domingo, 5 de fevereiro de 2012

Empregadas Domésticas

Certa vez, quando fazia planejamento institucional em RH em uma organização de topo da Aeronáutica, escrevi o artigo "Vivas ao empregado!!" A empregada em questão, de tão boa, seguiu comigo para o exterior onde realizei meu mestrado e por ser excepcional, foi convidada e para lá retornou. Eu sempre a chamei de empregada, jamais de secretária, e ela assim preferia, como também sua carteira assinada, INSS, e vários outros benefícios.

Eu, de fato, implico com neologismos, sobretudo na área de RH que não agregam tanto valor como prometem, na dinâmica relacional entre patrão e empregado. Ora, se temos a mania de copiar as práticas dos livros corporativos americanos, via de regra sem atender a nossa peculiar idiossincrasia morena  -americano no geral odeia greve e trabalha, muito, como voluntário, bem diferente de nossa prática consuetudinária- poderíamos evitar tanta expectativa tola e, também, tratar nossas empregadas com mais respeito e inteligência. Chamar empregada de secretária é um pedantismo que ressalta um lamentável mau gosto. Empregada. Pois ela emprega suas competências laborais e por este motivo é remunerada. Ademais, o  nome é previsto oficialmente, em nosso vernáculo. Nos EUA, em vários locais e cidades e empresas que visitei e conversei é BOSS e EMPLOYEE. Não existe este non sense de Leader and Follower.

Eu sou piloto, também sou professor e também sou administrador, e na minha empresa atual eu sou empregado. NÃO quero ser chamado de COLABORADOR, não, quero cumprir minhas atividades para agregar valor a empresa e a sociedade e por isso ser REMUNERADO, assim como faço com minha EMPREGADA. Eu tenho CHEFE, meus líderes na FAB foram poucos, eu tive muitos CHEFES e nossa relação sempre foi de respeito, distinção e de admiração mútua. Eu sempre disse a meus SUBORDINADOS que os trataria assim e não como LIDERADOS. De acordo com outras vozes, até hoje, mesmo após mais de vinte anos de contato, dizem que lhes sou de referência. Eu nunca me preocupei em ser líder, e sim ser um CHEFE justo e ético e assim convivi muito bem com todos ao longo de mais de vinte anos.


Enfim, a repórter abaixo coloca a questão de forma muito lúcida, acho que já está na hora, se quisermos mesmo amadurecer como sociedade, de passar a falar como gente grande e não com eufemismos.

Ah, minha empregada atual recebe ao todo mais de dois salários atualizados, folgas, incentivos para estudar a noite e eventuais ajudas para educar suas filhas. E é minha EMPREGADA!!




Empregadas Domésticas
MARTHA MEDEIROS
ZERO HORA 

Ouvi em algum lugar que o número de empregadas domésticas tem diminuído de ano a ano no Brasil. É uma boa notícia. A oferta de empregos aumentou e essas profissionais estão buscando colocação em outros setores, onde possam ganhar mais e alinhavar um plano de carreira. 

Pode ser bom inclusive para seus empregadores, que terão que se adaptar a um novo estilo de vida: eles próprios farão os afazeres domésticos, convocando a família inteira para colaborar. Ninguém morre se tiver que cozinhar e lavar uma louça, e me parece digno que os filhos entrem nesse mutirão, se preparando melhor para a vida. Hoje não mexem um dedo porque tem uma Maria que faz tudo por eles. 

Pois a Maria, segundo estatísticas, não quer mais ser empregada doméstica, e sim ter um status mais elevado. Quem sabe, ser uma secretária. De fato uma secretária. Muitas pessoas chamam suas empregadas de secretárias, na boa intenção de prestigiá- las. Acho estranho. Então devemos chamar as verdadeiras secretárias de quê? Empresárias? 

Pessoas que promovem verbalmente suas funcionárias acreditam estar valorizando-as, mas parece o contrário: demonstram que ser empregada doméstica não é honroso, a ponto de fingirem que elas são outra coisa. 

Se eu me referisse à minha empregada como "secretária", creio que estaria revelando desdém a sua real função. Seria o mesmo que chamar o peão-de-obra de engenheiro ou a garçonete de chef de cozinha. Um upgrade de mentirinha. 

Algumas empregadas domésticas ainda não são totalmente alfabetizadas. Não dominam o uso do computador. Não controlam a agenda profissional de seus patrões. São exímias cozinheiras, arrumadeiras, braços direitos das famílias, mas não fazem o que uma secretária faz. Assim como secretárias podem não saber fritar um ovo e nem passar direito uma camisa. Uma não substitui a outra. Umanão é melhor que a outra. Ambas são imprescindíveis, cada uma em seu ambiente de trabalho. 

Se a palavra “empregada” parece pejorativa, pode-se chamá-la de funcionária, que é o que ela é também. Já chamá- la de secretária apenas expurga a culpa do patrão, que não quer parecer um senhor do engenho, do tipo que tem escravos. Ou seja, ele se utiliza de um eufemismo para provar que respeita todos os direitos trabalhistas da sua funcionária. 

Nem se dá conta de que esse pudor com a palavra empregada talvez desmereça as profissionais que tiveram a chance de estudar mais e que fizeram cursos preparatórios para trabalhar numa empresa, e não numa casa de família. 

Secretárias não fazem trabalho doméstico, e sim de escritório. Apesar de eu nunca ter lido nenhuma pesquisa a respeito, tenho a impressão de que elas devem se sentir desconfortáveis ao verem as duas funções confundidas. 

Eu, às vezes, me confundo. Outro dia me disseram: vou te levar lá em casa para provar o suflê de queijo que a minha secretária preparou. Logo pensei: coitada, fazendo hora extra.
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