HENRIQUE GOMES BATISTA e DANIELLE NOGUEIRA
O ESTADÃO
Segundo especialistas, País poderia economizar R$ 90 bilhões por ano com matriz de transportes mais eficiente, como a dos EUA
Enquanto o Brasil gosta de se vangloriar que possui uma matriz energética limpa e eficiente, o País convive com uma matriz logística suja e cara, que reduz diretamente a competitividade. Isso é visto na excessiva dependência de rodovias, burocracia nos portos, infraestrutura deficiente nos aeroportos. Se a eficiência americana nos transportes fosse replicada no Brasil, dizem os especialistas, a redução nos custos de transporte seria de R$ 90 bilhões por ano.
Aqui, 65,6% da matriz é de estradas. As ferrovias respondem por 19,5%, seguidas por 11,4% do modal aquaviário e 3,5% do dutoviário. O transporte aéreo representa pífio 0,1%. Com esse desenho, o custo logístico no País era de 10,6% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2011, segundo levantamento feito a cada dois anos pelo Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos). Nos EUA, o porcentual era de 7,7% do PIB.
Nos EUA, as rodovias respondem por 38% da matriz de transporte, seguidas pelas ferrovias (28,7%). A parcela do transporte aquaviário é igual à brasileira, mas o modal dutoviário tem uma fatia bem maior: 21,5%. "Além da herança JK (ex-presidente Juscelino Kubitschek, que estimulou a malha rodoviária ao incentivar a indústria automotiva), essa matriz é resultado do baixo investimento em transporte nas últimas décadas. Você consegue ter mais veículos circulando numa estrada do que o número que ela comporta. Mas não consegue o mesmo num aeroporto. Como o Brasil não investia na expansão da infraestrutura de transporte, aquele modal que era mais elástico acabou sobressaindo", explicou Maurício Lima, do Ilos.
Paulo Resende, da Fundação Dom Cabral, acredita que os problemas de logística já têm um impacto maior do que imaginamos. Ele acredita que isso – aliado à crise financeira global – contribui para o fato de o Brasil não conseguir, nos últimos anos, combinar dois anos seguidos de forte crescimento econômico, na faixa de 4%.
Cabral afirma que os problemas hoje vão além da infraestrutura de transporte e chegam a outros pontos, como a falta de armazéns. "O Brasil não participa da formação do preço de grande parte dos produtos agropecuários que é relevante porque não temos armazéns, precisamos produzir e enviar logo ao exterior. A nossa capacidade de guardar grãos, por exemplo, é um quarto da capacidade dos Estados Unidos. Poderíamos ter um papel mas relevante nesses preços", afirma Resende.
Remendos. Ele acredita que o sistema logístico cria problemas em cadeias e as soluções apresentadas muitas vezes são remendos, o que piora todo o cenário. Mas, para ele, desta vez, a equipe do governo começou a enxergar o setor com a visão da logística integrada. "Hoje em dia, apenas duas empresas têm essa visão integrada de logística do Brasil: a Vale e a Petrobrás, e não é por acaso que as duas são as maiores empresas do País.
No ranking de desempenho logístico elaborado pelo Banco Mundial em 2012, o País ocupa a 45.ª posição, atrás de nações ricas como Alemanha (4.ª) e EUA (9.ª) e de emergentes como África do Sul (23.ª) e China (26.ª). O ranking, que reúne 155 países, considera itens como infraestrutura de transporte e procedimentos alfandegários. Considerando este último critério isoladamente, o Brasil desaba para 78.º lugar.
Custos. A inadequação da matriz de transporte brasileira também é uma das razões para seu baixo desempenho em relação a outras nações da lista e a principal causa do custo logístico elevado. Bruno Lima Rocha, presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma), afirma que, além dos problemas de obras em si, os setores de portos e cabotagem sofrem com regulamentação excessiva e burocracia. "Durante a greve dos funcionários da Anvisa, uma embarcação ficou sete dias em Salvador esperando fiscais. O empresário que vive isso nunca mais usa a cabotagem, apesar de ser mais barata. Usa o caminhão, que não passa por fiscalização alguma. Se tivéssemos as mesmas normas que valem para os caminhões, ganharíamos mercado e o País seria beneficiado com custos menores, haveria menos acidentes nas estradas e menos emissão de gases poluentes."
Rocha afirma que a cabotagem poderia ser muito desenvolvida e lembra que o objetivo do governo, previsto no Plano Nacional de Logística e Transporte (PNLT) – estabelecendo que em 2025 o transporte marítimo represente 29% da carga transportada do País, contra os 12% atuais – é factível. "O setor é o mais eficiente do mundo, somente precisamos ter condições. Hoje, esse tipo de transporte só é utilizado de forma relevante por granéis líquidos, graças a Petrobrás, e por minérios, por causa da Vale", lembra.
Desperdício. Cleber Cordeiro Lucas, presidente da Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem, afirma que o País ignora que possui o meio mais eficiente de transporte tendo quase 8 mil quilômetros de costa. "Temos uma ‘BR’, uma rodovia de altíssima capacidade e uma ferrovia que liga os principais pontos, onde está 70% do PIB brasileiro, praticamente sem uso", disse.
Em sua opinião, os entraves burocráticos que afetam o segmento, além dos problemas de infraestrutura, são fatais para as empresas de cabotagem. "Se um navio que vai para a China perde um dia em um porto brasileiro é algo terrível, mas esse navio consegue recuperar parte desse tempo no caminho até a Ásia. Mas se um navio de cabotagem perde um dia é fatal, ele perde toda a sua agenda, toda a sua escala, não cumpre nenhum prazo e fica sem clientes."
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