CLÓVIS ROSSI
FOLHA DE SP
O país tem "soft power" para ser ouvido no horror do Oriente Médio, mas está sendo muito tímido
MADRI - A presidente Dilma Rousseff falou um pouco ontem sobre a voz do Brasil no mundo, para dizer que "a política do Brasil será a de um país que não cultiva inimigos nem projeta intolerância".
É verdade, mas é pena que o atual governo pareça tímido em fazer ouvir a sua voz, especialmente em momentos agudos como, para ficar apenas na atualidade imediata, a violência entre Israel e o Hamas.
Pena não só porque um país que está em paz com o mundo e não é intolerante tem o "soft power" para ajudar a desarmar crises, mas também porque a posição brasileira sobre a situação em curso na Palestina é correta.
"Só haverá paz na região se houver dois Estados legitimamente consolidados [Israel e o Estado Palestino]", disse Dilma ontem.
É essa a razão de fundo para o conflito que agora subiu de novo às manchetes gerando "o horror que sensibiliza qualquer ser humano", como disse, ao lado de Dilma, Mariano Rajoy, presidente do governo espanhol.
De fato, a foto na capa da Folha de ontem de uma criancinha palestina morta por um ataque israelense na faixa de Gaza supera qualquer limite do horror.
É correto também o apelo de Dilma ao secretário-geral das Nações Unidas para convocar o Conselho de Segurança, de forma a discutir e impor um cessar-fogo, primeiro e indispensável passo para brecar o horror.
Note, leitor, que a presidente, ao apontar a necessidade de dois Estados consolidados legitimamente não está tomando partido, não está apontando o dedo acusador para ninguém, nem para o Hamas, que ataca Israel, nem para Israel, que responde com uma força desproporcional.
Rajoy, embora muito mais cauteloso e moderado que Dilma, é mais incisivo nesse ponto. Diz que "Israel tem direito à legítima defesa, mas nós solicitamos contenção na resposta, para que a situação não degenere em conflito aberto".
Quando digo que o governo é tímido, refiro-me à política de comunicação de Dilma e de seu chanceler, Antonio Patriota, não às posições deles.
Seguinte: Dilma só falou sobre o assunto que domina todo o noticiário internacional quando provocada por uma pergunta de André Luiz Azevedo (Rede Globo), na entrevista que concedeu ao lado do líder espanhol, após o encontro bilateral.
A presidente e seu chanceler não tomaram a iniciativa de apresentar-se, uma ou o outro, espontaneamente, para falar aos jornalistas -e, de preferência, não apenas aos brasileiros.
Em Cádiz, durante a 22ª Cúpula Ibero-Americana, havia espaço para que os líderes presentes falassem a um grupo enorme de jornalistas.
Espaço que usaram Durão Barroso, o presidente da Comissão Europeia, e os quatro presidentes da Aliança do Pacífico (México, Colômbia, Peru e Chile), para não mencionar Vanda Pignato, a primeira-dama (brasileira) de El Salvador, que falou sobre o combate à violência contra a mulher.
Uma tribuna imperdível para um país sem inimigos e sem intolerância, numa hora em que a intolerância leva ao horror.
Se continuar a falar baixo, o Brasil nunca será cachorro grande na cena internacional.
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