segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Xerém do Zeca.





Sem querer desqualificar a ação humanitária, in loco, do artista, desde as seis da manhã, tal lastimável efeméride é um excelente exemplo de como a leitura apressada e superficial do Facebook e tweeter transformam cidadãos regulares (regular Joe) em heróis, ainda que celebridades em UM segmento artístico.

Xerém do pé de serra, do bom forró do pé de serra antes da chegada de Zeca, sempre teve problemas com chuvas fortes. Depois que fecharam a FNM (Fênêmê - Fábrica Nacional de Motores, estatal que produzia caminhões horrível aspecto, mas de tecnologia avançada para a época) pelo governo militar para dar espaço a ampliação da Ford, Wolkswagen e Chrasler, ela virou mais do que um distrito dormitório do Rio e Caxias, virou uma cidade fantasma.

A chegada do Zeca de Xerém e sua fama trouxeram nova vida a Xerém, sinônimo de "longe p'rá cacete" como diziam as colegas do Pedro II do Engenho Novo. Quando queríamos namorar uma gatinha do Grajaú, Tijuca ou Méier, padrão minhas saudosas amigas Vera Paes  e Jane Paes, elas (não estas) vinham com um desdém de "ele é de Xerém" pra dizer que o pretenso namorado morava longe pacas. Sentia como se onde Judas perdeu as botas fora posto para reabastecimento...

Com Zeca e seu pagode Xerém passou a ser chic, como toda boa e genuína mania de carioca. Assim como a Helibrás, a CSN etc, quando vão se interiorizar levam o desenvolvimento junto. No caso daquelas engenheiros querem boas escolas, comércio, serviços, ruas e vias com boa assessibilidade, energia sustentável. Assim, Zeca e seu pagode desenvolveram um razoável elenco de comércio e serviços que, aliado a nova imagem carioca chic, tornou a distrital Xerém cobiçada. 

Mas e aí? Aí é que para mim, ele não é mais herói do que o moço com a vassoura na calçada, ou qualquer outro "popular" também lá salvando o que restou de vidas e patrimônios. Absurdo. Talvez para os de leitura light, breve e fátua que só o Facebook e tweeter proporcionam. 

Quem se aprofunda um pouco mais leria no Atlas de Saneamento do IBGE, que eu já informei algumas vezes, que o primeiro motivo de enchentes é o lixo urbano, o segundo, desmatamentos em encostas para construções irregulares. Tcharam!! Pois é, com o aprofundamento, a desconstrução do mito se revela.

Se não vejamos. Xerém do Zeca sempre teve alagamento e deslizamentos com chuvas fortes de janeiro. Vinte anos era tempo mais do que suficiente para se aprender e prever isto, com bastante antecedência. Se o Zeca atraiu novos moradores para a Xerém do Zeca, era razoável a expectativa de um ilustre e influente vizinho procurasse, por lei, impedir construções irregulares que levassem ao segundo principal motivo de deslizamentos. Ele fez? Acho que não. Deve ter pensado que os vizinhos "tavam defendendo o deles". 

E quanto ao primeiro motivo? Não é razoável, também, se supor que uma pessoa que sai na foto abraçada com Lula, Cabral e o prefeito do Rio, Paes, não tivesse bala na agulha e influência suficientes para se dar ao trabalho de procurar saber o motivo pelo qual a coleta de lixo estava atrasada semanas? Ele fez isto? Também os fatos sugerem que não. Por que, então, dizer e atribuir culpa aos políticos -pelo visto nenhum dos três da foto-? 

Será que ele e os de leitura breve e light do Facebook que o transformaram e herói nacional, sabem que existem contratos públicos regidos por Lei, em um Estado Regular de Direito? Por que, novamente, ele não exerceu sua influência para forçar alternativas legais? Será que o cacife de quem sai abraçado em foto com o presidente não resolveria? Por que ele não fez? Por que não se antecipou à tragédia? Será que os políticos que ele tem nojo poderiam burlar a lei existente? E mais, será que ele, de fato, estava preocupado com os lixos nas ruas sem recolhimento?

Para mim, em termos preventivos, como figura pública cuja penetração e representatividade no distrito afetado é inquestionável, se omitiu em sua liderança e influência. Não deixo de reconhecer e louvar seu esforço, fidalguia e amor pelo próximo, depois da fechadura arrombada. Em termos de omissão preventiva, que diferença ele tem dos políticos que ele tem nojo? 

Portanto, antes de enaltecê-lo, como herói, em uma sociedade imersa na  mais absoluta crise de referenciais éticos e de lideranças sociais críveis, devagar com o andor porque o Santo é de barro.
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