quinta-feira, 8 de março de 2012

As instituições mundiais no caminho do fracasso?


 MARCO ANTONIO ROCHA
O Estado de S.Paulo

A palavra paradoxo vem do grego: pará = contra; dóksa = opinião. E mestre Houaiss ensina que, além de indicar uma opinião contrária à comum, pode denotar algo "estranho, bizarro, extraordinário".

O que vem bem a propósito do socorro que a União Europeia (UE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) propõem à combalida Grécia - extraordinário, sim, mas meio bizarro e estranho o bastante para um trocadilhista dizer que se trata de presente de grego. No caso, para grego, pois o paradoxo que transparece no pacote é que ele anula sua finalidade. Seu objetivo principal, segundo declarações dos socorristas, é que a economia da Grécia volte a crescer a fim de que ela possa pagar o auxílio recebido.

Todavia, como o Produto Interno Bruto (PIB) grego pode voltar a crescer o bastante para que o país pague o socorro recebido, uma vez que o peso das condições impostas para receber o auxílio arrocha o PIB da Grécia? Com o salário mínimo, as aposentadorias, as despesas do governo, o funcionalismo público e as rendas internas do país substancialmente cortados, de onde virá consumo suficiente para puxar o trem da economia?

A suposição, ao que parece, é que o governo grego, livre de boa parte das dívidas e das despesas com funcionários, aposentados, etc., vai dispor de mais recursos para investir, e seus investimentos levantarão a economia. Mas vai investir em quê? Na produção, em transportes, fábricas, portos, ferrovias, aeroportos, armazéns, ou o que seja? Mas, então, o governo estará aumentando seus gastos, injetando dinheiro na economia e favorecendo a inflação - justamente o que se temia que acontecesse sem o socorro.

O governo grego teria, pois, de investir em coisas que não inflacionassem os meios de pagamento internos e que trouxessem dinheiro do exterior. Por exemplo, uma astronômica campanha publicitária mundo afora para trazer turistas endinheirados que gastassem divisas dentro da Grécia. Mas a receita de turismo da Grécia, que já deve ser enorme, não bastou para equilibrar suas finanças, e dificilmente pode ser aumentada, seja qual for o gasto em publicidade no exterior.

Em suma: a Grécia recebe uma polpuda mesada para acalmar seus credores e um perdão de dívidas, que cairão de mais ou menos 160% do PIB para algo como 120% do PIB. Ou seja, a dívida continuará enorme. E, como o PIB vai diminuir, em razão das medidas contracionistas previstas no acordo, é possível que o remanescente da dívida ocupará, em relação ao PIB, o mesmo porcentual da dívida original.

Alguém pode sugerir um paradoxo grego mais perfeito do que esse?

É por isso que "o pacote grego não convence" - como dizia o título do comentário do nosso colega Alberto Tamer, na última quinta-feira. Porque, além da falta de confiança na firmeza do governo grego em cumpri-lo, que leva à descrença, o pacote encerra um paradoxo digno dos de Heráclito, Epicuro, Zenão ou de qualquer outro filósofo grego menos votado.

Mas essa história contém algo mais grave: a perplexidade sobre o porquê das atuais instituições multinacionais.

A União Europeia surgiu para promover o progresso, o bem-estar e a harmonia na Europa, dotá-la de massa crítica capaz de fazer frente não só ao "desafio americano" - advertido há muitos anos no livro de Jean-Jacques Servan-Schreiber -, mas aos desafios que se agigantaram depois: da Rússia, da China, do Japão.

E o que acontece?

A União Europeia, em vez de solução, vira problema, atravanca o progresso no mundo e tropeça nas próprias pernas: não consegue que suas regras sejam respeitadas por seus membros e não atina com uma solução consequente para as dificuldades de um dos seus menores membros.

O FMI, por sua vez, joga na lateral, sem saber o que fazer e dizer.

Na área política, a Organização das Nações Unidas (ONU) surgiu para administrar a paz, tornar o mundo menos perigoso e promover a harmonia entre os povos.

E o que acontece?

Neste momento, três países atravancam a estrada da harmonia e do progresso pacífico. Três pins in the asses - diriam os americanos: Síria, Irã e Israel, com três povos cuja história se perde na noite dos tempos, e que nada aprenderam com ela. Agem contrariamente aos melhores propósitos da comunidade internacional. E ninguém, nem a ONU, nem os grupos paralelos das grandes potências ocidentais, nem a UE, nem países historicamente pacíficos, como o Brasil e o Canadá, por exemplo, podem fazer qualquer coisa para tirar aqueles pins do ass do mundo.

A conclusão é de que o mundo ainda não foi capaz de criar instituições multinacionais capazes de exercer com eficácia o papel civilizador que delas se espera.

Então, de duas uma: ou os atuais líderes mundiais se empenham nisso com afinco, ou o mundo voltará ao estado de semibarbárie do século 19, em que a imposição pela força das armas era a regra.

Só que os anões de jardim que nos lideram hoje em dia - de Angela Merkel a Barack Obama, com Sarkozy, Putin, Cameron, etc. - só pensam em ficar bem na fita. Assim, está difícil apostar num futuro melhor.
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