Adriana Fernandes - O Estado de S.Paulo
As resistências estão em ebulição e podem desmanchar pacote de compensação
O recuo do recuo na tabela de preço mínimo do frete é só uma amostra da batalha que vem por aí em torno dos termos do acordo que o presidente Michel Temer fechou com os caminhoneiros para garantir uma queda de R$ 0,46 do diesel nas bombas.
As medidas que a equipe econômica anunciou para bancar parte do custo para as contas públicas do subsídio ao diesel – a bolsa caminhoneiro – também estão sob forte ataque dos setores que perderam com o pacote anunciado às pressas no dia 31 de maio, enquanto os caminhoneiros ainda tomavam conta das rodovias e impediam o abastecimento do País.
Depois do frete, essa será a próxima zona de desgaste do governo. As resistências estão em ebulição e podem desmanchar o pacote de compensação que o governo adotou.
A grita maior vem da Zona Franca de Manaus e é contra a medida que barra a engenharia tributária com uso do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) feita pelas grandes multinacionais produtoras de bebidas – entre elas Coca-Cola e Ambev – para obter crédito tributário na venda de xarope usado na fabricação dos refrigerantes.
A bancada do Amazonas se articulou para derrubar o decreto do presidente no Congresso. Os deputados Pauderney Avelino (DEM-AM) e a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) apresentaram cada um deles uma proposta para derrubar o decreto do presidente que busca diminuir os prejuízos
Pelos cálculos do Fisco, para cada R$ 100 vendidos por uma empresa que produz na Zona Franca, R$ 4 acabam sendo “pagos”, na prática, pelo Tesouro.
Ou seja, por todos os contribuintes.
É que essas empresas não só conseguem não pagar o tributo com a isenção da Zona Franca como também ficam com o crédito tributário, que pode ser usado para pagar o IPI de outros produtos, inclusive de outras bebidas, como cervejas.
Como a empresa instalada em Manaus não paga o IPI, ela fica com crédito muito alto. E usa esse crédito para abater o débito do imposto de outros produtos. Em busca do mesmo “benefício”, empresas menores de refrigerantes também correram para fabricar o xarope no norte do País.
Não é de hoje que o governo tenta acabar com essa manobra tributária sem sucesso. O ex-ministro da Fazenda Guido Mantega propôs à presidente Dilma Rousseff a medida, que menos de quatro dias depois de editada foi revista diante de tamanha pressão das empresas e dos parlamentares na época.
O governo considera que o decreto legislativo é ilegal e se prepara para a batalha jurídica, caso seja aprovado. Pela Constituição, decreto legislativo só pode ser aprovado quando o Poder Executivo exorbita na regulamentação de uma lei. O que na visão da área econômica não é o caso porque o governo pode por decreto regular o IPI.
A outra frente de pressão vem dos exportadores que não querem a redução quase a zero do Reintegra, programa que garante um crédito tributário nas vendas externas. Na mira da Organização Mundial do Comércio (OMC), o programa – caríssimo, diga-se – foi criado para eliminar os resíduos tributários na cadeia de produção de produtos exportados. Algo que o Brasil não conseguiu comprovar até agora no processo aberto pela organização. A economia só com essa medida em 2018 é de R$ 2,27 bilhões. E no ano que vem mais R$ 10 bilhões. A mais importante das medidas do ponto de vista de economia de arrecadação.
O presidente Michel Temer vetou parte dos setores que continuariam com a desoneração da folha de pagamento, benefício criado no governo da ex-presidente Dilma Rousseff. A medida que na prática aumenta a carga tributária das empresas para compensar parte das perdas com subsídio do diesel também pode sofrer baixas no Congresso. Parlamentares insatisfeitos prometem derrubar os vetos.
Com tantas resistências e recuos do Palácio do Planalto, não se sabe qual será a capacidade de resistência do presidente aos pedidos de mudanças nos pontos de compensação do pacote para agradar aos caminhoneiros. E, aí, novas medidas terão que ser editadas ampliando o desgaste do governo.
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