EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo
A crise econômica tem feito estragos severos nas contas públicas nacionais, ainda em estado muito melhor que as do mundo rico, mas em visível deterioração nos últimos meses. Com a economia crescendo bem menos que a dos outros países emergentes e perdendo a corrida até para a americana, atolada numa gigantesca dívida federal, o País tem perdido fontes importantes de geração de tributos. De janeiro a agosto, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) rendeu apenas R$ 30,7 bilhões, 2,2% a mais que em igual período de 2011. O governo central arrecadou em oito meses R$ 691,9 bilhões, 7,2% mais que um ano antes, mas gastou 12,2% mais que nos meses correspondentes do ano anterior. Dividendos de estatais bem maiores que os do ano passado ajudaram a reforçar a posição do Tesouro e o recurso a esse expediente deve intensificar-se até o fim do ano.
A redução de juros, alardeada como uma das grandes metas da presidente Dilma Rousseff, permitiu a redução dos custos financeiros, mas, apesar disso, o buraco total das contas públicas aumentou nos últimos meses. Entre março e agosto, a despesa com juros dos três níveis de governo - valor acumulado em 12 meses - diminuiu de R$ 236,7 bilhões para R$ 224 bilhões, passando de 5,6% do Produto Interno Bruto (PIB) para 5,2%. Mas o déficit nominal (incluídos os gastos com juros) cresceu de 2,4% para 2,7% do PIB nesse intervalo. Essa evolução, estranha à primeira vista, é facilmente explicável. A correção da dívida de Estados e municípios foi uma das causas. A outra, mais importante, foi a piora das contas primárias, isto é, do resultado de receitas e despesas antes do pagamento de juros.
Entre março e agosto, o superávit primário acumulado em 12 meses por todo o setor público diminuiu de 3,2% do PIB para 2,5%. No caso do governo central, a redução foi de 2,4% para 1,8%. Isso inclui uma ligeira piora no déficit da Previdência, mas a causa principal foi mesmo a deterioração das demais contas do governo federal.
Não há como mexer nas contas da Previdência, depois de fixado o aumento dos benefícios. A partir daí, a despesa evolui de forma quase automática, apenas afetada pelo aumento ou pela redução dos empregos formais. Os contratos com carteira assinada continuaram aumentando neste ano, embora menos que em 2011, e essa evolução positiva reforçou as contas previdenciárias, ou, pelo menos, impediu uma deterioração maior.
O aumento salarial do funcionalismo resultou numa expansão dos gastos - apenas 3,3%, em termos nominais. No próximo ano o quadro será muito menos benigno, por causa dos aumentos salariais concedidos neste ano. A folha de salários e encargos é uma das despesas dificilmente comprimíveis a curto prazo, porque os vencimentos são legalmente irredutíveis e os funcionários são normalmente estáveis. É um problema semelhante ao dos gastos da Previdência.
O governo federal reforçou suas contas com R$ 16,1 bilhões de dividendos pagos por estatais, valor 26,7% maior que o de um ano antes. Em 2011 o Tesouro já havia recorrido a dividendos para reforçar as contas e garantir o cumprimento da meta fiscal. Em 2012, no entanto, esse expediente é mais importante. Até o fim do ano a contribuição das estatais deve chegar a R$ 29 bilhões, um número recorde que aparece na revisão bimestral de execução orçamentária.
A economia brasileira cresceu 2,7% em 2011. Deve crescer 2%, segundo as novas contas do Ministério do Planejamento. O Banco Central acaba de publicar uma previsão de 1,6%, muito parecida com a do mercado financeiro. O resultado abaixo de medíocre é explicável essencialmente pelo mau desempenho da indústria de transformação. Mais uma vez, segundo os economistas do BC, a expansão do comércio varejista é bem maior que a do setor manufatureiro. Ou, como afirmam os técnicos da Confederação Nacional da Indústria: o esquema de crescimento baseado no estímulo ao consumo está esgotado. Com grande atraso, o governo parece haver descoberto esse fato.
A estagnação da indústria, resultado de um erro de estratégia, reflete-se agora, com toda força, nas finanças do governo. O círculo completou-se.
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