sábado, 10 de dezembro de 2011

As pessoas em primeiro lugar?



     Por mais que me esforce, não consigo concordar completamente com a frase famosa que várias empresas e consultores de Recursos Humanos apregoam: "As pessoas em primeiro lugar, os produtos e o lucro vem a seguir".
     Considerando que sou um psicólogo e mesmo um destes tais consultores de Recursos Humanos, a minha discordância fica ainda mais difícil de compreender, a ponto de eu mesmo questionar a minha posição, várias vezes, procurando por algo que ainda não tenha pensado, um ponto de vista que ainda não tenha abordado e que torne a proposta "As pessoas em primeiro lugar" totalmente aceitável. Mas, até hoje não encontrei.
     Na minha forma de ver as coisas, as pessoas vêm necessariamente em segundo lugar. E isso é para o bem delas. Penso assim justamente por conhecer os processos internos de crenças, de motivação e liderança que formam a base do comportamento humano no trabalho. Penso assim por respeitar o modo como as pessoas "funcionam" no trabalho, por conhecer os caminhos que fazem as pessoas darem o máximo de si.
     Nós humanos somos seres de significado. Nossas crenças nos importam mais que tudo. Vivemos do que acreditamos, muito mais que da realidade objetiva. E uma das mais efetivas crenças em termos de motivação é ter um objetivo. Acredito firmemente na idéia de que o ser humano é um essencialmente um lutador. Damos o melhor de nós, quando estamos lutando por um objetivo que nos pareça importante. E ficamos profundamente desmotivados quando nos falta um objetivo que tenha significado em nossa vida. Nesta situação, alguns ficam tão deprimidos que chegam a questionar a própria vida. Por objetivos somos capazes de coisas que nunca faríamos sem eles, como matar nossos semelhantes, em guerras. Objetivos nos movem, o tempo todo. São a base de nossa motivação.
     Outra de nossas características fundamentais é que seguimos líderes. Onde quer que se juntem pessoas, a liderança despontará. É um processo natural de nossa psicologia. Seguimos quem aparente saber o caminho à frente. Os líderes definem o caminho a seguir, e nos encorajam a seguir em frente. Eles criam os significados que se tornarão objetivos para nossa vida. Pense novamente em um líder militar em uma guerra. Como Eisenhower e Churchill conseguiram que mais de 100.000 pessoas se dispusessem a participar de um ataque praticamente suicida à praias fortemente defendidas, no dia D? Por meio de significados que naquele momento especial assumiram valor maior que a vida de cada um. A vida de todos, a pátria, a liberdade. Os líderes apontaram esse caminho, atribuíram os significados, e as pessoas os seguiram.
     Agora pense na proposta inicial de algumas empresas "As pessoas em primeiro lugar". Para onde essa proposta aponta? Qual o objetivo que norteará a ação de todos dentro dessa empresa?
     Colocar as pessoas em primeiro lugar não dá a elas um objetivo comum, um significado maior pelo qual lutar. Volta-as para dentro de si mesmas. Coloca-as em busca de seus objetivos, da forma como elas já os definiam. É uma proposta individualista, que dispersa esforços. Nesta proposta a empresa abdica de usar os princípios da liderança para definir os rumos de todos como grupo organizado. Assim a empresa perder-se-á em uma miríade de objetivos pequenos que não apresentam coesão. E as pessoas não se sentirão parte de algo maior que elas, algo que lhes dê um significado maior para seu trabalho. Por incrível que pareça, já que estávamos buscando a satisfação dos objetivos delas, as pessoas sentir-se-ão frustradas, perdidas, sem rumo.
     Os funcionários das empresas são pessoas, e gostam de lutar por algo maior. Gostam de sentir-se produtivos. Gostam de saber que seus esforços tiveram resultado. Gostam de saber que estão todos juntos lutando por um objetivo. Dê a eles um objetivo compartilhado, e terá o melhor de todos. E esse objetivo, em uma empresa privada, comercial, pode ser a rentabilidade, o lucro, a liderança de mercado, a produtividade. Buscar um destes objetivos organiza os esforços de todos em uma luta que é possível vencer. Aglutina as pessoas em torno da liderança, dá a elas significado para àquelas horas de trabalho. Faz as pessoas sentirem que são capazes, que são produtivas.
     Há uma ressalva importante em minha proposta. O objetivo tem que ser compartilhado. Por exemplo, não pode ser apenas lucro para mim, como dono do negócio, ou para os acionistas. As pessoas têm que ter sua parte na divisão do resultado, com critérios justos. Isso faz parte dos elementos da liderança. As pessoas me seguirão como líder se eu tornar meus objetivos delas também. Mas para fazer essa operação terei que dividir ao final o produto de nossos esforços, de modo a manter o significado da luta verdadeiro para todos. Um líder tem que se justo com seus seguidores e valorizar o papel de cada um na consecução da meta.
     As pessoas na liderança absoluta do segundo lugar, portanto, é a minha proposta. Primeiro os objetivos, depois os meios para alcançá-los. O objetivo pode ser o lucro, os meios para alcançá-lo são as pessoas da organização. É como uma jornada: temos o destino programado à frente, e cabe à nossas pernas levar-nos até ele. Cuidamos delas apropriadamente alimentando-nos corretamente e descansando quando é necessário, pois sabemos que dependemos delas para chegar aonde queremos. Mas para fazê-las andar, precisamos que a mente dê a elas um destino, um norte. Sem um destino elas não sabem para onde ir. Tendo um destino, elas se sentirão bem de fazer o que sabem fazer, caminhar, e, apesar do cansaço, ao final do caminho, sentir-se-ão realizadas de ter levado-nos a ele.
     Mostre às pessoas um destino, e eles te seguirão. Alimente-os durante a jornada, para que estejam sempre fortes e em condições de caminhar. E alimente-os ainda mais e melhor ao chegar, para que sintam que a caminhada valeu a pena e queiram te seguir na próxima. Você verá que as pessoas se sentem muito bem estando em segundo lugar, desde que o primeiro lugar esteja ocupado por um objetivo comum a todos, que lhes torne a vida cheia de significado!

  Rodrigo Paiva de Castro - Psicólogo, mestrando em Administração de Empresas e professor de Psicologia Organizacional. Atua como consultor em RH.
Texto retirado do site www.rh.com.br
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