EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo
Não são apenas os números, por si sós espantosos, que assustam no caso da indefinição sobre o destino a ser dado às concessões dos serviços de energia elétrica que vencem em 2015. O que mais incomoda os consumidores, os dirigentes das empresas concessionárias e os potenciais investidores é a dificuldade do governo em propor uma solução para um problema conhecido desde 1995 e que, se não for resolvido com presteza, poderá paralisar boa parte do sistema elétrico brasileiro. Isso pioraria as condições do fornecimento de energia. Afinal, as incertezas sobre a situação das atuais concessionárias já impediram soluções de mercado para alguns casos e vêm limitando os investimentos indispensáveis para a manutenção, melhoria e expansão dos serviços.
O problema não existiria se o governo tivesse adotado, a tempo, a solução que já está definida em lei. Aprovada há mais de 16 anos, a Lei Geral de Concessões, que regulamentou os regimes de outorga e prorrogação das concessões dos serviços do setor elétrico (produção, transmissão e distribuição), é clara. Ela dispõe que, uma vez vencida a concessão, esta será revertida ao poder concedente (no caso, a União), que deverá ressarcir as concessionárias dos valores referentes a investimento não amortizados e, em seguida, realizar nova outorga por meio de licitação.
A excessiva demora do governo em colocar em prática a solução estabelecida pela lei tornou sua adoção problemática. Vencem, em 2015, as concessões de geradoras que respondem por 20,2 mil MW (18% da oferta de energia) e 80,2 mil km de linhas de transmissão (84% do total), além de 23% da energia comercializada no País. Será necessário definir um modelo para a licitação, com regras claras sobre a qualidade e o preço dos serviços, e garantias suficientes para o investidor que se dispuser a aplicar os recursos necessários para obter a concessão. Há muito pouco tempo para isso.
Os valores impressionam. Antes de fazer nova licitação, o governo terá de ressarcir as atuais concessionárias num montante que pode chegar a R$ 47,1 bilhões, de acordo com cálculos feitos pelas próprias empresas. É possível que o total esteja superestimado, mas dá uma ideia da dimensão financeira da questão. E ainda será preciso encontrar investidores com recursos suficientes e dispostos a disputar as concessões.
Por causa dessas dificuldades, passou-se a examinar a possibilidade de renovação das concessões que vencem em 2015. Também este caminho é complicado, pois exigiria mudanças na legislação, sujeitas a lentas e complexas negociações no Congresso.
Relatório encaminhado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) à Presidência da República aponta mais pontos positivos do que negativos na prorrogação das concessões, ao contrário do que ocorreria com a convocação de uma nova licitação. A renovação evitaria o risco de perda de valor das concessionárias, eliminando o risco de comprometimento dos recursos disponíveis para a ampliação do parque gerador, e permitiria a eliminação de deficiências do modelo atual. Entre os pontos negativos estão a menor transparência na fixação do preço da energia elétrica.
Em fins de novembro, o TCU deu prazo de 60 dias para o governo definir um plano de ação para os vencimentos das concessões do setor elétrico, indicando datas, atribuições e responsáveis para definir o modelo a ser adotado, incluindo parecer jurídico quanto à constitucionalidade e à legalidade da alternativa escolhida.
Por falta de definição quanto à prorrogação das concessões, o leilão de privatização da Cesp, em 2008, não teve interessados. Com seu futuro indefinido, algumas das concessionárias frearam ou interromperam planos de investimentos, com prejuízo para os consumidores. A redução ajuda a explicar a frequência dos colapsos no sistema elétrico, não obstante as multas aplicadas pelos órgãos reguladores.
Qualquer que seja a solução que o governo adotar - e isso tem de ser feito com urgência -, ela precisa oferecer maior segurança jurídica para o bom funcionamento do setor, estabelecer regras claras e duradouras, assegurar tarifas adequadas para consumidores e investidores e conter a exigência de prestação adequada de serviços e de contínua expansão da oferta de energia.
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