Pedro S. Cecchi
Valor Econômico
O aumento das descobertas de gás natural no Brasil comprova as estimativas do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2011-2020, realizado pelo Ministério de Minas e Energia e pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Segundo a projeção do Plano, a demanda de gás natural para os setores industrial, agropecuário, transportes, residencial, comercial e público deve crescer à taxa média de 5,7% ao ano no período, alcançando em 2020 o volume aproximado de 70 milhões de metros cúbicos por dia (m3 /d), comparados com os atuais 39 milhões de m3 /d em 2011. Adicionalmente, devemos considerar a demanda de 136 milhões de m3 /d como insumo para geração de energia elétrica, matéria-prima para fertilizantes, consumo nas refinarias e atividades de exploração, produção e transporte de hidrocarbonetos. Em termos globais de demanda, para 2020 estima-se um total de cerca de 206 milhões de m3 /d, resultando um crescimento médio anual de 7,7%, dado os atuais 105,9 m3 /d em 2011.
Fonte de energia de menor impacto ambiental, o gás é uma solução sustentável para substituir os combustíveis carvão e óleo atualmente utilizados nas usinas térmicas geradoras de energia. Segundo os dados recém-publicados pela Agência Internacional de Energia (AIE), o gás é o único combustível fóssil que terá aumento de participação na matriz energética global até 2035. No Brasil, o aumento da utilização do gás natural na geração de energia também será uma verdadeira revolução social nas regiões mais remotas que não contam com abastecimento regular de energia elétrica. Mas, todas as benesses advindas do uso do gás natural, como a garantia de fornecimento de energia firme e limpa, por exemplo, estão ameaçadas pela falta de investimentos na infraestrutura de transporte e distribuição desse insumo.
Uma das medidas para solucionar o gargalo na infraestrutura é o compartilhamento da faixa de servidão de dutos já existentes. A faixa de servidão é uma área sob um duto de petróleo, derivados ou gás natural, devidamente delimitada e identificada, cujo direito de acesso é garantido à proprietária do duto para fins de operação, inspeção, reparo, manutenção e preservação contra intervenções de terceiros.
Com a abertura do setor de óleo e gás no Brasil em 1997, surgiram novos players que atuam na exploração e produção em regiões onde já existe infraestruturas de transporte. Os novos investimentos no setor resultarão, indubitavelmente, em novas descobertas e na execução de projetos de desenvolvimento, aumentando, assim, a demanda por infraestrutura de transportes. O caminho natural em todo o mundo é, sempre que possível, compartilhar faixas de servidão de dutos para acelerar os empreendimentos, reduzir os custos e minimizar o impacto ambiental.
Particularmente no segmento do gás natural, o compartilhamento da faixa de servidão é essencial para o crescimento da participação desse insumo na matriz energética brasileira, que hoje é de apenas 10%.
A indústria de gás natural conta com apenas aproximadamente 9,2 mil km de gasodutos de transporte e 18,4 mil km de redes de distribuição de alta, média e baixa pressões, que totalizam 27,6 mil km.
Para dimensionar o tamanho do problema, basta compararmos os números com outro país latino-americano. A Argentina, com um terço da área do Brasil, conta com 11 mil km de gasodutos de transporte e 93 mil km de redes de distribuição, que alcança a extensão total de 104 mil km. Ou seja, quatro vezes a nossa rede de dutos. No país vizinho, o consumo de gás natural per capita equivale a nove vezes o consumo do Brasil. Além disso, na Argentina, a participação do gás natural na matriz energética é de 52%.
Esses números mostram que a indústria nacional de gás natural está apenas engatinhando e sua expansão demanda não apenas aumento de exploração, produção, redes de distribuição e malha dutoviária, mas também melhoria do arcabouço institucional que crie ambiente propício aos novos investimentos em infraestrutura.
Identificada uma das medidas para solucionar o gargalo na infraestrutura de transporte do gás natural, faz-se necessário preencher a lacuna existente na legislação, uma vez que Lei do Gás (Lei nº 11.909, de 4 de março de 2009) não faz referência à utilização de forma compartilhada da faixa de servidão de um gasoduto de transporte. E a regulamentação desse compartilhamento foi prevista na Resolução Aneel/ Anatel/ANP nº 1, de 24/11/1999, que aprovou o Regulamento Conjunto para Compartilhamento de Infraestrutura entre os Setores de Energia Elétrica, Telecomunicações e Petróleo.
Segundo o Parágrafo Único do Art. 1º do Anexo à referida Resolução, as regras de compartilhamento de infraestrutura entre agentes de um mesmo setor serão objeto de regulamentação específica, conforme a competência de cada agência, neste caso, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Na regulamentação, a ANP deverá observar as diretrizes da resolução, como o estabelecimento de regras de atendimento aos parâmetros de qualidade, segurança e proteção ao meio ambiente e de formação de preços e condições justas e competitivas.
Em síntese, o compartilhamento das faixas de servidão representará uma melhoria para o futuro do gás natural. As empresas de exploração e produção de petróleo e gás natural poderão expandir seus projetos de investimentos, já considerando a redução de custos a ser obtida com os pedidos de compartilhamento, como a utilização da faixa de servidão de um gasoduto já existente. Além do aumento de emprego e da geração de renda nas regiões de atuação, haverá outros benefícios com os novos investimentos, como a diminuição do tempo de implantação dos projetos e a redução dos impactos ambientais.
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