domingo, 26 de maio de 2019

O salto de produtividade do setor agrícola

- CELSO MING  O Estado de S.Paulo - 10/05

As principais instituições encarregadas de prever as safras começaram o ano com projeções de queda de crescimento. O fator adverso foram as más condições climáticas, especialmente a falta de chuvas na temporada da semeadura de primavera.

Mas, ao contrário do que aconteceu com o resto do PIB, cujas previsões começaram o ano bombando e agora despencaram, as novas projeções da agricultura são altamente promissoras. A Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), por exemplo, estima que a safra de grãos desta temporada alcance 236,7 milhões de toneladas, 4% superior à do ano anterior. Enquanto isso, o IBGE aponta 231,5 milhões de toneladas, crescimento de 2,2%.

Para efeito do PIB, o resultado será mais modesto pelo efeito preço. PIB é renda; renda e preço mais baixos implicam impacto negativo no PIB. Feitos os cálculos em dólares com os preços dos dois principais produtos agrícolas, nos cinco primeiros meses do ano, a soja perdeu 11,8% e o milho, 9,5%.

O fator mais impressionante na notável evolução do agronegócio no Brasil dos últimos anos não é o aumento da produção, mas o rendimento físico, ou seja, o aumento da produtividade por área plantada. Entre as safras de 2003/04 e as de 2018/19, a produção de grãos no Brasil aumentou 98,7%, enquanto a área plantada aumentou apenas 32,5%. A produtividade assim medida avançou 94,7%.

Como no futebol, em que não é apenas quem empurra a bola para dentro do gol que produz a vitória, também na área agrícola há muitos fatores que contribuem para o avanço da produtividade.

Aí é preciso levar em conta o impressionante aumento do mercado externo de consumo, especialmente na Ásia e, em particular, na China. Não houvesse a explosão das classes médias asiáticas e a busca por alimentos de qualidade, o agronegócio no Brasil provavelmente teria ficado relativamente estagnado. Outros produtores mundiais também tiraram proveito da renovada gênesis asiática, mas nenhum deles como o Brasil. E aí entram os fatores positivos próprios, a começar pela alta disponibilidade de terras.

Houve os resultados de tantos institutos de estudo e pesquisa que puxaram pela modernização. E houve o largo emprego de tecnologia de ponta que abrange enorme campo de atividades, desde as novas técnicas de preparo e manejo do solo, o largo emprego de sementes geneticamente modificadas até o uso de equipamentos de última geração, como tratores e colheitadeiras de condução automática e o emprego de drones para o controle de pragas ou da adubação correta. De uns anos para cá, boa parte das novas áreas de plantio proveio de simples incorporação de pastagens degradadas – e não de desmatamento.

No entanto, o que mais mudou foi a cabeça do produtor. Até há alguns anos, o agricultor brasileiro era um chorão inveterado. Queixava-se das condições do tempo, do governo que o ignorava, do preço alto demais dos insumos, da falta de crédito e da baixa qualidade da mão de obra. Mas, à parte o poder de lobby, que aumentou muito, ele se modernizou, tomou conhecimento das novas tecnologias à sua disposição e passou a empregá-las. Tratou de enfrentar as agruras de sempre não mais com lamúrias, mas como problemas a resolver. Essa mudança de atitude não tem preço e passou a dar frutos, nem sempre imediatamente reconhecidos. A esperança é que essa atitude modernizadora também se estenda para empresários de outros setores.

Infelizmente, não é esse estado de espírito que comanda a maior parte das lideranças industriais do País que seguem compensando a baixa competitividade das empresas com pressões junto do governo por mais pacotes de bondades de curto prazo.



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