terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Semeando incertezas


MAURICIO CANÊDO PINHEIRO
O GLOBO

As recentes medidas do governo para reduzir o custo da energia elétrica no Brasil já foram alvo de intenso debate e muita controvérsia. Boa parte da discussão se deu em torno do conteúdo das medidas, ou seja, dos efeitos que as novas regras, por si, teriam no setor. Entretanto, tão importantes quanto o teor das medidas, são os aspectos relativos à forma como elas foram anunciadas.

Os ativos envolvidos na prestação de serviços de infraestrutura não podem ser facilmente alocados para outros usos. Uma vez que o investimento já foi feito, os governos se sentem tentados a extrair condições mais vantajosas do que aquelas acordadas inicialmente. Quando os investidores anteveem essa possibilidade, ajustam suas expectativas, reduzindo o nível de investimento. Trata-se do risco regulatório.

As normas de funcionamento dos setores de infraestrutura, definidas pelo arcabouço legal e pelos contratos de concessão, são muito importantes para minimizar o risco regulatório. Mas não são suficientes. É preciso também uma governança regulatória adequada.

Entre outras medidas, o governo deve buscar emitir os sinais corretos e evitar ruídos na comunicação de suas decisões. Principalmente daquelas que têm impacto na taxa de retorno dos investimentos.

Embora um bom ambiente regulatório deva minimizar o grau de discricionariedade, decisões do governo em setores regulados sempre têm algum nível de arbitrariedade. Além disso, dificilmente envolvem situações em que todos ganham. Sendo assim, é importante que o processo decisório seja considerado "legítimo" ou "justo" por todas as partes interessadas. Todos os agentes afetados pela decisão - empresas e consumidores - devem ser envolvidos e consultados.

Nesse sentido, a publicação com antecedência de estudos que sustentam as decisões e a realização de consultas e audiências públicas são mecanismos consagrados. Esses procedimentos ajudam a ancorar as expectativas dos investidores e dão mais transparência às decisões, reduzindo a percepção de risco regulatório por partes dos agentes econômicos.

Nada disso foi feito no âmbito das recentes medidas no setor elétrico. Não por acaso, criou-se a partir do seu anúncio um ambiente de incerteza e volatilidade, que em nada ajudou no processo e que tirou o foco dos pontos essenciais da discussão.

É inegável que o custo da energia é um dos principais entraves ao crescimento sustentado do Brasil e que é urgente reduzi-lo. Entretanto, é preciso atenção aos detalhes. Se o governo pretende atrair o investimento privado para o setor de energia no Brasil - e é importante que o faça - deve estar atento não somente às normas em si, mas também à governança regulatória. O mesmo vale para os demais setores de infraestrutura. Nesse sentido, particular atenção deve ser dada aos ritos e procedimentos envolvidos na proposição e na mudança das regras. O conteúdo é essencial, mas a forma também é importante.
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