, o “apagão” de mão-de-obra está aí, pujante e desafiador.
Bem, ao mesmo tempo que meu queixo tocara a reluzente pança, o supervisor olhou-me com um misto de desconcertado e envergonhado por eu estar presenciando tão dantesca cena digna, todavia, dos anais de grandes feitos de nossos últimos ministros de Educação.
Após a amiga ajudá-la a concluir sua nobre tarefa a mesma olhou-me com desprezo e raiva contida, ante minha escancarada boca de espanto, quando não de pavor por nosso futuro nada varonil.
E eu? Bem, o mínimo que poderia fazer foi arrastar minha elegante e mastodôntica silhueta, à francesa, como se isto fora possível naquele ambiente, antes que a jovem me arremessasse impropérios de toda sorte massacrando –era de se esperar, convenhamos- nossa bela e inculta língua portuguesa.
“Não verás país algum...Já dizia o poeta.”
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Crônicas do cotidiano!!! Muito boa e pertinente, Jefferson!!!
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