O artigo do jornalista econômico abaixo narra, em forma inicial de leve prosa, um dos paradoxos que nossa economia vivencia atualmente. A pesada carga de impostos que nos afasta da competitividade internacional.
Vale a pena a leitura.
Dia dos Pais, a filha e... o custo Brasil
Carlos Alberto Sardenberg - O Estado de S.Paulo
Dia desses, num shopping em São Paulo, entrei numa loja de roupas, franquia de marca internacional, à procura de uma malha de lã, tipo cardigã. Tinha uma, bem bacana. O preço, não: quase R$ 500. Desisti.
Pouco depois, no Dia dos Pais, ganho de minha filha exatamente aquele cardigã. Uma alegria, claro, mas, sabe como é, um pai se preocupa se a filha é gastadeira. Saia-justa: não se pode reclamar do preço de um presente que se ganha. Mas que os R$ 500 por um casaco eram um absurdo, disso não havia dúvida.
Conversa daqui, conversa dali, o dilema se resolveu. Ela comprara o cardigã em Santiago, no Chile, na mesma franquia, também num shopping chique. O preço? Na casa dos R$ 200. Agora, sim, o presente ficara melhor.
De quebra, uma lição sobre o custo Brasil. A etiqueta do casaco mostra a origem - fabricado no Uruguai - e dá o endereço dos importadores no Chile, na Argentina e... no Brasil. Ou seja, é a mesmíssima malha, que sai, aqui, pelo dobro do preço chileno.
Como se explica? Basicamente, impostos. Aqui, de cada R$ 100 produzidos, cerca de R$ 35 vão para o governo na forma de impostos, taxas e contribuições. No Chile a carga tributária é de apenas 22% do Produto Interno Bruto (PIB). Lá, uma economia aberta, o imposto de importação, por exemplo, fica em torno dos 6%, o que eleva o grau de competição interna.
Aqui, o setor têxtil é um dos protegidos com alíquotas de importação elevadas. Mas o curioso dessa história é que a etiqueta do tal casaco informa ter sido produzido no Uruguai. Ora, este país pertence ao Mercosul, de modo que pelo menos o imposto de importação não deveria existir.
Ou seja, falta aqui uma apuração melhor desse comércio, que fico devendo ao leitor e à leitora.
Uma hipótese: talvez o produto não seja propriamente uruguaio, mas fabricado em algum país asiático - Vietnã, por exemplo, hoje um grande centro têxtil - e apenas nacionalizado ali no Uruguai.
A ver. Mas fica o registro desse enorme custo Brasil. E mais uma demonstração das consequências do protecionismo e de economias fechadas: exceto no caso de indústrias nascentes, em certas circunstâncias, a proteção à fabricação local leva a produtos de pior qualidade e mais caros. Uma conta para o consumidor.
Os meus lucros. Do presidente Lula, no dia 9 de agosto: "Todo mundo se lembra da quebradeira dos bancos brasileiros e do prejuízo que eles deram aos cofres públicos. Então quero que eles tenham lucro... por isso fico feliz. Fico feliz com a Caixa também, porque 15 ou 20 anos atrás esses bancos (públicos) só apareciam nos jornais como bancos deficitários - e hoje eles estão tendo lucros."
Explicando a história: grandes bancos privados brasileiros quebraram por causa do fim da inflação. Viviam de inflação. Como? Aplicando no overnight, em títulos do governo, o dinheiro que ficava parado nas contas dos clientes, um dia apenas que fosse. Ou, então, pagando juros de 10 na aplicação do cliente e recebendo 20 no mesmo dinheiro aplicado pelo banco. Era tão rentável que os bancos brasileiros nessa época nem cobravam tarifas.
Eliminada a inflação, o truque acabou e muitos bancos não conseguiram se reinventar e sobreviver. Para evitar uma quebradeira generalizada dos clientes, pessoas e empresas, o governo FHC criou dois programas de resgate das instituições: o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer), para os bancos privados; e o Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária (Proes), para os estatais.
Os donos perderam seus bancos. O governo os assumiu, liquidou alguns, passou outros para a frente e arcou com um prejuízo para sanear essas contas e impedir um colapso do sistema financeiro.
No caso dos bancos estatais o problema foi ainda maior. Havia o vício da inflação, mas, acima disso, o uso político das instituições - ou seja, o governo de plantão mandando a instituição emprestar, sem cobrar, para os amigos e correligionários. E, também, com os bancos públicos financiando enormes investimentos do próprio governo, que se revelaram inviáveis. Ou pararam pelo caminho ou não deram o retorno para ressarcir o banco.
Assim, por exemplo, quebrou o velho Banespa, que acabou privatizado.
Mas a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil também estavam quebrados. Não apenas davam prejuízo, como disse Lula, mas davam um enorme prejuízo.
Foram salvos pelo governo FHC, que, primeiro, colocou nos dois bancos um monte de dinheiro dos contribuintes para recapitalizar as instituições. E, depois, promoveu uma reforma completa no sistema de administração, preparando os bancos para a fase de expansão e de lucros.
Muita gente na época - inclusive este colunista - achava que o melhor seria privatizar um maior número de bancos estatais, federais e estaduais, ficando o governo com uma ou duas instituições de fomento. A tese: bancos públicos, mais cedo ou mais tarde, acabam sendo usados politicamente.
Mas prevaleceu a tese de manter aqueles gigantes financeiros estatais. É curiosa a história: apesar disso, Lula e, atualmente, Dilma Rousseff acusam o governo FHC de tentar privatizar os bancões. E mais: na época, Lula atacou os programas que sanearam os bancos.
Hoje, sem nenhum constrangimento e sem nenhuma revisão, simplesmente diz que no tempo dos outros os bancos davam prejuízo; na era Lula, olha só, só lucros. Êta nóis!
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