quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Quando o mais importante é o silêncio -


JOSÉ-MANUEL DIOGO
O GLOBO


Brasil de repente ficou no meio da polêmica mundial. Em menos de um mês parece que o Itamaraty virou referência para roteirista de James Bond.

Os brasileiros redescobrem o mundo da espionagem e ao mesmo tempo ficam sabendo, pela voz da sua presidente, que o Brasil não tem espiões de qualidade - não há espião que resista.

Quando funciona bem, uma agência secreta é completamente invisível. A existência das melhores do mundo, como a britânica MI6, foi negada durante quase um século; a americana NSA é tão discreta que a chamam No Such Agency. Sempre que aparecer a palavra espião escrita em alguma notícia de jornal, quer dizer apenas que alguma coisa correu mal. A história da espionagem é feita com apenas de dois tipos de matérias: histórias verdadeiras sobre coisas falsas ou então ótimas mentiras sobre algo que nunca aconteceu.

Ao contrário de quase todas as atividades profissionais que muitas vezes são valorizadas por terem eco na opinião pública, quando se trata de espionagem e agências secretas o mais importante é o silêncio. Os espiões vão sempre fazer os seus relatórios ao chefe, nunca aos jornais, o que se aplica também aos espiões jornalistas. É um contrassenso. Alguém consegue contabilizar o verdadeiro custo para o Brasil da notícia que correu mundo de que um dos seus ministérios está sendo espionado?

Os tempos mudam demasiado rápido e o poderio econômico do Brasil não foi acompanhado pela modernização dos seus serviços de informação. Mas não adianta encontrar culpados em "fantásticas" matérias de TV. Isso vale para discurso político, mas não para a prática.

Nos dias de hoje, com o desenvolvimento - e também democratização - das tecnologias de informação, as atividades que todos conotamos com a espionagem clássica e com os espiões românticos que o cinema americano ajudou a popularizar, usando disfarces, microcâmeras, alteraram-se para sempre. Os espiões são agora muito mais tecnológicos e muito menos atléticos. Sabem programação de computadores, cálculo matemático e são sociólogos; provavelmente nem vão ao ginásio.

Os mais eficazes espiões da atualidade não são perigosos operacionais da CIA, do MI6 ou do Mossad, nem assassinos profissionais, nem agentes de elite, nem militares; são aqueles que através da internet sabem encontrar os caminhos para dominar o mundo.

Os hackers, homens e mulheres que conseguem entrar e alterar sistemas informáticos supostamente seguros, estão agora na primeira linha do recrutamento para as atuais agências secretas. Já não são mais locais como West Point, Sandhurst ou Resende os viveiros preferenciais para encontrar um candidato a agente secreto. Os novos espiões começam a sua atividade na mais tenra adolescência, percorrendo em sua casa, no quarto, os caminhos mais obscuros do mundo virtual. Fazem-no às escondidas dos pais e da sociedade, não seguindo nenhum código de honra ou parâmetro moral. O seu único objetivo é poder descobrir o que está escondido na internet; e o grande perigo para a sociedade é que tudo, de cada individuo, está na world wide web.

Mas, como se pode comprovar no caso do Canadá, que espionou o Ministério de Minas e Energia, não se trata de uma relação entre nações amigas. Isso nem está em discussão, até porque, nesse mundo da espionagem, amizade não existe. As relações se pautam por um único objetivo: interesse. E é uma prática que vem de longe. Sun Tzu, o sábio general chinês que viveu cinco séculos antes de Cristo, dizia que o que possibilita ao soberano inteligente conquistar o inimigo é o poder de previsão, e que esse conhecimento só pode ser adquirido por meio de homens que estejam a par de toda movimentação do inimigo. Por isso, devem ser mantidos espiões por toda parte. O fato é que todo governo gostaria de ter um BBB para chamar de seu.

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