O sentido político da vaia recebida pela presidente Dilma de uma plateia de prefeitos, anteontem, em Brasília, extravasa a demonstração de deselegante intolerância. A presidente foi punida pelo apupo ao dizer uma verdade: se prefeitos, governadores e respectivas bancadas do movimento de reforma do sistema de royalties sobre o petróleo investirem na quebra de contratos, para auferir receita imediata, serão derrotados na Justiça. Terão deflagrado uma crise federativa, com todas as implicações negativas de um conflito desse teor - Congresso paralisado, retaliações -, e não obterão êxito.
O explosivo tema tem várias facetas. Uma delas, as deformações institucionais existentes no universo de 5.565 municípios, a grande maioria dos quais sem condições de sobreviver com receitas próprias. Com a liberalidade permitida após a promulgação da Constituição de 1988, surgiu uma indústria de criação de prefeituras apenas com objetivos políticos paroquiais. Em não muito tempo, fundaram-se quase 1.500 municípios. Poucos ou nenhum em condições de arrecadar o próprio sustento.
Vivem dos repasses de estados e da União. E veem na distribuição nacional dos royalties do petróleo mais uma fonte de dinheiro fácil para financiar seus projetos, nenhum de grande relevância. Pois, se fossem obras muito necessárias, o cenário do saneamento básico brasileiro não seria tão vergonhoso.
A vaia de terça-feira saiu de uma aliança política entre governadores, bancadas e prefeitos de estados não produtores de hidrocarbonetos interessados em abocanhar um dinheiro novo, sem qualquer preocupação com o aspecto legal da questão.
A responsabilidade do cargo leva a presidente Dilma a alertar prefeitos e a quem interessar para a impossibilidade de receitas de royalties de campos já em produção ou licitados, à espera do início da fase de exploração, serem repartidas segundo novas regras. Estará configurada a quebra de contrato, causa de insegurança jurídica, sem chances de passar pelo crivo do Supremo Tribunal Federal (STF). Como acontecerá, caso estados produtores (Rio de Janeiro, Espírito Santo à frente) sofram o esbulho no Congresso.
O presidente Lula conteve, uma primeira vez, o delírio no veto à emenda do deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) ao projeto da nova distribuição de royalties, a partir do novo modelo de exploração aprovado na Câmara. A questão foi ao Senado e está de volta à Câmara, em que o deputado Carlos Zarattini (PT-SP) trabalha na relatoria de nova proposta.
Se não seguir as linhas de uma proposta ainda do governo Lula, pela qual só as receitas futuras poderão ser repartidas por novos critérios em benefício de estados não produtores, o impasse continuará. Como a União resiste a abrir mão de recursos, obtidos também dos royalties, para o restante da Federação, as chances de haver acordo que não fira qualquer direito das regiões produtoras se estreitam.
É positivo o entendimento do Palácio do risco da crise institucional que poderá ocorrer, e da qual toda a Federação sairá com prejuízos. O alerta feito pela presidente demonstra esta consciência. Mas é crucial a coordenação do Planalto, no Congresso, e junto a governadores, para evitar uma ruptura federativa.
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quinta-feira, 17 de maio de 2012
O significado da vaia de prefeitos
O Globo
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