sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Um atalho duvidoso


ESTADO DE MINAS


Prioridade deveria ser o ensino médio de qualidade para todos

O Brasil ainda está muito longe de superar os gargalos que governos e sociedade permitiram que se formassem na educação. Além de refletir e ajudar a agravar a desigualdade social, a dificuldade de acesso à escola de boa qualidade de nível universitário soma-se à precariedade do ensino médio público para formar um quadro preocupante. Os resultados deixam o país mal em todos os rankings internacionais de qualquer nível de ensino e já afetam a qualidade da mão de obra disponível para a manutenção do crescimento econômico do país.
Dados do Censo da Educação Superior, divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) na terça-feira, um dia depois da publicação das regras de cotas sociais e raciais impostas a todas as universidades e escolas técnicas federais, não deixam dúvida quanto à lentidão com que o país vem promovendo a universalização do ensino superior. Segundo o MEC, entre 1997 e 2011 o percentual de negros e pardos de 18 a 24 anos matriculados ou que já concluíram um curso universitário passou de 4% para 19,8%. E a quantidade de estudantes de nível superior de famílias de baixa renda evoluiu de 0,5% para 4,2%. Émuito pouco para período tão longo (14 anos). Pior: essa proporção de negros e pardos no universo dos estudantes ou portadores de diploma de nível superior não guarda relação aceitável com a realidade da população. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esse segmento racial é majoritário no país, respondendo atualmente por 51% dos brasileiros.
Os problemas não param por aí. Ainda é muito baixa a população brasileira de 25 a 34 anos com diploma de nível superior: apenas 12%. O dado coloca o Brasil em desvantagem em relação a pelo menos 37 países, de acordo com relatório divulgado em setembro pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Ficamos muito abaixo da média de 37% e perdemos feio para emergentes, como a Rússia (55%), e vizinhos, como o Chile (35%).
Mas nem mesmo esse quadro negativo autoriza o país a correr o risco de atalhos duvidosos. Decisões nesse campo são estratégicas, têm a ver com o futuro de várias gerações. O preço que o país paga pelas deficiências do presente precisa servir de alerta para o perigo de escolhas precipitadas e voluntariosas. Especialistas de várias tendências não se cansam de indicar o ensino médio como o endereço do pior e mais urgente dos gargalos. Afinal, é graças à péssima qualidade da escola pública desse nível que os mais pobres de todas as raças não conseguem vaga nas universidades públicas, as melhores do país. Em vez de desatar o nó do ensino médio gratuito, investindo na elevação do nível da escola pública, eliminando a distância que a separa dos bons colégios particulares, preferimos transferir o abacaxi com casca e tudo para as salas da universidade, embrulhado em cotas sociais e raciais. Os riscos vão desde a dificuldade de acompanhamento das aulas pelos menos preparados – o que pode motivar desistências – até a tentação de baixar o nível da universidade para atender esse aluno – o que, a médio prazo, valoriza no mercado de trabalho os jovens que cursaram faculdades particulares que investirem na qualidade do ensino.
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