terça-feira, 22 de maio de 2012

O Rio não merece o Copacabana Palace




 BARBARA GANCIA
FOLHA DE SP 

Quem foi que apontou uma arma na fuça de Carlos Lacerda em pleno bar do Copa?

HOSPEDEI-ME NO Copacabana Palace na semana passada, o primeiro grande hotel que conheci, aos quatro anos de idade. De lá para cá, o Copa permanece sendo para mim um oásis onde tu­do dá certo. Tão certo, que até o ser­viço de quarto consegue acertar o meu sexo, apesar de minha voz de Gengis Khan, atendendo aos meus chamados sempre com a mesma frase: "Pois, não senhora?"

Para quem já passou pela "benet­tonização" do mundo, vendo surgir uma loja padronizada em cada es­quina do planeta, de Durban a Tiananmen Square, depois observou a mesma uniformização que ocorreu no vestir acontecer no mercado do luxo, na forma da "louisvuittoniza­ção", nada mais natural do que ob­servar agora a estandardização da hotelaria. Não que o fenômeno seja novo, nada disso.

A essa experiência, em que o clás­sico foi desprezado em favor do pós-moderno ou do moderninho, eu chamo de "philippestrackiza­ção" e, pessoalmente, para mim, ela significa a morte.

Certa vez, hospedei-me em um hotel do arquiteto Philippe Starck em Nova York. Não consegui en­contrar lugar para apoiar a mala, não dava para ler na cama, ajeitar o nécessaire no banheiro, enfim, era tudo tão minimalista que tive von­tade de mandar o sr. Starck usar um daqueles espremedores de limão que ele produz para fins um tanto mais rústicos.

Mas voltemos ao Rio. Nesta sema­na mais um prédio desabou ao lado de onde estão a Petrobras e o hotel Glória, que está sendo renovando pelo novo salvador da pátria, Eike Batista. Vá você tentar dizer alguma coisa a seu respeito a um carioca em uma cultura acostumada a re­verenciar qualquer barão que faça uma benfeitoria na cidade. Lembra do Aniz Abrãao, Castor de Andrade e do Nem? Pois então. Bastou fazer que ganha aplauso, ninguém nem sequer pergunta quem é.

E dá-lhe bandana na cabeça no Le Bristol de Paris e às favas com a tra­dição. Quem quer saber se Orson Welles ou Frank Lloyd Wright an­daram pelo Rio ou se Santos Du­mont e Ava Gardner curaram a res­saca no bar do Copa?

Em Santa Tereza, o hotel em que a Amy se hospedou sofreu arrastão? Não importa, é lá que o pessoal que frita a cabeça em Ibiza quer ficar.

O Rio de Janeiro é um visto de ci­ma (esplendoroso) e outro (por ve­zes aterrorizante) visto da calça­da. Os turistas que hoje atrai são to­dos duas estrelas. De três estrelas para cima, ninguém quer ir descan­sar em lugar com praias infectadas.

Endinheirado, mesmo, só vem para cá a turma dos bacanas, o pes­soal in, que sabe circular e conhece aquele cara que conhece o outro, que vai na casa do Caetano e joga bola na casa do Chico. É a "wallpa­perização" do sistema. Para eles existe o hotel Fasano, muito baca­na, aliás, mas que atende a um cir­cuito fechado.

Neste ano o naufrágio do Titanic comemora cem anos. Ele nos fasci­na até hoje por ter simbolizado, além de um tapa na presunção de domínio sobre a tecnologia, tam­bém o fim da era da "noblesse obli­ge". John Jacob Astor IV, o homem mais rico do mundo à época, recu­sou-se a subir nos botes salva-vidas para ceder seu lugar. Morreu de ca­saca ouvindo a orquestra e beben­do champanhe. Não estou dizendo que o Copacabana Palace repre­sente esse tipo de espírito em con­traste com a esbórnia da turma de lenço na cabeça.

Mas o Rio de hoje faz tudo para não merecer o Copa e seu valor his­tórico e cultural. Quem ainda se lembra quem foi que apontou uma arma na fuça de Carlos Lacerda em pleno bar do Copa?
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2 comentários:

  1. Não é difícil perceber que o texto traduz o pensamento de um ignorante. De alguém que desconhece o Rio, suas mazelas e seus encantos. De alguém que exagera em rótulos de um tempo que passou para ele despercebido. De alguém que fala de celebridades que tomou conhecimento em alguma revista de fofocas. De alguém que conhece a história assistindo Globo Repórter. Meu caro, quando voltar, faça contato. Terei prazer em lhe mostrar o Rio de Janeiro sob o prisma de quem vive o seu dia a dia. De lhe mostrar o que temos de pior e de melhor. A verdade, e como não estamos tratando, acho eu, de uma troca de farpas bairrista, seguindo o seu pensamento, grandes cidades do mundo não mereceriam metade dos seus patrimônios. Mas, definitivamente, Recife não entraria nessa lista. Porque ela sim, ela merece o que tem. Como alguém tão especial como você. Abraço.

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  2. Já ia me esquecendo... uma abraço à Bárbara deseleGância também.

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