segunda-feira, 13 de maio de 2019

A importância politica do Censo

MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 01/05

No mundo moderno, é possível dizer que o censo é o termômetro de uma gestão democrática. É a partir dele é que políticas públicas podem ser planejadas


Foi aprovado ontem o processo de contratação dos temporários para o Censo, tendo sido o ato publicado no Diário Oficial da União. Espera-se que um outro, referente aos recenseadores, seja divulgado pelo DOU até sexta-feira. O perigo de não realizar o Censo ano que vem parece estar superado, o que nos colocaria em situação similar à Etiópia, que não fez o censo, mas está em guerra civil há duas décadas. Esse é o tipo de país que não consegue fazer um censo. Foi o nosso caso em 1990, no governo Collor, cuja desorganização acabou transferindo o censo, que se realiza de 10 em 10 anos, para o ano seguinte.

Não é à toa que se considera que a realização de um censo mostra a capacidade de gestão de uma sociedade. No mundo moderno, é possível dizer que o censo é o termômetro de uma gestão democrática, pois uma das suas funções básicas é medir a densidade populacional de um país e seu perfil econômico e social. A partir dele é que as políticas públicas podem ser planejadas. 

Sendo o próximo ano de eleições municipais, não ter um censo, que alimenta diretamente o Fundo de Participação dos Estados e Municípios, provocaria mais crise nas políticas governamentais. Estimar esse denominador corretamente é o alicerce de todas as políticas públicas (FPE e FPM), e também serve para calcular a amostra de todas as pesquisas importantes, como a Pesquisa Nacional por Domicílio (PNAD).

O censo, por definição, tem que ir a todos os domicílios, pelo manual das Nações Unidas, para que seja possível comparar todos os países. O manual para os censos 2020 (Principles and Recommendations for Population and Housing Censuses) recomenda que os tópicos a serem cobertos num questionário censitário devem ser determinados buscando-se um equilíbrio entre as necessidades de informações dos usuários, a existência de outras fontes de dados para as mesmas informações e a disponibilidade de recursos do país para realizar a operação censitária.

Essa busca de equilíbrio deve levar em conta, para a ONU, as vantagens e limitações de se obter as informações por método alternativo ao censo. Não ter censo no ano zero não só traz uma série de complicações domésticas, com a quebra das séries históricas, mas tem implicações internacionais importantíssimas. Nos critérios da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE), que reúne as maiores economias do mundo, da qual o Brasil está empenhado em participar, está o fortalecimento dos institutos de estatísticas do país, e a condução de um censo de qualidade.

Comparado com 10 anos atrás, nosso contexto de país, e o de mundo, é completamente diferente. Hoje, assim como o mundo, o país está totalmente conectado, e o fenômeno da subnumeração ganha relevância, não apenas pelos erros técnicos que dele decorrem mas, também, pelo que ele revela de nossa realidade, muitos mais violenta. Além da perda de credibilidade das estatísticas oficiais.

Foi feita uma prova piloto do censo, dentro da amostra de 20 mil domicílios no Brasil inteiro, e houve nada menos que 54% de recusa, ou de registro de que o cidadão não estava em casa. O IBGE, diante das restrições orçamentárias, está se organizando para antecipar uma transição que seria feita naturalmente, do censo genérico para um Censo Misto, usando tecnologias que permitem a atualização dos registros com amostras menores.

Além de uma campanha para mostrar à população a importância do Censo, e pedir sua colaboração, uma sequência de ajustes será feita na operação, que precisa ser mais simples e ágil. Precisa focar no central, que é conseguir os dados para a realização de políticas públicas, sem perder as séries históricas.

Aliás, os Estados e Municípios, dado o Fundo de Participação, são os maiores interessados, e o IBGE espera que ajudem na operação de coleta de dados. 
É preciso fazer o ensaio-geral, que é o censo experimental, que ocorrerá em Poços de Caldas, Minas, em setembro, um ano antes do censo real. É uma operação de guerra. São mais de 200 mil pessoas que entram nessa operação que vai a 71 milhões de domicílios.  

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