Roberto Campos
Veja, 18/3/98
Dizia Winston Churchill que a diferença entre o capitalismo e o socialismo é que naquele os resultados são melhores que as intenções; neste, o contrário acontece.
Segundo a retórica hirsuta (e às vezes burra) de nossas esquerdas, na raiz da "exclusão social", que se traduz em desigualdades de renda e no desemprego, estariam três personagens tipicamente capitalistas: o neoliberalismo, a tecnologia robotizante e a globalização.
A realidade é outra. Os Estados Unidos são ao mesmo tempo a fortaleza do liberalismo, têm alta densidade tecnológica e se inserem na economia globalizada. Mas são também a maior máquina de "inclusão social" no mundo, gerando mais de 300.000 empregos por mês para nativos e imigrantes.
A flexibilidade do mercado de mão-de-obra é parte essencial da explicação. Tanto assim que no contexto europeu, afligido por grave desemprego, os países como a Inglaterra e a Holanda, que flexibilizaram sua regulamentação laboral, têm desemprego muito menor que o da Alemanha, sem diferenças apreciáveis no grau de globalização e densidade tecnológica.
É certamente um paradoxo que a economia americana, a mais selvagem na reengenharia e downsizing das empresas durante o ajuste dos anos 80, seja a que goze hoje de menores taxas de desemprego. A crueldade inicial foi mais que compensada por saltos de produtividade.
No Brasil, a "exclusão social", traduzida na elevação do desemprego no setor formal (85% dos novos empregos se geram no setor informal, à margem da lei), nada tem a ver com os citados personagens. O neoliberalismo é uma ficção num país onde sobrevivem monopólios estatais (inclusive de câmbio), a moeda é inconversível, as importações voltaram ao obsoleto regime de licença prévia e a regulamentação trabalhista é amordaçante. Com uma participação do comércio exterior no PIB de apenas 15%, a economia está longe de ser globalizada. E a densidade tecnológica e o nível de automação são primitivos pelos padrões europeus e americanos.
A explicação tem de ser buscada alhures. A responsabilidade pela "exclusão social" recai principalmente sobre as posturas antiliberais e anti-reformistas esposadas pelas nossas esquerdas. Basicamente, nosso medíocre crescimento e baixa "empregabilidade" derivam de três fatores:
a) o inadequado nível de investimentos;
b) os encargos trabalhistas desincentivadores das contratações;
c) a falta de liberdade empresarial.
Ao defender os monopólios estatais, as esquerdas reduzem nosso potencial de absorção de capitais privados nacionais e estrangeiros e, portanto, nossa capacidade de gerar empregos. Como o governo despoupa, é levado a aumentar impostos ou a financiar-se a juros altos, asfixiando a atividade privada.
A onerosa regulamentação trabalhista, defendida pelos sindicatos, expulsou 57% da mão-de-obra para a economia informal, à margem da proteção previdenciária e do sistema de crédito. Os sindicatos, hoje em declínio no mundo inteiro, são assim agentes de "exclusão", pois, se protegem os empregos e salários dos já empregados, nada fazem pelos desempregados (a não ser talvez torná-los inempregáveis).
Curiosamente, nossos políticos de esquerda não se pejam de apoiar a manutenção de privilégios previdenciários para o setor estatal, assim como a universidade gratuita para os ricos, surrupiando recursos que deveriam caber à educação de massa.
O outro elemento faltante em nossa dinâmica de desenvolvimento é a liberdade empresarial. Somos ainda a república dos "alvarás", com empresários oprimidos por um sistema fiscal confuso e dependentes de uma infra-estrutura controlada por estatais ineficientes.
A melhor contribuição que poderiam dar nossas esquerdas é parar de dizer bobagens sobre globalização e desemprego tecnológico e deixar que o Brasil tenha um real banho (e não apenas uma benzedura) de liberalismo e capitalismo. Chega de boas intenções. Precisamos de resultados.
Roberto Campos foi embaixador e deputado federal
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