O Estado de S. Paulo
Um ano depois do início das negociações de paz entre o governo colombiano e a narcoguerrilha Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), prevalece o pessimismo.
Em 18 de outubro de 2012, quando começou oficialmente mais essa tentativa de diálogo, sabia-se que não seria nada fácil de superar os tantos entraves depois de meio século de guerra e de diversas negociações fracassadas. Feridas abertas há tanto tempo não cicatrizam só com discursos e boas intenções. Mas havia alguma esperança de que, enfim, as Farc depusessem suas armas e decidissem aderir à democracia.
Tal expectativa surgiu porque a iniciativa das negociações partira da própria narcoguerrilha, talvez um indicativo de suas dificuldades ante a repressão. Tornar-se um movimento político passou a ser uma alternativa real para as Farc, que hoje são muito mais um bando de traficantes - responsáveis por 60% do comércio de entorpecentes na Colômbia - do que um exército revolucionário.
O balanço do diálogo até aqui é razoável, se o parâmetro forem as desastrosas conversações anteriores. Dos cinco pontos iniciais da agenda levada a Havana, sob mediação de Cuba, Venezuela, Chile e Noruega, houve sucesso em apenas um - o governo comprometeu-se a promover uma ampla reforma agrária, reivindicada pelas Farc desde a sua fundação, em 1964. Embora pareça pouco, tratou-se de um avanço inédito e que parecia indicar genuíno empenho das partes. A paz, enfim, parecia estar ao alcance da mão.
A esperança, contudo, começa a dar lugar à frustração. A discussão empacou já no segundo ponto da agenda - a participação dos integrantes da guerrilha na vida política. Para estruturar-se como partido, as Farc exigiram financiamento público, "condições especiais" de acesso a meios de comunicação e reserva de vagas no Congresso para parlamentares da futura legenda.
Tais demandas, se aceitas, seriam certamente repudiadas pela maioria dos colombianos, que ademais nunca acreditaram na boa-fé dos guerrilheiros nessas negociações. Na mais recente pesquisa de opinião, nada menos que 76% dos entrevistados disseram que as Farc não têm intenções legítimas de alcançar um acordo.
O governo do presidente Juan Manuel Santos acusa as Farc de obstar as negociações ao impor temas alheios à agenda oficial - que, além da questão agrária e da participação política, inclui o fim das hostilidades, o combate ao narcotráfico e os direitos das vítimas do conflito. Segundo o negocia-dor-chefe do governo, Humberto de la Calle, os guerrilheiros queriam discutir também o modelo econômico do país e a reforma do Estado, entre outras questões que não são atinentes a uma negociação de paz.
O impasse se dá também porque o presidente Santos não garantiu anistia a líderes guerrilheiros acusados de terrorismo e porque as Farc não aceitavam a ideia de um referendo para avalizar o eventual acordo de paz - em vez disso, defendiam uma Constituinte. A proposta de referendo afinal foi aprovada na Câmara, o que é uma forma de pressão sobre as Farc, dada a sua imensa rejeição popular.
Diante desse quadro, a guerrilha sugeriu que talvez fosse o caso de retomar as negociações somente depois das eleições do ano que vem - haverá pleito legislativo em março e presidencial em maio, e Santos deve ser candidato a mais um mandato.
O governo rejeita o adiamento - teme-se que, se for suspenso, o diálogo não será mais retomado. No entanto, manter conversações impopulares com a guerrilha pode prejudicar a campanha de Santos. Assim, o presidente terá de optar entre seu futuro político imediato, que o impele a endurecer o diálogo com as Farc, e seu legado à história, isto é, insistir num acordo de paz que parece cada dia mais distante.
Não é uma escolha fácil. Considerando-se que atualmente 67% dos colombianos não acreditam num desfecho positivo das negociações com as Farc, Santos terá de ter bons argumentos para mantê-las, se quiser permanecer no poder.
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