sábado, 19 de outubro de 2013

A outra crise da saúde

 EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP 



Não é só o SUS que padece de males crônicos; clientes de planos privados também sofrem com atrasos e perda de qualidade nos serviços

Sob o ângulo estreito do rendimento eleitoral, fez bem a presidente Dilma Rousseff em remendar falhas gritantes do Sistema Único de Saúde com o programa Mais Médicos. São quase 150 milhões de usuários no SUS, contra menos de 50 milhões nos planos de saúde privados.

O segundo contingente, contudo, merece mais atenção do poder público. São muitas as indicações de que o atendimento na rede de cerca de 1.300 operadoras particulares piora de modo acelerado.

Isso é tanto mais revoltante porque seus clientes pagam duplamente pela saúde: como consumidores e como contribuintes financiadores do SUS, que não usam, mas ao qual recorrem quando o serviço contratado os negligencia.

No Estado de São Paulo, os clientes de planos que se socorrem do SUS chegam a 22%, segundo pesquisa da Associação Paulista de Medicina encomendada ao Datafolha. Outros 12% pagam consultas e exames do próprio bolso --pela terceira vez-- para não ter de esperar por serviços já contratados.

Pior, a moléstia vem se agravando: em 2012, eram 15% os que já haviam recorrido ao SUS. Houve, assim, um incremento no grupo dos insatisfeitos com os planos.

Em números absolutos, 2,3 milhões de um total de 10,4 milhões de clientes paulistas foram empurrados para o sistema público por deficiências dos planos de saúde. Filas e atrasos, como no SUS, são as queixas mais frequentes.

O pronto atendimento em hospitais conveniados dos planos ocupa o topo das queixas: 80% relatam problemas (em 2012 eram 72%), como salas de espera superlotadas (74%) e demora no atendimento (55%). Dois terços se queixam das consultas médicas, sobretudo da demora para agendá-las (52%).

Se essa situação não chega a configurar uma tragédia como a do sistema público, pode-se dizer que caminha na mesma direção. A responsabilidade por essa deterioração recai em grande parte sobre a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que só passou a exercer pressão efetiva sobre o setor há um ano, ao suspender a comercialização de vários planos.

A omissão da ANS tem sua origem, decerto, na captura da agência pelos interesses do mercado que deveria regular --precisamente aquilo que os governos petistas prometiam evitar, ou reverter, mas que na prática deixaram prosperar.

Duas semanas atrás, o diretor de gestão da ANS, Elano Figueiredo, pediu demissão após confirmar-se que havia omitido do currículo ter sido representante jurídico da operadora Hapvida até 2012.

A saúde brasileira, em resumo, vai de mal a pior, seja no sistema público, seja no setor privado --dupla infecção que não será debelada por iniciativas eleitoreiras.

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