FERREIRA GULLAR
FOLHA DE SP
O 'Diário Carioca' introduziu no jornalismo brasileiro a técnica redacional norte-americana do lide e sublide
O "Diário Carioca" (1928-1965) nunca esteve entre os grandes jornais brasileiros mas, ainda assim, marcou época e contribuiu para a modernização de nossa imprensa. É o que está evidente no livro que Cecília Costa acaba de publicar e cujo título diz exatamente isso.
Conforme nos conta, foi por acaso que soube desse jornal, de que mal ouvira falar, já que ninguém o lia em sua casa. Foi atrás, pesquisou, ouviu jornalistas que nele haviam trabalhado e nos deu um livro feito com indiscutível empenho, rico de informações e pleno de lucidez.
O assunto também me diz respeito, muito embora o "DC" nada me deva. Muito pelo contrário, fui eu que muito aprendi no pouco tempo em que ali trabalhei. Lembro esse tempo com muito prazer e saudade, uma vez que nunca pertenci a uma Redação de gente tão bem-humorada quanto aquela. Esse bom humor se refletia nos textos, nos títulos e às vezes na escolha dos assuntos noticiados. O principal responsável por isso era Luiz Paulistano.
Já me referi, aqui mesmo, noutras crônicas, a esse ambiente de camaradagem que nos contaminava a todos. Mas o "DC" não se limitou a isso: implantou no jornalismo brasileiro a técnica redacional norte-americana do lide e do sublide, que veio substituir, em nosso jornalismo, o velho "nariz de cera".
A nova técnica introduzia o leitor de imediato no fato que estava sendo noticiado, já que, em dois parágrafos de quatro linhas cada, saberia o fato que se queria contar, quem era o autor da ação, onde e quando ocorrera e por quê, se fosse o caso.
Mas o livro de Cecília Costa não se limita a nos contar a história do "Diário Carioca". Vai adiante ao nos informar do desdobramento que aquela experiência jornalística conheceu, quando alguns daqueles redatores transferiram-se para o "Jornal do Brasil", em 1958, no momento em que se iniciou a renovação do velho jornal, então transformado num veículo de anúncios classificados. Nem Redação tinha mais, e as notícias eram transcrições do que publicava a agência oficial do governo federal.
A renovação do "Jornal do Brasil" começou, de fato, com o suplemento literário (o "SDJB"), criado por Reynaldo Jardim no ano de 1956. O êxito desse suplemento estimulou a condessa Pereira Carneiro, sua proprietária, a renovar o próprio jornal. Chamou Odylo Costa Filho para fazê-lo.
O acaso, como se sabe, é um fator decisivo na existência dos fatos e das pessoas. E assim foi que, por acaso, fui parar na Redação do "JB", por indicação de Carlos Castelo Branco. É que, àquela altura, já o "DC" atrasava pagamento dos salários, e eu necessitava daquela grana para as despesas da família.
Assim foi que, por acaso, me tornei chefe do copidesque do "JB". Para compô-lo, sugeri a Odylo a contratação de dois redatores: Jânio de Freitas e José Ramos Tinhorão, ambos ex-colegas meus no "DC". A vinda de Jânio -que era meu amigo desde quando trabalhamos na revista "Manchete"- foi decisiva.
Com a colaboração de Amílcar de Castro, começou uma revolução gráfica no "JB". Já falei aqui, mas acho importante repetir: naquela época, as primeiras páginas dos jornais eram ocupadas por matérias que continuavam nas páginas de dentro, quaisquer páginas.
Jânio mudou isso, ocupando a primeira página com resumos das notícias principais, que estariam completas numas mesmas páginas, conforme o assunto. Isso obrigou a escrever as matérias em tamanho definido. Assim nasceu o papel diagramado: cada redator tinha que ater-se a um número exato de linhas.
O jornal ganhou em organização e em clareza. Pode ser que exagere. A verdade, porém, é que os demais jornais pouco a pouco absorveram essas inovações surgidas no "Jornal do Brasil".
Cabe ressaltar que uma parte importante do livro de Cecília são depoimentos que nos mostram, sem mistificação, o que eram os jornais daquela época.
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