O artigo abaixo defende o projeto do Trem de Alta Velocidade.
É elaborado por um técnico do BNDES que irá financiar vultosas partes desse mega-projeto.
Para tal investimento atingir economia de escala teríamos, em meu entender, que ter o hábito de mensurar valores imensuráveis tais como o conhecimento e o tempo reduzido entre reuniões e formulações de negócios a serem consolidados.
De toda sorte é um argumento bem elaborado e apresentado e, independentemente de pendores ideológicos acredito valer a pena ler e acompanhar.
O TAV e o desenvolvimento regional
Autor(es): Maurício Borges Lemos, Diretor do BNDES |
Correio Braziliense - 16/08/2010 |
A oportunidade da concessão do Trem de Alta Velocidade (TAV) pode ser analisada em pelo menos quatro aspectos. Um primeiro refere-se à competitividade desse serviço de transporte em qualidade e preço em relação a outros serviços, notadamente a ponte aérea entre Rio e São Paulo. Um segundo refere-se ao balanço ambiental do projeto que considere tanto a sua implantação quanto a sua operação. Na verdade, cada um desses aspectos mereceria o detalhamento de um artigo específico. Por simplificação, partiremos do princípio de que o TAV apresentaria boa competitividade em preço e qualidade em relação ao concorrente mais próximo, bem como sua pegada de carbono seria também muito vantajosa em relação ao transporte aéreo.
Isso porque o foco no presente artigo refere-se a dois aspectos adicionais que estão ligados, do mesmo modo que os dois itens antes mencionados, ao custo-benefício de construção do TAV. Assim, um terceiro aspecto refere-se ao custo fiscal do projeto. Nesse caso, teremos um custo fiscal direto determinado pelo valor das desapropriações (entre R$ 3bilhões e R$ 4bilhões, que ficariam a cargo do governo federal) e um custo indireto determinado pelo financiamento do BNDES (limitado a 60,3% — R$19,9bi — do valor do projeto), o qual pode ter uma equalização do Tesouro Nacional (TN) no máximo de R$ 5 bilhões (se a receita bruta do TAV Brasil do primeiro ao quinto ano da operação for inferior àquela projetada nos estudos da ANTT).
A respeito de eventual equalização do TN, há controvérsias se o financiamento do BNDES, tendo como custo básico a Taxa de Juros de Longo Prazo — TJLP — (referência para o financiamento de todos os setores industriais, comerciais e de serviços, incluídas as concessões, inclusive as rodoviárias estaduais do estado de SP) implicaria custo fiscal. Estudos recentes de técnicos do BNDES mostram custo fiscal zero ou mesmo superávit fiscal, ao se considerar os retornos diretos e indiretos produzidos e induzidos pelo investimento. Portanto, é bastante provável e razoável supor que o custo fiscal do TAV será, no máximo, de R$ 9 bilhões, representando pouco mais de 25% do valor do projeto.
Tal valor poderia ser considerado baixo ou alto dependendo do custo de oportunidade de outros investimentos, bem como do custo-benefício do projeto em si. Se o custo de oportunidade for considerado em relação ao metrô, por exemplo, a comparação é altamente vantajosa para o TAV. Uma vez que o metrô não consegue remunerar nem pagar o investimento, vale dizer, ele tem de ser ressarcido integralmente pelos tesouros estaduais (ou federal, conforme o caso). Assim, a comparação deve ser feita entre a parcela subsidiada do TAV e todo o investimento no metrô. Note-se que o subsídio de R$ 9 bilhões não é suficiente sequer para construir 9km de linhas de metrô no Rio de Janeiro ou em São Paulo, ou seja, tal equalização (frise-se, sem custo fiscal) é um pingo d’água no oceano de necessidades das duas metrópoles.
A equação do custo de oportunidade fica ainda mais favorável quando se considera o quarto e principal aspecto do benefício do empreendimento: o TAV vai facilitar o deslocamento de executivos, consultores e mão de obra qualificada de forma a viabilizar localizações corporativas de primeiro nível fora da região metropolitana de São Paulo, que é, no momento, a única metrópole nacional, dada a secular decadência do Rio de Janeiro acentuada a partir dos anos sessenta.
Como é por demais reconhecido, a região metropolitana de São Paulo encontra-se com custos — deseconomias — de aglomeração crescentes, o que enseja duas estratégias alternativas que podem vir a ser complementares. A primeira é um esforço de microlocalização metropolitana, o que vem sendo tentado há várias décadas através da triplicação de rodovias em direção ao interior do estado, estratégia que, ao que parece, atingiu o limite em termos de eficácia. A segunda seria apostar numa segunda metrópole com aptidão nacional que fosse relativamente próxima de São Paulo.
A proposta do TAV viabiliza as duas alternativas na medida em que abre espaço para novo padrão de desconcentração concentrada microlocacional em Campinas e São José dos Campos e passa a viabilizar inequivocamente a volta do Rio de Janeiro ao cenário nacional, capacitando-o como metrópole nacional alternativa — e complementar — a São Paulo.
Para aqueles com arraigado sentimento paulistocêntrico, não há nada no horizonte a preocupar, uma vez que o Rio de Janeiro, dadas algumas de suas limitações, dificilmente seria um espaço concorrente, mas provavelmente complementar a São Paulo. Em termos locacionais dos níveis corporativos, estaria acima de Campinas e São José dos Campos, mas certamente um degrau abaixo da grande metrópole brasileira.
Nesse caso, o TAV ajudaria o coração econômico do Brasil — a região metropolitana de SP — a ter as artérias desobstruídas, viabilizando maior crescimento e um desenvolvimento regional mais equilibrado da economia brasileira. Com o TAV ganham o Rio de Janeiro, São Paulo e o Brasil.
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