Celso Rocha de Barros - Folha de S. Paulo
Faltam quatro meses para a eleição e, até agora, a disputa parece ser anormal
A nova pesquisa Datafolha trouxe resultados bem diferentes da realizada em abril. Os números são quase exatamente os mesmos. Mas esses mesmos números, a tão pouco tempo da eleição, são um resultado muito diferente.
A discussão central entre os analistas da eleição de 2018 é se ela será uma eleição "normal". Haverá de novo uma polarização entre a centro-direita e a centro-esquerda, como vinha sendo PSDB vs. PT? O peso de estrutura de campanha, alianças, horário de TV e dinheiro será o mesmo que foi nas eleições anteriores? Não era esse o quadro no Datafolha de abril.
Lula ainda liderava tranquilamente, mesmo depois de condenado, e sem Lula na eleição a expectativa era de alta abstenção (uma evidente anormalidade). Mas esperava-se que Lula, depois de preso, perdesse seus votos para outra candidatura de esquerda.
Da mesma forma, Bolsonaro, o candidato mais extremista a disputar com chances a eleição presidencial brasileira em toda a nossa história, aparecia bem colocado, em segundo lugar, muito à frente dos candidatos de centro-direita. Mas esperava-se que esses votos de Bolsonaro voltassem para o centro conforme a candidatura de Alckmin se consolidasse. Faltam quatro meses para a eleição e, até agora, nada disso aconteceu. Os votos de Lula continuam não indo para lugar nenhum, e Bolsonaro continua bem na frente de Alckmin. Os votos de centro-esquerda estão indo para a abstenção, os de centro-direita estão indo para o extremo.
A eleição continua anormal. E faz muita diferença que o quadro tenha continuado assim depois de dois meses. Já deu tempo para desistir de Lula depois de vê-lo sendo preso, e pouca gente desistiu. Os eleitores de direita já sabem que têm uma opção mais moderada em que votar, mas os bolsonaristas não estão migrando para Alckmin.
Isto é, as pessoas que estão se desviando do normal das eleições brasileiras parecem ter convicções bem mais fortes do que achávamos. Nada disso vai mudar por inércia.
Para que a eleição volte a ser disputada em torno do centro, serão necessários gestos políticos grandes, o apoio de Lula a alguém, vitórias de Ciro contra o PT na disputa por aliados (por exemplo, pelo PSB), uma ofensiva muito bem-sucedida de Alckmin contra Bolsonaro.
Não se sabe se esses gestos serão possíveis, se terão tempo de tornarem-se eficazes, ou se neutralizarão um ao outro. O PT vai conseguir resistir à ofensiva de Ciro sobre o patrimônio eleitoral lulista? Se conseguir, será capaz de lançar candidato próprio viável ou a centro-esquerda vai cair dividida? Alckmin conseguirá derrubar Bolsonaro mesmo carregando os pesos mortos de Aécio e da participação no governo Temer? O Datafolha sugere que, no momento, é mais fácil fazer política de dentro da cadeia do que de perto do Planalto.
Até outubro, as máquinas políticas vão rodar, e a pressão pela normalização da eleição será maior. Mas, mesmo se o segundo turno for entre os bons e velhos PT e PSDB, que ninguém se engane: as máquinas não vão continuar rodando indefinidamente sem injeções periódicas de legitimidade. As atuais lideranças precisam se retirar, os partidos precisam se reorganizar ou abstenção e extremismo serão o novo normal.
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Celso Rocha de Barros é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford.
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