quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Não é assim mesmo...



FÁBIO COLLETTI BARBOSA
FOLHA DE SP


Nossa pior atitude é aceitar que "é assim mesmo" e que nada podemos fazer para melhorar as coisas no país

Por muito tempo achei, assim como muitos, que a questão de cidadania se resolveria por meio de um melhor nível médio de educação. Entretanto, temos muitas evidências indicando que isso não é suficiente.

O reforço que teve de ser dado recentemente na questão do respeito dos motoristas à faixa de pedestres na cidade de São Paulo mostra como ainda temos de lidar com noções muito básicas de cidadania.

Note-se que essa falta de respeito à faixa de pedestres acontece de forma generalizada pela cidade, não importa se estamos falando de um bairro de maior ou de menor nível de educação ou de renda.

Isso indica que não será suficiente um amplo investimento em educação, mas precisaremos também buscar uma forma de darmos foco ao que o jornalista Gilberto Dimenstein, na sua coluna nesta Folha, há um mês, chamou de Educação para a Cidadania.

Observar as leis de TRÂNSITO, cuidar da limpeza das ruas, respeitar a fila, não estimular o comércio ilegal ou "pirata", evitar o desperdício de água, entre outras, são condutas básicas para que possamos melhorar a qualidade de vida de todos. Mesmo em zonas da cidade onde o nível médio de educação é certamente bastante elevado, esses desvios são cometidos a todo instante.

Ao comentar esses problemas com colegas, e especialmente com jovens, noto uma grande receptividade para que busquemos formas de mobilizar a sociedade, não apenas conscientizando, mas também punindo e expondo aqueles que negligenciam esses comportamentos.

Algumas iniciativas poderão vir das autoridades, como é o caso da Lei Cidade Limpa na cidade de São Paulo, que, na minha opinião, já poderia ser estendido para além dos outdoors, chegando às ruas e às calçadas da nossa cidade.

Os currículos escolares precisam certamente ser ajustados, incorporando essa visão de cidadania, do papel que cabe a cada um de nós, e a valorização da interdependência, que existe entre tudo e todos.

Ninguém vive sozinho, e nossas atitudes (boas e más) impactam o todo, que deve ser construído junto.

A sociedade civil tem ferramentas tradicionais e modernas para se organizar: as redes sociais, o Twitter, as associações de bairros, as empresas etc.

Não precisa ser nada grandioso, nada que abranja toda a cidade, mas, se cada um conseguir impactar o seu "ao redor", o seu grupo de relacionamento mais próximo, a somatória será grandiosa. E assim um importante passo terá sido dado na mudança de atitude e na abertura de melhores perspectivas.

Recentemente, o jornalista espanhol José Arias, do jornal "El País", escreveu um artigo que causou grande repercussão. Lá, ele pergunta por que não nos indignamos. O foco era a questão dos casos de corrupção no Brasil, e o assunto repercutiu em vários jornais e artigos.

A mesma questão, porém, pode também ser estendida para o aspecto da cidadania. Por que não nos indignamos? A resposta para ambos os aspectos (apatia diante da corrupção e das questões de cidadania), parece ser que muitos acham que esse não é um problema nosso, ou que é grande demais para resolvermos ou influenciarmos. Decorre daí a pior das atitudes, que é a de aceitar que "é assim mesmo", e nada fazer...

Felizmente, há outro movimento, positivo e com um número cada vez maior de pessoas, especialmente jovens, se indignando, se mobilizando, procurando acender a luz e mostrar as coisas como elas são.

Esse é um primeiro e importante passo para que tenhamos a dimensão do problema e possamos tratá-lo de forma adequada. A imprensa e a opinião pública têm importante papel nessa jornada, mantendo a chama acesa e apontando novos caminhos.

Empunhar a bandeira da cidadania, e agir de forma coerente, são maneiras de sedimentar a base para a construção de cidades melhores, e, portanto, de um país melhor.

P.S.: Com esta coluna me despeço deste espaço onde escrevi textos durante pouco mais de um ano.

A partir do final de setembro assumirei novas responsabilidades, em outro grupo de mídia.

Agradeço à Folha pela oportunidade e aos leitores pelas tantas manifestações de apoio.

FÁBIO COLLETTI BARBOSA, 56, administrador de empresas, é presidente do conselho de administração do Banco Santander e presidente do conselho da Febraban.

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