sábado, 3 de março de 2012

Sem tempo para errar

Paulo Safady Simão
O Globo

Uma grande parte das cidades brasileiras, em particular as de médio e grande porte, se encontra à beira de um colapso e está cada dia mais distante do objetivo de proporcionar aos seus habitantes uma boa qualidade de vida. Neste sentido as eleições municipais de 2012 assumem papel crucial: ou a sociedade brasileira elege um novo modelo de gestão voltado ao desenvolvimento urbano sustentável, ou continuará empurrando os problemas para baixo do tapete. Pesquisa recente do IBGE constatou, no censo de 2010, o lamentável crescimento de aglomerados precários, totalizando 6.329 áreas espalhadas por 323 municípios brasileiros e que abrigam mais de 3,2 milhões de domicílios e 11 milhões de pessoas. São áreas ocupadas irregularmente, sem serviços públicos adequados, representadas por favelas, palafitas, grotas e vilas. O resultado desse descaso são as repetidas tragédias nas épocas das chuvas e a alta incidência de doenças causadas pela falta de saneamento básico — principalmente entre crianças. São várias as razões que levaram o país a ter que conviver com esta lamentável realidade. A principal origem do problema está na ausência, durante longos anos, de políticas urbanasadequadas. Justamente no momento em que a população rural migrava maciçamente para as grandes regiões metropolitanas. O resultado não poderia ser outro. Às vésperas de se tornar a quinta potência econômica do mundo, o Brasil não pode se omitir em equacionar estas e outras questões urgentes. Nos últimos anos, foram implementados e/ou desenvolvidos alguns programas e projetos cruciais, como os voltados para a área imobiliária, com destaque para o projeto Minha Casa, Minha Vida; o Plano Nacional de Saneamento, que demonstra preocupação maior com a área de saneamento básico — com destaque para a atuação da Funasa no atendimento dos municípios com menos de 50.000 habitantes; a política de resíduos sólidos, que encontrou boa repercussão em várias unidades da federação; e algumas obras do PAC, voltadas para a mobilidade urbana, especialmente nos grandes centros e nos projetos de urbanização das favelas, onde a própria pesquisa do IBGE já acusou alguns avanços importantes. Mas ainda é necessário continuar avançando para alcançarmos uma verdadeira e definitiva mudança. Lembrando sempre do papel estratégico que o empresariado no Brasil já vem desenvolvendo na solução de problemas estruturais do país por meio de parcerias público-privadas. Na área de habitação, por exemplo, não podemos relaxar e voltar ao passado. É urgente revermos as regras e as condições da segunda etapa do programa de moradia social do Governo federal. Não podemos deixar que obstáculos comprometam o bom andamento do programa, sob pena de não alcançarmos as metas previstas. Quanto ao saneamento básico, onde o país ainda mantém uma enorme dívida social, é preciso inovar e ousar, da mesma forma como o país encontrou a solução para o problema do déficit habitacional com o programa Minha Casa, Minha Vida. Temos que reabilitar as dezenas de companhias de saneamento espalhadas pelo país que estão, em sua maioria, operando no vermelho. É urgente pensarmos na implementação de um fundo federal que apoie o desenvolvimento de planos regionais de saneamento, com foco nas bacias hidrográficas e que também financie os planos municipais que se reportarem a este plano regional. Temos que pensar ainda em estímulos e incentivos aos agentes envolvidos, para que os obstáculos existentes sejam afastados. É necessário estabelecer metas ousadas e uma estrutura de acompanhamento e fiscalização eficiente dos serviços e obras a serem contratados, reduzindo os desperdícios, melhorando a qualidade dos empreendimentos e agindo preventivamente aos inúmeros problemas de saúde que afetam a nossa população por deficiência de saneamento. Na área da mobilidade urbana, já passou da hora de encararmos com seriedade o problema e pensarmos em soluções coletivas de qualidade para a mobilidade dos cidadãos, hoje submetidos a um verdadeiro suplício, perdendo preciosas horas diárias no trânsito em detrimento do maior convívio com suas famílias e disponibilidade para o lazer. Isso significa, entre outras ações, investir emtransporte de massa e desestimular o uso do transporte individual. É urgente que esses e outros temas que dizem respeito à qualidade de vida em nossas cidades, ocupem lugar de destaque na agenda pública em 2012. Os gestores municipais não podem continuar negligenciando a solução desses problemas, como tem acontecido ao longo da nossa história. Não temos mais tempo para errar. Precisamos eleger um novo modelo de gestão para as nossas cidades que incorpore inovação, sustentabilidade e qualidade de vida da população como condições fundamentais ao desenvolvimento. Com a palavra, os eleitores brasileiros.
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