Ruben Berta e Roberto Maltchik
O Globo
Apesar de verba já ter sido liberada, escolas ainda não foram reconstruídas
O ano letivo de 2011 seria o primeiro de estudos para Renata, de 5 anos, filha da doméstica Mônica Sabino França. Mas, em janeiro, as enxurradas que castigaram a Região Serrana atingiram em cheio o colégio onde ela estava matriculada, no bairro Cascata do Imbuí, em Teresópolis. Mais de seis meses depois, a menina não conseguiu vaga em outra unidade e vai ficar fora da sala de aula. Enquanto isso, R$74 milhões liberados em maio pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para o governo estadual reconstruir escolas atingidas continuam intactos, por problemas burocráticos. A Empresa de Obras Públicas (Emop) garante que a partir de amanhã os recursos começarão a ser aplicados.
- Tentei conseguir uma vaga num Ciep, longe da minha casa, mas nem assim consegui. Minha filha só vai poder estudar mesmo no ano que vem - diz Mônica, que havia matriculado Renata na pré-escola do Colégio Municipal Cascata do Imbuí, destruído em janeiro.
Entre escolas estaduais e municipais, só em Friburgo e Teresópolis há pelo menos 16 interditadas. Não há números precisos de alunos prejudicados, mas só em Teresópolis a prefeitura afirma que dez escolas foram condenadas pela Defesa Civil. Devido à destruição, 2.500 estudantes tiveram que trocar de colégio na cidade.
Em Friburgo, a situação também não é animadora. A prefeitura informou que, enquanto a verba federal não chega, "reformas contratadas pela Emop e realizadas em cerca de 50 unidades foram paralisadas por falta de pagamento". Ao todo, 60 colégios foram interditados no município. Quatro permanecem nessa situação. A prefeitura diz que milhares de alunos foram afetados. Há unidades funcionando em espaços adaptados, como associações de moradores e igrejas.
Verba está na conta do estado desde maio
Enquanto alunos sofrem as consequências, os recursos caminham lentamente. A tragédia ocorreu em 12 de janeiro e só em 25 de abril uma medida provisória do governo federal abriu caminho para a liberação da verba. Em 2 de maio, uma resolução regulamentando o repasse foi publicada. De acordo com o site do FNDE, desde 11 de maio, os R$74 milhões estão na conta da Secretaria estadual de Educação, sem uso.
Os recursos boiaram desde então no mar da burocracia. A Secretaria de Educação alega que a resolução federal determinou que o órgão assumisse a responsabilidade pelas obras nas escolas. Mas os serviços estão a cargo da Emop, subordinada à Secretaria de Obras. A Secretaria de Educação diz que pediu ao FNDE que a verba fosse direto para a Emop, sem sucesso.
No último dia 22, O GLOBO entrou em contato com a secretaria para saber por que o dinheiro não foi aplicado. Foi informado de que o órgão aguardava desde o dia 13 uma resposta do FNDE, sobre uma saída alternativa de emissão de notas de obras, que sairiam em nome da secretaria, mas com um carimbo ressaltando que a Emop usou o dinheiro na Região Serrana. Na última quarta-feira, o órgão informou que a solução foi aceita pelo governo federal.
Segundo o FNDE, os entraves burocráticos ocorreram no "âmbito do governo do Estado do Rio". O órgão federal não quis comentar o prejuízo aos alunos. Ainda assim, admitiu que, entre suas responsabilidades, está monitorar a aplicação do recurso. "Não cabe ao FNDE avaliar os procedimentos de nenhum governo, seja estadual ou municipal. Cabe repassar os recursos, estabelecer as regras para seu uso, monitorar sua aplicação e, depois, analisar a prestação de contas", informou em nota.
De acordo com a Emop, dos R$74 milhões, R$23,6 milhões começarão a ser aplicados nas escolas da Região Serrana a partir de amanhã. A verba será destinada à recuperação de 18 unidades estaduais e 73 da rede escolar dos municípios atingidos. Com a liberação dos recursos, o prazo é de 90 a 120 dias para a conclusão das obras. O restante do dinheiro (cerca de R$50,3 milhões) será usado depois para reconstruir unidades da rede municipal totalmente destruídas (R$41,7 milhões) e equipá-las (R$8,5 milhões).
À espera do repasse, há casos críticos, principalmente em Friburgo. Um levantamento do deputado federal Glauber Braga (PSB-RJ) mostra que há na cidade pelo menos seis unidades em situação extremamente precária. A Escola Anna Barbosa Moreira, no bairro de Lagoinha, é um exemplo: como a reforma não foi concluída, a unidade não foi reaberta, e os alunos precisam estudar numa sala improvisada na associação de moradores local.
Em Teresópolis, na região de Campo Grande, pais dizem que o fechamento da Escola Municipal Professor João Adolfo Josetti, onde estudavam 177 alunos, está criando dificuldades para as crianças. Elas foram remanejadas, apesar de a unidade estar aparentemente precisando só de pequenas reformas.
- Não tenho condições de pagar quatro passagens de ônibus (duas de ida e duas de volta) para meu filho estudar na escola onde consegui matrícula. Ele já está com 13 faltas este ano - reclama a dona de casa Estela Maria dos Santos, mãe de Yuri, de 6, e moradora de um bairro próximo a Campo Grande.
A prefeitura informou que a Escola João Adolfo Josetti, apesar de estar aparentemente em boas condições, tem risco iminente de deslizamento no seu entorno. Sobre o Colégio Cascata do Imbuí, disse que a estrutura do prédio pertence ao estado, que terá que se incumbir da demolição. A recomendação à mãe que não conseguiu vaga para a filha é que procure a Secretaria de Educação.
A Secretaria estadual de Educação disse que atualmente tem duas unidades na Região Serrana cujos alunos foram transferidos. A Etelvina Shotz, na região de Córrego Dantas, em Friburgo, está interditada pela Defesa Civil e os 197 estudantes foram para o Ciep Glauber Rocha. Já o Colégio Galdino do Valle, no Centro de Friburgo, está com problemas estruturais e seus 847 alunos foram para o Ciep Licínio Teixeira. De acordo com o órgão, já foram gastos R$13 milhões para que as escolas voltassem a funcionar o mais rápido possível.
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