EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
Projeto franqueia TV a cabo para telefônicas; promessa de ampliar e baratear serviços, inclusive internet de banda larga, precisa de metas claras
As mudanças na lei de TV a cabo, aprovadas pelo Congresso Nacional e à espera de sanção da presidente Dilma Rousseff, deverão produzir efeitos amplos em todo o setor de telecomunicações.
Existe hoje um despropositado gargalo no setor. A ampliação da infraestrutura para TV por assinatura e internet de banda larga demanda pesado investimento, por exemplo para estender a rede de fibras óticas a mais cidades.
Só 262 dos mais de 5.500 municípios brasileiros contam com TV a cabo, que alcança 36 milhões de pessoas num país de 190 milhões.
Sem alteração do atual modelo, que data de 1995, e sem a permissão para empresas nacionais e estrangeiras de telefonia entrarem nesse mercado, o investimento necessário continuaria reprimido.
As teles poderão, a partir de agora, oferecer a seus clientes pacotes que englobem três ou quatro serviços de telecomunicação, como internet, televisão e telefonia (fixa e celular). Terão mais incentivos para ampliar a rede de cabos e, por força da competição entre si, oferecer serviços mais baratos.
A banda larga é o setor mais cobiçado. Cresceu 57% nos últimos 12 meses e já engloba 45,7 milhões de clientes, mas se amplia com base na telefonia celular, em geral de desempenho ruim.
Não por acaso, a aprovação da lei que franqueou o mercado às teles ocorre no momento em que ganha corpo o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), que objetiva universalizar o acesso à internet rápida. O governo espera, como contrapartida, que elas invistam R$ 60 bilhões, em dez anos, na expansão da infraestrutura.
Uma mão lava a outra, depreende-se. Mas a mão do Estado deve precaver-se, fixando na regulamentação da lei metas verificáveis de capilarização da rede, qualidade de serviços e redução de tarifas.
Outro compromisso obtido pelo governo federal está na decisão de separar distribuição de sinais e produção de conteúdo. Pelo artigo 5º do projeto de lei nº 116, teles não poderão deter mais que 30% do capital de empresas de radiodifusão, produção e programação; estas, por sua vez, não poderão ultrapassar 50% do capital votante nas de telecomunicações.
Um resultado previsível da norma modificada será a transferência de controle da distribuidora Net Serviços, da Globo para seus sócios do grupo Telmex, do mexicano Carlos Slim. Mas a Globosat, nesse quadro de separação, poderá continuar em posição dominante na área de conteúdo.
Tal divisão salomônica da cadeia de telecomunicações deu origem a um dos dispositivos mais controversos da nova legislação: o estabelecimento de cotas para programas brasileiros (como os de emissoras tradicionais) e também para os de produtoras independentes. É razoável: a lei reserva apenas meia hora por dia para a programação nacional, metade disso para produções independentes (ou 15 minutos diários). Além disso, de cada três canais, um teria de ser nacional.
Não parece absurdo, para um país que decida manter produção cultural própria. E essa reserva valeria só pelos próximos 12 anos.
A grita contra o controle do cumprimento das cotas pela Ancine (Agência Nacional de Cinema) parece exagerada. Basta regulamentar que a fiscalização se faça apenas sobre a origem da produção, não sobre o conteúdo.
A nova lei -que provavelmente será sancionada como está- inicia a adaptação do mercado de telecomunicações brasileiro à evolução da tecnologia no sentido da chamada "convergência" dos serviços, uma tendência mundial.
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