PEDRO LUIZ PASSOS
FOLHA DE SP
Nova lei sobre lucros no exterior tem avanços, mas pode evoluir para ampliar a competitividade do país
Pelos padrões internacionais, a nova legislação sobre tributação de lucros no exterior que o governo enviará em breve ao Congresso será uma das mais severas do mundo, mas não deixará de atender, ao menos em parte, o requisito de competitividade das companhias brasileiras com operações internacionais. Como as corporações com as quais concorremos no exterior ainda desfrutarão de vantagens tributárias, esperamos que a modernização legal nessa área esteja apenas começando e que o esforço em prol da competitividade da economia brasileira não seja interrompido.
Persiste, porém, um problema grave na nova regulação: ela não remove a insegurança jurídica quanto à utilização dos acordos celebrados pelo Brasil com outros países para evitar a bitributação.
Eles preveem pagamento de imposto onde o lucro é gerado, em geral, com alíquota inferior à brasileira. A interpretação desses acordos pela Receita Federal gerou um contencioso entre governo e empresas que soma R$ 70 bilhões. Como tal disputa está distante do desfecho, o governo anunciou o abatimento de multas e juros para as empresas que pagarem à vista o valor do principal, estimado em R$ 27 bilhões.
É difícil antecipar o nível de adesão ao programa. De qualquer forma o ideal seria que a nova legislação estabelecesse uma interpretação inequívoca, válida para os acordos em vigor e os futuros compromissos.
A nosso ver, é possível combinar o estímulo à internacionalização com a preservação da base tributária nacional, de modo a assegurar que a maior presença da empresa brasileira no exterior gere em sua plenitude efeitos positivos sobre o desempenho da economia.
Ao longo do último ano, governo e empresas realizaram reuniões com o objetivo de revisar a legislação. O governo demonstrou ininterrupta disposição ao diálogo e, de fato, buscou meios para melhorar a competitividade da empresa brasileira, sem abrir mão de controles fundamentais sobre a base tributária.
Nesse sentido, atendeu a algumas ponderações do setor privado, dentre as quais duas se destacam.
Primeiro, parcelou o pagamento do imposto sobre resultados no exterior em oito anos, embora tenha exigido a incidência de juros baseados na Libor. Com isso, amenizou as desvantagens que as novas regras trariam às corporações nacionais em relação às empresas de outros países que adotam regimes tributários distintos.
Segundo, aceitou compensar o prejuízo em determinado país com o lucro obtido em outro mercado, um mecanismo comum em todo o mundo, mas que, segundo a Receita, pode ser uma fonte de erosão da base fiscal.
Aqui a questão concorrencial também é decisiva: a proibição de abater do imposto devido os prejuízos que normalmente ocorrem nos primeiros anos de operação em novos mercados constituiria uma desvantagem para as empresas brasileiras, ao impedir a redução de seu atraso no processo de internacionalização.
Sugestões levadas ao governo pelo IEDI abriram caminho para uma parcial revisão do tema: a medida somente seria aplicada para as atividades operacionais das empresas fora de paraísos fiscais e que abrissem integralmente suas contas no exterior. Como meio adicional de proteção, o governo optou por aplicar a medida a países e atividades selecionados e definiu um "prazo experimental" de quatro anos para sua vigência.
Entendemos que estabelecer um marco legal para as operações no exterior é tarefa complexa devido à dificuldade em harmonizar dois requisitos: não permitir a erosão da base tributária em razão da expansão das corporações fora do país e incentivar a internacionalização, o que é desejável porque traz vantagens para as próprias empresas, para os trabalhadores e para a economia em geral.
Esse avanço é possível e absolutamente necessário. Ao concorrer no exterior, a empresa assimila e desenvolve padrões superiores de gestão e produtividade. No mundo, está em curso uma revisão dos regimes tributários nacionais visando melhor equilibrar os dois objetivos.
O tema não é isento de polêmicas. A negociação continua sendo o melhor caminho para se construir o consenso.
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