quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Mas fazer o quê?



RODRIGO AMARAL
O Globo


Aí vêm mais dois meses de IPI menor. Vamos comemorar! Afinal, quem é contra redução de impostos no Brasil? Afora aspectos mais complexos, é bom que o cidadão possa acessar bens mais baratos, ainda que por um tempo. Mas e depois? Já em novembro, virá uma ressaca. Antecipamos demanda.

Em primeiro lugar, que tal reduzir impostos permanente e amplamente? Onde mais se taxam indústrias com um imposto que mais parece uma multa? Não sou especialista, mas nunca vi nada igual alhures. Ao menos nos países importantes, ou que querem sê-lo. Uma economia desonerada talvez nem precisasse de medidas de exceção. Afinal, mesmo se o objetivo é apenas produzir e vender mais carros, não podemos fazê-lo em detrimento do sucesso econômico geral: há um limite à capacidade de absorver mais carros, que precisam ser pagos, mantidos e de uma infraestrutura para rodar.

E se o objetivo é esse, há muito a fazer, do lado fiscal, no custo de propriedade e estrategicamente. Com os impostos: a) dar previsibilidade - se a cada "x" anos vemos que o imposto estrangula o negócio, vamos reduzi-lo em definitivo em "y%"; b) ser seletivo: há carros mais adequados e há itens desejáveis para esses mesmos veículos - tributar conforme as emissões (e parece que finalmente começamos a nos movimentar nesse sentido!), estimular os pneus "verdes" etc.; c) isentar itens de segurança - após quanto tempo e quantas vidas, air bag e ABS serão de série? Poderiam sê-lo há anos, ajudados por isenção.

Também o custo de propriedade inibe os negócios, sem receber merecida atenção. Resumindo, comprar carro é fácil. O difícil é mantê-lo. Um popular custa R$ 2.000 mensais, entre depreciação, custo de capital, manutenção, seguros, sinistros, impostos, gasolina, multas etc. E há aquele tema de sempre: qualidade das vias de tráfego. Antes de trem-bala, queremos a infraestrutura existente funcionando.

Nossa indústria automotiva, relativamente mais importante que a da média dos países desenvolvidos e na qual o governo aposta suas fichas sempre que pensa na economia, não é muito competitiva. Pior, está em um provável ponto de inflexão, onde os importantes centros de desenvolvimento, produção e consumo exploram a propulsão híbrida e elétrica. E nós - mais ninguém - insistindo no etanol e só nele, sacrificando a lavoura em prol de um benefício ambiental que se dissipa planeta afora, sem cobrar por isso. Não dá para ser o quinto do mercado, ficar à margem da tecnologia e perder o bonde de novo. Cabe a mão do governo.

Outro aspecto estratégico é a produção de eletrônica embarcada, que só cresce em quantidade e valor. Corremos o risco de virar uma megazona franca automotiva. Mais importante que soja, alumínio, minério, trem-bala, copa e olimpíada seria ter uma indústria de componentes eletrônicos que suportasse essa e outras cadeias industriais. Os desafios colocados à indústria são muito mais sérios que uma simples crise temporária de demanda.
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