quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

O Pará existe?

Esse foi um evento marcante para mim, mais importante até que a criação do Mato-Grosso do Sul e Tocantins. Dessa vez o show de desinformação explícita ao arrepio do bom-senso, regado e amparado por altíssimas doses de torpe visão politicamente correta fez com que a divisão de um Estado que já não tem integridade, em função das extensas áreas de preservação ambiental, reservas indígenas e quilombolas -estas duas sem nenhuma interferência do Estado Federação (claro está que querer que os "esclarecidos" soubessem disso era pedir demais)- fez com que regiões que produzem e recolhem impostos federais não os veja retornar para seus benefícios por ficarem, em grande parte, retidos em Belém -note-se o cinismo do atual governador falando em "repensar" investimentos para os insatisfeitos.

O que ocorre em termos de gestão tributária nos municípios que queriam a merecida autonomia ressalta a flagrante desigualdade social que, pessoas com acesso às mídias sociais, em tese, deveriam estar lutando contra, talvez, pelo menos, na mesma intensidade com a qual defendem animais mal-tratados ou outros temas de flagrante e intensiva insignificância nas mídias socias para justificar seus altos investimentos em celulares smart phones ou Ipad's.

Não sou paraense mas relembro as dificuldades enfrentadas pelos cidadãos de Santarém, Altamira, Marabá, Paraupebas etc e me revoltei um pouco ao ver a alegria dos moradores de Belém felizes por continuar se beneficiando na maior proporção de investimentos públicos em retorno a uma arrecadação cuja origem eles mesmo não contribuíram na íntegra. Ou seja, felizes em ver seus irmãos lhes sustentando enquanto passam necessidades.

O tema central dos pífios argumentos era o aumento de cargos públicos, como se todo o cidadão brasileiro (incluindo os que dão golpe nas declarações de imposto de renda ou compras sem notas fiscais ou produtos piratas) viesse a pagar as despesas. O impressionante é que o affair do CPMF, onde a mídia veiculou várias matérias explicando como se dava a arrecadação de impostos e tarifas de toda sorte e o motivo pelo qual o governo federal dependia, avidamente, da manutenção desse imposto, de nada adiantou em termos de agregar valor na capacidade de avaliar cenários dos cidadãos ligados, antenados e conscientes. Afinal, nunca se gosta de falar de política e na hora de se dar uma opinião sobre um importante tema a opinião alinhada com a moda, seja ela coerente ou consistente, de nada importa, afinal, a maioria pensa da mesma forma.

Enfim, o que procurei falar aos amigos é que sem se entender um pouco acerca de lei de responsabilidade fiscal, regime da política tributária nacional, fundo de participação de estados e muncípios (transferência de rendas) jamais conseguiria se entender a intensa e profunda desigualdade que os "insatisfeitos" viviam.

Eu não vivo no Pará, mas esse evento, com o que, lamentavelmente, li nas mídias sociais me deixou bastante desiludido. Afinal, temos acesso a informação, a questão é que, mesmo quem tem acesso a internet e mídias sociais, não tem a menor capacidade de fazer um bom uso dela, o que dirá mobilizar seu entorno contra a corrupção ou desigualdade social. Não admira que kits e passeatas de toda sorte tenham tanta visibilidade em uma sociedade confusa e sem referenciais para se manter em busca do desenvolvimento.


Falta leitura e reflexão.





 O Pará existe? 
MARCELO COELHO
FOLHA DE SP





Não sei como dar conta do paradoxo, do beco sem saída que a votação mostra do ponto de vista lógico

Não lembro mais em que Copa do Mundo, com o Brasil já desclassificado, a Alemanha disputava a final. Mesmo sem interesse por futebol, um amigo torcia com entusiasmo pela seleção adversária.

"Vitórias da Alemanha são sempre má notícia", explicou. Seguia um pouco o espírito daquele político francês dos tempos da Guerra Fria, que dizia adorar o país de Hitler e Bismarck. "Gosto tanto da Alemanha que acho ótimo existirem duas."

Não tenho a mesma implicância, mas de algumas torcidas eu não abro mão. Pode ser preconceito, ou raiva injusta, mas, no caso de Duda Mendonça, sou como o amigo germanófobo. Encaro como má notícia qualquer vitória do famoso publicitário baiano.

Leio que não deu certo sua campanha pela divisão do Pará -e, só por isso, já tenho motivos para comemorar o resultado do plebiscito.

Não é que Duda Mendonça seja ruim como marqueteiro. Ao contrário, ele é bom demais. Se, em determinada eleição, a maioria ficou imune aos seus truques e técnicas, isso pelo menos me dá a segurança de que a manipulação publicitária não pode tudo.

Duda Mendonça ressuscitou Maluf na forma de doce de marzipã, inventou um Lula sabor de pêssego, aplicou slogans e jingles idênticos para candidatos de partidos diferentes, e, até na Argentina, numa campanha para Menem, usou a sua receita para fazer da política uma geleia geral.

O Pará resistiu. Viva o Pará. Viva o Pará? O problema é que, fora minha antipatia pelas artes de Duda Mendonça, o resultado do plebiscito não me deixa convencido.

Claro, novos Estados significam novos governadores, novas Assembleias Legislativas, diminuição do peso político de São Paulo no Congresso, mais gastos e desperdícios.

Mas basta dar uma olhada no mapa para pensar que esses Estados gigantescos são coisa do passado; a tendência, na medida em que se povoam, é se dividirem mesmo. Fica estranho haver tantos Estados pequenos ao leste do país e imensidões no oeste com um ou dois governadorezinhos tomando conta de tudo.

De resto, o plebiscito do Pará teve um resultado estranhíssimo. Não sei como dar conta do paradoxo, do beco sem saída que a votação apresenta do ponto de vista lógico.

A maioria dos paraenses votou pela manutenção do Estado como é hoje. Mas a maioria dos paraenses se concentra na região de Belém. Os habitantes de Carajás, em sua maioria, queriam Carajás. Os habitantes de Tapajós também queriam Tapajós. Ou seja, a vontade da população estava dividida. Um plebiscito que fosse realizado apenas nas cidades tapajenses, ou tapajoaras, seria esmagadoramente a favor da separação.
"Queremos autonomia, queremos nos separar", dizem os carajenses, ou carajanos. "Não podem, vocês têm de ficar conosco", diz a maioria de Belém.

Quem tem razão? Qual a legitimidade para se manter uma união de três partes se duas delas não querem permanecer unidas?

Ou seja, não fica claro, num plebiscito desse tipo, quem é o sujeito, quem é o agente da decisão. "O Pará" quer se manter unido. Mas é a existência dessa entidade, "o Pará", que está em discussão. Belém decide o que quer fazer com Tapajós; e como Tapajós oficialmente ainda não existe, não pode sozinho passar a existir.

E, se Belém decide por Tapajós, por que não estender a decisão para todo o país? Paulistas, mineiros, baianos têm seu interesse afetado também. O assunto não é "paraense", é nacional. Conceder a um Estado o poder de dividir-se ou não talvez seja ilegítimo.

O diabo é que não sei bem para que os Estados servem, do ponto de vista administrativo. Políticas de segurança, políticas econômicas, leis sobre meio ambiente, royalties do petróleo, quase tudo o que importa só pode funcionar sob uma ótica federal.

A autonomia dos próprios Estados tende a ser cada vez mais ilusória. É resquício de um passado em que o país sobrevivia sem tanta integração e interdependência. Não faz sentido que professores ou policiais no Estado A ganhem o dobro do que ganham seus colegas no Estado B.

Só vejo uma vantagem: é que, com um Congresso desmoralizado, são os governadores que respondem por um mínimo de equilíbrio de poder, impedindo que o poder presidencial se torne absoluto.

Nada como um pouco de relativização e de diferença na vida política. Relativizando mais ainda, quem sabe se, afinal, Duda Mendonça não estava certo desta vez.

Um comentário:

  1. Jefferson, parabens!
    Texto claro e objetivo, retrato da realidade local.
    Carinha

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